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Capítulo 1: Stress relacionado com o trabalho e burnout

7- Prestação de cuidados de saúde, stress e burnout

7.2. Stress e burnout em enfermeiros de unidades específicas dos hospitais

7.2.5. Stress e burnout em enfermeiros de outras unidades hospitalares

A prestação de cuidados de saúde a doentes com SIDA também parece ter um impacto negativo no bem-estar psicológico dos profissionais uma vez que, para além de ser uma doença grave com prognóstico reservado e com elevada taxa de letalidade, pode existir medo de contágio, dificuldade em lidar com doentes com perturbações emocionais associadas, estigma social e até identificação com os doentes por parte dos profissionais de saúde (KLIMES, 1991; SLONE, STEPHANY, 1995). Contudo, outros autores não encontraram níveis de stress ou de burnout mais elevados em profissionais que cuidavam de doentes com SIDA de serviços de infecciologia e de hemofilia, quando comparados com os níveis detectados em profissionais de outros sectores, designadamente enfermarias de oncologia e de medicina (LÓPEZ-CASTILLO et al., 1999).

Aqueles autores avaliaram os níveis de distress e de burnout utilizando a versão de 28

itens do questionário The General Health Questionnaire (GHQ28) e o Maslach Burnout

Inventory (MBI) em 242 profissionais que trabalhavam em unidades de infecciologia

(n=67), de hemofilia (n=34), de oncologia (n=52) e de medicina interna (n=89). Os níveis de perturbação emocional avaliados pelo GHQ28 eram mais elevados no grupo

que trabalhava na unidade oncológica. Do total de participantes, 38,7% apresentavam níveis superiores ao ponto de corte (superior a cinco) para prováveis casos de mal-estar psicológico (44,2% na unidade de infecciologia, 13,8% na unidade de hemofilia, 52,5% em oncologia e 37,1% na unidade de medicina). No entanto, o trabalhar específico com doentes com SIDA não era determinante para os níveis encontrados (LÓPEZ- CASTILLO et al., 1999).

Nesse mesmo estudo, os níveis de burnout eram mais elevados nos enfermeiros que nos médicos, o que poderia estar relacionado com o facto de os enfermeiros serem mais jovens ou com aspectos relacionados com a actividade profissional, nomeadamente do contacto mais próximo com os doentes na prestação de cuidados (LÓPEZ-CASTILLO et al., 1999). Os factores indutores de stress mais vezes referidos consistiram em lidar com o sofrimento e a morte dos doentes e também com as suas famílias, tendo-se verificado algumas diferenças na frequência dos factores indutores de stress, de acordo com o local de trabalho (Quadro nº 3).

Quadro nº 3 – Factores indutores de stress mais referidos, por local de trabalho LOCAL DE TRABALHO FACTORES INDUTORES DE STRESS

Unidade de oncologia

- Deterioração clínica dos doentes - Lidar com as famílias dos doentes - Cuidar de doentes crónicos - Cuidar de doentes jovens

- O tipo de patologia dos doentes a quem prestam cuidados - As condições físicas e a falta de recursos

Unidade de hemofilia

- Cuidar de doentes jovens

- O tipo de patologia dos doentes a quem prestam cuidados - As condições físicas e a falta de recursos

Unidade de infecciologia - O tipo de patologia dos doentes a quem prestam cuidados Unidade de medicina - As condições físicas e a falta de recursos

- Prestar cuidados a doentes idosos e dependentes

Frequentemente, os doentes com patologia oncológica são diagnosticados e tratados em enfermarias não específicas, nomeadamente enfermarias de medicina interna e de outras especialidades médicas ou cirúrgicas. Mohan e colaboradores aplicaram um questionário a vinte e cinco enfermeiros de várias enfermarias não específicas que também internavam doentes oncológicos e entrevistaram cinco deles, os quais identificaram como principais factores indutores de stress a falta de tempo para cuidar dos doentes, a falta de conhecimentos sobre a patologia oncológica, as exigências emocionais dos doentes ou dos seus familiares e as condições físicas para cuidar dos doentes de um modo adequado (MOHAN et al., 2005).

McIntyre e colaboradores estudaram as respostas de stress, as circunstâncias indutoras de stress e os recursos de coping disponíveis e desejados por sessenta e dois enfermeiros de serviços de internamento de cardiologia, de reabilitação e de medicina de um hospital central e relacionaram estas variáveis com a sua experiência profissional. As primeiras quatro circunstâncias indutoras de stress foram de natureza organizacional (sobrecarga de trabalho, deficientes condições físicas e técnicas, carência de recursos e grande número de doentes) tendo sido classificada, apenas em quinto lugar, a incapacidade para responder às exigências emocionais dos doentes. Por sua vez, o recurso de coping mais utilizado foi o apoio social (McINTYRE, McINTYRE, SILVÉRIO, 1999).

Também foram observados níveis elevados de stress em enfermeiros de blocos operatórios (BIANCHI, 1990, citado por GATTI et al., 2004), tendo sido as relações interpessoais, nomeadamente com o grupo dos médicos, um dos factores indutores de

stress frequentemente referido. Gatti e colaboradores realizaram um estudo em que

avaliaram os níveis de ansiedade em sessenta e cinco enfermeiros, que trabalhavam numa UCI, num bloco operatório, num serviço de urgência e em unidades de internamento de um hospital e verificaram que os níveis de ansiedade eram mais reduzidos nos enfermeiros da UCI e mais elevados nos enfermeiros do serviço de urgência, sendo moderados nas unidades de internamento e no bloco operatório (GATTI et al., 2004).

No estudo comparativo de Gray-Toft e Anderson, os principais factores indutores de

stress identificados pelos enfermeiros (n=122) das enfermarias de medicina, cirurgia,

diferentes unidades. Os factores indutores de stress mais valorizados foram a sobrecarga de trabalho, o contacto com o sofrimento e com a morte dos doentes e sentir-se inadequadamente preparado para lidar com as exigências emocionais dos doentes (GRAY-TOFT, ANDERSON, 1981).

Contudo, naquele mesmo estudo, verificou-se que os níveis de stress foram mais elevados nos enfermeiros da enfermaria de medicina comparativamente às outras unidades estudadas e foram mais reduzidos na unidade de cuidados paliativos. Os autores sugeriram que as diferenças encontradas nos níveis de stress poderiam dever-se às condições de trabalho (incluindo condições organizacionais) existentes. Enquanto a enfermaria de medicina era uma enfermaria antiga, que internava doentes com diversas patologias, e cujos enfermeiros referiram muitos conflitos com os médicos, chefias e outros elementos da equipa, a enfermaria de cuidados paliativos era uma unidade recente, cujos enfermeiros tinham formação e treino para lidar com os doentes terminais e com as suas famílias (GRAY-TOFT, ANDERSON, 1981).

Deste modo, verifica-se que as características estruturais e também organizacionais dos diferentes locais de trabalho poderão facilitar, por exemplo, a ambiguidade de papéis e os conflitos interpessoais, contribuindo também para as diferenças verificadas nos níveis de stress de enfermeiros, nas várias unidades. A organização de cada local de trabalho condiciona a percepção dos vários factores indutores de stress de natureza profissional referidos pelos enfermeiros, pelo menos relativamente aos factores indutores de stress de natureza organizacional, dificultando significativamente a sua generalização, mesmo em unidades que prestam cuidados a doentes com o mesmo grupo de patologia e com níveis de gravidade semelhantes.