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3 O PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO E A PROTEÇÃO PATRIMONIAL

3.2 PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO

3.2.2 Sucessão hereditária

A sucessão hereditária, nada mais é que a sucessão originada do falecimento do patriarca ou matriarca da família, conforme já destacado acima, a sucessão se dá através de herança ou testamento, sendo tecnicamente conhecidas como sucessão legítima e sucessão testamentária, ambas, de acordo com o Código Civil, iniciam imediatamente após o falecimento do sucessor.

Neste sentido, Fabio Ulhoa Coelho (2009, p. 255) dispõe sobre quando a sucessão legítima ocorre:

Quando falece alguém sem testamento, caduca o testamento deixado ou declara-se sua invalidade, os bens do patrimônio do falecido são destinados exclusivamente aos herdeiros legítimos, isto é, seus familiares indicados na lei (CC, art. 1.788).

Ou seja, nesta situação, a herança será transmitida aos herdeiros legítimos, respeitando a ordem estabelecida no artigo 1.829 do Código Civil brasileiro, que expõe da seguinte forma:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens ( art. 1.640, parágrafo único ); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais. (BRASIL, 2002)

Para o mesmo autor citado acima, Fabio Ulhoa Coelho (2009, p. 285), a sucessão testamentária é estabelecida, tendo em vista que “a ordem jurídica

reconhece, dentro de certos limites, o direito de a pessoa física definir, por sua própria vontade, a destinação de seus bens após a morte. É o direito de testar, atribuído a todas as pessoas capazes (CC, art. 1.857). “

Diante o exposto, conclui Carlos Roberto Gonçalves (2017):

Enquanto na sucessão testamentária é sucessor o designado no testamento, na legítima é a lei que diretamente o designa. A existência de testamento não exclui a sucessão legítima. Com efeito, a sucessão testamentaria pode com ela conviver, em havendo herdeiro necessário, a quem a lei assegura o direito à legítima, ou quando o testador dispõe apenas de parte de seus bens. Herdeiro legítimo é a pessoa indicada na lei como sucessor nos casos de sucessão legal, a quem se transmite a totalidade ou quota-parte da herança. Herdeiro testamentário é o sucessor a título universal nomeado em testamento.

Assim sendo, discorrendo mais um pouco sobre as formas de sucessão, passaremos a tratar sobre o auxílio da holding na sucessão hereditária. Neste sentido, conforme previamente abordado, a importância do planejamento sucessório em relação ao futuro da família e de seu patrimônio adquirido é muito grande, além do que, mesmo quando o risco de conflitos e disputas entre os herdeiros ou de constatar- se uma possível incapacidade em gerir o patrimônio e negócios da família já não oferece mais riscos, a morte do patriarca, pode oferecer desafios aos herdeiros, podendo ser amenizados quando a família previamente estabelece um planejamento (MAMEDE; MAMEDE, 2018, p. 101).

Além do que os autores Gladston Mamede e Eduarda Mamede (2018, p. 101-102), ressaltam que:

Não se pode esquecer que a morte lança os herdeiros e o patrimônio familiar nas teias burocráticas dos procedimentos de inventário [...]. Some-se a incidência de tributos que, infelizmente, podem se elevar quando as pessoas agem de forma improvisada. Em muitos casos, a falta de planejamento faz com que sejam praticados diferentes atos, muitos deles considerados hipóteses de incidência tributária, o que conduz à obrigação de pagar mais e mais tributos quando, em oposição, o planejamento pode definir, de forma lícita e legítima, caminhos com menos oneração fiscal.

Neste sentido, tendo o patrimônio da família sido transferido para a holding familiar, cabe agora analisar as melhores formas e, mais benéficas para ser definida pelo planejamento da sucessão. Com isso, caberá à família, analisar e definir se a transferência das quotas ou ações da sociedade será feita antes ou após a morte do patriarca da família.

