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Capítulo II “A gente tem sabedoria só para entrar, mas não tem para sair”

2.1 Tekoha 1 – O acampamento que sempre foi tekoha

O Tekoha 1 está localizado nas proximidades da Rodovia, dentro de uma área arrendada. Diferentemente de outras áreas de retomada o Tekoha 1 permite refletir, não apenas sobre a fluidez e mobilidade desses espaços, mas também, acerca da permanência como parte deste processo, pois esse tekoha está fixado nessa área há mais ou menos 40 anos.

A liderança e a vice-liderança do Tekoha 1 são irmãos (no croqui 3, pode se ver a localização dos barracos onde eles moram, estão representados pelos números 1 e 12, respectivamente). Os agregados a esse tekoha, estão vinculados principalmente por laços de parentesco com a vice-liderança e a sua esposa52. A história de espoliação desse território é narrada pela liderança. Na sua fala, sua família retornou para o Tekoha 1 no final dos anos 1970, início dos anos 1980, após terem passado por diferentes reservas da região. Segundo ele desde 1910 lá morava sua família, seus pais e avôs e já era considerado tekoha. Mas, por volta dos anos 1930, a área foi comprada por um fazendeiro que os expulsou de seu território.

Após a expulsão, a família das lideranças foi morar na Reserva de Amambaí (1915) - aproximadamente 130 km de Dourados - depois passam por Rancho Jacaré53 e eles estavam na Reserva de Caarapó quando seu pai decidiu retornar com a família, cerca de 18 pessoas, para o seu antigo tekoha. Nessa época a liderança tinha 14 anos, como me contou. Também me explicou que seu pai veio quietinho, não disse que ali era terra de índio e pediu emprego em troca de morar no local. Essa teria sido a estratégia de seu pai,

52 Segundo Crespe (2009, 2015), as áreas de retomadas liderados por um casal conseguem agregar mais a parentela.

53 Essa é uma das mobilizações, mencionadas no capítulo anterior, que faz parte da espiral das retomadas na região.

para voltar a morar no seu tekoha, e ao mesmo tempo evitar o confronto direto com o proprietário, pelo menos num primeiro momento.

Na narrativa do meu interlocutor, a figura do seu pai foi muito importante para ele se constituir enquanto liderança. Ele disse que “roubou a sabedoria54” do seu pai “para saber viver no meio do seu povo”. Sobre a sua luta pelo tekoha, a liderança também aponta o papel central que o pai teve, pois, é o pai quem lhe ensinou muita coisa, o pai “deu uma história” e ele “marcou tudo no papel”. Essa é a história do Tekoha 1 e como seu pai, a liderança também fez o seu filho continuar marcando a história deles. Marcar tudo no papel, mais do que uma forma de não esquecer sua história, é um modo de contar a história para os brancos, já que são eles quem produzem e regulam os termos para a demarcação de suas terras. Nesse sentindo, a escola também foi fundamental para a liderança poder organizar o conhecimento que adquiriu do seu pai55. Davi Kopenawa (2016), a esse respeito, fala que o branco só aprende olhando para as peles de imagem, por esse motivo entregou suas palavras a Bruce Albert para que os brancos pudessem conhecer a história do povo da floresta.

Conhecer a história é um elemento ressaltado pela liderança do Tekoha 1 e por outros interlocutores como indispensável a retomada. No contexto das ocupações Guarani Ñandeva no sul de São Paulo, Ribeiro (2016) também menciona como o resgate da história foi central para o grupo, oriundo da Reserva de Araribá (município de Avaí/SP), realizar a ocupação de suas terras tradicionais. A autora conta que a retomada aconteceu após Claudemir Marcolino (antiga liderança), sustentado pelos relatos de Curt Nimuendajú em seu livro As Lendas da Criação e Destruição do Mundo (1987) ter feito um levantamento documental em cartórios e paróquias que confirmaram a existência de um antigo aldeamento indígena, localizado na região conhecida como “Mata dos Índios”

