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8 A RGAMASSAS DE CAL AÉREA COM COMPONENTES POZOLÂNICOS

3.3 Ensaios, características e acções específicas

3.3.2 Superfície específica

A superfície específica é definida como sendo a área externa das partículas de um sólido pulverulento relativamente à unidade de massa, sendo geralmente referida em m2/kg ou cm2/g.

Quando a determinação é realizada por difracção laser, os valores podem vir expressos em m2/cm3. Vários factores influenciam a superfície específica, como sejam a massa volúmica, a

distribuição dimensional do grão, a forma das partículas e a regularidade das superfícies.

No caso da caulinite [681] parece existir uma relação estreita entre o grau de cristalinidade e a respectiva superfície específica, de modo que caulinites com baixo grau de cristalinidade apresentam valores altos de superfície específica, enquanto outras muito cristalinas apresentam valores baixos. Diferentes caulinites apresentam partículas com factores de forma (diâmetro/espessura) distintos e o diâmetro médio não define com precisão uma determinada amostra, de tal modo que à medida que o diâmetro da partícula aumenta, a sua espessura também aumenta.

A determinação da superfície específica é importante porque uma maior área superficial favorece uma maior reactividade, por existir uma maior área de contacto entre as partículas reagentes. No caso específico da reacção entre os componentes pozolânicos e o hidróxido de cálcio, a reacção pozolânica é favorecida com o aumento da superfície específica das partículas.

3.3.3 Pozolanicidade

A determinação da pozolanicidade, fundamental para a avaliação de materiais que possam ser adicionados à cal aérea para obtenção de argamassas hidráulicas, tem vindo a ser estudada por vários investigadores.

Luxán et al [413] determinaram a reactividade pozolânica dos componentes pozolânicos, através da diferença entre condutividades eléctricas de soluções saturadas em Ca(OH)2 com componente

pozolânico relativamente à mesma solução saturada sem a adição. Através da diferença entre as condutividades medidas da solução com e sem amostra classificaram o material em termos de pozolanicidade.

McCarter et al [439, 440] aplicaram misturas de pozolana com Ca(OH)2 para seguirem o desenvolvimento da actividade química na mistura. Utilizaram métodos eléctricos para acompanhar as características iniciais da hidratação de materiais pozolânicos com Ca(OH)2 à

temperatura ambiente. Identificaram os diferentes estádios de hidratação ao longo do tempo (que designaram por período de início da actividade química, período de indução, período de rápida

3. Procedimentos experimentais e acções específicas 79 actividade que resulta num aumento da rigidez da mistura e, por fim, um período de velocidade de reacção mais lenta) e o nível de reacção em cada patamar.

Payá et al [501] estabeleceram um método analítico de determinação rápida da quantidade de sílica amorfa, e sua relação com a reactividade pozolânica dos materiais.

Shvarzman et al [580] estudaram a influência da composição química na reactividade pozolânica de diferentes materiais (que podem ser utilizados como ligantes em diversas argamassas), ao longo do tratamento térmico a que são sujeitos.

3.3.4 Retenção de água

A retenção de água por parte de uma argamassa é uma característica fundamental, por poder condicionar o desempenho efectivo dos constituintes que compõem a argamassa e as respectivas condições de aplicação. Quando uma argamassa é aplicada, a sua água tem tendência a evaporar ou a ser absorvida pelo suporte. No caso de argamassas com ligantes hidráulicos, como é o caso do cimento, aplicadas sobre suportes porosos (com forte poder de sucção de água da argamassa), como é o caso da generalidade dos suportes antigos, esta situação pode conduzir a deficiente hidratação do ligante, por falta de retenção de água por parte da argamassa. Uma deficiente hidratação conduz a que o ligante hidráulico não atinja as características a que estava proposto, nomeadamente em termos de resistência, mas permanecendo na argamassa como fonte de libertação de sais solúveis.

A capacidade de retenção de água de uma argamassa é uma característica fundamental para a escolha da argamassa de revestimento, em função das condições envolventes (ambientes e de suporte), com vista a facilitar a aplicação da argamassa e preservar a sua durabilidade. A cal aérea contribui muito para aumentar a capacidade de retenção de água [570]. No entanto, essa retenção de água na argamassa fresca pode ter efeitos muito destrutivos quando ocorre a acção do gelo, com aumento de volume da água no interior da argamassa, à data, com fracas resistências mecânicas para poder suportar as tensões a que é submetida.

3.3.5 Impermeabilidade e secagem

Normalmente as características de impermeabilidade e de secagem são aferidas a partir da avaliação da capilaridade e da permeabilidade ao vapor de água. Podem também utilizar-se ensaios de secagem, do tipo do referido na ficha de ensaio Fe 07 [636].

