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PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

Capítulo 1 – Perspetivas teóricas sobre supervisão

1.7. Supervisão e liderança escolar

No âmbito do conceito de supervisão escolar que temos vindo a abordar, o supervisor assume funções de liderança das comunidades aprendentes onde se encontram inseridos (Alarcão, 2003). Neste contexto, a supervisão está associada a práticas de planificação, organização, liderança, apoio, formação, avaliação, visando a mobilização de todos os atores educativos para a consecução dos objetivos da escola.

Desde os primeiros estudos sobre eficácia escolar que a liderança tem sido enfatizada, devido à importância que representa no desenvolvimento das organizações em geral e da escola em particular, designadamente no impulso e facilitação das mudanças

17 O mal estar docente é conhecido pela palavra inglesa burnout que na literatura psicológica

educacional e profissional traduz a exaustão sofrida pelos profissionais com amplas exigências sociais (Marchesi, 2008).

25 consideradas necessárias na escola para desenvolver projetos de melhoria na ação educativa18. Em 2012, o Relatório McKinsey refere que a liderança educacional, depois

da ação docente, é o fator que maior relevância tem nos resultados escolares e na aprendizagem dos alunos (cit. por Leite, 2015.) Assim, no âmbito da prestação de contas, exige-se cada vez mais à liderança e à gestão das escolas, pressupondo-se líderes com conhecimentos técnicos e competências para responder às exigências cada vez mais complexas da sociedade19.

Importa considerar que a liderança em contexto escolar é necessariamente diferente da liderança noutros contextos, uma vez que a especificidade da organização escolar prende-se à singularidade da sua missão de caráter pedagógico e educativo, não se limitando a sua liderança à dimensão administrativa. No contexto escolar, o líder deverá ser o protagonista de um processo complexo de desenvolvimento e transformação pelo qual a escola deverá passar. Embora a responsabilidade desta transformação deva ser coletiva e não individual, a tarefa fundamental dos líderes consiste em potenciar sentimentos positivos nas pessoas que são lideradas, que ocorrem quando o líder cria ressonância, aumentando a intensidade de sentimentos positivos em seu redor (Prates, Aranha & Loureiro, 2010).

Salientemos que quando nos referimos ao conceito de liderança fazemo-lo tendo em conta a abrangência que o mesmo encerra no contexto escolar, não se centralizando exclusivamente na figura do diretor e na sua ação, mas sim em enfoques concetuais mais amplos e diversos, nomeadamente nas equipas diretivas e de supervisão, que denominamos por lideranças intermédias. Esta visão de liderança vai ao encontro de estudos recentes nesta matéria que relacionam o fator liderança nas organizações escolares com a exigência de hierarquias mais horizontalizadas e democráticas, para que os processos de decisão potenciem maior eficiência e eficácia (Estevão, 2000).

Independentemente dos diferentes modelos teóricos que diacronicamente têm suportado o exercício de liderança, desde os tradicionais (carismáticos, burocráticos, formais e hierárquicos) aos democráticos e participativos, aos colaborativos e colegiais,

18 O estudo da liderança está hoje na ordem do dia, já que se reconhece que uma organização, seja

ela uma empresa ou uma escola, é tanto mais eficiente, quanto melhor for o seu líder e uma liderança eficaz pode ser encarada como a chave para a resolução de muitos problemas que a escola enfrenta (Costa & Pacheco, 2013, pág. 4026).

19 Salientamos a publicação do Decreto-Lei n.º 75/2008, de 22 de abril, que reforça a liderança da

escola, atribuindo maiores responsabilidades ao diretor, conferindo-lhe o poder de designar os responsáveis pelos Departamentos Curriculares, principais estruturas de coordenação e supervisão pedagógica, assim como os coordenadores de ciclo.

26 traduz-se o mesmo numa pluridade de práticas que deverão configurar uma perspetiva “transformacional” da escola (Burns, 1978; Bass, 1985, cit. por Rocha, 2012).

Esta deverá ser um tipo de liderança facilitadora do trabalho docente, que se entende por uma liderança efetiva e reconhecida, combinada com um processo participado de tomada de decisão, envolvendo o conjunto da comunidade educativa na “definição e salvaguarda dos objetivos do próprio estabelecimento de ensino” (Chapman, 1990; Rollin,1992, citados por Nóvoa, 1992a, p.26), promovendo uma responsabilização interna que capacite através de uma cultura de participação e não de prescrição (Higham et al., 2009, cit. por Leite, 2015). Aqui o líder desempenha um papel fundamental na implementação da mudança e na modificação e transformação dos outros. Sendo as escolas espaços de interação, o mais importante na autoridade do líder é a sua visão de futuro e a sua capacidade de mobilização para a partilha de valores, que não os próprios, mas os que cimentam a convivência dos atores educativos. Nesta perspetiva, o líder ultrapassa os interesses individuais em função dos interesses coletivos da organização.

