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Sujeitos, Procedimentos e Instrumento de Coleta de Dados

Os sujeitos da pesquisa foram 25 portadores cadastrados no Programa Municipal de Controle e Eliminação da Hanseníase – Cajazeiras – PB. Tais pessoas eram pacientes do PSF, da Clínica Escola Integrada da Faculdade Santa Maria – FSM e da Policlínica Municipal, de ambos os sexos e com diagnóstico confirmado de hanseníase. O procedimento consistiu em identificar aqueles que, dentro desse universo, sofreram alguma forma de preconceito ou discriminação através da aplicação de um questionário (Apêndice A).

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde – CCS da Universidade Federal da Paraíba – UFPB. Para a realização da coleta de dados foi solicitada a aquiescência de cada sujeito investigado mediante a utilização de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (Apêndice B), tal como preconiza Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

8 DESCRIÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

“[...] Mas como quisessem me correr eu falava olhando a dor e a maceração dos corpos/-Não temas, povo escravo! A mim me morreu a alma mais do que o filho e me assaltou a indiferença mais do que a lepra/A mim se fez pó a carne mais do que o trigo e se sufocou a poesia mais do que a vaca magra/Mas é preciso! para que surja a Exaltada, a branca e sereníssima Ariana/A que é a lepra e a saúde, o pó e o trigo, a poesia e a vaca magra/Ariana a mulher - a mãe, a filha, a esposa, a noiva a bem-amada!/E à medida que o nome de Ariana ressoava como um grito de clarim nas faces paradas/As crianças se erguiam, os cegos olhavam, os paralíticos andavam medrosamente/E nos campos dourados ondulando ao vento, as vacas mugiam para o céu claro/E um só clamor saía de todos os peitos e vibrava em todos os lábios/-Ariana!/E uma só música se estendia sobre as terras e sobre os rios/-Ariana!/E um só entendimento iluminava o pensamento dos poetas/-Ariana![...]”

(Ariana, a mulher, Vinícius de Moraes).

Após a análise e discussão dos dados obtidos na aplicação dos questionários, chegou-se aos seguintes resultados:

Dos 25 portadores de hanseníase que participaram da pesquisa, 12 eram do sexo

masculino e 13 do sexo feminino (Gráfico 02). Oliveira; Romanelli (1998 apud NUNES,

2005) acreditam que existam certas diferenças na hanseníase relacionadas ao sexo, e que elas possuem um aspecto tanto biológico quanto sócio – culturais, pois as mulheres enfrentam risco duplo, além de sofrerem a “estigmatização”, possuem geralmente um status social inferior. Os autores concluíram que os efeitos da hanseníase nas mulheres podem contribuir para agravar a sensação de decadência própria a doença, na medida em que põe em risco seu espaço, seja dentro da família ou no trabalho. Ademais, o não cumprimento das suas funções dentro da família, gerado pela “incapacidade” de fazer face às ocupações doméstica e ao cuidado com os filhos, amplia o desgaste emocional e a sensação de que foram “podadas” dos atributos de “mulher competente” e “capazes de realizarem as tarefas que lhes são atribuídas”, tanto dentro como fora do ambiente familiar.

Gráfico 02: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com o Gênero.

Em relação à idade, não houve predomínio relevante da doença em nenhuma faixa etária específica, demonstrando, com efeito, que o poder de contágio da doença atinge crianças, adolescentes, adultos e idosos na mesma proporção, como mostra a Tabela 01. Os dados apresentados nesta tabela apresentam um alto coeficiente de variação (44,06%) – uma grande dispersão em torno da média de 43,10 anos que não é representativa desta distribuição de dados ou que a ocorrência de hanseníase não se concentra em torno de 43 anos, mas se distribui por todas as idades com dois picos de concentração: a faixa de 21 – 30 anos e a faixa de 51 – 60 anos. Estas duas classes de valores extremos têm influência sobre a média que fica assim intermediariamente entre estas classes (Gráfico 03).

Tabela 01: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com a Faixa Etária.

FAIXA ETÁRIA N PERCENTAGEM (%)

11 – 20 anos 3 12 21 – 30 anos 6 24 31 – 40 anos 2 8 41 – 50 anos 4 16 51 – 60 anos 5 20 61 – 70 anos 3 12 71 – 80 anos 2 8 Total 25 100 48% 52% MASCULINO FEMININO

Gráfico 03: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com a Faixa Etária.

