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A Sociologia das Profissões e sua contribuição ao debate sobre Educação Interprofissional

ANÁLISE Trabalho em Equipe:

6.1 A Sociologia das Profissões e sua contribuição ao debate sobre Educação Interprofissional

A revolução industrial impôs à sociedade uma nova forma de organização do trabalho, sob a égide da produtividade exigida pelo mercado. Nessa perspectiva, a sociedade passa a ser organizada, a partir da intervenção do homem, através do trabalho, dividido socialmente. Neste cenário, surgem esforços no sentido de delimitar limites profissionais muito claros, como forma de assegurar essa divisão e organização social(160).

Assim, a Sociologia das Profissões tem importantes contribuições para se compreender as definições de profissão e de profissionalismo, oferecendo importantes subsídios teóricos para a compreensão dos papéis profissionais, do Estado e das organizações profissionais. A Sociologia das Profissões não é um debate atual, mas teóricos norte–americanos e europeus retomaram o debate, procurando superar a mera compreensão funcionalista das profissões(161). Autores como Freidson(162), Abbott(163) e Larson(164) deram importantes contribuições para a construção das ideias principais da sociologia das profissões. No Brasil, é possível mencionar como importantes colaboradores, Machado(165), Barbosa(166) e Bonelli(167).

Freidson, que se configura como um dos maiores teóricos na sociologia das profissões apresenta algumas ideias centrais importantes. Define profissão enquanto ocupação que exige um corpo de conhecimentos necessários para sua execução. São esses conhecimentos que agregam reconhecimento social à profissão. O conjunto de conhecimentos necessários para o exercício profissional apresenta uma utilidade reconhecida por todos os elementos da dinâmica social(168, 169).

As profissões são reconhecidas oficialmente pelo arcabouço de conhecimentos capazes de conferir diferenciação em relação a outras ocupações. A especialização aparece, assim, como o conjunto de conhecimentos e habilidades requerido para o exercício profissional. A profissão é uma ocupação como as demais, mas se diferencia exatamente pelos seus conhecimentos específicos, que por sua vez, assegura diferenciação de outras profissões. No entanto, essa especialização, ou diferenciação, não é algo rigidamente estabelecido. Ela varia, de acordo com a relevância social que lhe é atribuída, nos diferentes momentos históricos. Assim, tão importante quanto os conhecimentos que fornecem elementos para a configuração das especificidades profissionais é a relevância que as profissões adquirem no contexto social(170).

É no campo da busca das especificidades que se estabelece o debate sobre profissionalismo, como forma de organizar a divisão social. O profissionalismo é o processo onde as profissões se organizam em torno da reivindicação de suas especificidades, expressas pelas competências, obtidas pelo campo de conhecimentos, que lhes confere identidades, respaldadas pela importância de serem funções para a sociedade. O profissionalismo constrói instrumentos para assegurar o direito de exclusividade naquele campo de atuação, respaldado pelos

processos de formação e pelas intervenções do Estado. O reconhecimento dessas especificidades, pela sociedade, legitima e agrega status e poder às profissões.

Na teoria de Freidson, o conhecimento aparece como elemento central, na medida em que permite a diferenciação entre ocupações e profissões. Assim, a educação profissional também aparece como importante ferramenta de construção das identidades profissionais, e consequentemente dos limites definidos para elas. A literatura tem apontado que a formação incorpora não somente os conhecimentos das áreas profissionais, mas constrói também comportamentos e valores compatíveis com o papel social das profissões(171, 172).

A partir dessas assertivas o autor discute o controle exercido pelo profissionalismo, no sentido de controlar o mercado e o acesso à educação profissional. Essa estratégia permite que as categorias profissionais deem sustentabilidade à sua valorização e reconhecimento. Esse controle acontece por várias frentes: por um lado o profissional que, na relação com a sociedade, cria uma relação de dependência; as instituições de representação das categorias que estabelecem limites legais das profissões; e os intelectuais que constroem o arcabouço teórico de sustentação dos elementos anteriores(165, 173).

Assim, a educação assume importância central por ser considerada ferramenta para a conquista de poder, prestígio e renda. Neste sentido, Larson traz contribuições relevantes. O poder e prestígio das profissões assumem aderência com a lógica econômica e o controle de mercado é explicado para que as profissões forneçam elementos para se tornarem indispensáveis. Assim, o status e o poder, assumidos pelos grupos profissionais, reproduzem características das desigualdades gerais da sociedade. A autora chama a atenção para o papel do Estado, através da burocracia, para a legitimação desse pensamento(165). Porém, em anos recentes, o Estado tem feito intervenções mais frequentes como forma de assegurar alguns objetivos, econômicos ou políticos, e comprometido o controle que as profissões exercem sobre seus limites profissionais(174).

Abbott, por sua vez, traz importantes contribuições quando critica o estudo das profissões, de forma isolada. O autor critica as perspectivas funcionalistas e defende que o estudo das profissões deve partir da compreensão de que há conflitos entre os grupos profissionais, embora defendendo que estes grupos fazem parte de um sistema maior e que mantêm uma relação de interdependência. Essa disputa acontece como forma de assegurar o que ele definiu como jurisdição e deve

dar atenção à competição que existe entre as profissões, entendendo que diversos grupos profissionais buscam garantir o que ele definiu como jurisdição, que seria a relação entre a profissão e sua prática profissional. Nessa perspectiva, nenhuma profissão domina todas as jurisdições, nem várias profissões dominam uma única jurisdição, o que fortalece os laços de interdependência entre as mesmas(175).

Neste sentido, a Sociologia das Profissões se apresenta como importante abordagem sociológica para que se possa compreender como as categorias profissionais agem no sentido de caracterizar e normatizar as atuações das diferentes categorias profissionais. Debater a Sociologia das Profissões, no âmbito da educação interprofissional e do trabalho colaborativo é desafiador, na medida em que permite compreender a natureza das relações estabelecidas nas relações e interações interprofissionais.

Embora se reconheça a necessidade de estabelecer limites às profissões, o cenário atual, de grandes e importantes transformações, demanda um novo profissionalismo onde os profissionais estejam abertos ao trabalho em equipe e estejam comprometidos com o fortalecimento dos sistemas de saúde, bem como, também sejam capazes de estabelecer novas relações entre os usuários dos serviços de saúde(176).

Nesse sentido, a educação interprofissional tem fundamental importância, na medida em que deve estimular, no processo de formação, atitudes e valores relacionados ao respeito e o reconhecimento da importância de cada profissional, na complexa rede de produção dos serviços de saúde, sem negligenciar a construção de conhecimentos específicos e das identidades profissionais. Esse novo profissionalismo impõe a necessidade de dar centralidade às necessidades dos usuários e, assim, viabilizar ações em saúde, mais resolutivas(177, 178).

6.2 A realidade do Trabalho em Equipe: desafios para a efetivação da