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Teoria da carga dinâmica do ônus probatório

4. A CRIAÇÃO DE UM NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

4.3 INOVAÇÕES DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

4.3.1 Teoria da carga dinâmica do ônus probatório

501 RIBEIRO, Ludmila. A Emenda Constitucional 45 e a Questão do Acesso à Justiça. Revista

DIREITO GV 8 <http://direitogv.fgv.br/publicacoes/revista/artigo/emenda-constitucional-45-questao- acesso-justica> Acessado em 30 de novembro de 2013. p. 467.

502 RIBEIRO, Ludmila. A Emenda Constitucional 45 e a Questão do Acesso à Justiça. Revista

DIREITO GV 8 <http://direitogv.fgv.br/publicacoes/revista/artigo/emenda-constitucional-45-questao- acesso-justica> Acessado em 30 de novembro de 2013. p. 475.

503 FERREIRA, Cláudia Galiberne; ENZWEILER, Romano José. Novo CPC representa oportunidade desperdiçada. Revista Consultor Jurídico, 27 de julho de 2013. <http://www.conjur.com.br/2013-jul- 27/codigo-processo-civil-oportunidade-desperdicada> Acessado em 01 de dezembro de 2013.

Pois bem, passa-se a análise em específico de alguns pontos do novo Código de Processo Civil, inolvidável que o vigente Código de Processo Civil, em seu artigo 333, distribui a carga do ônus probatório, com uma visão estática, na qual cabe ao autor comprovar os fatos constitutivos de seus direitos e ao réu, por sua vez, comprovar os fatos impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado pelo autor. Em outras palavras, em regra, o ônus probatório é dividido conforme a posição processual da parte.

Sob esse prisma Bertolino504 entende que nem o autor nem o réu devem desfrutar de uma vantagem numa determinada categoria de casos, isto porque as regras relativas ao ônus da prova devem estar em conformidade com o princípio da igualdade formal, exceto em casos especiais, quando a legislação intervém para estabelecer diferentes distribuições do ônus da prova, por causa da maior proteção para certas situações jurídicas substantivas. Essas regras só se justificam quando a partilha de riscos satisfaz os critérios de bom senso racional e políticas de igualdade formais ou leis para a proteção da igualdade substancial, em suas palavras:

Nel processo civile sembra esservi un principio generale in base al quale il rischio di errore per la mancata prova deve essere distribuito in maniera equa. Ne l‘attore né il convenuto devono godere di un vantaggio in nessuna particolare categoria di casi. Ci sembra di poter dire che in via generale le regole sull‘onere della prova rispondono al principio dell‘eguaglianza formale fra attore e convenuto, salvo i particolari casi in cui la legge interviene per stabilire diverse distribuzioni dell‘onere della prova, in ragione della maggior tutela accordata a certe situazioni giuridiche sostanziali. Tali regole sono necessarie in ragione del divieto nel nostro ordinamento di pronunce di non liquet. Esse sembrano pero essere giustificate solo nel momento in cui la ripartizione del rischio risponda a criteri razionali di buon senso ed uguaglianza formale o a politiche legislative di tutela dell‘eguaglianza sostanziale.

Contudo, hodiernamente, parte da doutrina tem entendido que a melhor forma de distribuição do ônus probatório, e mais justa, seria em obediência a teoria da carga dinâmica da prova, ou seja, o ônus probatório deveria competir a parte que

504 BERTOLINO, Giulia. Giusto processo civile e giusta decisione (IUS/15): riflessioni sul concetto di giustizia procedurale in relazione al valore della accuratezza delle decisioni giudiziarie nel processo civile. Corso Di Dottorato In Diritto Processuale Civile. Universidade de Bolonha. 2007. p. 14.

melhor tem as condições de esclarecer os fatos. Nesse sentido, Ribeiro505 afirma

que:

Em linhas gerais, pela teoria da distribuição dinâmica dos ônus probatórios, (i) não se deve aceitar o estabelecimento prévio e abstrato do encargo; (ii) não importa a posição da parte no processo; (iii) não é relevante a clássica distinção entre fatos constitutivos, extintivos, modificativos, etc; é importante apenas (iv) o caso concreto e a (v) natureza do fato a ser provado – imputando-se o encargo àquele que, pelas circunstâncias reais, encontrar-se em melhores condições de fazê-lo.

De fato parece estar em consonância com a atual Constituição a teoria da carga dinâmica da prova, pois privilegia de uma maneira mais justa e equânime que aquele que tenha facilidade em comprovar os fatos produza a prova, em observância ao devido processo legal, com o fito de a decisão se aproximar da realidade.

O processo não deve servir para assegurar aquele que seja mais hábil, mais culto, mais forte, mas sim para dar razão à parte cujo direito seja superior, nesse sentido, Cambi506 aduz que o processo deve servir para, em um Estado Social, garantir a igualdade substancial, por isso, o ordenamento jurídico brasileiro, notadamente a Constituição Federal, tenta suprir as carências do litigante hipossuficiente.

