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2 O SISTEMA PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO E O SUBJETIVISMO NA

2.1 Subjetividade do julgador e a eficácia das decisões judiciais

Diante da peculiar característica da multa coercitiva - coagir o devedor-, e da inexistência de critérios taxativos para que esta seja fixada, a subjetividade do julgador impera com a necessidade de atender ao fim perseguido, sem tornar ineficaz a aplicação do mecanismo em questão.

Para esta atividade, adverte Humberto Theodor Júnior que a fixação da multa ou de qualquer outra medida coercitiva deve ser realizada em “observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de sorte a guardar a relação de adequação com o fim perseguido, não podendo acarretar para o réu sacrifício maior do que necessário.” (Theodoro Jr., RePro, 196, p.80).

A multa, dado seu caráter coercitivo, não viola a vontade do devedor, que poderá concluir que o cumprimento da obrigação lhe é mais vantajoso do que arcar com o pagamento da multa cominada. Mas isto, evidentemente, só virá a ocorrer se a multa efetivamente for fixada com razoabilidade e proporcionalidade em face da situação posta em causa, ou seja, em valor que não ultrapasse o necessário para a coação do réu e represente, nas palavras de Barbosa Moreira, a ameaça de uma conseqüência desvantajosa e suficientemente forte, a ponto de que a renúncia ao benefício visado cause um mal maior ao réu (Moreira, 1988, p. 38).

Cabe destacar o ensino do nobre Evandro Carlos de Oliveira acerca do tema (2011, p. 141):

Quando o devedor de uma obrigação de dar deixa de satisfazê-la, o estado não tem dificuldade para a efetivação da pretensão do exeqüente, que poderá ser obtida, por exemplo, com o cumprimento de mandado de busca e apreensão. Por sua vez, quando se tratar de obrigação de fazer ou de não fazer, ante a impossibilidade de utilização de força para constranger o devedor a cumprir a obrigação, a utilização da multa é o instrumento coercitivo adequado para a obtenção desse resultado. (grifei)

Importante pontuar, que a imposição das astreintes, pela dicção do artigo 461 e 461-A do CPC, refere da possibilidade de cominação tanto em decisões

interlocutórias que concedem a antecipação de tutela pleiteada, quanto na sentença de mérito, não apenas por juízes de primeiro grau, como também por relator de recurso ou por órgão colegiado. Veja-se, que para que a multa apresente resultado positivo como meio de tutela inibitória, necessário que o juiz ou relator, possam se valer de tal meio de coação para que o devedor cumpra a ordem contida no mandado.

A par da possibilidade do momento de fixação, deverá o julgador atentar para o estabelecimento de prazo razoável ao cumprimento da obrigação pretendida, nos termos do § 4º do artigo 461, que apesar do grau de subjetividade nele contido, é norteado igualmente pelo caso concreto, o que relativiza o conceito de “prazo razoável” diante das circunstâncias possíveis, as quais não poderia o legislador predeterminar.

Tais considerações se devem em razão do artigo 461, § 5º, do CPC apresentar, dentre o rol exemplificativo, “a imposição de multa por tempo de atraso”, em consonância ao § 6º do mencionado artigo, que aduz a possibilidade de alteração da periodicidade da multa caso o juiz verifique que se tornou insuficiente ou excessiva, conduzindo, destarte, a uma interpretação de ser empregada, a multa, em período de tempo menor do que um dia.

Em que pese o elevado grau de subjetividade no conceito vago disposto no artigo 461, § 4º, do CPC, o juiz, na busca de encontrar o ponto de equilíbrio para a fixação das astreintes deve observar alguns critérios objetivos quanto a essa tarefa. Dentre eles, está a pessoalidade do sujeito obrigado, a capacidade econômica e a capacidade de resistência do sujeito passivo da ordem, a capacidade intimidatória da multa, a importância do bem jurídico tutelado e a possibilidade prática de a tutela específica ser realizada (Amaral et al. RePro, 196, junho/2011, p. 67).

O comando judicial para o cumprimento da obrigação deve ser destinado ao responsável pela obrigação, pois cabendo ao mesmo o cumprimento do preceito judicial, a sua recalcitrância dará ensejo à incidência da medida, seja ela pessoa de direito público ou de direito privado.

A capacidade econômica do sujeito guarda ensejo quanto às possíveis vantagens que o sujeito possa obter se deixar de cumprir o preceito, a fim de não tornar inócua a utilização do mecanismo, cominando valor inferior ao lucro obtido com a violação do direito (MARINONI, 2008, p. 478).

No que tange a capacidade intimidatória da multa, pode-se dizer que esta está intimamente ligada à função coercitiva, justificando sua fixação em elevado valor com o objetivo de compelir e estimular o devedor em cumprir a obrigação específica

Ainda, a importância do bem jurídico tutelado e a possibilidade da tutela específica ser realizada, atuam como critérios importantes para a fixação da multa coercitiva. O primeiro, por mais que o valor da multa não esteja vinculada essencialmente ao valor da obrigação inadimplida, o bem da vida em litígio é predominante para a forma de incidência da astreinte, enquanto o segundo, atuando em um plano de ordem prática é bem esclarecido pelas palavras de Marcelo de Lima Guerra (1998, p. 192):

A multa não pode ser imposta diante da impossibilidade prática da execução específica ser realizada. É dizer: quando se verificar que a execução específica é ou tornou-se impossível, a multa não pode ser imposta, ou continuar incidindo, concretamente.

Na aplicação da prática forense, ora se sobressai o valor “efetividade da tutela judicial”, ora se sobressai a “vedação do enriquecimento sem causa”. Para se obter o aperfeiçoamento da efetividade no caso concreto, por vezes o devedor recalcitrante é obrigado a pagar multa em patamar que supera muito além do interesse principal perseguido em juízo, por outro lado, ou a adequação do valor da multa para evitar o enriquecimento sem causa, freqüentemente é reduzida consideravelmente, muito embora na contramão da conduta inerte do devedor, que além de não cumprir a obrigação, ainda assim, consegue suavizar a reprimenda que lhe fora outrora imposta.

Nota-se, portanto, que os valores que devem ser ponderados subjetivamente pelo juiz, por ocasião do arbitramento da multa, se resumem essencialmente a dois

critérios: a) efetividade da tutela prestada, para cuja realização as astreintes devem ser suficientemente persuasivas, e b) vedação do enriquecimento sem causa do beneficiário do crédito, dado que a multa não é em si, o bem jurídico perseguido em juízo.

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