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Aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação da multa coercitiva no processo civil

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Academic year: 2021

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PRISCILA ANGELA VICENTINI

APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA

RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO DA MULTA COERCITIVA NO PROCESSO CIVIL

Monografia final do Curso de Graduação em Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUI, apresentado como requisito para a aprovação no componente curricular de Trabalho de Curso. DCJS

Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientador: MSc. Joaquim Henrique Gatto

Ijuí (RS) 2012

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APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA

RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO DA MULTA COERCITIVA NO PROCESSO CIVIL

Trabalho final do Curso de Graduação em Direito aprovada pela Banca Examinadora abaixo subscrita, como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito e a aprovação no componente curricular de Trabalho de Curso

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Ijuí, 11 de dezembro de 2012.

___________________________________________ Joaquim Henrique Gatto – Mestre - UNIJUÍ

_________________________________________ Lisiane Beatriz Wickert - Mestre - UNIJUÍ

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Dedico este trabalho a todos que de uma forma ou outra me auxiliaram e ampararam- me durante estes anos da minha caminhada acadêmica.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, acima de tudo, pela vida, força, coragem e sabedoria.

À minha família pelo apoio constante e todo carinho.

Ao meu orientador pela preciosa atenção que dedicou a mim, assim como o incentivo ao longo da jornada.

A todos que colaboraram de alguma maneira durante a trajetória de construção deste trabalho, minha gratidão.

(5)

“A Justiça é o pão do povo. Às vezes bastante, às vezes pouco. Às vezes de gosto bom, às vezes de gosto ruim. Quando o pão é pouco, há fome. Quando o pão é ruim, há descontentamento.”

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RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise acerca da aplicação do instituto das astreintes no ordenamento jurídico pátrio, através de um estudo específico do tema, abordando, além da origem e da natureza jurídica do instituto, a premente necessidade de ponderação entre princípios, sobretudo aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, visto que constatada a insuficiente disciplina legislativa, que confere, em conseqüência, elevado grau de subjetividade ao julgador na fixação da multa cominatória. Nessa perspectiva, tece algumas considerações sobre a efetividade e adequação das astreintes, atuando psicologicamente sobre o obrigado como medida coercitiva apta a incentivá-lo ao cumprimento da obrigação.

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ABSTRACT

The present paper of monographic research does an analysis on the implementation of astreintes institute of the national laws, through a specific study of the subject, including, beyond the origin and the nature of the institute, the pressing need for weighting principles, especially the principles of reasonableness and proportionality, insofar as the legislative discipline is insufficient, which gives as a result, a high degree of subjectivity to the judge in determining the coercive fine. From this perspective, such paper presents some considerations about the effectiveness and appropriateness of astreintes, which acts psychologically on the obligator, as a coercive measure able to encourage him to fulfill the obligation.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 09

1 ASTREINTES: ORIGEM, CONCEITOS, OBRIGAÇÕES PASSÍVEIS DE FIXAÇÃO, PRINCÍPIOS E NORMAS ... 11

1.1 Origem... 11

1.2 Ingresso das astreintes no Direito brasileiro... 13

1.3 Natureza jurídica e características das astreintes ... 14

1.4. Obrigações passíveis de fixação da multa coercitiva... 16

1.5 Beneficiário das astreintes... 19

1.6 Direito Comparado ... 20

1.7 Princípios e normas ... 24

1.7.1 Princípios constitucionais processuais ... 26

1.7.2 Princípio do devido processo legal ... 28

1.7.3 Princípio da duração razoável do processo ... 29

1.7.4 Princípio da proporcionalidade... 30

1.7.5 Princípio da razoabilidade ... 32

2 O SISTEMA PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO E O SUBJETIVISMO NA APLICAÇÃO DAS ASTREINTES ... 34

2.1 Subjetividade do julgador e a eficácia das decisões judiciais ... 35

2.2 Modificação da multa pelo julgador... 38

2.2.1 Vedação do enriquecimento ilícito ... 38

2.2.2 Permissão legal para redução/majoração da multa ... 40

2.2.3 Possibilidade de revogação da multa aplicada ... 41

2.3 Os princípios da razoabilidade e proporcionalidade como critérios fundamentais na aplicação das astreintes... 44

2.4 As astreintes e a previsão no Projeto de Lei do novo Código de Processo Civil...49

CONCLUSÃO ... 51

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INTRODUÇÃO

O instituto das astreintes se revela, atualmente, um instrumento valioso na consecução do bem jurídico visado pelo autor, mormente em face da ineficácia das decisões judiciais. Todavia, a obtenção do sucesso na prestação jurisdicional, notadamente quanto ao uso da multa cominatória, exige daquele que a impõe, a adequada fixação do quantum, de modo que efetivamente o devedor cumpra com o que está obrigado.

A partir destas considerações, bem como da importância conferida ao instituto em questão, adotado, por sua vez, pelo sistema processual brasileiro, o presente trabalho visa, em seu primeiro capítulo, teoricamente, explanar um estudo cognitivo da origem, da natureza, das obrigações passíveis de imposição da multa e os seus beneficiários. Além disso, concomitantemente as normas e princípios relacionados ao aludido tema, traz, ainda, elementos comparativos de outros ordenamentos jurídicos.

Na sequência, o plano prático das astreintes como cerne da pesquisa, é apresentado no segundo capítulo. A par da subjetividade do julgador, se procura estabelecer quais os critérios que deverão pautar a atividade do juiz ou tribunal, na fixação do quantum adequado e suficiente, de modo a assegurar a efetividade da decisão, sobretudo, o cumprimento da obrigação.

Isso se deve ao fato de que, no atual Código de Processo Civil, o instituto das

astreintes, ao que se verifica, apresenta-se quase que exclusivamente sistematizado

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específicos para a fixação do valor devido a título de multa, resta culminada a absoluta subjetividade do julgador, que pode, por sua vez, comprometer a finalidade do instituo acaso não apreciada adequadamente as especificidades do caso em concreto.

Com isso, o que se propõe é o estabelecimento de princípios, sobretudo da proporcionalidade e da razoabilidade, como norteadores e garantidores da efetividade da decisão judicial e à satisfação do direito, com o cumprimento da obrigação, juntamente com as disposições legais que regulam a matéria. Isso porque, como dito, a subjetividade é um elemento presente e constante na aplicação da multa coercitiva, o que impõe, necessariamente, ao julgador, em cada situação fática, dedicar maior atenção e cuidado na ponderação de tais princípios.

Associado a isso, procura demonstrar, igualmente, a importância do julgador em verificar o comportamento dos litigantes, sopesando a capacidade de resistência da parte em não cumprir a decisão (devedor recalcitrante) com a atitude do credor que, não raras vezes, permanece em silêncio, a priori, desinteressado pela tutela específica, dando azo a um enriquecimento sem causa daquele.

Ao final, traz a compreensão da correta apreciação do conjunto de normas e princípios, como medida de garantia da eficácia das decisões judiciais e do cumprimento da obrigação pelo devedor recalcitrante, fim maior da utilização da multa empregada como técnica de tutela coercitiva.