Para tanto, devem ser observados dois princípios norteadores da distribuição da carga dinâmica, o primeiro é a cooperação ou solidariedade, cujo teor consiste no dever que as partes têm de cooperação com o órgão jurisdicional, sem refúgio ao seu mero interesse particular, o segundo é o da igualdade, pois a relação processual pode ficar desequilibrada caso as partes não recebam um tratamento

505 RIBEIRO, Flávia Pereira. A Regulamentação da Teoria da Carga Dinâmica das Provas. SILVA,

José Anchieta da. (Org.). O Novo Código de Processo Civil. 1ª. ed. v. 1. São Paulo: Lex Editora, 2012. p. 248.

diferenciado em razão de sua desigualdade507. Nesse diapasão é o Projeto de Lei

de n° 8046, de 2010:

Art. 357. O ônus da prova, ressalvados os poderes do juiz, incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Art. 358: Considerando as circunstâncias da causa e as peculiaridades do fato a ser provado, o juiz poderá, em decisão fundamentada, observado o contraditório, distribuir de modo diverso o ônus da prova, impondo-o à parte que estiver em melhores condições de produzi-la.

§1º - Sempre que o juiz distribuir o ônus da prova de modo diverso do disposto no art. 357, deverá dar à parte oportunidade para desempenho adequado do ônus que lhe foi atribuído.

§2º - A inversão do ônus da prova, determinada expressamente por decisão judicial, não implicará alteração das regras referentes aos encargos da respectiva produção.

Art. 359. É nula a convenção relativa ao ônus da prova quando: I – recair sobre direito indisponível da parte;

II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito. Parágrafo único. O juiz não poderá inverter o ônus da prova nas hipóteses deste artigo.

Com efeito, parte da doutrina entende já ser possível atualmente a aplicação da teoria da carga dinâmica do ônus probatório, sem necessidade de qualquer reforma a lei processual, exatamente pela interpretação, a luz da Constituição, de princípios como o da igualdade (art. 5, caput, CF), devido processo legal (art. 5º, XIV, CF) e acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CF)508.

Impera ressalvar que a teoria da carga dinâmica do ônus probatório é medida excepcional, somente devendo ser aplicada quando a regra ordinária não possibilite a melhor decisão, não efetive o direito reclamado em juízo, conforme se percebe pela manutenção do art. 333, do CPC, alterado com a ressalva dos poderes do juiz para o art. 357, do Projeto de Lei de 8046, de 2010.

507 RIBEIRO, Flávia Pereira. A Regulamentação da Teoria da Carga Dinâmica das Provas. SILVA,

José Anchieta da. (Org.). O Novo Código de Processo Civil. 1ª. ed. v. 1. São Paulo: Lex Editora, 2012. p. 248.

508 RIBEIRO, Flávia Pereira. A Regulamentação da Teoria da Carga Dinâmica das Provas. SILVA,

José Anchieta da. (Org.). O Novo Código de Processo Civil. 1ª. ed. v. 1. São Paulo: Lex Editora, 2012. p. 248.

A grande novidade, pelo menos legislativa, foi o disposto no art. 358 do projeto, cujo teor possibilita ao juiz, considerando as circunstâncias da causa e as peculiaridades do fato a ser provado, distribuir de modo diverso o ônus da prova, impondo-o à parte que estiver em melhores condições de produzi-la, sempre de maneira fundamentada e com respeito ao contraditório.

Insta salientar, que por força do § 2º do artigo em comento, mesmo que houvesse a inversão do ônus probatório, o encargo (econômico), ou seja, as custas correriam por conta de quem originalmente teria a incumbência de realizar a prova em juízo.

E mais, a teor do art. 118, do Projeto de Lei de 8046, de 2010, poderá o juiz, ao dirigir o processo, alterar a ordem de produção dos meios de prova, com o fito de adequá-los às necessidades do conflito, para conferir maior efetividade à tutela jurisdicional. Ou seja, foi atribuído ao juiz um maior poder para flexibilizar da instrução.

Art. 118. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

V – dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova adequando-os às necessidades do conflito, de modo a conferir maior efetividade à tutela do bem jurídico;

Nesse ponto em específico, aparentemente prestigiou-se a efetividade da decisão judicial, em detrimento da segurança jurídica, pois o juiz pode alterar o meio de produção de prova invertendo uma ordem que atualmente é previamente estabelecida.

Porém, esse conflito é aparente, já que todas as vezes que o juiz inverter a ordem da produção das provas deverá fundamentar os motivos, sendo controlado pelas superiores instâncias, ademais, não se pode perder de vista que a produção de provas é feita para o convencimento do julgador, bem como a jurisprudência fixará quais os casos que serão permitida a aplicação da carga dinâmica da prova,

Por outro lado, não se pode perder de vista que toda lei nova causa insegurança, haja vista que até a jurisprudência se assentar leva-se um tempo

considerável, porém, se fosse só em razão desse motivo jamais haveria alteração legal.