Diante desta situação, caso optem pela transferência das quotas antes da morte do patriarca, esta transferência será feita através de doação, sendo antecipada as partes que caberão à cada herdeiro necessário após a morte. Caso decidam que

a transferência seja somente após a morte, deverá ser utilizado o testamento, fazendo com que o controle da holding familiar fique mantido com o ascendente responsável e, somente após sua morte, seja transferido para os descendentes (MAMEDE; MAMEDE, 2018).

Antes de adentrarmos ao assunto, vale destacar, que a doação está prevista pelo Código Civil brasileiro a partir do artigo 538 que estabelece que “considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberdade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra ‘’ (BRASIL, 2002).

Neste sentido, a sucessão inicia-se em vida, tendo em vista o planejamento de distribuição aos descendentes, e a elaboração do contrato e testamento, porém, ela só terá efeito após a morte do ascendente da família, fazendo com que ele (a) se mantenha no topo da holding familiar até então.

Assim sendo, tendo em vista que a constituição da holding familiar e a devida subscrição e integralização de seu capital social através da transferência do patrimônio para a holding, fazendo com que a titularidade dos bens/patrimônio não esteja mais pertencendo à pessoa física do patriarca, mas sim, à pessoa jurídica da sociedade. Com isso, expressam Gladston Mamede e Eduarda Mamede (2018, p. 102) que a “sucessão hereditária, assim, se fará não nos bens ou na empresa ou na participação societária na (s) sociedade (s) operacionais, mas na participação societária da holding. “

Nesta perspectiva, caso decidam em fazer a transferência das quotas ou ações da sociedade familiar, os membros, conforme dito acima, farão isso através da doação, ou seja, antecipando as partes cabíveis a cada herdeiro após a morte do patriarca, mas, mantendo-o no poder da administração da holding. Para isso, será feito a doação com reserva de usufruto. Assim sendo, explanam Gladston Mamede e Eduarda Mamede (2018, p. 103):

Alternativamente, há o recurso do usufruto: transfere-se aos herdeiros apenas a nua propriedade dos títulos societários (quotas ou ações), mantendo o (s) genitor (es) a condição de usufrutuários, ou seja, podendo exercer os direitos relativos àqueles títulos e, dessa maneira, podendo manter a administração da holding e, com ela, o controle das sociedades operacionais e demais investimentos da família.

Nesta mesma linha de pensamento, explana Dias (2011, p. 384), que a cláusula de reserva de usufruto:

Conserva o titular para si o usufruto e transfere a nua-propriedade aos herdeiros. Assim, quando de sua morte, consolida-se o domínio em favor dos

herdeiros o que dispensa o processo de inventário. A doação feita corresponde a adiantamento de legítima.

Em conformidade com as citações acima, expões Roberta Prado (2011, p. 284), que no caso de empresas familiares:

[...] é possível ao patriarca ou matriarca doar a seus herdeiros, como antecipação de legítima ou não, a nua- propriedade de bens móveis, consubstanciados quer seja em ações ou em cotas de sociedades operacionais, ou de holdings, puras, mistas, imobiliárias ou patrimoniais, reservando-se o usufruto total e vitalício.

Sendo assim, o Código Civil brasileiro prevê a possibilidade de o patriarca continuar na administração da sociedade, sendo estabelecido em seu artigo 1.394 que, conforme sua redação, “o usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos. “ (BRASIL, 2002)

Para Diego Viscardi (2013), o usufruto é:

O usufruto é o direito real conferido a alguém para retirar, temporariamente, da coisa alheia os frutos e utilidades que ela produz, sem alterar-lhe a substância, ou seja, o usufrutuário detém os poderes de usar e gozar do bem, explorando-o economicamente. A partir do momento em que o patriarca efetua a doação de quotas para os herdeiros automaticamente se instituirá como usufrutuário das quotas sociais, e possuirá direito aos rendimentos que essas quotas vier a proporcionar, ou seja, terá direito aos dividendos que a holding familiar distribuir aos sócios.