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1 ASTREINTES

Dentre os instrumentos à disposição do juízo para tornar a prestação da tutela jurisdicional mais adequada, está a tutela específica, prevista no ordenamento jurídico brasileiro no artigo 461 do Código de Processo Civil, a qual tem, na multa coercitiva, a principal medida acessória destinada à conferir a efetividade da ordem judicial.

São as denominadas astreintes, inspiradas no direito francês e no instituto do

contempt of court do ordenamento anglo saxão, cujo objetivo é coagir

psicologicamente o réu/executado a cumprir com a obrigação específica.

Diante da inexistência de regulamentação objetiva para aplicação da multa coercitiva, a partir do estudo específico deste instituto, será demonstrado o quanto deve o juiz estar atento aos parâmetros empregados para a adequada fixação do

quantum atribuído a título de astreintes, notadamente pela aplicação dos princípios

constitucionais.

1.1 Origem

Com o objetivo de vencer a resistência do obrigado no cumprimento de sua obrigação, surge originariamente no Direito Francês um instituto de nome astreintes, cujo primeiro dispositivo legal surgiu em 5 de julho do ano de 1972 pela Lei n.º 72-626, sob o título “ Da astreinte em matéria civil”, reformada atualmente pela Lei 91-650, com as alterações conferidas pela Lei 92.644 (AMARAL, 2010, p. 34).

Refere, ainda, que pela legislação francesa as astreintes não são vinculadas necessariamente a algum tipo de obrigação, mas tem função precípua de assegurar o cumprimento da decisão proferida pelo juiz, tenha ela cunho obrigacional ou não, com ou sem valor patrimonial, podendo, inclusive, ser fixada

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Trata-se de um instituto, pelo Código Francês, com ampliada possibilidade de aplicação, seja em procedimento sumário, na esfera trabalhista, em sede recursal, ou ainda, em partilha judicial de bens. Assim como o instituto do contempt of court, tem como objetivo a coerção psicológica do executado, atuando de forma a pressioná-lo a cumprir a obrigação específica (RODRIGUES; JORGE, 2001, p. 371).

Igualmente, pode-se dizer que as astreintes surgiram em inspiração ao ordenamento anglo saxão pelo contempt of court, que por sua vez exigia obediência à determinação do rei, pois do contrário o indivíduo meditaria na prisão, ou seus bens seriam objeto de sequestro, até o momento em que voltasse a ter consciência de seus sentimentos, preservando, assim, a integridade da Corte e o respeito e a obediência às decisões judiciais. As medidas adotadas pelo contempt of court, desde sua criação tinham caráter punitivo pela violação da boa–fé (AMARAL, 2010, p. 37)

No direito norte-americano a expressão contempt of court designa tanto o ato de descumprimento da ordem judicial quanto o poder que possui o juiz para sancionar esse ato. É constituído um dos instrumentos mais eficazes nos países anglo-saxônicos para garantir a realização concreta da tutela dos direitos.

No Brasil, o instituto não é desconhecido, tendo Ada Pellegrini Grinover (Grinover, RePro 102, p. 219-227) o definido como “a prática de qualquer ato que tenda a ofender um juiz ou Tribunal na administração da justiça, ou a diminuir sua autoridade ou dignidade, incluindo a desobediência a uma ordem” e Araken de Assis afirmando que "pode-se definir contempt of court como a ofensa ao órgão judiciário ou à pessoa do juiz, que recebeu o poder de julgar do povo, comportando-se a parte conforme suas conveniências, sem respeitar a ordem emanada da autoridade judicial.” (Assis, RePro 111, p.19).

É nesse sentido, através da evolução legislativa e jurisprudencial, que o modelo de medida coercitiva judicial, fundado pelo direito francês e baseado no

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ordenamentos jurídicos contemporâneos, notadamente o brasileiro (apud AMARAL, 2010, p. 36).

1.2 Ingresso das astreintes no Direito brasileiro

Sob a influência de leis especiais, como a Lei da Ação Civil Pública, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e o Código de Defesa do Consumidor, o Código de Processo Civil de 1973, posteriormente com as reformas editadas através das Leis n.º 10.352/01, 10.358/01, 10.444/02, 11.323/05 e 11.382/06, consagrou a utilização da multa periódica como mecanismo preferencial pela busca da tutela específica das obrigações de fazer e não fazer e obrigações de entregar coisa (AMARAL, 2010, p. 48-49).

Pela redação original do artigo 2871 do Código de Processo Civil, havia previsão somente em sentença para fixação da multa diária e desde que requerida pelo autor. Os artigos 644 e 645, os quais remetiam ao artigo 287, tinham a seguinte disposição:

Art. 644. Se a obrigação consistir em fazer ou não fazer, o credor poderá pedir que o devedor seja condenado a pagar uma pena pecuniária por dia de atraso no cumprimento, contado o prazo da data estabelecida pelo juiz (redação original).

Art. 645. A condenação na pena pecuniária deverá constar da sentença, que julgou a lide.

Logo, não havia possibilidade de o juiz inovar no processo de execução, cujo requerimento para cominação da multa deveria ser realizado pelo autor na peça inicial do processo de conhecimento, e devidamente fixada na sentença.

Com o advento da Lei n.º 7.347/85, Lei da Ação Civil Pública, sobreveio a possibilidade de fixação das astreintes ex officio (artigo 11, in fine), bem como em sede liminar, a incidir não apenas do trânsito em julgado da sentença, mas “desde o

1

Art. 287. Se o autor pedir a condenação do réu a abster-se da prática de algum ato, a tolerar alguma atividade, ou a prestar fato que não possa ser realizado por terceiro, constará da petição inicial a cominação da pena pecuniária para o caso de descumprimento da sentença (arts. 644 e 645).

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dia que se houver configurado o descumprimento (art. 12, § 2º) (AMARAL, 2010, p. 49-50).

Posteriormente, a reforma mais significativa relativamente ao instituto das

astreintes ocorreu com a Lei 10.444 de 2002, estabelecendo ao juiz a possibilidade,

de ofício ou a requerimento da parte, determinar, dentre as medidas necessárias, a imposição de multa por tempo de atraso, inclusive para as obrigações de entrega de coisa, culminando atualmente com a disposição dos artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil, que assim dispõem:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. (...)

Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

Logo, as astreintes tornaram-se um instituto atraente para o cumprimento das decisões judiciais, legitimamente assegurado no direito brasileiro.

1.3 Natureza jurídica e características das astreintes

Dentre as medidas autorizadas pelo Código de Processo Civil como meio hábil a compelir o obrigado ao adimplemento das obrigações específicas, tem bastante realce a multa coercitiva, como versão brasileira das astreintes concebidas pelos tribunais franceses. O termo empregado é de uso habitual na doutrina brasileira e em diversos outros países, sem tradução possível.

Por astreintes, entende-se a multa em caráter periódico pelo atraso no cumprimento de uma obrigação (de fazer ou não fazer), incidente em processo executivo, fundado em título judicial ou extrajudicial, cuja função é pressionar psicologicamente o executado a cumprir com sua obrigação (CÂMARA, 2007, p. 276).

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Conforme refere Guilherme Rizzo Amaral (2010, p. 69), a tutela jurisdicional

stricto sensu consiste no fim almejado pela imposição da multa (cumprimento da

obrigação), enquanto em sentido lato sensu, expressa a necessidade do juiz multar para desempenhar sua função jurisdicional.

