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CAPÍTULO 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.4. FILMES COM LIPÍDIOS

2.4.1. Surfactantes

Os surfactantes são geralmente usados para melhorar a estabilidade das emulsões utilizadas na elaboração dos filmes. Eles aumentam a afinidade entre a fase continua e a dispersa: mais baixa a afinidade, mais baixa a homogeneidade do filme.

Os surfactantes caracterizam-se por apresentar grupos com pouca afinidade pelo solvente, grupo liofóbico, e com forte afinidade pelo solvente, grupo liofílico (ROSEN, 1989). Se o solvente é água, estes grupos se conhecem como as porções hidrofóbicas (apolar) e hidrofílicas (polar) do surfactante. O grupo hidrofóbico para 99% dos surfactantes é formado por hidrocarbonetos principalmente lineares, devido à demanda de biodegradabilidade; e o grupo hidrofílico pode ser não iônico, iônico ou zwiteriônico (PORTER, 1991; TADROS, 2005).

Os surfactantes apresentam duas propriedades fundamentais: capacidade de absorção nas interfaces e tendência a se associar para formar estruturas organizadas (PORTER, 1991). Quando uma molécula de surfactante é introduzida em uma interface ar-água, produz-se absorção das moléculas do surfactante na superfície da água (Figura 2.2) diminuindo sua tensão superficial.

Figura 2.2. Molécula de surfactante na interfase ar-água. Fonte: Adaptado de Suchocki (2004).

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Eventualmente, atinge-se uma concentração de surfactante na qual existem suficientes moléculas para saturar a interface. Nesta concentração de surfactante, a tensão superficial permanece constante, mesmo que seja adicionado mais surfactante. A partir desta concentração as moléculas não têm mais espaço na interface, e começam a formar agregados (p.e. micelas) entre elas. A concentração na qual as primeiras micelas são formadas se conhece como concentração micelar crítica (CMC) (PORTER, 1991). Vários efeitos tendem a favorecer ou opor-se à formação de micelas. Assim por exemplo, a CMC diminui à medida que o número de carbonos na cadeia hidrofóbica aumenta. Por outro lado, grupos hidrofílicos carregados têm CMCs muito mais altas que os não iônicos

etoxilados, devido à repulsão entre os grupos hidrofílicos.

Além disso, a adição de eletrólitos à surfactantes iônicos reduz as forças repulsivas diminuindo a CMC e favorecendo a formação de micelas (ROSEN, 1989).

As micelas são responsáveis por uma propriedade fundamental das soluções de surfactantes: o poder solubilizante. Na Figura 2.3 pode-se visualizar a variação da concentração de um hidrocarbono solubilizado em uma solução de surfactante em função da concentração deste último. A partir da CMC, a solubilização aumenta consideravelmente, devido à penetração do hidrocarbono no interior das micelas. A solubilização micelar permite “dissolver” óleo em água ou vice-versa, o que é de grande interesse para diversos tipos de aplicações tais como a detergência, emulsões, etc. A formação de micelas também se produz em meios apolares, mas de forma diferente (RANGEL-YAGUI et al., 2005).

A medida da afinidade de um surfactante para óleo ou água pode ser identificada pelo seu HLB (Balanço Hidrófilico-Lipófilico). Os valores de HLB podem ser calculados ou determinados experimentalmente. Conforme o valor do HLB, o surfactante será lipofílico (HLB < 9) ou hidrofílico (HLB > 11) e será usado em emulsões do tipo água/óleo ou óleo/água, respectivamente. Aqueles na faixa de 9-10 são intermediários (O’BRIEN, 1998). Para emulsões água em óleo são recomendados surfactantes com valores de HLB entre 3 e 6, e para emulsões de óleo em água são recomendados surfactantes com valores de HLB entre 8 e 18. A Tabela 2.5 mostra os valores de HLB de alguns dos surfactantes que serão utilizados no presente trabalho.

Tabela 2.5.Valores de HLB de alguns surfactantes alimentícios

Produto HLB Lecitina de soja crua sem óleo hidrolisada acetilada hidroxilada acetilada e hidroxilada Monoestearato de sorbitana Monooleato de sorbitana SSL

Ésteres de sacarose (SE)

3 4 7 8 8 9-10 4.7 4.3 21.0 8-16

Fonte: Schneider (1997); Garti et al. (1999); Dhaymers (2005).

O número de HLB é indicativo somente do tipo de emulsão que se espera, e não da sua eficiência (concentração requerida de surfactante) ou efetividade (estabilidade da emulsão) com a qual este será incorporado (ROSEN, 1989). O valor de HLB pode mudar em função das condições de emulsificação (temperatura, natureza das fases óleo e água, presença de co-surfactantes ou outros aditivos). Por exemplo, tem sido observado que à medida que a temperatura aumenta o grau de hidratação de um surfactante não iônico polioxietilenado (POE) diminui, e o surfactante começa a ser menos hidrofílico. Conseqüentemente, seu HLB deve diminuir. Assim, uma emulsão óleo em água feita com um surfactante iônico (POE) pode inverter a uma emulsão água em óleo quando a

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temperatura é elevada. A temperatura na qual a inversão ocorre é conhecida como a temperatura de inversão de fase (TIF) (ROSEN, 1989).

