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Sobrepotencial e resistência de transferência de carga

3. Teoria dos microeletrodos em biomedicina

3.1 Interface eletrodo-eletrólito

3.1.2 Sobrepotencial e resistência de transferência de carga

Os modelos capacitivos na interface eletrodo-eletrólito foram discutidos anteriormente. Agora estamos interessados em descrever o quadro elétrico da interface. Se for aplicado um potencial DC na interface, uma corrente flui sobre certas condições. Assim, se considera relevante o efeito resistivo do trajeto dos íons em paralelo à capacitância elétrica no modelo de dupla camada. Esta resistência, assim como os elementos capacitivos do sistema pode ser não linear. Um fluxo de corrente através da interface se apresenta devido a presença da diferença de potencial aplicado no sistema. No estado de equilíbrio, existe um fluxo constante

devido ao potencial de equilíbrio presente no sistema (V0), mas o fluxo resultante é igual a

zero [33]. Desta maneira, o potencial resultante é a diferença entre o potencial aplicado e o do estado de equilíbrio (V-V0), que é responsável pelo fluxo total de cargas e que se denomina

sobrepotencial, que por sua vez está dividido em quatro sobrepotenciais diferentes:

Eq. 8

é causado pela transferência de carga na dupla camada capacitiva; está associado com o potencial difusivo dos reagentes; é devido às reações no eletrodo; e é causado pela troca de átomos metálicos com íons da solução, também denominado cristalização [36].Com isso, dado um potencial aplicado superior ao potencial de equilíbrio, parte desse potencial irá dividir-se em transferência de carga, difusão, reações químicas e cristalização. Desta maneira, três correntes em paralelo podem ser imaginadas, cada uma movida pelo sobrepotencial associado. Perto do potencial de equilíbrio, o sobrepotencial de transferência de carga (Vt) torna-se dominante na corrente total. À medida que este valor é empurrado para

fora deste estado de equilíbrio, a difusão dos reagentes pode tornar-se um fator limitante, fazendo desta maneira que o sobrepotencial difusivo (Vd) seja mais significativo. O efeito de

cristalização se apresenta parcialmente em algum tipo de microeletrodos metálicos, mas este sobrepotencial junto com o sobrepotencial associado com reações químicas não é significante nas aplicações biológicas [37].

O valor de corrente por unidade de área é conhecido como densidade de corrente de intercâmbio . Esta corrente depende das propriedades do material do eletrodo, da composição eletrolítica e das reações de óxido-redução resultantes. Um dos problemas da óxido-redução quando se trata de determinar é que frequentemente a reação eletroquímica é, em geral, uma relação não linear e uma das formas de determinar este valor é por métodos experimentais [33]. Por exemplo, o valor para Au em solução tampão de fosfato-salino (PBS, da sigla em inglês phosphate buffered saline) é de [38]. Com isto,

pode-se calcular a equação de corrente associada ao potencial aplicado. A equação de Bultler- Volmer pode ser utilizada para calcular a corrente resultante J:

onde a densidade de corrente de intercâmbio, também denominada tensão térmica, a valência do íon, b o factor de simetria, e que é um número adimensional que varia entre 0 e 1[36]. Pequenas alterações de afetam de maneira relevante a corrente . Desta maneira, a escolha de material do eletrodo pode chegar a impactar de maneira significativa a quantidade de fluxo de corrente gerado pela tensão aplicada. Para o caso de estímulo elétrico com microelétrodos, materiais com grande densidade de corrente de intercâmbio (como o , ) são desejáveis.

É importante ressaltar que reações eletroquímicas em estado gasoso podem chegar a acontecer na interface eletrodo/eletrólito devido à decomposição da molécula de água ( ) em gás hidrogênio ( ) e oxigênio ( ) para tensões altas, denominado energia de ativação da água. Estas reações são indesejáveis e devemos conhecer as condições nas quais ocorrem para evita-las no uso de dispositivos in-vivo.

Para determinar o valor da resistência de carga (Rt) que existe na interface

eletrodo/eletrólito, inicia-se supondo que está em paralelo com a dupla camada capacitiva. Pode-se observar que o valor de Rt está relacionado com Jt e Vt e que é de tipo não linear. Se,

dadas as condições b=0.5, T=37 e z=1, uma aproximação para Rt para potenciais menores que

50 mV é dada por (em ) [36]:

Eq. 10

Esta estimativa é útil para aplicações de registro de atividade neural onde o potencial aplicado é zero. Assim, a corrente resultante (J) pode ser calculada a partir da lei de Ohm:

Eq. 11

Para valores mais elevados de corrente, como no caso de estimulação elétrica do tecido nervoso, já não existe um valor de resistência que seja constante. No entanto, assumindo, existe uma relação de caráter exponencial associado com J:

Desta maneira, o modelo de interação eletrodo/eletrólito, pode ser apresentado como um condensador Cl que depende da tensão aplicada no sistema (dupla camada capacitiva) em paralelo com uma resistência Rt do meio, que é tipicamente não linear, mas se pode assumir

um valor fixo para potenciais menores que 50 mV pico. As impedâncias relativas destes dois elementos são quem determinam as características básicas do eletrodo. Se a densidade de corrente é muito elevada, (R0) a resistência de transferência de carga tende para zero, como se

observa na Eq. 12. Assim a relação entre J vs Vt da Eq. 12 é uma função divergente, ou quer

dizer que mesmo existindo uma corrente que fluísse através da interface, não existiria um potencial desenvolvido entre o eletrodo/eletrólito. Isto se denomina, uma interface não- polarizável, e que é fundamental para definir qual material é o melhor para estimulação cerebral [33].

Uma situação oposta, onde J0 é denominado como uma interface idealmente polarizável.

Ele se comporta como um capacitor não faradaico: a carga da solução é igual que a carga sobre o eletrodo em todos os momentos. No entanto, esta capacitância não é independente do potencial. Experimentalmente, é quase impossível criar um material que seja idealmente polarizável ou não polarizável, porém se podem obter materiais com uma boa aproximação [34]. O mais importante neste caso é a magnitude da corrente de transferência em relação com a densidade de corrente total. Se a corrente resultante é pequena em relação a J0, em seguida,

a interface não deve ser perturbada para fora do equilíbrio, para assim obter um resultado perto do comportamento não-polarizável. No entanto, se a corrente é grande comparada aJ0,

observa-se um comportamento perto de um metal polarizável.

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