Diante disso, sendo o usufruto um direito real, ele está previsto pelo Código Civil em seu artigo 1.225, IV e, conforme foi exposto, poderá ser instituído quando o patriarca da família, como parte do planejamento sucessório, fazer a doação de bens aos seus herdeiros, mas continuar na direção da sociedade familiar (MAMEDE; MAMEDE, 2015 p. 102).

Não obstante, o planejamento sucessório já estando encaminhado e praticamente estabelecido em relação aos herdeiros, o patriarca da família ainda poderá impor determinadas cláusulas de proteção na parte do patrimônio que será transferido aos filhos, evitando e prevenindo possíveis problemas com cônjuges, e assim, impossibilitando dilapidações do patrimônio com o decorrer do tempo. (ARAUJO, 2011)

Com isso, sobre os bens que componham a disponível poderá o patriarca gravar, por ato de liberalidade, no contrato de doação ou no testamento as conhecidas cláusulas restritivas sobre o patrimônio que está sendo doado, sendo elas as

cláusulas de incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade, devendo os herdeiros/donatários respeitá-las. (GONÇALVES, 2017)

Sobre as cláusulas restritivas, se expressam Gladston Mamede e Eduarda Mamede (2015, p. 80) da seguinte forma:

Cuidam-se de valiosos instrumentos de planejamento sucessório as cláusulas inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. Permitem atender às preocupações do autor da herança, na condição de testador (ou donatário [...]), com o bem-estar das gerações futuras, protegendo o patrimônio de fragilidades pessoais ou contextuais específicas.

Já Venosa (2017, p. 166), aduz que “os bens inalienáveis são indisponíveis. Não podem ser alienados sob qualquer forma, nem a título gratuito nem a título oneroso. “

Neste mesmo sentido, mas de uma forma mais detalhada e explicativa, conceituam Kignel, Phebo e Longo (2014, p. 65):

Inalienabilidade: cláusula temporária ou vitalícia pela qual o donatário (herdeiro ou legatário, se a transmissão for por testamento) recebe o domínio limitado sobre o bem, pois, embora possa livremente utilizá-lo (inclusive dele receber renda), não poderá vende-lo, permuta-lo, dá-lo em pagamento nem em garantia etc.; a inalienabilidade temporária permite que o donatário aliene o bem após determinada data ou evento, com o consentimento do doador, ou após o falecimento deste; a inalienabilidade vitalícia veda a alienação pelo donatário até o seu falecimento, o que pode engessar o patrimônio por uma geração inteira

Diante disso, na mesma linha de raciocínio se expressa Diego Viscardi (2016) sobre a cláusula de inalienabilidade:

A cláusula de inalienabilidade tem a função primordial instituir sobre as quotas doadas uma vedação aos herdeiros, uma vez que ficarão impedidos de alienar as quotas recebidas. Esse gravame sobre as quotas impede a dilapidação do patrimônio da sociedade após a morte do patriarca, porquanto a cláusula de inalienabilidade das quotas pode ser instituída de maneira vitalícia. Constando a cláusula de inalienabilidade no contrato social, automaticamente o patriarca estará gravando as quotas também com incomunicabilidade e impenhorabilidade.

Dessa forma, tendo os herdeiros recebido pelo patriarca as quotas da holding familiar através da doação ou testamento, ficarão impedidos de aliená-las pelo período de tempo estabelecido pelo patriarca, ou até sua morte, ou de forma vitalícia, ou seja, até a morte do herdeiro. Essa decisão do tempo estabelecido será definida de acordo com as capacidades e formas de vida de cada membro da família, tendo em vista que este instrumento visa evitar a dilapidação do patrimônio da holding familiar.

Não obstante, a cláusula restritiva de inalienabilidade implica também na impenhorabilidade e incomunicabilidade do patrimônio, conforme apresenta o artigo 1.911 do Código Civil, “a cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade ” (BRASIL, 2002).