54 A liderança sempre utilizava a expressão roubar, para se referir a algo que aprendeu: como a viver no meio do seu povo, aprender a luta pelo tekoha, bem como aprender o português. Acredito que é preciso fazer um investimento etnográfico maior a expressão, que podem integrar pesquisas futuras. Roubar me parece que se refere a “tomar” para si algo que era dele, um conhecimento, que é uma palavra, o que só é possível “ouvindo”. Acredito que não seja possível “roubar” a palavra porque a palavra/conhecimento não pode ser “roubada”, pois ela existe por si, é a própria existência/vida que é transmitida. O termo roubar aqui é um empréstimo que muito provavelmente nada tem a ver com os sentidos que atribuímos a palavra. 55 A liderança sempre costuma ressaltar a importância de marcar tudo no papel. Uma vez em campo quando perguntei se podia gravar nossa conversa ele disse que preferia que eu anotasse no papel. Comecei a perceber também que ele ficava satisfeito quando eu anotava o que me contava no meu caderno, com o passar do tempo ele mesmo me dizia: “anota isso também no seu caderno”. Em vista disso, o significado que tem o papel nesse contexto, se tornou um dos temas que merecerá um investimento etnográfico na pesquisa de doutorado. Os documentos do MPF podem ser uma entrada de reflexão, pois neles encontro cartas da liderança e da comunidade. Vale ressaltar, que os Guarani e Kaiowá reconhecem a importância do papel, pois é através dele que os não indígenas e o Estado ditam as regras, por isso, é muito comum, no processo de reivindicação, que as lideranças enviem cartas tanto para a Funai como para o MPF, para fazer pedidos, denúncias ou mesmo informar mudanças de liderança.

no município de Itaporanga (SP). A história passa operar então, como uma categoria que faz parte da linguagem de demanda, nesse sentido a história também é um elemento mobilizado para reivindicar o pertencimento a terra.

No caso da liderança do Tekoha 1, “além do conhecimento da história, ele precisou assimilar outros recursos e saberes necessários para a mobilização de um grupo, assim como, para formalizar a demanda de regularização fundiária da área via FUNAI” (CRESPE, 2015: 217). A esse respeito, a passagem dos irmãos por Rancho Jacaré é central para entender onde eles aprenderam como é que luta56. Em Rancho Jacaré, os irmãos, junto com seu pai tiveram a oportunidade de acompanhar as lideranças na retomada e na luta política pelo tekoha. “Então ele me contou, ele me deu uma escola, como é que luta. Eu não sei naquele tempo como é que luta, eu aprendi” (CORRADO,2013: 144). Sobre as lideranças com quem aprendeu o processo de luta a liderança do Tekoha 1 citou Gabriel Cavalheiro57, Agostinho Almeida e Lídio Moraes, todos, na época, de Rancho Jacaré. Nesse período ele contou que tinha por volta de 12, 13 anos de idade e que também aprendeu ouvindo as conversas de seu pai com essas lideranças nas rodas de tereré58 e complementa: “eu vi a luta dele e guardei isso”.

Ouvir as pessoas mais velhas, como pais e avós, é uma das formas de se adquirir conhecimento para os Guarani e Kaiowá. Era comum a liderança do Tekoha 1 me falar sobre a importância de se dar e ouvir um bom conselho. Em campo também observei como as crianças e os jovens ficavam próximas aos locais onde conversava com as lideranças, elas não interrompiam a conversa, porém percebia que sempre prestavam muita atenção. Adriana Testa, ao falar sobre criação e cuidado entre os Mbya, descreve a fase pela qual os jovens devem aprender a falar com moderação e a sempre escutar, chamada de omboguapy vy oendu aguã, cuja a tradução possível seria, ser conduzido para sentar ouvir (2014: 90). Na própria descrição do meu interlocutor, ele diz que aprendeu “como é que luta” e como ser uma boa liderança principalmente ouvindo e acompanhando seu pai e outras lideranças. Ao analisar os relatos de seus interlocutores Testa também observou “a importância de sentar (- guapy) e se concentrar/ escutar atentamente (- japyxaka) para ouvir (- endu), pegar (- jopy) e guardar/cuidar (- ereko) das palavras que são passadas pelas pessoas mais velhas” (2014: 152). Essa passagem é elucidativa sobre esse modo de aprender e desse “pegar saberes”, que parece ter

56 Rancho Jacaré é uma das reservas demarcadas no MS nos anos de 1980, após intensas mobilizações políticas de luta pela terra. É justamente nesse período que a família das lideranças viveu lá.