Quanto à profissão/ocupação foi possível observar a relação de correspondência entre o desenvolvimento de hanseníase e o baixo nível sócio – econômico, na medida em que todos os entrevistados possuem profissões/ocupações, cuja renda é igual ou inferior a um salário mínimo, como é o caso das atividades de agricultor(a) e doméstica/do lar. Assim, tais resultados estão compatíveis com aqueles encontrados no estudo realizado por Aquino et al. (2003) na Amazônia do Maranhão, o qual revelou que 76,3% de um total de 207 participantes tinham rendimentos inferiores a um salário mínimo e 58,5% eram agricultores ou domésticas/do lar.

De acordo com a localização das habitações dos indivíduos pesquisados, 21 residem na zona urbana e apenas 04 residem na zona rural (Gráfico 04). Conforme indicam Yamamouchi; Caron; Shiwaku (1993 apud HINRICHEN, 2004) a distribuição de casos de hanseníase no Brasil ocorre de forma desigual, sendo que o maior nível de incidência está concentrado no meio urbano.

Gráfico 04: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com a Localização das Habitações.

Em relação ao tempo de aparecimento dos primeiros sinais e o diagnóstico de hanseníase, foi possível observar um retardo no diagnóstico da doença, mediante o fato que a média de tempo mais freqüente foi entre 01 – 06 meses, porém 05 entrevistados só tiveram o diagnóstico de hanseníase após 02 anos do aparecimento do primeiro sinal da doença. Foi possível observar ainda que 16 entrevistados tiveram o diagnóstico apenas clínico, enquanto 09deles tiveram que se submeter à baciloscopia para confirmação da doença e início da PQT (Gráfico 05). Acerca do diagnóstico, convém ressaltar que a hanseníase é diagnosticada através do exame clínico, momento em que se busca os sinais dermatoneurológicos da doença (lesões de pele com alteração da sensibilidade, acometimento de nervos com espessamento neural e baciloscopia positiva) (BRASIL, 2002). Segundo Andrade (2006) o Brasil em 2005 comemorou avanços importantes na acessibilidade dos pacientes ao tratamento, expressos por um aumento próximo de 50% da cobertura de serviços de saúde voltados para a hanseníase. Essa estratégia tem sido possível graças aos avanços na simplificação do método de diagnóstico (80% dos casos da doença o diagnóstico é clínico, sem necessidade de exames complementares).

Gráfico 05: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com a Forma de Diagnóstico da Hanseníase. 84% 16% ZONA URBANA ZONA RURAL 64% 36% CLÍNICO LABORATORIAL

Quanto ao tempo de tratamento que os entrevistados pesquisados estão fazendo uso da PQT, foi observado que 03 entrevistados tiveram alta por cura, definida pelo MS (BRASIL, 2002) como a alta dada após a administração do número de doses preconizadas pelo esquema terapêutico, ou seja, esquema PB: 06 doses mensais supervisionadas de rifampicina (em até 09 meses) mais sulfona auto – administrada; esquema MB: 12 doses mensais supervisionadas de rifampicina (em até 18 meses), mais sulfona auto-administrada e a clofazimina auto – administrada e supervisionada (Tabela 02).

Tabela 02: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com o Tempo de Permanência no Tratamento. PERMANÊNCIA N PERCENTAGEM (%) Entre 01-06 Meses 5 20 Entre 07-12 Meses 12 48 Acima de 01 Ano 3 12 Alta 3 12 Recidiva 2 8 Total 25 100

O tempo de permanência no tratamento teve média igual a 11,9 meses, com coeficiente de variação altíssimo (60,01%), o que indica que a maior parte dos casos se concentra em torno na faixa de 07 a 12 meses e um menor número de casos estão distribuídos pelas outras faixas conforme pode se constatar no Gráfico 06.

Gráfico 06: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com o Tempo de Permanência no Tratamento.

