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2- DIVERGÊNCIAS DOUTRINÁRIAS E JURISPRUDENCIAIS ACERCA DA

2.1 Das modalidades de interpretação

2.1.3 Taxatividade mitigada

Visando apresentar solução que permita abranger hipóteses excepcionais e imprescindíveis ao rol de cabimento do Agravo de Instrumento, a Corte Especial apresenta a

taxatividade mitigada, modalidade inovadora que torna precisa a exposição de suas características e respostas apresentadas.

O julgamento dos recursos repetitivos representativos da controvérsia REsp 1.704.520/MT e REsp 1.696.396/MT, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, definiu a natureza jurídica do art. 1.015 do CPC/2015 como de taxatividade mitigada e resultou nos seguintes desdobramentos, in verbis:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NATUREZA JURÍDICA DO ROL DO ART. 1.015 DO CPC/2015. IMPUGNAÇÃO IMEDIATA DE DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS NÃO PREVISTAS NOS INCISOS DO REFERIDO DISPOSITIVO LEGAL. POSSIBILIDADE. TAXATIVIDADE MITIGADA. EXCEPCIONALIDADE DA IMPUGNAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. REQUISITOS. 1- O propósito do presente recurso especial, processado e julgado sob o rito dos recursos repetitivos, é definir a natureza jurídica do rol do art. 1.015 do CPC/15 e verificar a possibilidade de sua interpretação extensiva, analógica ou exemplificativa, a fim de admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que verse sobre hipóteses não expressamente previstas nos incisos do referido dispositivo legal. 2- [...] 3- A enunciação, em rol

pretensamente exaustivo, das hipóteses em que o agravo de instrumento seria cabível revela-se, na esteira da majoritária doutrina e jurisprudência, insuficiente e em desconformidade com as normas fundamentais do processo civil, na medida em que sobrevivem questões urgentes fora da lista do art. 1.015 do CPC e que tornam inviável a interpretação de que o referido rol seria absolutamente taxativo e que deveria ser lido de modo restritivo. 4- A tese de que o rol do art. 1.015 do CPC seria taxativo, mas admitiria interpretações extensivas ou analógicas, mostra-se igualmente ineficaz para a conferir ao referido dispositivo uma interpretação em sintonia com as normas fundamentais do processo civil, seja porque ainda remanescerão hipóteses em que não será possível extrair o cabimento do agravo das situações enunciadas no rol, seja porque o uso da interpretação extensiva ou da analogia pode desnaturar a essência de institutos jurídicos ontologicamente distintos. 5- A tese

de que o rol do art. 1.015 do CPC seria meramente exemplificativo, por sua vez, resultaria na repristinação do regime recursal das interlocutórias que vigorava no CPC/73 e que fora conscientemente modificado pelo legislador do novo CPC, de modo que estaria o Poder Judiciário, nessa hipótese, substituindo a atividade e a vontade expressamente externada pelo Poder Legislativo. 6- Assim, nos termos do

art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, fixa-se a seguinte tese jurídica: O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação. 7- Embora não haja risco de as

partes que confiaram na absoluta taxatividade serem surpreendidas pela tese jurídica firmada neste recurso especial repetitivo, pois somente haverá preclusão quando o recurso eventualmente interposto pela parte venha a ser admitido pelo Tribunal, modulam-se os efeitos da presente decisão, a fim de que a tese jurídica apenas seja aplicável às decisões interlocutórias proferidas após a publicação do presente acórdão. [...] (BRASIL, 2020, grifo nosso)

Dentre inúmeras razões que justificam a definição de taxatividade mitigada pela Corte Especial, está a crucial importância de a partir das normas fundamentais do Processo Civil,

priorizar a proteção aos casos urgentes indissociáveis do direito de ação e também do princípio do acesso à justiça (DIDIER JR; CUNHA, 2019).

Dessa forma, a relatora mencionou que há diversos exemplos de casos urgentes que não foram contemplados pelo legislador no elenco do art. 1.015 do CPC/2015, os quais se examinados apenas por meio do recurso de apelação, terão uma tutela jurisdicional tardia e inútil. Assim, citou como exemplo a decisão interlocutória que versa sobre segredo de justiça, devendo ser lembrado aqui também, o exemplo da interlocutória que versa sobre competência, mencionado anteriormente, que deve, necessariamente, fundar sua recorribilidade imediata no critério urgência.

Assim, em primeiro plano, é preciso denotar que a taxatividade mitigada fugindo dos argumentos das outras definições do art. 1.015 do CPC/2015, está fundada, basicamente, neste critério e algumas possíveis relativizações, explanados no acórdão em que restou definida a Controvérsia nº 35/STJ, conforme segue, in verbis:

[...] a partir de um requisito objetivo - a urgência que decorre da inutilidade futura do julgamento do recurso diferido da apelação –, possibilitar a recorribilidade imediata de decisões interlocutórias fora da lista do art. 1.015 do CPC, sempre em

caráter excepcional [e continua] independentemente do uso da interpretação extensiva ou analógica dos incisos do art. 1.015 do CPC, porque, como

demonstrado, nem mesmo essas técnicas hermenêuticas são suficientes para abarcar todas as situações [...] (BRASIL, 2020, grifo nosso)

Logo, o voto vencedor, fundamentou, excepcionalmente, o cabimento de Agravo de Instrumento, em situações fora do rol do art. 1.015 do CPC/2015, sempre que presente o requisito urgência, e a fim de demonstrar não ter havido desrespeito a intenção do legislador, argumentou com base no parecer nº 956/2014, da Comissão Temporária do Código de Processo Civil (BRASIL, 2020).