A multa coercitiva não é uma indenização nem mesmo uma punição, mas uma técnica coercitiva da ordem judicial, ou seja, a fixação da multa não tem finalidade em si mesma, sendo utilizada como técnica para a consecução da tutela jurisdicional. Constitui, portanto, técnica de tutela do cumprimento efetivo dessa função, manifestando, inclusive, o poder de imperium do juiz (AMARAL, 2010, p. 70).

Para Marinoni (2001), a multa “é apenas um meio processual de coerção indireta voltado a dar efetividade às ordens do juiz; não tem ela, como é obvio, qualquer finalidade sancionatória ou reparatória”.

Ainda, assevera que “as astreintes não estão vinculadas à condenação principal, mas às ordens do juiz, demonstrando, em seu conceito, a acessoriedade às decisões de cunho mandamental” (MARINONI, 2001, p. 105-106).

Tal conceito de tutela coercitiva e acessória também pode ser ampliado para dizer que as astreintes visam pressionar o réu a cumprir o mandamento judicial, mediante pressão exercida através da ameaça ao seu patrimônio, consubstanciada na fixação de montante periódico a incidir acaso descumprida uma obrigação.

Enrico Tullio Liebman (apud AMARAL, 2010, p. 76), ao tratar das “medidas coercitivas” no processo de execução, inclui as astreintes entre elas, afirmando ser “destinada a obter do devedor o cumprimento de obrigação de fazer pela ameaça de uma pena susceptível de aumentar indefinidamente”.

Logo, as astreintes possuem natureza híbrida, porquanto além da função processual atuando como valioso instrumento na eficácia das decisões, apresenta caráter preponderantemente material, compensando o autor pelo tempo que ficou

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privado de fruir o bem da vida que lhe fora concedido, seja por meio de tutela antecipada ou em sentença definitiva.

Vale ainda sinalar, que as astreintes não se confundem com as perdas e danos, que tem o condão de reparar o dano causado pelo não-cumprimento da obrigação, sendo, em contrapartida, a multa responsável por causar constrangimento a ponto de que a prestação devida seja satisfeita. Assim, não possui natureza convencional e menos ainda se presta a prefixar perdas e danos.

1.4 Obrigações passíveis de fixação da multa coercitiva

Além do importante exercício de um juízo de conveniência, em atenção à efetividade da medida e seu objetivo, as astreintes possuem requisitos expressos previstos em lei, no que tange aos casos passíveis de sua incidência.

A reforma do Código de Processo Civil brasileiro no ano de 2002 com a Lei n.º 10.444, como já dito, representou significativa alteração na sistemática do instituto, ampliando o campo de sua aplicação e a forma até então utilizada. Antes da reforma, o § 4º do artigo 461 do Código em comento, referia que as astreintes apenas poderiam ser utilizadas quando se estivesse diante de decisões que contivessem ordem para o cumprimento de determinada obrigação de fazer ou não fazer.

Após a reforma, a incidência da multa coercitiva foi estendida para as obrigações de entregar coisa, acrescentada pelo artigo 461-A, não apenas para a tutela das obrigações de entrega de coisa certa, mas inclusive para entrega de coisa incerta2, ou determinada pelo gênero e quantidade.

A jurisprudência também tem enfrentado a hipótese de aplicação das

astreintes até mesmo à tutela de pagar quantia. O STJ, porém, definiu pela

2

STJ, REsp 852.084/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/08/2006, DJ 31/08/2006, p. 312.

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inaplicabilidade da multa processual em tais hipóteses, conforme REsp 438.003/RS3 e REsp 371.004/RS4.

No mesmo sentido e, não obstante se tratar de obrigação de fazer, a exibição de documento ou coisa, segundo entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, não pode ser objeto de coerção a utilização das astreintes5. Acerca do tema foi editada a Súmula 372 pelo STJ com a seguinte redação: “Na ação de exibição de documentos, não cabe a aplicação de multa cominatória”. Tal comando justifica-se em razão de que “A não-exibição do documento requerido pelo autor na via judicial implica a admissão da presunção da verdade dos fatos que se pretende comprovar por meio da prova sonegada pela parte adversa, restando este fato a única sanção processual cabível”, segundo entendimento esposado no REsp 845.860/SP.6

A obrigação de prestar declaração de vontade, quase sempre espécie do gênero obrigação de fazer, está definitivamente excluída do campo de aplicação da multa, conforme artigos 466-B e 466-A do Código de Processo Civil. Isso porque, após o trânsito em julgado da sentença os efeitos da declaração de vontade são consequentemente produzidos.

Assim é a lição de Humberto Theodoro Júnior (2002, p. 25):

Com a sentença do procedimento previsto nos arts. 639 a 641 do CPC, o credor obtém, portanto, execução específica da obrigação de fazer contida na promessa de contratar. Por expediente diverso do contrato prometido chega-se a efeito jurídico e prático a ele equivalente.

Ainda acerca das obrigações de fazer, importante a diferenciação sobre a fungibilidade das obrigações. Na definição da Ilustre Maria Helena Diniz (apud AMARAL, 2010, p.114):

3

STJ, REsp 438.003/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2006, DJ 18/08/2006, p. 363;

4

STJ, REsp 371.004/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/03/2006, DJ 06/04/2006, p. 254

5

STJ, AgRg no REsp 1178467/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 13/06/2012.

6

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ter-se-á obrigação de fazer infungível se consistir seu objeto num

facere que só poderá, ante a natureza da prestação ou por

disposição contratual, ser executado pelo próprio devedor, sendo, portanto, intuito personae, uma vez que se levam em conta as qualidades pessoais do obrigado.

Já a obrigação de fazer fungível o será sempre que “a prestação do ato puder ser realizada indiferentemente tanto pelo devedor como por terceiro, [...]” (apud AMARAL, 2010, p.114).

Acerca do tema, a jurisprudência do STJ se manifestou no sentido de ser facultado pleitear a cominação da pena pecuniária (astreintes) como meio executivo para cumprimento de obrigação de fazer (fungível ou infungível) ou entregar coisa7, ainda nos casos em que a obrigação seja cumprida por terceiro, que não o devedor.

Destarte, independentemente do juízo de fungibilidade, busca-se sempre atingir o cumprimento específico da obrigação, de forma mais célere e eficaz para o credor. De toda sorte, ainda existem posicionamentos doutrinários isolados contra a utilização das astreintes relativamente a coerção do réu no cumprimento das obrigações fungíveis.

Sendo o réu o sujeito passivo da multa, pouco importa que ele seja particular ou pessoa jurídica de direito público. Conforme salienta Talamini (apud AMARAL, 2010, p. 127):

Não há o que obste a cominação da multa contra pessoas de direito público. A separação dos poderes não serve de argumento em sentido contrário. [...] Aliás, a ideal observância dos princípios norteadores da função pública tornaria a multa até desnecessária. [...] Como, no entanto, a realidade administrativa está longe daquele parâmetro legal, os meios processuais de coerção, inclusive a multa, revelam-se de extrema utilidade.

7

STJ, AgRg no Ag 1352318/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/02/2011, DJe 25/02/2011. É cabível, mesmo contra a Fazenda Pública, a cominação de multa diária - astreintes - como meio coercitivo para cumprimento de obrigação de fazer (fungível ou infungível) ou entrega de coisa. Precedentes do STJ REsp 893.041/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/12/2006, DJ 14/12/2006.

