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Sobre o surgimento da Culpa

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II. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

II.4 Sobre o surgimento da Culpa

Sobre a culpa cita Melanie Klein (1957/1974):

Parece que uma das consequências da inveja excessiva é a culpa. Se a culpa prematura for experimentada por um ego ainda não capaz de suportá-la, ela é sentida como perseguição e o objeto que desperta a culpa se transforma em perseguidor. O bebê, então, não pode elaborar, seja a ansiedade depressiva ou a persecutória, porque elas se confundem uma com a outra. Alguns meses mais tarde, quando surge a posição depressiva, o ego mais integrado e fortalecido tem maior capacidade de suportar o sofrimento da culpa e de desenvolver defesas correspondentes, principalmente a tendência a efetuar reparação (p.59).

Essa culpa que a autor menciona, estaria relacionada a inveja do seio que alimenta e a sensação de ser despojado de sua bondade por meio de ataques invejosos. A inveja exagerada pode interferir na gratificação oral. Se, ainda nos primeiros estágios do desenvolvimento, o objeto primário for estabelecido com relativo equilíbrio, a culpa despertada por tais sentimentos pode ser enfrentada com mais êxito porque a inveja é transitória e menos suscetível de prejudicar a relação com o objeto bom.

Para Grinberg (2000) a culpa, quando excessiva e ilógica, estaria relacionada com a depressão grave ou melancolia, como sintoma. E seguindo os teóricos da escola psicanalítica inglesa, como Melanie Klein, que estudaram os primeiros estágios da vida prossegue: na criança, suas fantasias inconscientes estão relacionadas ao corpo e representam fins instintivos dirigidos ao objeto, pois ainda não distingue fantasia da realidade. Este fato pode levá-la a crer que danificou ou destruiu realmente à mãe, ao expressar o seu amor ou ódio através de mecanismos de incorporação ou expulsão. Essa fantasia de que destruiu a mãe provoca culpa e o sentimento de que será perseguida pela própria agressão projetada ao objeto.

O autor coloca que, se esta condição ocorrer com persistência no inconsciente ocasionara o aparecimento de angústia e culpa, que levarão, em diferentes graus, a processos defensivos patológicos, que comprometerão as possibilidades de uma vida normal e feliz. Em uma fase posterior, como efeito, vemos muitas pessoas incapacitadas para batalhar pelos seus direitos ou lutar pelos seus interesses: “O inconsciente de um acusado pode desejar o mesmo que conscientemente recusa com todas as suas forças” (p. 43). O conflito entre amor e ódio para com os objetos queridos cria a dor, que terá como consequência o sentimento de culpa, uma vez que a bondade se choca com a maldade.

O sentimento de culpa (GRINBERG, 2000) pode manifestar-se como irritabilidade, mau-humor, apatia, depressão, perturbações psicossomáticas, etc., quando se encontra num plano inconsciente, recalcado, porque nem sempre aparece no plano da consciência. Pode aparecer, também, através de um sofrimento contínuo, depressão e a sensação de uma catástrofe iminente, ou seja, através de uma tensão intrapsíquica. Neste caso, associados a uma necessidade de castigo, com um sentimento de não ser uma boa pessoa, mas sim fraca e pouco eficiente.

Associado a isto, um comportamento de submissão, um sentimento de inferioridade, podendo levar a atitudes criminosas ou agressivas, criando um círculo vicioso pelo efeito dinâmico antitético destes sentimentos. Segundo Rickman (apud GRINBERG, 2000), a culpa tem uma importância essencial no desenvolvimento da estabilidade da personalidade, no que concerne as vivências nos primeiros anos de vida, envolvendo a descoberta dos sentimentos de amor e ódio em relação aos pais. Esta culpa pode levar aos sucessos e as realizações na vida futura, mas também, a doença mental, a instabilidade emocional e ao crime. Grinberg cita um verso de Goethe, e sugere aos pais a culpa suscitada nos filhos, e a responsabilidade em expiá-las:

À vida nos lançais,

Deixando que o pobre incorra em culpa; Logo o deixais sofrer

Grinberg, referindo-se a Freud, coloca que uma pessoa se sente culpada quando faz algo que julga errado ou mesmo quando tem a intenção de fazê-lo, neste último caso culpa estaria relacionada à fantasia inconsciente. Levanta duas origens do sentimento de culpa, sendo a primeira relacionada à autoridade, e a segunda o medo do supereu. O sentimento de culpa dominaria toda a vida pulsional porque impede a satisfação das pulsões e, também, porque aumenta o masoquismo.

Por medo de perder o carinho e proteção, e sob a influência do sentimento de culpa, o Eu se submete às ordens do Supereu., renunciando as satisfação das pulsões. Após esta renúncia, ficam saldadas as dívidas com esta autoridade, eliminaria o sentimento de culpa. Em relação ao Supereu não ocorre o mesmo, não sendo a renúncia satisfatório, resultando em sentimento de culpa e a necessidade de castigo. Acrescenta:

Para a formação do Supereu e o desenvolvimento da consciência moral concorrem vários fatores constitucionais inatos e ainda a influência do meio envolvente. Não deve estranhar-se esta dualidade uma vez que ela representa a condição etiológica de todos os processos (2000, p. 71).

O autor explica que Melanie Klein encontrou na análise de crianças muito pequenas, de 2 a 4 anos, um Supereu severo e cruel, que não era compatível com a imagem dos pais reais. Isso se deveu em parte, à projeção dos próprios impulsos sádicos da criança. Alguns autores alegam que toda forma de privação, toda a satisfação pulsional desfalcada, poderia ter como consequência um sentimento de culpa. Esta autora levantou uma distinção entre duas formas principais de angústia: a angústia persecutória e a depressiva, O sentimento de aniquilamento de Self estaria relacionado com a primeira e a segunda com a fantasia do dano imposto aos objetos internos e externos pelos impulsos destrutivos. Chegou à conclusão que a ansiedade depressiva estaria ligada ao sentimento de culpa e a tendência a reparação e que estaria relacionado a introjeção do objeto como um todo. Inicialmente ela defendeu esta ideia, mas, posteriormente, afirmou que poderia, também, estar conexos com objetos parciais, e que, portanto, podiam aparecer durante a posição esquizoparanóide.

Como pode ser visto a qualidade das relações iniciais entre mãe-bebê será fundamental para o desenvolvimento emocional do indivíduo e suas interações

com outras pessoas em uma fase posterior, quando adulto, como foi apontado por vários autores e que pode ser constatado na prática clínica. Portanto, a mãe (ou seu substituto) constitui-se como o primordial fator do desenvolvimento para seu filho, assim como as falhas da função materna incorrerá para a desestruturação de seu psiquismo.

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