57 Gabriel Cavalheiro também foi casado com Damiana Cavanha, liderança do Apyka’i. 58 Bebida gelada feita com erva-mate.

ressonância com a expressão roubar, utilizada pela liderança para se referir a algo que se aprendeu.

Ainda sobre a retomada do Tekoha 1, os irmãos a descrevem por fases, pois, “não entramos pelo atropelo” foi “estudando como a gente pode retomar essa área”. Assim, a vice-liderança me descreveu quais são os primeiros passos para se fazer uma retomada: “primeiro tem que saber fundamento”, o que seu irmão completou dizendo “a história”, e depois é preciso “saber batalhar”. Esse batalhar se refere a retomar a área, mas não de qualquer maneira, há todo um procedimento. Aqui, para meus interlocutores toma um sentido de um evento produzido na minúcia, pensado, planejado, no trabalho de estabelecer alianças, de chamar a parentela, de aprender a história da ocupação tradicional daquela área, que implica roubar sabedoria e pedir ajuda. Em outras palavras, como mencionava a liderança, é “cavucando por baixo”. Através das falas é significativo perceber que elas não expressam apenas os passos de uma retomada, na visão dos meus interlocutores, mas também imprimem as trajetórias e as vivencias dessas lideranças. Por isso, ao me narrarem os passos da retomada, eles me relatavam a possibilidade de “levantar o tekoha” (opuã) que se efetiva com a volta ao lugar de origem e a liderança complementou: “a gente tem sabedoria só para entrar, mas não tem para sair”. Sair do tekoha, para meu interlocutor, não está no horizonte de possibilidades. Ele prefere “sofrer aqui mesmo”, porque no Tekoha 1 estão entre parentes e é lá que está o cemitério onde foram enterrados membros de sua família.

Ainda sobre as fases de fazer uma retomada, me foi dito, que é muito importante, após a entrada do grupo, batizar a terra. Sobre o batismo do Tekoha 1, a liderança contou que foi seu pai quem o fez, porque, ele também era rezador: ele lavou o Xirú e com essa água, ele a derramou nos quatro cantos da terra, “aí a área já está batizada, confirmada”.59

Mauss definiu inicialmente no texto A Prece [1909] como “um rito é pois, uma ação tradicional eficaz” (2013, 266). Na fala da liderança, ele me chamou atenção justamente, para a eficácia do batismo, pois é ele que leva o medo para o coração do fazendeiro, é ele que garante e confirma o retorno, e principalmente, a permanência no tekoha, uma vez que, “os atos rituais [...] são por essência, capazes de produzir algo mais

59 Aponto para a relevância de se fazer um investimento analítico, em pesquisas futuras, sobre essa ‘linguagem de luta’ que meus interlocutores me apresentavam ao narrar suas histórias: guardar a luta, a

história, batalhar, cavucar, batizar, confirmar, saber o fundamento, remetem a uma série de práticas e

do que convenções; são eminentemente eficazes; são criadores; eles fazem” (Mauss, 2003: 56.). Sobre isso Pereira escreve:

Levantar uma comunidade tem como implicação o balizamento do espaço físico no qual as relações sociais serão novamente erguidas, o ato implica em tornar essa porção de terra bendita. As rezas purificam e sacralizam as pessoas e o local onde vivem. É por esse motivo que os xamãs kaiowá sempre batizam as terras que as comunidades vêm reocupando em Mato Grosso do Sul, elas são inclusive nominadas a partir do vocabulário religioso. Todo gesto de fundação ou refundação de uma comunidade reproduz o ato original do criador, realizado pela primeira vez em Yvy Pyte (2004, 360).