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A multa será suportada pela pessoa jurídica de direito público, que figurará no polo passivo, e não diretamente pelo agente que deixou de atender ao comando judicial.

Com efeito, sendo a astreinte acessória e não subsidiária, portanto, sem ordem preestabelecida, a adoção de medidas sub-rogatórias ou a aplicação da multa deverá ser analisada com prudência pelo juiz, verificando caso a caso, a técnica mais adequada para o alcance da finalidade posta em causa, atentando para o cabimento da multa em face de cada espécie de obrigação.

1.5 Beneficiário das astreintes

Os artigos 461 e 461-A do atual Código de Processo Civil regulam a matéria no âmbito da sistemática processual brasileira. Todavia, os mencionados artigos não apresentam de forma clara e inequívoca muitas das principais polêmicas acerca do instituto das astreintes, a exemplo, o titular do crédito, lacuna sanada, se aprovado o projeto do novo Código de Processo Civil.

A doutrina majoritariamente adota a posição de que as astreintes constituem crédito exclusivo do beneficiário da decisão. Assim é a posição de Cássio Scarpinella Bueno (2010), Guilherme Rizzo Amaral (2010), Marcelo Abelha Rodrigues (2008) e Joaquim Felipe Spadoni (2007).

Em sentido diverso, Barbosa Moreira (1994, p. 14):

[...] por outro lado, já que ela [a multa] não tem caráter ressarcitório, mas visa a assegurar a eficácia prática da condenação, constante de ato judicial, não parece razoável que o produto da aplicação seja entregue ao credor, em vez de ser recolhido aos cofres públicos.

Outra posição acerca do destinatário das astreintes é dita pelo Min. Marco Buzzi, no REsp 949.509-RS, julgado em 8/5/20128, o qual afirma não vislumbrar

8

STJ, REsp 949.509-RS, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para o acórdão Min. Marco Buzzi, julgado em 8/5/2012. No mesmo sentido: STJ, REsp 1063902/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA

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qualquer lacuna na lei quanto à questão, posto que, o legislador quando pretendeu atribuir ao Estado a titularidade da multa, assim o fez expressamente, consoante artigo 14, parágrafo único, do CPC, em que se visa coibir o descumprimento e a inobservância de ordens judiciais.

Logo, a multa mencionada no parágrafo único do artigo 14 do Código de Processo Civil apresenta nítido caráter punitivo, enquanto a multa cominatória possui feição coercitiva, movida por desígnios de ordem dissuasória e intimidatória, cujo propósito final é, que a multa nem incida concretamente.

Não se pode negar o interesse imediato do credor da obrigação principal de vê-la prontamente cumprida pelo obrigado, apresentando-se a multa cominatória como instrumento acessório a realização do direito material. O fato é, que as

astreintes, destinada exclusivamente para o autor, é fruto de hábito reiterado

confortavelmente pela prática forense, paga pela parte renitente a título de pena privada.

1.6 Direito comparado

A proteção dos direitos humanos deixou de ser uma questão exclusiva e interna de cada Estado (“domestic affair”) para se converter numa questão de índole internacional (“internacional concern”). Nas palavras do Ilustre Ronald Dworkin “o Direito Internacional deve ser levado mais a sério”, denotando, por certo a importância de uma ordem e uma soberania com competência ampla, Legitimada a direcionar esforços para a solução, final ou aproximada, dos conflitos internacionais (GOMES;DOWRKIN. Jornal Estado de Direito, fl. 27).

Destarte, a proteção dos direitos humanos, evidentemente inclui a satisfação do bem-estar comum, através da efetividade do acesso a justiça, garantindo ao cidadão a segurança e certeza jurídicas da proteção ao seu direito.

TURMA, julgado em 19/08/2008, DJe 01/09/2008; STJ, REsp 770.753/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/02/2007, DJ 15/03/2007, p. 267.

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Acerca do Direito Comparado sobre o instituto das astreintes, o notável e marcante voto proferido pelo Min. Luiz Felipe Salomão em Recurso Especial9, esboça a previsão da multa como meio persuasório de cumprimento das decisões judiciais em outros ordenamentos jurídicos, dentre os quais, o direito francês, alemão, anglo-americano e português.

As astreintes francesas, com as quais a multa periódica (artigo 461, § 4º, CPC) guarda similitude, nasceu com a superação de dogmas insculpidos sobretudo pelo Código napoleônico (artigo 1.142), suavizando a ideia de que toda obrigação de fazer ou de não fazer resolver-se-ia em perdas e danos.

Com o objetivo de sanar a lacuna existente no direito francês, quanto à satisfação das obrigações de fazer e não fazer, as astreintes surgiram, no início do século XIX, como criação pretoriana de caráter coercitivo e independente de eventual indenização dos prejuízos decorrentes da inexecução da obrigação reconhecida judicialmente (GUERRA, 1998, p. 110).

A disciplina legal no direito francês veio a lume apenas em 1972, melhorada posteriormente no ano de 1991, através de construções jurisprudenciais desde antes praticadas, reconhecendo a típica função coercitiva das astreintes. Porém, como noticiado por Marcelo Lima Guerra, “persistindo o devedor no inadimplemento, a

astreinte, ao incidir concretamente, tem a natureza de uma pena privada, uma vez

que a quantia devida em razão de sua decretação é entregue ao credor (GUERRA, 1998, p. 115).

No direito alemão, das medidas coercitivas destinadas à execução indireta para pressionar psicologicamente o obrigado a realizar a prestação devida, extrai-se como destaque a Zwangshaft (prisão do devedor) e a Zwangsgeld (pena pecuniária).

Nas palavras do Relator do acórdão acima exarado, a Zwangsgeld, assim como a astreinte francesa, possui caráter eminentemente coercitivo e é arbitrada

9

STJ, REsp 1006473/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 08/05/2012, DJe 19/06/2012.

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pelo magistrado à luz do caso concreto, perdurando enquanto persistir o inadimplemento, independentemente de reparação dos danos concretamente experimentados pelo credor. Contudo, distancia-se do direito francês à medida que possui um teto, fixado em lei, do qual não pode ultrapassar o montante resultante da incidência da multa e, principalmente, porque o valor é sempre destinado ao Estado e não ao credor.

Pelo último traço característico, a Zwangsgeld ostenta caráter público e o interesse por ela protegido é o da dignidade da justiça e sua correta e efetiva administração (AMARAL, 2010, p. 43-44).

De alguma forma também se assemelha à astreinte francesa e à Zwangsgeld alemã, uma das vertentes do contempt of court do direito anglo-americano, o chamado contempt of court indireto civil.

Nessa linha, o reconhecimento do "escárnio à corte" pode render ensejo a multa de caráter coercitivo, consistente em quantia determinada a incidir cada vez que a parte viola a ordem judicial, ou por cada dia em que persistir o não cumprimento (GUERRA, 1998, p. 100).

Sobre o instituto anglo-americano, Amaral refere que o civil contempt pode ser reparatório (remedial) - destinado a compor os danos causados ao autor -, e coercitivo (coercive), destinado a pressionar o réu renitente a cumprir a determinação judicial. Nesse último caso, além da prisão civil, a reprimenda pode consistir em multa diária (per diem fine), hipótese em que o valor é revertido para o Estado (AMARAL, 2010, p. 38).

