• Nenhum resultado encontrado

2.1 SUPERFÍCIES DE EROSÃO: UMA REVISÃO DA ABORDAGEM

2.1.6 Superfícies de aplainamento do Brasil

As superfícies aplainadas no Brasil eram tratadas como resultados de uma peneplanização, formada a partir de processos atuantes de um passado bastante remoto. As superfícies apresentam um caráter policíclico com instabilidade crustal, este derivado do soerguimento regional, seguido de épocas em que os agentes de denudação conduziam a um rebaixamento contínuo do relevo por conta da estabilidade endógena (PASSOS e BIGARELLA, 2006). De Martonne (1943) explicava a evolução dessas superfícies aplainadas no Brasil como formas resultantes de processos de peneplanização atuantes desde o passado. Segundo o autor, o caráter policíclico do modelado era explicado por sucessivos momentos de instabilidade crustal. Estes eventos provocaram o soerguimento em escala regional, seguidos por momentos em que os processos erosivos atuariam na evolução das formas, rebaixando progressivamente o relevo.

De acordo com King (1956) as superfícies em diversos níveis de erosão, encontradas no Brasil Oriental, são em sua essência resultados de alçamento da crosta e têm a sua evolução de acordo com os postulados de Penck, ou seja, os patamares de piemonte (Piedmonttrepen). King substituiu os processos de peneplanização pelos processos de

pedimento e pediplanação de acordo com a teoria de regressão paralela das encostas. No trabalho sobre o Brasil Oriental, King (1956) identificou diversos níveis de aplainamento e fez relação com as superfícies estudadas por ele previamente na África. King fez a identificação das seguintes superfícies: Fóssil (idade Carbonífera); Superfície Desértica (Triássico-Superior); Superfície Gondwana (Cretáceo Inferior); Superfície Pós-Gondwana (Cretáceo-Superior); Superfície Sul-Americana (Terciário Inferior), a qual teria sido dissecada a partir do Paleoceno, pelas superfícies subseqüentes, ficando somente os topos derivados, estando estes sub-nivelados; Superfícies Velhas (Terciário Superior); e Superfície Paraguaçu (Neógeno).

Segundo Valadão (1998), o relevo do Brasil oriental deve ser tratado como uma evolução a partir de episódios de soerguimento e denudação durante o cenozóico e mesozóico. Dessa forma o mesmo autor descreve três grandes superfícies de aplainamento: Superfície Sul-Americana, desenvolvida no Cretáceo Superior-Mioceno; Superficie Sul- Americana I, desenvolvida no Mioceno Médio ao Plioceno Superior; e por último a superfície Sul-Americana II, esta como uma resposta a um soerguimento crustal no final do Plioceno até os dias atuais. Essas três grandes superfícies não possuem tanta validade quando a sua aplicação vai para o Sudeste brasileiro, devido ao tectonismo que interrompeu a sua evolução e deu origem ao arrasamento das superfícies.

Bigarella e Ab`Saber (1964 apud PASSOS E BIGARELLA, 2006) em concordância com a geomorfologia climática de que os processos de pedimentação e pediplanação são os responsáveis pela gênese de grande parte das superfícies aplainadas do Brasil, foram os primeiros a generalizarem as influências climáticas profundas na explicação da morfogênese de grande parte da paisagem brasileira. As condições de clima semi-árido contribuíram para que os processos de pediplanação fossem os responsáveis pela gênese das grandes superfícies aplainadas (pediplanos) e pelos processos de pedimentação aos níveis embutidos nos vales (PASSOS e BIGARELLA, 2006). No nordeste brasileiro Bigarella e Ab`Saber (op. cit.) atribuíram as condições paleoclimáticas (variação de semi-árido para úmido) como responsáveis pelas formas erosivas e seus depósitos correlativos. As condições climáticas do passado observadas pelos autores estariam ligadas a uma ciclicidade de episódios que estão expressos na paisagem.

