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“Parcerias Institucionais”

Capítulo 1 Sobre o SEBRAE

Capítulo 1 - Sobre o SEBRAE

Conforme foi visto na primeira parte da tese, as artesãs dos grupos de trabalho relatam que são muito incentivadas e apoiadas pelo SEBRAE. Todas as entrevistadas salientam a importância desse órgão para o trabalho que estão desenvolvendo. O próximo passo no desvelamento do universo do artesanato feito por grupos de mulheres em Brasília passa pelo entendimento do papel do SEBRAE no Distrito Federal, e ainda mais especificamente, pelo ponto de vista das pessoas dessa instituição que estão lidando diretamente com as mulheres.

“O SEBRAE ajuda. Aí eu ligo para Antonieta Contini, ou eu ligo para a Mônica, falo “nós estamos precisando de”. Dessa vez até essas miçangas que nós estamos fazendo, o SEBRAE ele doa para nós, eles ajudam. Retalhos de pano, de tecidos, enchimento das bonecas também, espumante para encher as bonecas, quer dizer, linha, essas coisas, matéria prima, o SEBRAE está sempre no tempo presente ajudando a gente. Sempre jogando para cima, isso é muito bom. Se tivesse várias empresas que fossem como o SEBRAE, que dessem um pouco do que tem para ajudar um projeto social, uma comunidade carente como aqui no Varjão, talvez o Brasil não estava com tanta miséria como está hoje. E não é falta. De os empresários não terem, que não possam ajudar, é falta de conscientização, de poder ajudar e direito de ajudar aquela comunidade. Então isso é muito interessante e muito importante também. Maria Anita da Silva, Mulheres em Ação/Arte Varjão

“É um pedacinho de nada. Como o SEBRAE, o que o SEBRAE nos cede? Um pedaço de tecido, um carretel de linha, um novelo, então isso já cria um trabalho lá na comunidade que para quem está lá fora não é nada, mas para elas que estão precisando desse dinheiro para aumentar um pouco a renda, que tem muitas que muitas vezes nem tem mesmo o que dar pros filhos é muito importante.” Maria Anita da Silva, Mulheres em Ação/ Arte Varjão

Nessa parte da tese eu apresento o SEBRAE como instituição diretamente ligada à organização do trabalho artesanal desenvolvido em Brasília, conforme apontado pelas próprias artesãs. Falar sobre o ponto de vista de uma instituição é algo complexo, uma vez que a Instituição possui uma existência social, embora seja formada por muitas pessoas reunidas alegadamente em torno de um objetivo ou propósito comum. Falar da instituição é falar das pessoas que a compõem, ao mesmo tempo em que cada pessoa não é a Instituição em si, embora fale em seu nome. O propósito das pessoas, quando elas falam pela instituição, muitas vezes se confunde com os propósitos da Instituição, que por sua vez não existiria sem as pessoas que a representam. Procuro aprofundar essa reflexão mais adiante, nessa segunda parte.

Analiso inicialmente um discurso institucional, conforme ele é apresentado no projeto de desenvolvimento local do SEBRAE, através das entrevistas realizadas com a Gerente de Desenvolvimento Local, Antonieta Contini. Ela é a pessoa responsável pelo encaminhamento das mulheres para a formação de grupos de trabalho e pelo projeto como um todo. Antonieta Contini trabalha pela promoção do empreendedorismo dentro do SEBRAE, visando encaminhar para um esquema formal, seja na forma de uma associação, organização não-governamental ou micro-empresa, aquele segmento de trabalho artesanal que costuma manter-se na informalidade.

Em seguida, analiso o conteúdo do website institucional do SEBRAE, porque em determinados momentos da entrevista os entrevistados se remetiam a ele para falar de determinados assuntos, e por perceber a força que pode ter um discurso institucional tornado público e disponível na web, para a reificação das falas dos informantes. Soava algo como: “não sou eu que estou dizendo isso, você pode ver no site do SEBRAE, é o SEBRAE quem diz assim” (seja ele quem for).

O contato com Antonieta Contini foi um dos mais difíceis durante o trabalho de campo, porque ela tem uma agenda cheia de compromissos, viaja bastante, para feiras e localidades em que organiza cursos, e também porque ela própria não atende diretamente ao telefone, sendo necessário marcar um horário para entrevistá-la. Assim, eu telefonava nos horários mais variados, conforme era informada de que conseguiria encontrá-la e repetidamente não a encontrava e não conseguia estabelecer contato ou marcar entrevista.