No direito português, se verifica uma peculiar sistemática, a chamada “sanção pecuniária compensatória”, prevista à razão de 50% para o Estado e 50% para o credor, nos termos do art. 829-A do Código Civil Português com a seguinte disposição:

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1. Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.

2. A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indenização a que houver lugar.

3. O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado.

4. Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indenização a que houver lugar.

Com a divisão da multa ao Estado e ao credor denota se a opção do legislador luso em reconhecer que a chamada “sanção pecuniária compensatória”, a par da natureza coercitiva, resguarda, a um só tempo, os interesses do credor na solução do litígio e os interesses do Estado na preservação de sua autoridade (SILVA, 2002, p. 445).

O direito brasileiro, por sua vez, optou pela disciplina das astreintes, expressado de maneira lacunosa na legislação atual, para o caso de descumprimento de descumprimento judicial.

Dentre as principais similitudes do instituto das astreintes entre o sistema francês e o sistema brasileiro, está a possibilidade de fixação de ofício pelo juiz, através de decisão liminar, ordenando, imediatamente as medidas necessárias para garantir a eficácia do provimento judicial. Outrossim, o juiz da execução pode fixar

astreinte, dotada em ambos os sistemas de caráter meramente acessório e

coercitivo, independente de perdas e danos (AMARAL, 2011, p. 63-64).

Ao contrário do que ocorre no direito francês, que estabelece expressamente a destinação do valor da astreinte ao particular, a legislação brasileira não prevê a exata destinação do crédito resultante da imposição de multa diária, destinando, habitualmente ao autor da ação, sob o risco, de enriquecimento sem causa.

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Quanto a unidade de tempo, há casos no direito francês, desde a origem das

astreintes, de fixação de multa por dia, ano, e até mesmo segundo de atraso,

conforme noticiam Planiol e Talamini (apud AMARAL, 2010, p. 65), enquanto a única unidade de tempo, legalmente admitida até recentemente no direito brasileiro, era o dia, alterada por força do parágrafo 5º do artigo 461, além do novo § 6º, que permite ao juiz modificar o valor ou a periodicidade da multa, que poderá ser fixada em outras unidades de tempo.

O que se observa, portanto, sobre a sistemática processual brasileira do instituto das astreintes, é a existência de um conceito e uma regulamentação ainda insuficiente, que dificulta compatibilizar a efetividade das decisões judiciais, pela falta de critérios claros sobre a aplicação da multa, ocasionando, não raras vezes, a imposição de multa exacerbada, gerando enriquecimento sem causa, e consequentemente não atingindo sua finalidade. Por outro lado, a fixação em patamares módicos não estimulam o cumprimento da decisão judicial.

1.7 Princípios e normas

A estruturação das normas, catalogadas em princípios e regras, auxiliam significativamente no campo da interpretação e aplicação, sobretudo das normas constitucionais, sem, contudo, deixar de lado normas legislativas comuns, transmissoras de subprincípios jurídicos.

A Constituição contém em seu bojo, tanto princípios quanto regras, ostentando inegável relevância dos princípios constitucionais, aos quais se lhes atribuem variadas missões, expressando a axiologia normativa superior, que ao mesmo tempo busca a unificação do sistema jurídico, estabelecendo parâmetros para a hermenêutica jurídica, seja na interpretação quanto na aplicação das normas de direito positivo.

Partindo do pressuposto de que princípios são normas, necessário distinguir princípios e regras, como sendo normas jurídicas diferentes. Para Canotilho (apud

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NERY JÚNIOR, 2010, p. 29), a distinção prática entre princípios e regras é uma tarefa particularmente complexa, para a qual são sugeridos diversos critérios:

a) Grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem um grau reduzido de abstração. b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (do legislador? do juiz?), enquanto as regras são suscetíveis de aplicação directa. c) Caráter de fundamentabilidade no sistema das fontes de direito: os princípios são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua hierarquia no sistema das fontes do direito (ex: princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex: princípio do Estado de Direito). d) “Proximidade” da ideia de direito: os princípios são “standards” juridicamente vinculantes que se radicam na ideia de justiça (DWORKIN) ou de direito (LAURENZ); as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente funcional. e) Natureza normogenética: os princípios são fundamentos de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.

Obra que também representa uma genuína contribuição sobre o tema é a conceituação apresentada por Humberto Ávila (2007, p. 78-79):

As regras são normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência, para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência [...] entre a construção conceitual da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos. Os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção.

Em um Estado Democrático de Direito, os direitos fundamentais e humanos atuam como realizadores dos procedimentos, cuja interpretação não opera de maneira meramente silogística e reprodutiva, mas sim exige interpretação e aplicação adequada do direito, sendo sempre uma atividade produtiva e criadora, na sistemática da atuação conjunta de princípios e regras reguladoras do instituto acessório em questão.

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Os princípios, nas palavras do Alexy (apud NERY JÚNIOR, 2010, p. 25), são mandamentos de otimização, caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e de que seu cumprimento não somente depende das possibilidades reais, mas também das possibilidades jurídicas. Ou seja, são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes.

Interessante destacar também o ensinamento do Lenio Streck (2008, p. 174-175), o qual afirma que os princípios vieram para superar a abstração da regra, desterritorializando-a de seu locus privilegiado, o positivismo. Em crítica ao que apresenta Robert Alexy, refere que não se pode caracterizar a noção de princípio como se fora um “postulado” ou “mandado de otimização”, porque isso traz embutida a ideia positivista para que seja reavivada a abstratalidade, e, consequentemente, seja afastado o mundo prático ínsito aos princípios.

Ainda em seus ensinamentos, Streck (2008, p.175) explica que por intermédio dos princípios é que se torna possível sustentar a existência das respostas adequadas (corretas para cada caso concreto). “Portanto, a resposta dada através dos princípios é um problema hermenêutico (compreensão), e não analítico-procedimental (fundamentação).”

Com efeito, as regras vêm perdendo cada vez mais espaço e relevo para aplicação dos princípios, notadamente aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade no que tange ao instituto da multa coercitiva, para garantia de eficácia da ordem judicial. Insta mencionar, porém, que um sistema equilibrado não deve ser pautado apenas em princípios, como também na mera aglutinação de regras, sendo necessária a aplicação harmônica e moderada dessas fontes pela autoridade competente.

1.7.1 Princípios constitucionais processuais

Na lição de Konrad Hesse, a Constituição é a ordem jurídica fundamental da coletividade, determinando princípios diretivos e procedimentos de pacificação de

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conflitos no interior da sociedade. Significa, isto sim, que os textos constitucionais devem estabelecer as premissas materiais e processuais fundantes para aplicação do direito (apud NERY JÚNIOR, 2010, p. 38).

Sob essa ótica, todos os ramos do direito, notadamente o direito processual, vinculam-se à Constituição, de sorte que é a Carta Política que fixa os princípios, os contornos e as bases sobre as quais deve erguer-se o edifício normativo brasileiro (NERY JÚNIOR, 2010, p. 39).