Assim sendo, a cláusula restritiva de impenhorabilidade tem por objetivo proteger o patrimônio do herdeiro, impedindo que determinado bem seja penhorado devida a dívidas contraídas pelo herdeiro ou devido a passivos vinculados a ele, exceto dívidas tributárias ou decorrentes do próprio bem (Viscardi, 2016).

Nesta mesma perspectiva, os autores Kignel, Phebo e Longo (2014, p. 65) definem a impenhorabilidade da seguinte forma:

Impenhorabilidade: cláusula pela qual determinado bem não pode ser utilizado como garantia nem para o pagamento de dívidas contraídas pelo donatário (ou herdeiro), salvo aquelas decorrentes do próprio bem (exemplo: débitos de condomínio garantidos pelo próprio imóvel) e de dívidas tributárias; essa cláusula também pode ser temporária ou vitalícia

Para Carlos Roberto Gonçalves (2017) “a cláusula de impenhorabilidade imposta pelo testador sobre os bens da legítima visa impedir a sua constrição judicial em execução, por dívidas contraídas pelo herdeiro, restringindo a atuação de credores. “

Com as definições destacadas, podemos acreditar que tal cláusula restritiva de impenhorabilidade garante que os bens doados não poderão estar inseridos como garantia de possíveis dívidas assumidas pelos membros herdeiros, exceto àquelas de cunho tributário ou decorrente do próprio bem.

Por fim, a cláusula de incomunicabilidade, impede que o bem faça parte da comunhão do casamento. Neste mesmo sentido, dispõe Carlos Roberto Gonçalves (2017), “cláusula de incomunicabilidade é disposição pela qual o testador determina que a legítima do herdeiro necessário, qualquer que seja o regime de bens convencionado, não entrará na comunhão, em virtude de casamento. “

Ou seja, é estabelecida para evitar problemas futuros com cônjuges do herdeiro, fazendo com que as quotas ou ações da holding sejam excluídas da comunhão, apesar de não se excluir os frutos percebidos, de acordo com o Código Civil brasileiro em seus artigos 1.668, inciso I e 1.669 (BRASIL, 2002):

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

Art. 1.669. A incomunicabilidade dos bens enumerados no artigo antecedente não se estende aos frutos, quando se percebam ou vençam durante o casamento.

No entendimento de Kignel, Phebo e Longo (2014, p. 65), a “Incomunicabilidade: independentemente do regime de casamento adotado pelo donatário (ou herdeiro, ou legatário), o bem não se comunica ao seu cônjuge ou companheiro. “

Com isso, vale lembrar a questão estabelecida no artigo 1.848 do Código Civil, o qual prevê que salvo se houver justa causa declarada no testamento, poderão ser estabelecidas as cláusulas restritivas acima comentadas, sobre os bens da legítima. (BRASIL, 2002)

Diante todo o exposto neste capítulo, é relevante que quando se há uma constituição de holding familiar composta por um adequado e organizado planejamento sucessório conforme demonstrado acima, a possibilidade de todo o patrimônio transferido à holding perpetuar, crescer e continuar de certa forma garantindo a qualidade de vida dos membros da sociedade é muito grande.

Isso também se dá em virtude de o planejamento sucessório através da constituição da holding familiar se devidamente feito de forma estudada e adequada às exigências e características da determinada família, pode ser muito vantajosa em relação a ter que passar por todo um processo de inventário, que é moroso, delicado, há despesas financeiras altas quando da existência de bens e demais custos tributários, além claro de todas as despesas judiciais e dos riscos de conflitos familiares.

Não obstante, no próximo capítulo será detalhado como o planejamento sucessório através da holding familiar pode proporcionar aos membros da família um menor custo fiscal e tributário, e como cada imposto acaba incidindo na sociedade familiar.

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