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E COM FOCO NA PROMOÇÃO DE RESILIÊNCIA COMUNITÁRIA

2 TECNOLOGIAS SOCIAIS COMO OBJETO DE ESTU DO DA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Defender a temática das tecnologias sociais como políticas públicas e pauta das discussões da Psicologia Comunitária parece per- tinente diante da realidade brasileira notadamente marcada por de- sigualdades e exclusão social em diferentes segmentos. Mas, afi nal o que é tecnologia social? Programas denominados Tecnologias Sociais são vistos como movimentos que emergem no cenário brasileiro “de baixo para cima” e que se caracterizam pela capacidade criativa e or- ganizativa de segmentos da população em gerarem alternativas para suprirem necessidades ou demandas sociais. Não se constituem preli- minarmente em políticas públicas, mas merecem um reconhecimento pela capacidade de produção de ciência e aplicação de tecnologia em prol do desenvolvimento social. No que tange a diferentes áreas, há exemplos de Tecnologias Sociais em vários campos: saúde, educação, meio ambiente etc., e muitas são encaradas apenas como boas práticas, perdendo portanto, o horizonte das políticas públicas (Lassance & Pedreira, 2004).

A Tecnologia Social surgiu no Brasil da última década do século passado. Embora não possuam um marco conceitual conso- lidado, as entidades que apoiam, desenvolvem ou estudam esse tipo

de tecnologia já formam uma rede no Brasil – a Rede de Tecnologia Social (RTS) – com mais de 500 entidades participantes. Essa Rede é composta, principalmente, por Movimentos Sociais, ONGs, Univer- sidades e órgãos ligados ao Governo (ITS, 2007).

Uma das defi nições de tecnologia social (a que utilizaremos neste trabalho) é proposta pelo Instituto de Tecnologia Social (ITS) elaborada com mais de 80 instituições (ONGs, associações comuni- tárias, movimentos sociais, cooperativas, universidades, centro de pes- quisa, poder público e órgãos de fomento de CT&I). Nela, tecnologia social “é um conjunto de técnicas e metodologias transformadoras, de- senvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropria- das por ela, que representam soluções para a inclusão social e melhoria das condições de vida” (p. 26).

As Tecnologias Sociais desenvolvem-se em geral, a partir da iniciativa da própria comunidade, que, motivada por suas próprias necessidades, cria metodologias inovadoras que chegam a resultados geradores de transformações sociais signifi cativas para pessoas e gru- pos sociais. Uma importante característica das Tecnologias Sociais é a possibilidade de ser reproduzida ou replicada em outros locais que apresentem situações e necessidades similares. Importante ainda apontar que tais tecnologias sociais não necessariamente devem emer- gir no seio das comunidades, mas podem também advir do ambiente acadêmico, desde que contemplem e associem claramente os saberes populares ao conhecimento científi co.

As Tecnologias Sociais têm como objetivo a melhoria das práticas sociais espontâneas, bem como atribuir um novo signifi cado para a produção de conhecimento popular, aproximando os problemas sociais de soluções viáveis ( Juliano, 2013). O processo de produção dessa tecnologia é essencial para sua caracterização, pois se preocupa com a emancipação dos autores envolvidos, tanto dos seus produto- res, como dos seus usuários, implicando na construção de soluções de modo coletivo pelos que irão se benefi ciar dessas soluções e que atuam

com autonomia. Recomenda-se que seja desenvolvida e praticada na interação com as populações e apropriada por elas.

Neste capítulo, buscamos associar as dimensões das tecno- logias sociais e os aspectos da resiliência comunitária evidenciados em resultados de fortalecimento e empoderamento dos produtores e usuários das tecnologias sociais, conforme demonstrado por Juliano (2013). O trabalho pioneiro dessa autora demonstrou a forte relação entre as tecnologias sociais produzidas e a resiliência em comunidades. Importante esclarecer que, neste trabalho, o construto de re- siliência é compreendido como possibilidades de superação de ad- versidades presentes no cotidiano de qualquer indivíduo, grupo ou comunidade. Pesquisadores reconhecidos nesse campo de estudo geralmente salientam que resiliência se defi ne por superação de ex- periências traumáticas com resultados de sucesso na vida, de resis- tência ao estresse e de bom desempenho nas tarefas vitais (Masten, 2014). Portanto, resiliência é estudada como o resultado de processos complexos e dinâmicos que dependem da interação entre condições individuais e coletivas que caracterizam o desenvolvimento humano gerando transformações. Assim, resiliência se refere a um conjunto de processos que explicam mais do que o enfrentamento de situações de sofrimento, mas salientam o papel dos indicadores de proteção que possibilitam o fortalecimento, o empoderamento e as transformações pessoais/coletivas/culturais (Yunes, 2015).

Conforme mencionado anteriormente, defender que as tec- nologias sociais podem ser promotoras de resiliência comunitária é um dos objetivos deste capítulo. Esse é um tema ainda pouco ou nada investigado no âmbito da Psicologia Comunitária. Pouco se sabe sobre saúde ou resiliência no contexto institucional e no âmbito da saúde comunitária. Ou seja, a literatura sobre resiliência como resul- tado de uma ação coletiva é escassa e o tema é pouco explorado por pesquisadores. Nesse sentido, é relevante o pensamento teórico dos autores sul-americanos e precursores das principais ideias sobre esse

assunto (Ojeda; La Jara & Marques, 2007).  Os referidos pensadores apontam cinco pilares essenciais para que se defi nam expressões de resiliência em comunidades. São eles: a solidariedade, a autoestima coletiva, a identidade cultural, o humor social e a honestidade estatal. Entende-se que, para promover a resiliência comunitária, é preciso compartilhar de forma solidária, saberes, informações, desafi os e, va- lorizar as prioridades e as relações signifi cativas com pessoas, grupos, movimentos sociais ou instituições. Isso está em linha com o conceito de tecnologia social (Zape; Dell´Aglio & Yunes, 2015). 

Assim, governantes, gestores, agentes sociais e pesquisadores da área da Psicologia Comunitária que pretendam cumprir seu papel a serviço do desenvolvimento humano saudável e positivo, deverão estar dispostos a olharem com cuidado e atenção para possíveis elementos que indiquem tecnologia social e promoção de resiliência comunitária. Investigar e compreender previamente a multiplicidade de elementos sociais, ecológico-sistêmicos, culturais e os saberes e valores implícitos e explícitos de cada comunidade é essencial para a implementação de programas de intervenção e políticas sociais capazes de gerar melhor qualidade de vida, bem-estar coletivo e desenvolvimento comunitário.

Assim, ao invés do Psicólogo comunitário planejar, desenhar e introduzir uma intervenção, defi nindo-a, implementando-a e avalian- do-a, nossas propostas de pesquisas propõem que seja feito o caminho inverso, ou seja, aquele proposto originalmente por Bronfenbrenner, explicitado no editorial de 1974 e implícito em todas as suas obras, qual seja o de estudar programas sociais já existentes na comunidade. Trata-se de lançar um olhar ecológico para a busca de tecnologias sociais, com um diferencial que forneça indicadores de concepções de intervenções que emerjam no seio das comunidades como solução de reais problemas e necessidades.

3 O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO E DE AVALIAÇÃO