Até bem pouco tempo, o processualista via no Código de Processo Civil (lei ordinária principal), a única norma a ser consultada para encontrar a solução dos problemas naquela área. Atualmente, pode-se dizer que o Brasil, ao longo de um fenômeno cultural e político, evoluiu, dando ênfase ao respeito pela Constituição, que em outras épocas de instabilidade política, tampouco fora aplicada efetivamente.

Como ramo do direito público, o direito processual é composto de um sistema uniforme e homogêneo, facilitando a compreensão e aplicação das normas para a solução de possíveis ameaças e lesões a direito. Apesar do reconhecimento dessa unidade, também existe didaticamente um direito constitucional processual, para significar o conjunto das normas de direito processual que se encontra na Constituição, ao lado de um direito processual constitucional, que seria a reunião dos princípios para o fim de regular a denominada jurisdição constitucional (NERY JÚNIOR, 2010, p. 41).

Exemplos de normas de direito constitucional processual podem ser citadas as previsões dos artigos 5º, inciso XXXV e 8º, inciso III, ambos da Constituição Federal e como institutos de direito processual constitucional o mandado de segurança, o habeas data, a ação direta de inconstitucionalidade, dentre outros.

Certo é, que o intérprete deve buscar a aplicação do direito ao caso concreto, tendo sempre como pressuposto fundamental a Constituição Federal, para então depois, passar a análise da legislação infraconstitucional acerca do tema consultado.

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1.7.2 Princípio do devido processo legal

O princípio constitucional fundamental do processo civil sobre o qual todos os outros princípios e regras se sustentam, no entender do Nelson Nery Júnior (2010, p.79) é o devido processo legal, expressão oriunda da inglesa due process of law. A Constituição Federal brasileira de 1988 expressamente registra que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Doutrinariamente, são manifestações do devido processo legal a publicidade dos atos processuais, a impossibilidade de utilizar-se em juízo prova obtida por meio ilícito, assim como os postulados do juiz natural, do contraditório e do procedimento regular, garantindo aos litigantes o direito a um processo e uma sentença justa.

Esse princípio tem fundamento constitucional nas Emendas 5.ª e 14.ª da Constituição norte-americana, tutelando genericamente, o trinômio vida-liberdade-propriedade (NERY JUNIOR, 2010, p. 83). O conceito de “devido processo” com o tempo foi sendo modificado, alargando o âmbito de sua abrangência, de modo a permitir a interpretação mais elástica possível em favor dos direitos fundamentais do cidadão.

Consoante ensinamento de Fredie Didier Júnior (2012, p. 45), o processo é método de exercício de poder normativo, onde as normas jurídicas são produzidas após um processo, entendido este como conjunto de atos organizados para a produção de um ato final, caracterizando o devido processo legal uma garantia contra o exercício abusivo do poder, seja ele qual for.

A cláusula due processo of law não refere-se somente a tutela processual, sendo caracterizado de forma bipartida, ante a existência do substantive due

process e o procedural due process, indicando a incidência do princípio em seu

aspecto substancial, atuando no direito material, e, de outro lado, tutelando direitos por meio do processo judicial ou administrativo (NERY JÚNIOR, 2010, p. 83).

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Nesse aspecto, da locução “devido processo legal” são oriundas inúmeras garantias quanto ao processo, dentre as quais o direito à citação e ao conhecimento do teor da acusação, a publicidade do julgamento, a possibilidade de arrolar testemunhas e à notificação das mesmas para comparecimento perante os tribunais, o exercício do contraditório, o direito à plena igualdade de tratamento entre as partes, a impossibilidade de condenação fundada em provas ilícitas e a concessão da assistência judiciária gratuita.

Conforme José Celso de Mello Filho (apud NERY JUNIOR, 2010, p. 87), especificamente ao processo civil, já se firmou ser manifestação do due process of

law: a) a igualdade de partes; b) garantia do jus actionis; c) respeito ao direito de

defesa; d) contraditório.

O princípio do devido processo legal foi expressamente abrigado pelo inciso LIV do artigo 5º da Constituição Federal, dispondo que ninguém será privado de sua liberdade ou de bens sem o devido processo legal, entretanto, doutrina e jurisprudência brasileiras têm empregado o princípio num sentido eminentemente processual (ARAÚJO; NUNES JÚNIOR, 2008, p. 183).

1.7.3 Princípio da duração razoável do processo

A Emenda Constitucional n.º 45, de 30.12.2004 (DOU 31.12.2004), inseriu no rol dos direitos fundamentais do artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, que “A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

O princípio da razoável duração do processo, ao mesmo tempo em que visa respeitar o tempo do processo, considerando seu início e a decisão final transitada em julgado, seja ele judicial ou administrativo, igualmente procura fazer com que sejam adotados meios alternativos à solução do litígio, abreviando, como consequência, a duração média do próprio processo. É garantido, portanto, que o processo se inicie e seja também concluído, incluindo a fase recursal, dando-se por

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encerrado, quando houver o trânsito em julgado da decisão, ou seja, dela não caiba mais qualquer recurso (NERY JÚNIOR, 2010, p.319).

O princípio em questão, necessita, para sua aplicação, verificar a hipótese concreta, aferida através de critérios objetivos, dentre eles (NERY JÚNIOR, 2010, p.319):

a) a natureza do processo e complexidade da causa; b) o comportamento das partes e de seus procuradores; c) a atividade e o comportamento das autoridades judiciárias e administrativas competentes; d) a fixação legal de prazos para a prática de atos processuais que assegure efetivamente o direito ao contraditório e ampla defesa.

Em nosso ordenamento jurídico, existem inúmeras manifestações legislativas, que se traduzem em meios hábeis a possibilitar a celeridade do processo judicial e administrativo, como meios alternativos de solução de conflitos, a exemplo, a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Lei n.º 9.099/95, Lei da arbitragem, a ação monitória, artigo 1.102-A do CPC, a utilização de processo eletrônico, dentre outros.

Frisa-se que através da razoável duração do processo, não se está a falar de uma garantia desatenta aos demais princípios e garantias que norteiam e orientam a atividade jurisdicional. Pelo contrário, se busca atender a efetividade da pretensão violada, a qual fez surgir o direito, valorizando inclusive as demais garantias constitucionais e processuais indispensáveis ao atual estado democrático de direito, mas também mantendo intacta no indivíduo, a certeza e a segurança jurídicas, de ver satisfeita a obrigação postulada.

1.7.4 Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade objetiva a ponderação entre os meios utilizados e a finalidade perseguida, orientando o intérprete na busca da justa medida para aplicação de cada instituto jurídico, pautado pelo menor sacrifício ao cidadão dentre às alternativas à disposição do juízo.

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Sobre o princípio, é a manifestação de Raquel Denizze Stum (apud ARAÚJO; NUNES JÚNIOR, 2008, p. 90):

O juízo de ponderação entre os pesos dos direitos e bens contrapostos deve ter uma medida que permita alcançar a melhor proporção entre os meios e os fins. Em outras palavras ‘os meios legais restritivos e os fins obtidos’ devem situar-se ‘numa justa medida’, impedindo-se a adoção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos (CANOTILHO & MOREIRA, 1993, p. 152). Decorre da natureza dos comandos dos princípios válidos a otimização das possibilidades fáticas e jurídicas de uma determinada situação. Otimizar implica em relativizar as possibilidades jurídicas de um determinado princípio, tendo em vista o peso do princípio colidente num caso concreto. A decisão de um conflito exige, então, a ponderação a partir do momento em que ele se verificar (ALEXY, 1993, p. 112).