Os indivíduos pesquisados foram indagados acerca de qual a opinião deles a respeito do tratamento PQT. Apenas 05 disseram achar o tratamento ruim ou razoável, enquanto 20 o consideraram bom ou ótimo, apesar de alguns destacarem as reações adversas (Gráfico 07). De acordo com o MS (BRASIL, 2002) os efeitos colaterais da rifampicina, clofazimina e dapsona são: cutâneos (rubor de face e pescoço, prurido, ressecamento da pele, alteração na coloração da pele, suor e dermatite esfoliativa); gastrointestinais (diminuição ou perda de apetite, náuseas, vômitos, diarréias, diminuição da peristalse e dor abdominal); hepáticos (mal-estar e icterícia); hematopoéticos (trombocitopenia, púrpuras ou sangramentos anormais – epistaxes, hemorragias gengivais e uterinas) e hemolíticos (anemia, tremores, febre, cefaléia, choque, cianose, dispnéia, taquicardia, fadiga, desmaio e anorexia).

Gráfico 07: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com a Opinião Sobre o Tratamento PQT.

No referido estudo, também perguntou-se aos indivíduos pesquisados sobre quem sabe a respeito da doença. Das opções que existe no questionário, 01 indivíduo afirmou que apenas o(a) esposo(a) sabia sobre a doença. Enquanto isso, 05 dentre eles afirmaram que apenas a família tinha tomado conhecimento do fato. Houve ainda 15 indivíduos que afirmaram que a família e os amigos sabiam do ocorrido. Finalmente, 05 indivíduos disseram que, além da família, os amigos e os colegas (trabalho e/ou escola) estavam cientes do que se passava com eles. Os indivíduos cujas famílias e amigos sabiam a respeito da doença sempre deixavam bem claro que apenas os mais íntimos conheciam o fato, pois receavam serem tratados mal. Segundo Queiroz; Carrasco (1995) essa atitude de preservação, de silêncio diante da doença ocorre porque uma vez que o indivíduo é estereotipado com uma marca que o reduz a uma condição inferior ao padrão mínimo atribuído às condições humanas, restaria a ele duas possibilidades: se adequar ao papel marginal a ele designado ou tentar encobrir as marcas que caracterizam o estereótipo “estigmatizante”.

12% 8% 72% 8% RUIM RAZOAVEL BOM OTIMO

A questão acerca se eles sofreram alguma atitude de preconceito e/ou discriminação, 06 indivíduos afirmaram que sim, ou seja, que foram submetidos a algum tipo de preconceito/discriminação pela família, amigos, colegas ou patrões (Gráfico 08). O fato ocorreu em varias situações e lugares, em sua própria casa ou na de amigos durante uma reunião – conversa, no trabalho ou no sitio onde mora.

Gráfico 08: Número de Sujeitos Pesquisados de Acordo com a Ocorrência de Preconceito/Discriminação.

Quando se perguntou aos 06 portadores de hanseníase que afirmaram ter sido vitimas de preconceitos ou discriminação sobre quando e em que situação o fato ocorreu, as respostas revelam que, de fato, o fenômeno se constitui como um componente pernicioso a causar ainda

mais sofrimento em suas vítimas. Um deles (Portador F.R.A.) afirmou ter sofrido

preconceito/discriminação dos seus amigos por causa das manchas deixadas em sua pele pela doença. Ora, sabemos que as manchas deixadas pela hanseníase se impõem como um dos principais fatores que desencadeiam atitudes de discriminação e preconceito. No caso particular desse entrevistado, a doença é vista como um problema que se agrava ainda mais por causa da atitude das outras pessoas que não aceitam conviver com os doentes. O indivíduo portador de hanseníase apresenta-se “estigmatizado”, o que o coloca “na situação de indivíduo que está inabilitado para a aceitação social plena” por possuir “um traço que pode-se impor à atenção e afastar aqueles que ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus” (GOFFMAN, 1982, p. 07-14).

As histórias são bem parecidas e nos revelam o constante estigma social sofrido pelos portadores. Outra paciente (Portadora F.V.S.) nem mesmo apresentou manchas, mas foi evitada apenas pelo fato de ser portadora da doença. Essa atitude de discriminação/preconceito se constitui como uma realidade na vida de portadores de

24%

76%

SIM NÃO

hanseníase em todo o país. Segundo Romero – Salazar et al. (1995, p. 537, tradução nossa) “cada sociedade seleciona os atributos que constituirão o conceito de normalidade e, por oposição, define a noção de desvio. Assim, qualquer elemento que não coincida com as definições culturalmente postuladas, se converte em um perigo”.