Alarcão (2003) também associa ao líder a capacidade de mudança e inovação no sentido de encorajar todos os membros a caminhar no sentido traçado, promovendo o envolvimento ativo e livremente expresso dos diferentes atores. Pelo contrário, um líder “inflexível, autoritário provoca uma atitude reativa, quando deveria procurar uma atitude proactiva por parte dos professores” (Formosinho, 2002, p.130), revelando-se os seus seguidores mais preocupados em cumprir formalismos para agradar do que em partilhar ideias.

Importa, no entanto, considerar que no contexto das mudanças educativas que se têm operado no quadro da descentralização, a liderança escolar depara-se com uma complexidade de funções, no que Dinis (1997) caraterizou como o caráter dilemático da função do diretor, onde se sobrepõem esferas do domínio administrativo e pedagógico (Dinis, 1997, cit. por Silva, 2013). Com efeito, os dois papéis parecem padecer de uma lógica antagónica, tal como é referido por Silva (2013),

[…] temporalmente o líder, cativado pela sua visão, preocupa-se com o futuro, o gestor focado na resolução dos problemas imediatos prefere o presente; a ação do líder é mais pedagógica baseada na intuição e no desenvolvimento de relações que promovam a autoestima dos atores, no trabalho das emoções do grupo, enquanto nos gestores a ação é baseada na lógica, no conhecimento técnico relacionando-se com os atores numa perspetiva mais utilitária e imediata; o líder é um especialista de pessoas, e gosta de ruturas na organização, o gestor é um especialista de tarefas e gosta de estabilidade (pp.11-12).

27 Importa reconhecer as diferenças substanciais entre gestores e líderes escolares. Efetivamente, o gestor centra-se em tarefas técnicas e administrativas da organização, preocupando-se com a resolução de problemas imediatos, enquanto que o líder preocupa-se com a inovação e desenvolvimento da instituição, definindo objetivos de longo prazo e estratégias para os alcançar.

Os títulos de diretor, supervisor, coordenador, têm sido frequentemente postos em causa no âmbito da terminologia da supervisão por conterem implicações de autoridade. No entanto, o processo de autonomia passa pela atribuição de poderes de liderança e decisão aos atores educativos que desempenham funções de gestão na escola, o que é comprovado pelas diretrizes normativas onde as funções de supervisão apresentam-se conjugadas, associadas, cruzadas, ou mesmo sinónimas, com as de liderança (Gaspar, Seabra & Neves, 2012).

Podemos afirmar, que desde o novo modelo de gestão ditado pelo Decreto-Lei n.º 75/2008, até ao mais atual – Decreto-Lei n.º 137/2012, ressalta uma maior responsabilização e prestação de contas, em primeiro lugar, do líder de topo – o diretor – ao qual é confiada a gestão administrativa, financeira e pedagógica, mas também das lideranças intermédias, às quais são atribuídos poderes de liderança, supervisão e decisão. Contudo, esta liderança no contexto escolar, segundo Formosinho (2002), será de um singular entre singulares, porquanto a liderança de facto pode surgir de qualquer professor ou coordenador, sendo que o contexto de trabalho dos docentes não é hierarquizado como outros. No sistema educativo português, os normativos que definem os órgãos das lideranças escolares configuram um modelo em que existe uma partilha de responsabilidades e em que os processos de decisão são assumidos pelo coletivo dos órgãos (Diretor/Conselho Geral e lideranças intermédias), o que se traduz numa descentralização interna de gestão, originando múltiplas lideranças que deverão funcionar articuladamente (Quintas & Gonçalves, 2012).

Sanches (2000) carateriza este modelo de liderança como sendo de tipo colegial, assente numa rotatividade de papéis, decorrente da possibilidade dos professores exercerem diferentes funções dentro da organização educativa. Contudo, num período em que a prestação de contas se encontra cada vez mais focada na figura do diretor, parece- nos, tal como é salientado por Roldão (2012), que a prática e a cultura das escolas tem relegado as lideranças intermédias para um papel de “transmissão de informações e

28 diretrizes no interior da hierarquia da escola do que na responsabilidade de gestão pedagógica, curricular e didática que efetivamente detêm” (p. 138).

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