Além do batismo da terra é importante levar rezadores para a retomada. O trabalho dos rezadores nessas áreas é considerado fundamental, porque, segundo os Kaiowá e Guarani, os protegem dos conflitos violentos, além de assegurar a permanência na área, através de suas rezas60. Além disso, como destacou Pereira:

O retorno da comunidade ao seu antigo território ressalta a importância crucial da retomada das rezas e da recomposição do modo correto de se viver – teko katu. Em conjunto, teriam o poder de fazer a mata crescer novamente, trazer de volta os animais acompanhados de seus donos e tornar as pessoas novamente fortes, saudáveis, calmas e felizes. Mais que definir a condição humana ideal, a atualização das rezas possibilita superar os condicionamentos históricos atuais. Retomando a prática das rezas, os homens reatam o contato direto com as divindades e podem conseguir que elas atuem em seu favor (idem).

Em A Prece, Mauss nos dá elementos para pensar a palavra como um ato simbólico e que como tal imprime uma ação e tem efeito. Há por tanto um ponto de convergência entre o ritual e a crença e “a oração sendo uma palavra, acha-se por isso mesmo, mais próximo do pensamento” (2013, 233-234). Conforme Mauss:

A oração é uma palavra. Ora, a linguagem é um movimento que tem meta e um efeito; no fundo, é sempre um instrumento de ação. Mas age exprimindo ideias, sentimentos que as palavras traduzem externamente e substantivam. Falar é, ao mesmo tempo, agir e pensar: eis por que a prece depende, ao mesmo tempo, da crença e do culto (2013: 230). A antiga liderança do Tekoha 1 era o pai das atuais lideranças. É apenas após a sua morte que os irmãos passaram a dividir a liderança. A liderança tem papel fundamental para a organização da retomada, pois é ela a responsável por articular o grupo da sua parentela, bem como conseguir aliados políticos. Além disso, como mencionado, outros atributos foram se fazendo necessários ao longo do processo de luta política pelo território, como dominar o português, saber ler e escrever e estar em contato

60 Em uma reunião, ouvi uma indígena dizer que a morte de seu parente, num conflito em uma área de

com organizações do Estado como Funai, MPF, Universidades, entre outras. É nesse sentido que entendo a divisão da liderança no Tekoha 1, pois a liderança é quem sabe ler e escrever, além de ser ele quem dialoga com a FUNAI e com o MPF, sobre o pedido de cestas básicas e sobre a situação das terras (CORRADO, 2012). Por outro lado, a vice- liderança, por ser casado, reúne melhores condições de juntar os parentes e reorganizar a parentela. Casados, ele e sua esposa, reúnem em torno de si mais parentes para apoiá-los (CRESPE, 2009).

Os pais das lideranças não estão enterrados no Tekoha 1, eles estão enterrados na Reserva Indígena de Dourados, na Aldeia Bororo. Sobre isso a liderança expressou: “naquele tempo eu não estava com a cabeça boa”. Ele se referia ao fato de não ter podido enterrar os pais no Tekoha 1, pois não sabia que eles tinham esse direito, na época, “mas agora quem falece no Tekoha 1 é enterrado aqui mesmo”. No contexto das retomadas os cemitérios, além de seu significado simbólico para os Kaiowá, têm se tornado uma prova material importante no que se refere ocupação tradicional indígena na área. Por causa disso, é comum ouvir denúncias de que fazendeiros mandaram destruir antigos cemitérios. Outra questão, como a própria liderança levanta, é a proibição aos indígenas de enterrarem seus mortos nas áreas de retomadas, o que muitas vezes leva ao agravamento dos conflitos entre indígenas e fazendeiros.

A vice-liderança do Tekoha 2, também destacava como central o aprendizado nas retomadas, e o processo no qual as pessoas vão adquirindo conhecimento na vivência cotidiana na área de retomada e no circular por outras áreas, seja em reuniões como no Aty Gasu, seja recebendo ou visitando parentes. Na fala tanto da liderança do Tekoha 1, como da vice-liderança do Tekoha 2 é muito presente a saída para eventos em Brasília e em conferências, é na circulação por esses espaços que eles também vão adquirindo conhecimento. Como se verá no próximo capítulo, a mobilidade é um aspecto fundamental da sociabilidade Guarani e Kaiowá, pois é no caminhar que também se adquire conhecimento.