O Portador F. L. sofreu uma atitude “estigmatizante” por parte da própria mulher, a qual afirmava ter sido traída pelo marido, pois julgava que a hanseníase se constituía como uma doença sexualmente transmissível. Nesse caso, a falta de informação acerca da doença pode se constituir como um importante fator de estigma social que a doença suscita. Assim, em pleno Século XXI, com todo o desenvolvimento alcançado pela tecnologia e pela informação, ainda observamos a desinformação e ignorância, como revela o caso supramencionado. Essa atitude desconhece o fato de que a hanseníase é uma doença bacteriana, transmitida pelas vias aéreas e não mais transmissível após o inicio da PQT. Em um estudo realizado por Queiroz; Carrasco (1995), em Campinas – SP, 85% da população pesquisada (de um total de 34 famílias – 45 portadores e 164 comunicantes) não entendem as informações prestadas pelos profissionais de saúde ou a consideram insuficientes para explicar as dúvidas.

Há ainda o caso da Portadora C.S.S. que foi demitida por causa da doença, após ter

sido impedida de ter contato com a criança que cuidava. Eis mais um evidencia de como as atitudes das pessoas são geradas pelo estigma que acompanha a doença. No estudo mencionado acima (QUEIROZ; CARRASCO, 1995) as entrevistas mostraram que os doentes que não se preocupavam em preservar sua imagem social sofreram um processo de degradação, exclusão, ou no caso do trabalho, demissão.

A Portadora L.B.S. possuía uma das mãos em garra e manchas por todo o corpo. Ela nos revelou que a família de seu marido falecido a tratava mal, a humilhava, de modo que, para fugir dos maus tratos ela saiu de casa e foi morar com os filhos em outro domicilio sem nenhum amparo financeiro. No estudo de Queiroz; Carrasco (1995) os doentes que apresentavam sinais da doença mais visíveis como manchas no corpo ou deformidades físicas encontravam-se numa situação de estigma ainda mais pronunciado.

Por fim a Portadora N.V.A. afirmou que nunca havia sido vítima de um ato de preconceito ou discriminação, porém, contraditoriamente, mencionou que seus vizinhos sempre que a viam passando falavam baixinho, como se estivessem comentado algo sobre sua doença. Ela apresentou mudança da coloração da pele por causa da PQT, o que a fez acreditar ser o motivo dos sussurros. Já havíamos mencionado essa mudança de coloração associada à PQT. Sendo esta motivo de inconvenientes para os pacientes e falta de adesão ao tratamento.

Para o MS (2004 apud PINTO NETO, 2004) as alterações observadas na pele dos pacientes pela PQT podem ser consideradas como um marcador social que os identificam como portadores de hanseníase.

Esses resultados revelam que a ocorrência de preconceitos e discriminação, embora ainda atinja quase 25% dos sujeitos pesquisados, tem se tornado menos intensa e presente na vida dos portadores de hanseníase do que comumente se imagina. Isso pode revelar que há uma nova forma da população julgar tais doentes ou ainda um avanço na mentalidade das pessoas em relação à doença em geral, e aos seus portadores, em particular. Esse resultado revela que as campanhas educativas e os tratamentos adequados podem não apenas fazer avançar os processos terapêuticos, mas também arrefecer a carga de preconceito/discriminação que historicamente está associada à referida doença.

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Há bem pouco nascestes e já te vais... Nem eu nem tua mãe te deu um beijo Como é triste o destino que praguejo: Ter um filho e vê-lo órfão tendo os pais. Não nos verás...não te veremos mais. E na dor não verá o teu gracejo Quem te esperava no maior festejo Entre alegrias que se tornam em ais. Meu pobre filho, pra maior tormento Nem se quer repousaste um só momento No teu bercinho que enfeitei de flores. Ó dor que desespera e dá vertigem! Tua mãe, vejo-a louca como a virgem Quando a Jesus buscava entre os doutores”. (Meu Filho, Vila Belisário Pena).

Durante nosso percurso de revisão bibliográfica, pudemos constatar que a hanseníase é uma doença de múltiplas faces. Ao longo da história, os pacientes contaminados foram geralmente vítimas de discriminações/preconceitos. Durante séculos a palavra “leproso” passou a ser sinônimo de proscrito. Isso revela que a maior parte do sofrimento das pessoas infectadas advém, sobretudo, do tratamento excludente que lhe é reservado pelos demais indivíduos.

