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4.4 O que os Sistemas Adaptativos Complexos (SAC’s) podem trazer para as

4.4.1 Subjetividade: a dimensão do agente

A construção da Teoria Administrativa ocorrida ao longo do século XX foi essencialmente calcada no paradigma newtoniano-cartesiano cuja base de sustentação é a racionalidade formal. Assim, a objetividade vem dominando o campo da gestão nos últimos cem anos, entendendo o processo administrativo como dotado tão somente da dimensão da eficiência e da eficácia. Esse arcabouço teórico ignorou sistematicamente, que o processo de gestão é pensado e praticado por pessoas, e que, por conseguinte, trazem subjacente, a dimensão da subjetividade. Consoante Chanlat (apud DAVEL; VERGARA, 2001), desprezar essa dimensão em prol do objetivismo que garanta toda a eficácia resume-se em condenar o ser humano a privar-se da mola essencial de sua dinâmica. Para o referido autor, a administração universal, em sentido lato, não existe. Cada modo de administração é sempre enraizado em uma cultura e em uma sociedade, em um agente, detendo, então uma história, carregando valores e significados próprios a cada grupo. Negar a subjetividade na formação do processo estratégico é negar a própria condição humana.

Em defesa dessa proposta, Davel e Vergara (2001, p. 42-43) indicam que a “contribuição da subjetividade no estudo das organizações é a de tornar compreensível a experiência humana em sua fonte mais complexa, rica e profunda”. A subjetividade é expressa em pensamentos, condutas, emoções e ações, uma vez que ela designa a interioridade da pessoa, a singularidade e a espontaneidade do eu, constituindo tudo aquilo como pertencente à individualidade humana, a qual sedimenta todo e qualquer conhecimento possível. Esses autores ressaltam que tanto a objetividade quanto à racionalidade merecem atenção no planejamento e gestão organizacional, e que pela via da subjetividade, a natureza das relações de confiança intra e interorganizacional pode ser constante e consistentemente repensada, e portanto, transformada.

A lógica da administração clássica enfatiza a racionalidade funcional que atua em um sistema racional (objetividade); já a lógica da administração moderna inicia um processo de transição, incorporando o sistema natural ao sistema racional, mas ainda atua predominantemente dentro da ótica da racionalidade funcional, pois enfatiza o ajuste entre as pessoas e o trabalho dentro de um desenho fixo. Dentro da lógica pós-industrial, a racionalidade substantiva entra em cena para dar às pessoas, maior nível de consciência sobre o seu papel como ator organizacional, percebendo e experienciando a realidade como um todo coerente e significativo, dando sentido às ações administrativas (admitindo, portanto, a subjetividade).

Para Ramos (1981), diferente da racionalidade formal, a racionalidade substantiva nunca poderá ser confinada a uma parte isolada. A racionalidade substantiva somente poderá ser compreendida através da experiência livre da realidade e de sua precisa articulação com o todo. Ou seja, só com o pleno reconhecimento da dimensão total do ser humano é que a racionalidade substantiva se faz presente. Racionalidade funcional e racionalidade substantiva constituem categorias fundamentais de duas concepções distintas da vida humana associada: a primeira, ligada por uma expectativa de resultados ou “fins calculados”, e a segunda (substantiva), é determinada independentemente de expectativas de “sucesso” e não caracteriza nenhuma ação humana interessada na “consecução de um resultado ulterior a ela”. Essa é, pois, intrínseca à condição humana (RAMOS, 1981, p. 4).

Corroborando com essa linha de pensamento, Senge (1990) argumenta que as organizações funcionam da forma como funcionam porque os seres humanos funcionam da mesma forma, e que nenhuma mudança organizacional significativa pode ser realizada sem que se efetuem profundas mudanças nas formas de pensar e interagir das pessoas. Logo, ignorar a dimensão da subjetividade constituir-se-á em erro crasso no processo de formação de estratégias.

Nóbrega (1996, p.213) destaca o “fracasso dos muitos planejamentos estratégicos exatamente porque desconsideram a dimensão da participação das pessoas”. Ele argumenta que o receituário técnico da seqüência de passos para elaboração do processo de planejamento fracassa por não considerar como componente vital a natureza do ser humano, que é quem dará vida ao processo. Ignorar essa dinâmica redunda em alienação dos atores e fracasso organizacional. Em oposição ao paradigma mecanicista de Taylor, Nóbrega (1996) propõe o paradigma da complexidade que preconiza, em síntese, a adaptabilidade, a instabilidade das propriedades emergentes nas organizações, e trata do processo da evolução e do aprendizado. Nesse contexto, o papel da liderança é tecer a rede, estabelecer o contexto adequado para permitir a emergência e cuidar para que a criatividade da rede não se deteriore (NÓBREGA, 1996).

O modelo comando-controle característico de organizações vista como máquinas não consegue dar conta da avalanche de mudanças presentes no atual ambiente organizacional e social, sobretudo porque engendrou um ser humano pouco criativo, moldado para o cumprimento de ordens, para reproduzir o que está dando certo, e fazer pequenos ajustes naquilo que está “saindo fora dos trilhos”.

considerar a subjetividade nas organizações significa que as pessoas estão em ação e em permanente interação, dotadas de vida interior e que expressam sua subjetividade por meio da palavra e de comportamentos não verbais. A linguagem controla e

estrutura as possibilidades de ação das pessoas. Se a linguagem é o veículo privilegiado da subjetividade, a vida psíquica é seu fundamento (DAVEL; VERGARA, 2001, p. 50).

Há um novo paradigma nascente nas organizações atuais (que considera os princípios da Ciência da Complexidade), nas quais os estudiosos dos fenômenos organizacionais centram suas preocupações em discussões voltadas para o processo de aprendizagem organizacional. A consolidação desse paradigma consubstancia o que Hock (2000) denomina de Era Caórdica – organização transitando entre o caos e a ordem (BARBOSA; REBELO, 2003).

Barbosa e Rebelo (2003) sugerem que, vislumbrar as organizações com esse novo olhar constitui-se em uma tarefa desafiadora. Para que esse modelo seja institucionalizado, todos os seus agentes, principalmente seus gestores, devem estar conscientes de que a complexidade preconiza a visão de um novo homem organizacional, que é multidimensional, tem vontades, desejos e deve participar ativamente da “vida” organizacional, sem abrir mão da vida pessoal.

Bauer (1999) chama atenção para a quase ausência de parâmetros subjetivistas na teoria das organizações, indicando que a construção de uma concepção organizacional centrada no humano irá requerer, em primeiro lugar, uma reconceituação, um resgate do humano em si, capaz de elaborar uma consistente crítica àquele “humano” desumanizado, objetivado em termos estritamente utilitaristas.