Tal princípio sugere um sistema de valoração, pois ao se garantir um direito, outro, em algumas situações acaba sendo restringido, o que é perfeitamente possível após a realização de um estudo teleológico, em que se conclua que o direito juridicamente protegido apresenta conteúdo valorativamente superior ao restringido.

A aplicação do juízo de proporcionalidade permite equilibrar o fim almejado e o meio empregado, ou seja, a interferência na esfera particular do indivíduo deve ser proporcional à carta coativa do motivo da intervenção. A regra contida no § 4º do artigo 461 concretiza a aplicação do princípio da proporcionalidade, ao determinar que a multa será suficiente ou compatível com a obrigação.10

Nas palavras de Kazuo Watanabe (apud AMARAL, 2010, p. 136):

O dispositivo confere maior plasticidade ao processo, principalmente quanto ao provimento nele reclamado, permitindo que o juiz, em cada caso concreto, através da faculdade prevista no parágrafo em análise, proceda ao adequado equilibro entre o direito e a execução respectiva, procurando fazer com que esta última ocorra de forma compatível e proporcional a peculiaridade de cada caso.

10

Art. 461. (...)§ 4oO juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

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Tal princípio, ainda que não expressamente previsto na Constituição Federal, está também arraigado na ideia de devido processo legal e nos primados da Justiça. É, sem dúvida, nas palavras de Luís Roberto Barroso (2009, p. 375):

[...] um valioso instrumento de proteção dos direitos fundamentais e do interesse público, por permitir o controle da discricionariedade dos atos do Poder Público e por funcionar como a medida com que uma norma deve ser interpretada no caso concreto para a melhor realização do fim constitucional nela embutido ou decorrente.

Do princípio da proporcionalidade se extraem três subprincípios, dentre eles, o subprincípio da adequação, o subprincípio da necessidade e ainda, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito (AMARAL, 2010, p.134).

Como requisito de adequação, se exige que as medidas adotadas pelo Poder Público sejam aptas a atingir os objetivos pretendidos; enquanto o subprincípio da necessidade ou exigibilidade impõe a verificação da existência de meio menos gravoso a ser utilizado para atingir os fins visados.

Em sentido estrito, o princípio da proporcionalidade conduz o juiz em verificar, dentre os interesses envolvidos, quais devem prevalecer, pois à medida que se garante um direito, muitas vezes é preciso restringir outro, o que é aceitável após um estudo teleológico no qual se conclua que o direito juridicamente protegido apresenta conteúdo valorativo superior ao que está sendo restringido.

Com efeito, é nessa senda que a efetividade da tutela jurisdicional, por óbvio, depende da adequada utilização dos mecanismos à disposição do juízo, pautada, sobretudo, em sólidos valores de convicção do julgador, mediante a aplicação de medidas proporcionais à solução da lide, com profunda análise das especificidades do caso concreto.

1.7.5 Princípio da razoabilidade

Apesar de não previsto expressamente na Constituição de 1988, o princípio da razoabilidade, originado da garantia do devido processo legal, conhecido também

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pelo due process of Law, é utilizado como parâmetro para valoração dos atos do Poder Público, norteado pelos critérios de Justiça, inerentes a todo ordenamento jurídico (BARROSO, 2009, p. 224-231).

Nas palavras do Barroso (2009, p. 231), “é razoável o que seja conforme à razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o que não seja arbitrário ou caprichoso; o que corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento ou lugar”.

O princípio da razoabilidade guarda, em linhas gerais, relação de semelhança e fungibilidade no resultado prático de sua aplicação com o princípio da proporcionalidade, uma vez que ambos visam nortear o juiz na garantia de uma adequada prestação jurisdicional, ao mesmo tempo em que preservam a não violação de outros princípios por conta da efetividade do comando judicial.

Nesse aspecto, verifica-se que o princípio da razoabilidade, a par do princípio da legalidade, procura, com vistas ao caso apresentado, tornar possível a realização prática do direito, sem desobedecer as normas, mas se utilizando de critérios aceitáveis do ponto de vista racional. É imperativo satisfazer a obrigação exigida pelo credor, mediante o uso razoável da medida empregada, não tornando assim o cumprimento, excessivamente oneroso ao devedor.

A partir dos princípios indicados e dos demais elementos (objetivos e subjetivos) que deve o julgador atentar para a aplicação do quantum da multa coercitiva, restará demonstrado o papel fundamental desempenhado pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade como máximas da eficácia e cumprimento das decisões judiciais e, consequentemente, da satisfação da tutela pretendida pelo autor.

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2 O SISTEMA PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO E O SUBJETIVISMO NA APLICAÇÃO DAS ASTREINTES

Dentre as medidas à disposição do juízo delineadas no artigo 461 do Código de Processo Civil, as quais pode-se dizer, são abundantes – que recaem tanto sobre o patrimônio quanto sobre a pessoa do executado –, está a multa coercitiva. Assim, o sistema processual é aparentemente perfeito, pois permite ao juiz tomar as medidas que julgar necessárias e apropriadas ao caso concreto, realizando verdadeiramente o direito de acesso à Justiça consagrado no artigo 5º, inciso XXXV, da Carta Magna (MEDINA, 2008, p. 275-276).

Todavia, a multa, no intuito de desestimular o descumprimento e não punir o atraso, por ausência de limites precisos à sua aplicação, pode, algumas vezes, autorizar critérios díspares na sua fixação, ocasionando, por conseqüência, o mau uso do mecanismo.

Importante que, a atividade jurisdicional na aplicação do conceito vago estampado no artigo 461, § 5º, do Código de Processo Civil, além de uma decisão fundamentada, exponha um juízo de valoração a justificar a adequação da multa aplicada. Isso porque, a liberdade do juiz fixar, diante da situação concreta, a medida executiva adequada, de modo algum significa que esta atividade seja discricionária, vez que, presentes as circunstâncias do artigo 461 do CPC, o juiz deverá estabelecer a medida que entender cabível e apropriada, através, como já dito, de um juízo de valor fundado nos princípios constitucionais do processo civil, a destaque, o da proporcionalidade e da razoabilidade.

Nesse sentido, se enaltece a atividade jurisdicional, quando são utilizados adequadamente os mecanismos a disposição do juízo, fazendo cumprir o ato estatal e a garantia da satisfação da obrigação, característica essencial a máxima efetividade do processo e conseqüentemente do direito tutelado através dessa instrumentalidade.

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2.1 Subjetividade do julgador e a eficácia das decisões judiciais

Diante da peculiar característica da multa coercitiva - coagir o devedor-, e da inexistência de critérios taxativos para que esta seja fixada, a subjetividade do julgador impera com a necessidade de atender ao fim perseguido, sem tornar ineficaz a aplicação do mecanismo em questão.

Para esta atividade, adverte Humberto Theodor Júnior que a fixação da multa ou de qualquer outra medida coercitiva deve ser realizada em “observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de sorte a guardar a relação de adequação com o fim perseguido, não podendo acarretar para o réu sacrifício maior do que necessário.” (Theodoro Jr., RePro, 196, p.80).