Gonçalves [263] desenvolveu uma metodologia que permite avaliar as características das argamassas de revestimento quanto à sua capacidade de impermeabilização e rapidez de secagem. As argamassas (ou sistemas de revestimento) serão tanto mais eficientes quanto:

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- menor for a quantidade de água que penetra através delas e atinge o suporte;

- maior for o tempo decorrido até que a água atinja o suporte;

- menor for o período de tempo durante o qual a água permanece junto ao suporte.

Determina-se o atraso na molhagem definido como o período decorrente desde o momento da aplicação da água sobre um provete até a água atingir as sondas (considerando que tal acontece quando se verifica uma quebra de tensão eléctrica de 5%), o período de humedecimento durante o qual o suporte permanece humedecido (considerando que tal acontece enquanto a tensão eléctrica se mantém abaixo de 95% do seu valor inicial), a intensidade de molhagem definida como a quantidade de molhagem sofrida durante o ensaio (a área situada entre a linha que define a variação da tensão eléctrica com o tempo e a linha correspondente ao valor da tensão no estado considerado seco – de 95% do valor inicial).

3.3.6 Retracção linear

Quando uma argamassa é aplicada sobre um suporte inicia-se a sua retracção de secagem, que é restringida pela aderência ao suporte, e que provoca o desenvolvimento de tensões de tracção na argamassa e de corte no plano de contacto da argamassa com o suporte. Esta acção é especialmente importante quando as argamassas são aplicadas no revestimento de paredes. As tensões de tracção tendem a fendilhar o revestimento e as de corte podem provocar o seu destaque relativamente ao suporte. Este, por sua vez, tem de ser suficientemente resistente para não sofrer ele próprio fendilhação por acção das tensões desenvolvidas [410].

A amplitude dos movimentos de retracção das argamassas depende do tipo de constituintes, da proporção em que entram na formulação, dos cuidados tidos em conta durante a aplicação e subsequente cura [666], e o nível das tensões de tracção instaladas em consequência da restrição induzida pelo suporte ao livre movimento de retracção da argamassa depende da maior ou menor susceptibilidade à retracção da própria argamassa e da sua compatibilidade física com o suporte. Se se mantiverem constantes todos os restantes factores, a retracção linear aumenta com a quantidade de água de amassadura da argamassa.

Numa argamassa “forte” (com módulo de elasticidade elevado), a fendilhação é geralmente acompanhada por perda de aderência ao suporte nas superfícies contíguas às fendas. As fendas são geralmente de largura elevada (por haver movimento relativo entre o suporte e a argamassa), afastadas entre si e atravessando toda a espessura da camada, formando-se só quando as tensões instaladas são tão elevadas que geralmente ultrapassam a capacidade de aderência ao suporte. Numa argamassa “fraca” (com baixo módulo de elasticidade), as tensões instaladas nunca atingem valores elevados porque a fendilhação ocorre cedo (por ser baixa a resistência mecânica

3. Procedimentos experimentais e acções específicas 81 da argamassa) e promove a dissipação das tensões. As fendas resultantes são finas, pouco espaçadas entre si e normalmente não atravessam toda a espessura do revestimento, por as tensões instaladas não serem suficientes para romperem a aderência ao suporte [666].

Quando o dispositivo de ensaio só permite quantificar a variação linear a partir da desmoldagem (prEN 1015-13 [158]) ou de quando a argamassa já tem consistência adequada para a aplicação sobre ela de um alongâmetro [220], é importante aferir a variação linear que ocorra até essa data, o que pode ser rudimentarmente realizado através de medição visual da separação do provete relativamente ao molde com auxílio de uma lupa e de micrómetro.

Veiga [670] desenvolveu um aparelho para avaliar a susceptibilidade à fendilhação através da determinação da retracção restringida. O mesmo aparelho, modificado de modo a permitir o livre movimento da cabeça superior, permite medir e registar o deslocamento da cabeça em relação a peças fixas laterais, que a investigadora considera corresponder à retracção livre do provete, estimando perdas por atrito médias de 0,02.

Bosiljkov [81] descreve outro equipamento de determinação da retracção linear a partir do instante da moldagem de provetes de argamassa. A sua análise mostra a grande desadequabilidade do método correntemente utilizado neste tipo de argamassas com base em cal aérea, por só permitir aferir a retracção a partir da desmoldagem, e esta ocorrer sempre após esse período inicial em que se desenvolve quase toda a variação linear no provete. O método utilizado poderá ter de ser aferido para confirmar se a retracção linear não está a ser subestimada por deficiente aderência inicial da argamassa aos dispositivos do equipamento que permitem efectuar a medição.