A relação da teoria de Bigarella e Ab`Saber e os postulados de King (1956) é que os autores trabalham com a questão da ciclicidade do relevo. A diferença reside no fato de que King concebe uma origem tectônica para as interrupções dos ciclos, enquanto Bigarella e Ab`Saber atribuíam às alternâncias climática a responsabilidade pela ciclicidade. Para estes

autores, as superfícies podem ser formadas em alvéolos com altitudes bastante variadas, evoluindo dependendo diretamente das soleiras (knick-point) mantidas pela rede de drenagem. Com esse pensamento, os níveis recentes não teriam o caráter regressivo como afirmava King (PASSOS e BIGARELLA, 2006). Dessa forma, o critério de análise baseado em questões altimétricas torna-se insuficiente para explicar e diferenciar os diversos níveis de aplainamento.

Os inúmeros estudos das superfícies de erosão e seus depósitos correlativos no quaternário, assim como os fenômenos erosivos e agradacionais ocorridos no Cenozóico, evidenciam que ocorreu uma alternância climática na terra com dois períodos distintos (semi- árido e úmido) e estes eventos climáticos são responsáveis pelos processos de degradação lateral ativa do terreno com períodos de dissecação vertical do terreno (BIGARELLA, MOUSINHO e SILVA, 1965; ERHART, 1956). Nas porções tropicais e subtropicais do Brasil Meridional e Sudeste a evolução dos terrenos é resultante dos processos de degradação lateral das superfícies com períodos de dissecação vertical, seguidos de intemperismo químico e formação de solos (PASSOS e BIGARELLA, 2006).

Vários autores buscam a explicação da formação das superfícies de aplainamento, fazendo uso de abordagem da geomorfologia climática, como De Martonne (1943), Bigarella e Mousinho (1965). Estas interpretações, como foi visto nos parágrafos acima, se baseiam na transição climática ocorridas durante os períodos geológicos, mais especificamente, o quaternário. Essas alternâncias climáticas se fundamentam na teoria da Bioresistasia de Ehrart (1956). A teoria postula que, em fases de clima úmido, ocorre maior desenvolvimento da vegetação, aprofundamento do manto de intemperismo, predominância de formas convexas e a drenagem se encontraria encaixada com sedimentação ao longo do canal fluvial. Nas fases secas haveria diminuição da vegetação e predomínio do intemperismo físico. Em relação às formas, o recuo das encostas dá origem a relevos residuais e formação de depósitos detríticos que estruturam as superfícies aplainadas com morfologia pedimentar. Nessa fase seca a drenagem, ao contrário da fase úmida, se encontra entulhada de sedimentos com escoamento difuso e rios intermitentes.

Baseando-se na teoria de Bioresistasia de Ehrart, os autores Bigarella & Andrade (1965) e Bigarella, Mousinho e Silva (1965) trabalharam com a questão das superfícies de erosão como testemunhos de ciclos de pediplanação. Estes pediplanos, segundo os autores, são remanescentes dispersos e preservados em rochas com maior resistência a erosão. Em climas mais úmidos, estas superfícies se apresentam bastante dissecadas. Autores como Bigarella e Ab`Saber (1964) e Bigarella e Andrade (1965), atribuem à semi-aridez a

responsabilidade pela formação dessas superfícies de erosão. Esses autores reconhecem três eventos de pediplanação da paisagem brasileira e suas respectivas superfícies. Eles denominaram estas superfícies de Pd1 ,Pd2,Pd3; sendo a Pd3 a superfície mais elevada, a Pd2 a

intermediária e Pd1 a mais rebaixada. O Pd3 teria a sido elaborado no Cretáceo-Eocêno, sendo

agora a superfície de cimeira. Este nível seria o equivalente à Superfície Sul-Americana ou Japi. O pediplano Pd2 teria se desenvolvido no Paleógeno e o Pd1, seria o aplainamento mais jovem tendo sido elaborado durante o Plioceno/Pleistoceno. No Pd1 são identificados dois níveis pedimentares embutidos: o P1 e o P2, estes de escala local, enquanto os pediplanos estão em escala regional. Os níveis P1 e P2 são, segundo os autores, respostas às mudanças climáticas no último período glacial, que no Brasil, principalmente no Sudeste, teriam propiciado o alastramento de climas mais secos, sendo que estes teriam como respostas os depósitos correlativos, os sedimentos detríticos, colúvios e Stone-Lines.

A partir da análise dessas interpretações das superfícies de erosão, este trabalho procura elucidar como se deu a evolução dos compartimentos que estão contidos no gráben do Cariatá.