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2.3 Creche: análise histórica e práxis pedagógica

2.3.3 Tendências pedagógicas da Educação Infantil

2.3.3.3 Tendência Crítica

No Brasil uma discussão mais aprofundada sobre esta tendência ainda precisa ser implementada. Ela traz como uma de suas metas pensar a educação como um instrumento de transformação da sociedade, não é papel da escola apenas “criar” sujeitos inventivos, criativos e descobridores e amoldá-los às condições estabelecidas, mas buscar alternativas de superação do status quo, porque:

A sociedade é plena de contradições que refletem os interesses antagônicos das classes sociais nela existentes, penetrando tais contradições em todos aspectos da vida social, inclusive na escola. Além disso, entende que a relação direta do homem com o mundo físico e social é feita pelo trabalho – sua atividade coletiva – e que “liberdade” não é cada um fazer o que quer, mas sim o que decidimos em conjunto (KRAMER, 2002, p. 33).

A Tendência Crítica tem em Celestin Freinet um dos seus aportes teóricos. Adversário ferrenho de algumas das tendências citadas anteriormente, isso por não concordar com o entendimento que trazem do trabalho pedagógico. Sustenta uma crítica tanto à Escola Nova como também a autores da tendência romântica como, por exemplo, Decroly e Maria Montessori. Questiona seus métodos, principalmente, quando assinalam que é preciso: materiais, local e condições especiais para a realização da ação didático/pedagógica. Diferentemente do que fizeram os autores da tendência romântica e cognitivista, traz uma preocupação com a excessiva valorização da teoria e teme o discurso vazio. Por isso

Freinet constrói uma pedagogia, não cria um método como caminho fechado, mas técnicas construídas lentamente com base na experimentação e documentação, que fornecem à criança instrumentos para aprofundar o seu conhecimento e desenvolver a sua ação (KRAMER, 2002, p.34).

Por considerar o trabalho como atividade básica, mostra-se preocupado com as atividades propostas na escola por serem enfadonhas e repetitivas, diferentemente dos jogos, enquanto atividade prazerosa (KRAMER, 2002), e diz que essa dicotomia prazer/trabalho termina por refletir as relações da sociedade:

Aponta como essa dualidade presente na escola reproduz a dicotomia trabalho/prazer gerada pela sociedade capitalista industrial. Propõe o trabalho- jogo como atividade fundamental da escola dinâmica popular [...]. Embora adaptado à criança, o trabalho deve ser atividade verdadeira, e não um trabalho

para brincar, assim como a organização escolar não deve ser uma caricatura da sociedade.

Uma outra característica importante da pedagogia de Freinet está vinculada, ao que hoje é uma proposição comum em todas as instâncias que tratam da educação infantil, ou seja, que é fundamental a inserção da família e da comunidade nos espaços de educação formal da criança pequena. Porque apartar o trabalho engendrado na Creche das ações que acontecem na família e na comunidade, este diálogo deve ser constante, “se se respeita a palavra da criança, necessariamente há mudança” (FREINET apud KRAMER, 2002, p.34).

Os princípios que norteiam a proposta pedagógica de Freinet estão pautados em algumas técnicas, tais como: as aulas passeio, o desenho livre e o texto livre, a correspondência interescolar, o jornal (mural e impresso), o livro da vida (diário individual e coletivo), o dicionário dos pequenos, o caderno-circular para os professores. “Tais técnicas visam a favorecer o desenvolvimento dos métodos naturais da linguagem (desenho, escrita, gramática), da matemática, das ciências naturais e das ciências humanas” (KRAMER, 2002, p.35). Pouco divulgado no Brasil, além da incompreensão de sua pedagogia, no que se refere à sua proposta de educação pelo trabalho, provocou a “ira” dos tradicionais por considerá-lo escolanovista, por outro lado, deixa os escolanovistas “zangados” já que estes consideram-no tradicional; foi perseguido pelos nazistas que viam nele um revolucionário, enquanto sofreu sérias críticas dos comunistas franceses por ele não ter se filiado ao Partido Comunista Francês (KRAMER, 2002).

Críticas podem e devem ser feitas, como toda e qualquer proposta pedagógica, não seria diferente com a pedagogia de Freinet, nesta perspectiva algumas “fragilidades” são apresentadas na nesta elaboração:

Sua pedagogia apresenta, obviamente lacunas – em termos de nossa realidade atual – que precisam ser ultrapassadas, dentre as quais pode-se destacar, por um lado, sua visão talvez por demais otimista quanto ao papel transformador da escola. Por outro lado, a dimensão social identificada por Freinet aos fatores de classe social ou geográfico-culturais, estando ausentes os aspectos referentes à discriminação de sexo e de cor, problemas efetivos para a sociedade brasileira e o movimento social atual. Do ponto de vista do método natural de leitura, pode-se questionar a proposta de o professor ser o “escriba” da turma, aspecto que as investigações, mais recentes da psicolingüística permitem modificar. Finalmente, falta na sua pedagogia uma explicitação mais articulada, sob o ponto de vista psicológico, do processo de desenvolvimento das crianças.

O que leva a inserção das diversas tendências da Educação infantil neste trabalho, além de esclarecer como as teorias se articulam na tentativa de promover a educação das crianças, é demonstrar que essas tendências oscilam no tempo e no espaço, ora uma, ora outra, mas sem uma hegemonia definida para nenhuma delas. A perspectiva anunciada nesta pesquisa não está enquadrada em nenhuma das tendências apresentadas, mas poderia facilmente ser colocada como uma visão crítica na Educação da criança pequena, não só pelo referencial que a sustenta, a teoria Histórico-Cultural, como também pela forma como estrutura sua práxis pedagógica.

3 ESTUDO DE CASO: CRECHE NOSSA SENHORA DE FÁTIMA

Neste capítulo, vai-se apresentar, no primeiro momento, as características da creche pesquisada, inclusive colocando as falas da sua diretora no sentido de que esta possa trazer as peculiaridades das crianças, dos seus pais, do lugar em que a creche está situada, da realidade social e do seu paradigma educacional. O objetivo é construir uma “imagem” do espaço onde se realizou a pesquisa; no segundo momento, o foco estará centrado na pesquisa realizada, com suas coletas, análises e resultados.