3.3.7 Resistências mecânicas

Por efeito da carbonatação nas argamassas com base em cal aérea ocorre um aumento da compacidade paralelo ao envelhecimento, que provoca um aumento das resistências mecânicas ao longo do tempo.

A resistência à fendilhação de uma argamassa é função, em grande parte, das tensões induzidas no seio da argamassa, pelo efeito da restrição da retracção conferida, principalmente, pela aderência a um suporte relativamente rígido, e pela capacidade da argamassa em resistir a essas tensões [669]. A tendência para a fendilhação será assim tanto menor quanto mais reduzida for a retracção e menor for o quociente entre o módulo de elasticidade e a resistência à tracção, pelo que uma retracção reduzida e um módulo de elasticidade baixo são aconselháveis numa argamassa. Uma boa aderência ao suporte contribui também para melhorar o comportamento à fendilhação, por possibilitar uma melhor distribuição de tensões pela argamassa.

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Um quociente mais elevado entre as resistências à tracção e à compressão traduz um comportamento mais dúctil da argamassa, permitindo optimizar a sua resistência às tensões de tracção criadas (essencialmente pela retracção restringida) sem transmitir esforços muito elevados ao suporte [669].

3.3.8 Carbonatação

No decorrer da carbonatação vai-se produzindo a deposição nos poros das argamassas do carbonato de cálcio microcristalino ou amorfo que se forma com expansão, resultando numa diminuição do volume livre dos poros e num aumento da compacidade das argamassas.

A carbonatação de argamassas de cal aérea reduz o valor de pH de 12,5 do hidróxido de cálcio [Ca(OH)2] para pH inferior a 9 (cerca de 8,3) do carbonato de cálcio (CaCO3); com a solução de fenoftaleína, a cor fica magenta quando o pH está entre 8,3 e 10 [656].

Velosa e Veiga [683] realizaram o ensaio de carbonatação sobre argamassas de cal aérea com pozolanas naturais (dos Açores e de Cabo Verde – Stº. Antão) deixando cair sobre a superfície de corte recente uma solução de fenoftaleína constituída por 50 ml de água, 50 ml de álcool a 96%, 1 g de fenoftaleína e hidróxido de sódio diluído em água destilada.

3.3.9 Capilaridade

A alteração da microestrutura interna das argamassas resultante do desenvolvimento da carbonatação de argamassas de cal aérea conduz a diferenças significativas em termos das características face à capilaridade.

Para além do coeficiente de capilaridade, Henriques [635] definiu o valor assintótico da curva de capilaridade, que quantifica a quantidade total de água absorvida pelo provete.

Veiga [672] considera que nas argamassas com base em cal se dá uma variação na estrutura interna do material com a molhagem, que se reflecte na absorção de água por capilaridade, pelo que considera como mais significativo fazer a determinação da capilaridade após os provetes terem sido sujeitos a molhagem prévia seguida por secagem (medições durante a segunda molhagem).

Peruzzi et al [509] propõem dois novos parâmetros relativos ao ensaio de capilaridade: o índice de capilaridade absoluto (ICa) e o índice de capilaridade relativo (ICr). O primeiro expressa a capacidade de absorção de água do material da amostra com o tempo, comparando a quantidade de água absorvida durante o ensaio com o limite teórico de absorção do material, e varia entre 0 e 1. O segundo indica a capacidade de absorção de água de uma amostra relativamente à água

3. Procedimentos experimentais e acções específicas 83 absorvida por uma amostra considerada como padrão. Pode ser menor ou maior que 1, indicando, respectivamente, uma diminuição ou aumento relativo da absorção de água. Este índice de capilaridade relativo exige a utilização de um mesmo período de ensaio e de amostras de dimensões idênticas, sendo essencialmente útil para comparação (por exemplo, entre provetes sujeitos a curas distintas ou entre amostras submetidas a tratamentos específicos).

3.3.10 Microestrutura

A durabilidade das argamassas de cal aérea está muito dependente da estrutura porosa que, entre outras contribuições, condiciona a facilidade de secagem.

A microestrutura controla o movimento da água na forma líquida ou de vapor na alvenaria; comanda a capacidade para transportar, reter e expulsar a água por evaporação, factores fundamentais nos processos de degradação, influenciando em consequência, a resistência aos sais e ao gelo e a propensão para a colonização biológica [676]. Tem ainda influência na carbonatação que, por seu turno, condiciona os aspectos anteriormente referidos (bem como as resistências mecânicas) e que, por sua vez, também condiciona a microestrutura interna.