***

O Tekoha 1 é uma área de retomada “estável”, comparada com outras áreas. O fato de estar localizado numa área arrendada, evita o conflito direto com o proprietário. No entanto, acredito que essa situação também reflete a estratégia utilizada pelas lideranças do local, pois como elas mencionaram, seu pai chegou “quietinho” e não disse que ali era “terra de índio”, estabelecendo desde o início uma relação de trabalho com o proprietário, em troca da permanência na área. A liderança reproduz o aprendizado e

sempre fez questão de me afirmar, que ele “não abusava”, não plantava e nem construía barracos onde existe a plantação do arrendatário.

A postura das lideranças com uma estratégia de não enfrentamento, possibilitando a permanência de sua parentela no local, sem entrar em conflito direto com o arrendatário é uma de muitas outras possibilidades de entrada nas terras na região, mas conforme mencionado na introdução deste trabalho, nesta aposta é preciso levar em consideração o contexto de extrema violência vivenciado pelos Guarani e Kaiowa61. Essa postura também se expressa na organização do tekoha, com o crescimento e a manutenção da sua parentela.

Através de dados existentes desde de 2008, percebe-se um pequeno aumento do número de moradores nessa área. Em 2008, por meio de um censo realizado no tekoha, por Crespe (2009), ela contabilizou 40 moradores e 11 casas no Tekoha 1. Em junho de 2011, em meu primeiro campo, como parte do projeto Jovem Pesquisador, fizemos um levantamento e contabilizamos 23 barracos e cerca de 48 moradores, o que já apontava para uma estabilidade da área, uma vez que o número de moradores, permaneceu quase o mesmo ao longo de três anos. Os barracos no tekoha eram feitos, com troncos de árvore que são fincados ao chão e cobertos com lona preta que os indígenas conseguem via Funai, ou podem ser lonas de caminhão ou algum outro material que conseguiram coletar ou de madeiras que também coletam principalmente das indústrias e galpões próximos ao Tekoha 1. Em 2011 todos os barracos estavam montados dentro da faixa de mata.

Apenas a família das lideranças morava numa casa de madeira, que antigamente era a casa do caseiro da propriedade. Os indígenas também haviam construído um pequeno prédio de madeira com chão de cimento, que se localizava à frente da casa das lideranças e funcionava como escola. O restante dos barracos estava localizado em pequenas clareiras, dentro das matas. Os moradores costumam transitar pela área, por trilhas conhecidas pelos Guarani e Kaiowá como tapes ou tape po’i62.

Os caminhos são um tema recorrente na cosmologia desses povos. É no caminhar que os Kaiowá vão conhecendo, mapeando e tecendo seu território. Logo o tekoha é composto pelos caminhos, tape po’i e pelos lugares e é essa intensa mobilidade

61 Não estou querendo dizer que existem estratégias melhores do que outras. Mas sim, que essa foi uma estratégia possível para a área do Tekoha 1, a qual a liderança atual deu continuidade após o falecimento do seu pai. Isso também não significa a inexistência de um conflito, ele só não é tão aparente como em outras

áreas de retomadas. Além disso, é flagrante o fato do grupo estar, aproximadamente, 40 anos ocupando a

região.

que fortalece a rede de relações entre os parentes. Para Pimentel (2012) os caminhos seriam fontes importantes para pensar as relações sociais. Sobre os caminhos Crespe expressa:

Acredito que tanto os caminhos, como os lugares conectados por eles, são importantes para a construção e reprodução dos grupos, bem como são importantes para uma melhor compreensão da territorialidade produzida no passado e atualmente, pelos Kaiowá e Guarani. (2015: 301,302

Figura 3. Croqui 1 - Tekoha 1, junho de 201163

Em janeiro de 2012, realizamos um novo levantamento de moradores do Tekoha 1, constatando 31 barracos e 22 duas famílias instaladas na área de retomada, num total de 66 pessoas64. Em relação a distribuição pelo espaço, não havia muitas alterações a não ser pela construção de novos barracos por causa da chegada de novas famílias. Na época, a chegada de uma família vinda da reserva de Caarapó, cerca de 50 km de Dourados, nos chamou atenção. O homem se mudou para o Tekoha 1 com sua família. Ele havia sido liderança na reserva de Caarapó, o que lhe garantia certo prestígio

63 Tekoha 1 (Dourados, MS). Fonte: Projeto “As Formas de Acampamento”. FAPESP 2010/02331-6.