A Associação de Fabricantes Europeus de emulsificantes para alimentos fornece uma lista de emulsificantes aprovados para uso alimentício incluíndo sua descrição, aplicações e outras informações (EFEMA, 1999). Dentre os surfactantes não iônicos citados encontram-se o estearoil lactato de sódio (SSL), os ésteres de sacarose, e as lecitinas.

O estearoil lactato de sódio (SSL) (Figura 2.4), obtido através da reação do ácido esteárico com ácido lático na presença de hidróxido de sódio, é um surfactante aniônico, dispersável em água com um ponto de fusão de aproximadamente 45°C. O SSL é um surfactante muito versátil com aplicações diversas. Devido às suas propriedades aniônicas é um surfactante efetivo em vários tipos de emulsões (KROG, 1997).

Figura 2.4. Estrutura química do SSL (a) e de um éster de sacarose (b). O grupo R corresponde à cadeia de hidrocarbono. Fonte: EFEMA (1999).

A sacarose tem 8 grupos hidroxilas livres que podem ser esterificados com ácidos graxos diferentes. Assim, é possível produzir ésteres de sacarose (ES) em uma ampla faixa de valores de HLB ( 5 -16) controlando o grau de esterificação. As propriedades dos ES são únicas uma vez que quase qualquer balanço hidrofílico-lipofílico pode ser obtido, desde que os ES não mudem seu HLB com a temperatura (diferente dos derivados etoxilados). Uma vez que a solubilidade dos ES nas fases água e óleo na temperatura ambiente é baixa, é necessário usar álcoois alifáticos como co-surfactantes (GARTI et al., 1999). A Figura 2.5 mostra um éster de sacarose, onde os radicais R1, R2, e R3 representam as cadeias de ácidos graxos. Contudo, os outros grupos OH também podem

Figura 2.5. Estrutura química de um éster de sacarose. Fonte: EFEMA (1999).

A Lecitina, nome comercial dado a um grupo de fosfolipídios que ocorre naturalmente, é um surfactante zwitteriônico natural que vem sendo utilizado como emulsionante há várias décadas em uma ampla gama de produtos alimentícios (BERG et al., 2004). Uma molécula de fosfolipídio é feita de quatro tipos de componentes: ácidos graxos, uma plataforma á qual se prendem estes ácidos (o glicerol), um fosfato e um álcool (colina, etanolamina ou inositol) unido ao fosfato (Figura 2.6). A estrutura favorecida para a maioria dos fosfolipídios em meio aquoso é uma lâmina bimolecular, em vez de uma micela. O motivo é que as duas cadeias de ácidos graxos de um fosfolipídio são muito volumosas para se adaptarem no interior de uma micela. As propriedades físicas e químicas dos fosfolipídios são determinadas pelo tipo de álcool unido ao fosfato, e pelo comprimento de cadeia e grau de insaturação dos ácidos graxos (BERG et al., 2004).

A principal fonte vegetal de fosfolipídios naturais é o óleo de soja. A lecitina forma parte das gomas que são separadas por centrifugação do óleo através do processo de degomagem úmida. As gomas consistem em fosfatídeos, triglicerídeos ocluídos, compostos solúveis em água como açúcares, se presentes, e água de hidratação (da ordem de 50%). Estas gomas, com ou sem aditivos (agentes branqueadores, agentes de fluidez) são secas até um nível máximo de 1% de umidade. O óleo pode ser extraído com acetona para obter lecitinas isentas de óleo. Por outro lado, o fracionamento da lecitina isenta de óleo com álcool pode ser empregada para a obtenção de uma fração solúvel em álcool (utilizada em emulsões óleo/água) com alto teor de fosfatidil colina, e uma fração não solúvel em álcool (utilizada em emulsões água/óleo) rica em fosfatidil inositol. A lecitina pode ser modificada quimicamente para aumentar sua dispersabilidade na fase aquosa ou para modificar suas propriedades emulsificantes (DORSA, 2004). Lecitinas

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quimicamente modificadas incluem produtos hidrogenados, hidroxilados, acetilados, sulfonados e halogenados (DORSA, 2004).

Figura 2.6. Estrutura básica dos fosfolipídios presentes na lecitina de soja. R representa as cadeias de ácidos graxos saturados ou insaturados. Fonte: EFEMA (1999).

Os surfactantes que têm sido utilizados na produção de filmes incluem ésteres de sacarose, diacetil éster tartárico de monoglicerídeos, éster acético de monoglicerídeos, lecitina de soja, monoestearato de sorbitano (Span 60), monoleato de polioxietileno sorbitano (Tween 80), monolaurato de polioxietileno sorbitano (Tween 20), monooleato de sorbitano (Span 80) (RODRÍGUEZ et al., 2006; DÍAZ-SOBAC; BERISTAIN, 2001; VILLALOBOS et al., 2006; DIAB et al., 2001; GONTARD et al., 1994).

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