Bayreuth Festspielhaus
5.18 Teatro de Epidauro
plateia.POLICLETO. séc. IV a.C.
5.19-5.20 Bayreuth Festspielhaus
plateia, promove uma clareza e efi ciência performativas encorajando, em simultâneo, a audiência a um profundo e activo compromisso perceptual. A ausência de distracções visuais, tais como músicos e instrumentos, enfatiza a acção no palco, ao mesmo tempo que acentua a associação entre a componente visual e auditiva da performance. A concepção de Wagner privilegiou uma experiência perceptual intensifi cada, preterindo as convenções da assembleia operática moderna. O auditório, inteiramente construído
em madeira, assenta na concepção do anfi teatro grego12 — nomeadamente do teatro ao
ar livre de Epidauro —, pela sua planta semicircular, onde o olhar de cada espectador
converge num único ponto, epicentro da acção dramática13. As alas de balcões, habituais
em edifícios performativos, desaparecem e reforçam a ideia de uma assembleia activa,
democrática e comunal. A respeito da negação de uma estratifi cação social14, implícita
na confi guração da plateia, George Bernard Shaw escreve: “the 1500 seats are separated by
no barriers, no diff erence in price, no advantages except those of the greater or less proximity to the stage. Th e few cabins at the back, for King and millionaires, are the worst places in the house.” 15 Os assentos, construídos em madeiras e altamente inclinados na direcção
do palco, são descritos como sendo desconfortáveis, sobretudo atendendo à duração das apresentações. A ausência de estofamento parece rejeitar os costumes luxuosos da
conduzido para o palco onde se mistura com as vozes. A acústica de Bayreuth continua a ser quase perfeita, sobretudo em produções como o Ring ou Parsifal, segundo as quais Wagner orientou o desenho do teatro.
12 “A forma do teatro grego lembra um vale solitário entre montanhas: a arquitectura da cena surge
como uma nuvem luminosa vislumbrada das alturas pelas bacantes em transe na montanha, como moldura magnífica em cujo centro se lhes revela a imagem de Dioniso.” in FRIEDRICH NIETZSCHE, O
nascimento da tragédia, §8, p.63.
13 “Um público de espectadores, tal como o conhecemos, era desconhecido aos Gregos: nos seus teatros
era possível a qualquer pessoa, tendo em conta a estrutura do espaço destinado aos espectadores, erguendo-se em anfiteatro de arcos concêntricos, deixar de ver todo o mundo civilizado em redor e imaginar-se enquanto coreuta, numa contemplação saciada.” in FRIEDRICH NIETZSCHE, Op.cit., §8,
p.62.
14 Tal como é latente em exemplos da mesma altura como a Ópera de Garnier em Paris ou o
Metropolitan em New York. Os balcões assim como os diferentes níveis correspondiam a uma hierarquia de preços e, consequentemente, de classes sociais.
15 GEORGE BERNARD SHAW, Sem título, Hawk, in Bayreuth, the Early Years: An account of the Early
Decades of the Wagner Festival as Seen by the Celebrated Visitors and Participants, p.141-42, citado por JULIET KOSS, Invisible Wagner, in The Aesthetics of Total Artwork, Baltimore: The Johns Hopkins
ópera novecentista; porém, têm um propósito bem mais nobre: “spectators were to face
forward and concentrate on the stage proceedings rather than socialize, gaze at ornate décor, or indulge in naps in cushioned seats.” 16 A atenção dos espectadores deveria, assim, ser
exclusivamente direcionada para a imagem do palco e para a música.
A estrutura geral do teatro é executada em madeira e emparelhada por tijolo, apresentando «tímidos» detalhes de pedra em pórticos e entablamentos [fi g. 5.11 a 5.13].
A própria volumetria é condicionada exclusivamente por princípios de funcionalidade; para além do acentuado volume do palco, existe uma área de apoio na fachada tardoz do edifício, destinada à colocação do motor, mecanismos e maquinaria, indispensáveis
à manipulação cénica das produções operáticas [fi g. 5.23 e 5.26]. Este carácter das
infraestruturas é intrínseco aos novos métodos de produção mecânica, sendo que a própria implantação do edifício não é alheia aos modernos meios de comunicação — nomeadamente a linha ferroviária — dada a sua proximidade ao terminal de Bayreuth. O desenho radicalmente simplifi cado do interior confere ao edifício um carácter austero e funcional. A plateia é ladeada por uma série de planos transversais que estabelecem um ritmo crescente no sentido do proscénio. Para além de acentuarem a perspectiva, são extremamente efi cazes acusticamente; a conformação dos pilares e do espaço resultante reduz o ângulo de incidência da orquestra, criando uma atmosfera sonora ideal. Estes planos defi nem ainda a ligação aos espaços de circulação do edifício, através de uma série de portas que facultam, de forma efi ciente e expedita, o acesso ao espaço do auditório.
16 JULIET KOSS, Op. Cit., p.178.
Por sua vez, a decoração é reduzida ao essencial; para além dos capitéis que encimam as colunas dos planos laterais, das lâmpadas de gás e dos motivos que adornam os frisos e as modenaturas, o ornamento estendia-se apenas ao tecto, originalmente revestido por uma lona pintada com desenhos geométricos simples e igualmente inspirado em exemplos gregos.
Desta forma, a concepção arquitectónica é orientada por um princípio de racionalidade e sobriedade, patente desde a composição exterior até à economia do pormenor. Estes procedimentos racionalizados podem igualmente ser constatados na organização interior do edifício e nos seus padrões de circulação determinados pela funcionalidade dos espaços. A efi ciência espacial torna Bayreuth um edifício democrático, sendo a intencionalidade da ideia elevada pela clareza da sua arquitectura.
Por outro lado, observamos um comportamento mecanizado da audiência — encorajada a comportar-se em uníssono — que advém não apenas do gosto partilhado pela música de Wagner, mas também da confi guração do espaço do auditório. O compositor utilizou as faculdades próprias da arquitectura enquanto modalidade artística não apenas para cumprir requisitos técnicos imperativos à apresentação do seu drama, mas, sobretudo, enquanto pré-condicionador de comportamento e elemento impulsor de intensidade e
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