A multa, dado seu caráter coercitivo, não viola a vontade do devedor, que poderá concluir que o cumprimento da obrigação lhe é mais vantajoso do que arcar com o pagamento da multa cominada. Mas isto, evidentemente, só virá a ocorrer se a multa efetivamente for fixada com razoabilidade e proporcionalidade em face da situação posta em causa, ou seja, em valor que não ultrapasse o necessário para a coação do réu e represente, nas palavras de Barbosa Moreira, a ameaça de uma conseqüência desvantajosa e suficientemente forte, a ponto de que a renúncia ao benefício visado cause um mal maior ao réu (Moreira, 1988, p. 38).

Cabe destacar o ensino do nobre Evandro Carlos de Oliveira acerca do tema (2011, p. 141):

Quando o devedor de uma obrigação de dar deixa de satisfazê-la, o estado não tem dificuldade para a efetivação da pretensão do exeqüente, que poderá ser obtida, por exemplo, com o cumprimento de mandado de busca e apreensão. Por sua vez, quando se tratar de obrigação de fazer ou de não fazer, ante a impossibilidade de utilização de força para constranger o devedor a cumprir a obrigação, a utilização da multa é o instrumento coercitivo adequado para a obtenção desse resultado. (grifei)

Importante pontuar, que a imposição das astreintes, pela dicção do artigo 461 e 461-A do CPC, refere da possibilidade de cominação tanto em decisões

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interlocutórias que concedem a antecipação de tutela pleiteada, quanto na sentença de mérito, não apenas por juízes de primeiro grau, como também por relator de recurso ou por órgão colegiado. Veja-se, que para que a multa apresente resultado positivo como meio de tutela inibitória, necessário que o juiz ou relator, possam se valer de tal meio de coação para que o devedor cumpra a ordem contida no mandado.

A par da possibilidade do momento de fixação, deverá o julgador atentar para o estabelecimento de prazo razoável ao cumprimento da obrigação pretendida, nos termos do § 4º do artigo 461, que apesar do grau de subjetividade nele contido, é norteado igualmente pelo caso concreto, o que relativiza o conceito de “prazo razoável” diante das circunstâncias possíveis, as quais não poderia o legislador predeterminar.

Tais considerações se devem em razão do artigo 461, § 5º, do CPC apresentar, dentre o rol exemplificativo, “a imposição de multa por tempo de atraso”, em consonância ao § 6º do mencionado artigo, que aduz a possibilidade de alteração da periodicidade da multa caso o juiz verifique que se tornou insuficiente ou excessiva, conduzindo, destarte, a uma interpretação de ser empregada, a multa, em período de tempo menor do que um dia.

Em que pese o elevado grau de subjetividade no conceito vago disposto no artigo 461, § 4º, do CPC, o juiz, na busca de encontrar o ponto de equilíbrio para a fixação das astreintes deve observar alguns critérios objetivos quanto a essa tarefa. Dentre eles, está a pessoalidade do sujeito obrigado, a capacidade econômica e a capacidade de resistência do sujeito passivo da ordem, a capacidade intimidatória da multa, a importância do bem jurídico tutelado e a possibilidade prática de a tutela específica ser realizada (Amaral et al. RePro, 196, junho/2011, p. 67).

O comando judicial para o cumprimento da obrigação deve ser destinado ao responsável pela obrigação, pois cabendo ao mesmo o cumprimento do preceito judicial, a sua recalcitrância dará ensejo à incidência da medida, seja ela pessoa de direito público ou de direito privado.

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A capacidade econômica do sujeito guarda ensejo quanto às possíveis vantagens que o sujeito possa obter se deixar de cumprir o preceito, a fim de não tornar inócua a utilização do mecanismo, cominando valor inferior ao lucro obtido com a violação do direito (MARINONI, 2008, p. 478).

No que tange a capacidade intimidatória da multa, pode-se dizer que esta está intimamente ligada à função coercitiva, justificando sua fixação em elevado valor com o objetivo de compelir e estimular o devedor em cumprir a obrigação específica

Ainda, a importância do bem jurídico tutelado e a possibilidade da tutela específica ser realizada, atuam como critérios importantes para a fixação da multa coercitiva. O primeiro, por mais que o valor da multa não esteja vinculada essencialmente ao valor da obrigação inadimplida, o bem da vida em litígio é predominante para a forma de incidência da astreinte, enquanto o segundo, atuando em um plano de ordem prática é bem esclarecido pelas palavras de Marcelo de Lima Guerra (1998, p. 192):

A multa não pode ser imposta diante da impossibilidade prática da execução específica ser realizada. É dizer: quando se verificar que a execução específica é ou tornou-se impossível, a multa não pode ser imposta, ou continuar incidindo, concretamente.

Na aplicação da prática forense, ora se sobressai o valor “efetividade da tutela judicial”, ora se sobressai a “vedação do enriquecimento sem causa”. Para se obter o aperfeiçoamento da efetividade no caso concreto, por vezes o devedor recalcitrante é obrigado a pagar multa em patamar que supera muito além do interesse principal perseguido em juízo, por outro lado, ou a adequação do valor da multa para evitar o enriquecimento sem causa, freqüentemente é reduzida consideravelmente, muito embora na contramão da conduta inerte do devedor, que além de não cumprir a obrigação, ainda assim, consegue suavizar a reprimenda que lhe fora outrora imposta.

Nota-se, portanto, que os valores que devem ser ponderados subjetivamente pelo juiz, por ocasião do arbitramento da multa, se resumem essencialmente a dois

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critérios: a) efetividade da tutela prestada, para cuja realização as astreintes devem ser suficientemente persuasivas, e b) vedação do enriquecimento sem causa do beneficiário do crédito, dado que a multa não é em si, o bem jurídico perseguido em juízo.

2.2 Modificação da multa pelo julgador

O Código de Processo Civil brasileiro prevê a possibilidade de modificação da multa, logo porque, como afirma Amaral (2010, p. 162), não pune o atraso, mas sim estimula o cumprimento. Nesse sentido, o artigo 461, § 6º, dispõe que “O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva”.

Evidentemente que este fator apresenta relevante importância, porquanto estabelece parâmetros flexíveis na atividade do juiz fixar a multa, exigindo, em contrapartida, criteriosa análise do caso concreto para evitar enriquecimento ilícito.

Assim, é de fundamental importância, que após a ponderação dos princípios, sobretudo da razoabilidade e proporcionalidade, na aplicação das astreintes, não se promova o enriquecimento ilícito de uma das partes, assim como seja possível a modificação do quantum fixado, com a sua majoração ou redução, e ainda que seja revogada acaso tenha se tornado impossível o cumprimento da obrigação.

2.2.1 Vedação do enriquecimento Ilícito

Nos termos do que fora apresentado, a multa deve atender a critérios de suficiência e compatibilidade, atendendo as especificidades do caso concreto, para que a astreinte atinja sua finalidade, segundo melhor entendimento do juiz, que pode, evidentemente, ser revisado pelo próprio juiz ou Tribunal superior, se porventura não for fixada em consonância com tais requisitos, sendo passível de alteração ou modificação caso a situação fática assim exija.

Referências

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