• Nenhum resultado encontrado

2.2 Sociedade das Nações: Um projeto Wilsoniano

No documento As Nações Unidas e a Governança Global (páginas 35-37)

Como foi já sublinhado, todos os contextos de pós-Guerra são um espaço de reaprendizagem, e o pós-Primeira Guerra não foi exceção. O término deste conflito foi determinado em Paris com o Tratado de Versalhes, onde mais uma vez se assistiu à reorganização do mapa geopolítico europeu, alicerçada pela idealização e posterior criação da Sociedade das Nações. Este assumia ser um período crítico para o Sistema Internacional, não só derivado do momento político conturbado, mas também devido à desconfiança sobre as dinâmicas cooperativas, onde ainda não tinha sido descoberta a “fórmula” diplomática para prever, antecipar e amenizar as Relações Internacionais em relação à cooperação Internacional, que implicaria na conceção de um novo projeto internacional direcionado para a paz, uma reestruturação efetiva que eliminasse a descrença em Organismos Internacionais, onde os valores diplomáticos superassem a direção dos diversos hemisférios políticos. Nas palavras de Van Ginneken (2006: 39): “(…) War, as a legal means to promote national

interests, could no longer be accepted. It had become clear that the Vienna system had failed, that European cooperation had led to nothing, and that international cooperation had to be organized on a worldwide level. New forms of inter-state relations had to be found and state sovereignty had to be limited.”

Durante as negociações em Paris para determinar os contornos do pós-Guerra, foi perceptível compreender que a restruturação europeia exigia também uma restruturação dos mecanismos de paz, e o discurso de Woodrow Wilson (Presidente dos EUA de 1912 a 1921) incutiu na Europa uma ideia de esperança com bases teóricas liberais. A Europa percebia que do outro lado do Atlântico existia uma potência em crescimento, que apesar da sua participação no conflito, foi a par da Grã-Bretanha, as potências menos afetadas pelo desenrolar da 1ª Guerra, e neste momento conturbado, onde não se vigoravam alternativas para reerguer o velho Continente, surgia a oportunidade de absorver ideais externos e liberais, que sob o controlo de Wilson, potenciaram o crescimento massivo dos Estados Unidos. “(…) Britain and America were the homes of the new thought, partly because these

two countries were less devastated by the war than others, and thereby, perhaps, more willing to look beyond the immediate issues, but also because the anarchic nature of world politics seemed particularly unfortunate to those nurtured by the liberal traditions of the two English-speaking powers. Given this latter point, the new thinking that was produced in Britain and America is conveniently summarized as‘liberal internationalism’ – the adaptation

of broadly liberal political principles to the management of the international system.”

(Brown e Ainsley, 2005:21).

A visão de Wilson, assente no seu plano de 14 pontos para a manutenção da Paz, eram sobretudo ideais intrinsecamente ligados à sua matriz política, eram ideias liberais, manifestamente afastados do grande e inquestionável poder político, ideais libertários que pretendiam eliminar “armas” que nas mãos de grandes decisores políticos causariam a destruição de qualquer esperança de renovação, como o imperialismo, o militarismo e as alianças e tratados secretos. Nas palavras de Van Ginneken (2006:40): “(…) As he outlined in

his Fourteen Points of January 1918, these vices had to be remedied by new inter-state relationships based on cooperation and openness, on coordination and international law, by a system of free trade and freedom of the seas, and by self-determination for colonial peoples. To achieve all this, a League of Nations had to be established. Wilson never lost sight of his great vision; it inspired him with every political step he took. And it made wonderful rhetoric. By the end of the war, Wilson was immensely popular with the public all over the world, seen by many as a great savior.”

Após a conceção dos 14 pontos de Wilson, nasce em 1919 em Paris, a Sociedade das Nações, um projeto assumido como um agente de transformação geopolítica que reuniu diversas e distintas reações no espectro político europeu, que devido à dependência americana para a resolução do conflito, provocou um alastramento ideológico para todas as áreas de influência europeia, com isto, é credível entender que o avanço deste projeto, teve na sua base, um sentimento de dívida europeia para com os EUA. As clivagens ideológicas liberais entre Wilson e os regimes nacionalistas e de autodeterminação dos grandes líderes europeus foram notórias desde a criação do Organismo18, Wilson acreditava num ideal de

segurança coletiva, na criação de um exército mundial que fosse capaz de defender os interesses da Sociedade Internacional, por outro lado os principais líderes europeus defendiam que a paz seria alcançada através do equilíbrio de poderes tradicional, sem grandes ruturas ideológicas, e com a resposta negativa do senado americano na participação e inclusão dos E.U.A na Sociedade das Nações, tornou-se clara qual a direção que iria ser tomada no desenrolar deste Organismo, a mudança e rutura que Wilson pretendia implantar, não iriam estar vincadas no núcleo da Sociedade, isto é, assistiu-se à criação de um projeto pensado, desenhado e estruturado de forma “americanizada” mas executado sob os “velhos” e inalteráveis ideais conservadores europeus.

18 “(…) Wilsonian-era liberal internationalism was also predicated on Westphalian state sovereignty. The

nation-state was championed, and ideas of a progressive liberal order were closely associated with anti- imperial movements and struggles for national self-determination. Wilson did not see the liberal “project” involving a deep transformation of states themselves as sovereign legal units. Nationalism was a dominant force in world politics, and Wilson’s support for rights of national self-government gave voice to it.” Vide a este respeito: Alexandroff, Alex; Cooper, Andrew (2010). Rising States, Rising Institutions: Challenges for Global Governance. Baltimore: Brooking Institution Press. p. 24

No documento As Nações Unidas e a Governança Global (páginas 35-37)