Finalmente consegui conhecê-la, indo pessoalmente ao SEBRAE num dia em que soube que ela teria retornado de viagem. Fui mesmo sem ter hora marcada. Permaneci lá sentada, na portaria, de plantão por algumas horas, até conseguir ser atendida. Uma vez atendida, ela mostrou-se muito simpática, conversou bastante, gravamos uma entrevista e gentilmente fui convidada a retornar sempre que necessário para novas entrevistas. Consegui seu telefone e diversas vezes voltei ao SEBRAE para conversar com ela, tanto sobre o trabalho do SEBRAE quanto para obter indicações de contatos com outras pessoas, como os designers que são contratados pelo SEBRAE para atuar junto aos grupos.

Os designers do SEBRAE fazem parte de um projeto chamado Via Design, que é apresentado também nessa segunda parte. Este projeto faz parte do programa de fomento ao artesanato e estímulo ao empreendedorismo que leva a denominação mais geral de Desenvolvimento Local. O conteúdo do website é mencionado na conversa precisamente naqueles momentos em que o entrevistado procura empregar a autoridade da Instituição para a qual trabalha para dar força ao seu próprio argumento, como um recurso de autoridade. Ele é acionado e funciona como se fosse um contrato firmado, com a força de uma lei. É o universo virtual operando como se fosse real. A análise discursiva do material apresentado no sítio institucional capturado na web, ao qual os entrevistados se reportaram reiteradamente durante as entrevistas, finaliza o primeiro capítulo.

A atuação dos designers desse projeto é discutida de modo mais detalhado nos capítulos seguintes. O contato com eles e a realização das entrevistas exigiu uma certa determinação, pois os designers em geral se mostram solícitos e dispostos a contribuir, mas ao mesmo tempo são pessoas atarefadas e envolvidas com muitos projetos ao mesmo tempo, o que faz com que estejam freqüentemente viajando.

Procuro descrever e mostrar o trabalho artesanal do ponto de vista daqueles

designers que permaneceram atuando junto aos grupos já apresentados na primeira parte da

tese. Busco mostrar quais são os discursos com os quais operam nas suas propostas, a partir da análise do material discursivo obtido por meio das entrevistas, com Antonieta Contini e os próprios designers do SEBRAE.

Dentre os consultores de design do SEBRAE, destaco o trabalho de Kátia Ferreira, consultora que decidiu assumir a liderança de vários grupos de trabalho, espalhados por Brasília inteira, montando suas próprias coleções de moda e inaugurando uma grife própria, chamada Apoena. As artesãs do grupo Mulheres em Ação e Arte Varjão, que têm no SEBRAE seu grande parceiro e incentivador, também fazem trabalhos de patchwork e fuxico sob encomenda para a grife Apoena.

O principal designer do SEBRAE de Brasília, na época da pesquisa, era Renato Imbroisi, responsável pelo desenvolvimento do produto das Bordadeiras de Taguatinga Flor do Ipê e da Flor do Cerrado, entre outros. Os dois casos são apresentados a partir das entrevistas realizadas com esses consultores. Analiso o papel do consultor de design na sua intersecção entre o universo das artesãs e o mundo do consumo e da moda, que ele representa.

Ao final da análise do papel dos designers no campo do artesanato e na interface com a moda, discuto a idéia de “coisas do tempo da vovó”, surgida na fala de alguns

informantes, e procuro demonstrar em cada caso como se aliam práticas “herdadas” ou “tradicionais” com as atualizações que visam “modernizar” ou “dar uma cara nova” para a produção artesanal. Ou seja, começo por analisar esse aspecto simbólico, assim como procuro apontar também outros existentes, do resultado da interação entre o trabalho das artesãs e sua vontade de trabalhar, face aos projetos do SEBRAE para incentivar e promover tais atividades, por meio do design.

No capítulo intitulado “A carteirinha de Artesão”, procuro descrever a dinâmica da empreitada burocrática de registro de um artesão em Brasília, na Secretaria do Trabalho do GDF, órgão competente para essa finalidade. Acompanhei a trajetória de várias artesãs em busca do registro oficial, numa jornada que tem início logo pela manhã e consiste basicamente na exposição das capacidades artesanais associada ao emprego de determinados materiais. A obtenção do documento pode levar muitas horas, ou mesmo um dia inteiro. Isso tudo para o encaminhamento do pedido, porque o documento em si, chamado “Carteira do Artesão”, só fica pronto aproximadamente um mês depois do pedido. O documento final é entregue numa ocasião solene, pelas mãos do próprio Secretário do Trabalho do Distrito Federal, em Brasília.

Discuto ainda as diversas formas de parcerias que conectam os atores sociais presentes e relevantes no universo do artesanato de Brasília, com foco principal na proposta de trabalho do SEBRAE/DF e nos seus consultores.