No parecer, o Senador e relator Vital do Rêgo, menciona acerca do Agravo de Instrumento que deve ser sempre cabível nos casos em que (BRASIL, 2020, p.78), in verbis: “[...] realmente, não se pode aguardar rediscussão futura em eventual recurso de apelação.”

Vale esclarecer que a urgência estabelecida pela relatora, é distinta da urgência elencada nas hipóteses de cabimento previstas no inciso I do art. 1.015 CPC/2015 que é de direito material. Aqui, diga-se urgência de direito processual, decorrente da morosidade de novo julgamento (PITTA, 2020).

Em segundo plano, explica-se a questão do marco preclusivo, que não impede a definição da taxatividade mitigada, porquanto, os casos excepcionais de Agravo de Instrumento ficarão condicionados a dupla condição de admissibilidade, quais sejam: 1) da

parte, que terá que demonstrar a excepcional urgência a justificar o cabimento do agravo de instrumento; e, 2) do tribunal, que observará se realmente trata-se de situação excepcional a justificar a reanálise imediata (BRASIL, 2020).

Isso porque, é exigível a presença cumulativa dos aspectos, algo que afasta as três modalidades (preclusões temporal, lógica e consumativa), sendo somente assim, então, para se falar em preclusão, porquanto, vejamos a explicação explanada por Didier Jr. e Cunha (2019, p. 259) in verbis:

[...] aquele que não agravou contra decisão interlocutória, exatamente porque ela não estava no rol do art. 1.015 do CPC, poderá impugnar na apelação, sem que se possa falar em preclusão. Para o STJ, então, agora é possível falar em decisões interlocutórias impugnáveis por dois recursos, o agravo de instrumento e a apelação.

Da mesma forma, igual tratamento é conferido aos prejudicados que tiveram o aludido recurso inadmitido por falta de cabimento, os quais poderão suscitar em apelação ou contrarrazões, pois também não há que se falar em preclusão imediata nesses casos (DIDIER JR; CUNHA, 2019).

Outro aspecto que favorece a definição da taxatividade mitigada, trata-se da intenção proposital ou involuntária do legislador em reacender a utilização inadequada do mandado de segurança para as hipóteses não agraváveis, algo que, para evitar tautologia, torna oportuno apenas ressaltar que vai de encontro aos preceitos legais do processo civil brasileiro, já que existindo meio processual mais eficiente e adequado - Agravo de Instrumento - , é permitida a utilização de meio contraproducente para essas hipóteses (TABA, 2020).

Não obstante, a definição do acórdão, motivou a incumbência da Corte Especial, analisando a jurisprudência dos tribunais e os posicionamentos doutrinários, definir as situações que merecem contemplação imediata de recorribilidade. Algo que, vislumbra ampla discricionariedade às partes no momento da formulação, e também aos Tribunais competentes pelos julgamentos dos diversos Agravos de Instrumento interpostos após a controvérsia, para que observando os casos específicos, verifiquem se preenchem o requisito urgência, fundamentando suas decisões pela (in)admissibilidade.

Em suma, após a fixação do entendimento pelo STJ, o rol de cabimento ficou caracterizado da seguinte forma, in verbis:

a) as decisões interlocutórias proferidas no processo de conhecimento e enumeradas no caput do art. 1.015 do CPC são impugnáveis apenas por agravo de instrumento, sob pena de preclusão; b) todas decisões interlocutórias proferidas em um dos contextos do parágrafo único do art. 1.015 do CPC são sempre impugnáveis por

agravo de instrumento, sob pena de preclusão; c) as decisões interlocutórias proferidas no processo de conhecimento, que não estejam listadas no rol do caput do art. 1.015 do CPC, são impugnáveis por agravo de instrumento ou por apelação [...] (DIDIER JR; CUNHA, 2019, p. 259-260, grifo do autor)

Vale ressaltar como outro ponto fundamental para a fixação da controvérsia que o problema de o legislador não contemplar hipóteses urgentes no rol do art. 1.015 do CPC/2015, é que isso configura visível ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, conforme manifestado pela relatora na controvérsia (BRASIL, 2020).

Levando em consideração esses aspectos, merece razão o pedido de não se interpretar literalmente a nomenclatura taxatividade mitigada, porquanto, a Corte Especial buscou conservar as hipóteses limitadas de cabimento do Agravo de Instrumento, apenas fazendo acréscimo de uma, com característica aberta, para contemplar hipóteses que restarão inefetivas se impugnáveis exclusivamente via apelação (PUGLIESE, 2020).

A esse ponto do debate, esclarecidas as modalidades interpretativas manifestadas para o dispositivo legal, é viável a análise do tema repetitivo nº 988, para esclarecer suas implicâncias que redundou na definição do presente tópico.

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