Hoje, não obstante o fato de a doença poder ser tratada e curada, um obstáculo que se oferece ao seu portador concerne à marca de vergonha que lhe é associada. Muitas são ainda as evidências encontradas na nossa realidade que revelam a situação de rejeição a que são submetidos certos portadores de hanseníase. Alguns indivíduos são constantemente discriminados por vizinhos, amigos, patrões, familiares e, até mesmo, por profissionais da saúde que desconhecem as verdades sobre a doença. Acredita-se que o estigma se mantém por falta de informações e que o preconceito aparece como um dos maiores desafios a serem enfrentados pelo doente. Essa situação torna-se ainda mais grave porque, como vimos no Capítulo 04, o qual trata da hanseníase, do estigma social e das várias formas de

“estigmatização” do doente, tal fenômeno acentua o isolamento e gera outras complicações psicológicas que tendem a dificultar o tratamento de tais pacientes. Além disso, o problema acaba se acentuando em virtude também da ausência de políticas de saúde publica que atuem não apenas combatendo a doença em si mesma, mas também que incidam sobre as repercussões causadas pelo estigma na vida dos seus portadores. No nosso país, a marca do estigma continua a acompanhar a doença, ainda que de forma menos freqüente em relação ao passado. Todavia, mesmo considerando que sua incidência tem decrescido é correto supor que a manifestação do estigma gera sérios problemas nos portadores da doença, tais como: ostracismo e exclusão sociais, consciência culpada, rejeição e autopunição, agravamento da doença, interrupção de tratamentos, dores e sofrimentos psicológicos, angústia existencial, sentimento de inferioridade, dentre outros fenômenos negativos.

Mesmo que o número de indivíduos que assumem ter sido vitimas de discriminação/preconceito esteja em decréscimo, como foi possível inferir após a aplicação dos questionários, há ainda que se lutar contra a força do estigma que acompanha a doença. Sabemos que no Brasil há ainda um longo caminho a ser percorrido no que se refere ao combate a tal doença. Da mesma forma, é certo que as Instituições ou Órgãos de Saúde, sejam eles públicos ou privados, nem sempre estão preparados para enfrentar ou tratar a dor e o sofrimento psicológico nos indivíduos que atingem os portadores de hanseníase. Assim, sem um Sistema de Saúde eficaz que possa instaurar mecanismos preventivos e curativos eficazes para atender toda a população potencialmente vulnerável e, sobretudo, que seja capaz de preparar a sociedade para aceitar os seus portadores e tratá-los com dignidade, os indivíduos atingidos por tal doença têm seu sofrimento potencializado e as esperanças de cura diminuídas, pois, como foi mostrado, a “estigmatização” e a rejeição que a acompanham interferem profundamente no processo terapêutico, sendo, muitas vezes, um fator que contribui para sua disseminação no meio social.

De maneira mais pontual, é necessário que várias ações sejam simultaneamente empreendidas de forma sincronizada nas esferas federal, estadual e municipal. A OMS, por exemplo, preconiza algumas medidas que devem nortear as ações dos Órgãos de Saúde Pública em suas campanhas de combate à hanseníase, como é o caso do Guia Para o Controle da Hanseníase: cadernos de atenção básica (2000). Algumas dessas iniciativas dizem respeito à identificação, por meio do diagnóstico precoce, e ao monitoramento dos casos novos; à realização de ações específicas de vigilância epidemiológica; ao envolvimento de outros segmentos da sociedade civil nas políticas sanitárias (igreja, ONGs, sindicatos, escolas, família); ao favorecimento do acesso da população à informação; à realização de campanhas

de conscientização sobre a hanseníase, a fim de também diminuir o estigma e a discriminação contra os seus portadores; à capacitação dos profissionais da saúde, dos psicólogos, dos assistentes sociais e de todos aqueles que lidam diretamente com o doente; finalmente, convém facilitar a descentralização do diagnóstico, controle e tratamento.

Vimos que o Brasil apresenta um dos maiores índices endêmico de hanseníase do mundo, com cerca de 45.000 casos anuais. As ações de diagnóstico e o tratamento oportuno se afiguram como as únicas vias para dificultar o avanço da doença. Além do problema gerado pelo longo tempo de incubação da doença, tem-se que destacar o fato de que sua proliferação é também potencializada em razão do grande número de pessoas infectadas em regiões distantes do país ou que possuem dificuldades de acesso aos serviços de saúde. A

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