• Nenhum resultado encontrado

Ou prática, ou teoria. Ambas são parte integrante de qualquer plano de estudos, mas parece haver uma divisão entre disciplinas – ou muito práticas, ou inteiramente teóricas. Esta dicotomia dá origem a um afastamento não só entre ambas as vertentes, como também entre as diferentes disciplinas e, assim, a um descruza- mento de temáticas que deveriam estar interligadas. Modesto reconhece a importância da interligação entre disciplinas, afir- mando que, idealmente, a disciplina de Projeto deveria desem- penhar o papel agregador, centrando em si toda a formação. Em Design Education as a Practice of Freedom?, a dupla de in- vestigadores Brave New Alps discute a oposição acima descrita: prática versus teoria. Neste artigo, refletem sobre a forma como as duas são apresentadas aos alunos: raramente o programa teó- rico discutido no âmbito de Projeto é posto em prática, enquanto que em disciplinas puramente teóricas, o conteúdo é despejado nos alunos sem direção e sem as ferramentas intelectuais para o ativarem de formas produtivas e estratégicas em âmbito prático. Face ao problema, são apresentadas propostas de solução: uma delas, o estudo de artigos relacionados com situações concre- tas de interesse para o projeto em causa; outra, a discussão dos projetos por parte dos alunos através de uma abordagem teórica específica em mente (Elzenbaumer e Franz, 2014). No seguimen- to desta linha de raciocínio, Costa refere que, em termos reais, falta o tempo para uma maior reflexão teórica no espaço de aula.

Fig. 53 Do lado da teoria, coloca-se a investigação e a docência. Do lado da prática, coloca-se o trabalho fora da academia – em atelier. Teoria Prática Design Education as a Practice of Freedom?, de Bianca Elzenbaumer e Fabio Franz, 2014 →

93 REPENSAR O ENSINO DO DESIGN

Discorda ainda que toda a investigação teórica se processe inva- riavelmente através da análise de artigos ou textos académicos – num projeto com uma complexidade alargada já se introduz a dimensão conceptual e estamos automaticamente a realizar investigação, ou melhor, várias investigações simultaneamen- te. A separação entre a teoria e a prática parece existir de igual forma quando o graduado termina os seus estudos académicos. Ou prossegue a linha de investigação ou se volta para o mundo do trabalho fora da academia. O elo de ligação entre prática e teoria é novamente que- brado. O mesmo se passa no seio da comunidade docente onde a investigação fica facilmente em se- gundo plano quando o docente se dedica, em parte ou inteiramente, à prática. Costa adiciona uma nova variável: quando o tempo a dedicar à investigação é consumido pela burocracia que se impôs com a in- trodução do Processo de Bolonha. Modesto, por seu lado, expõe a dicotomia entre professor praticante e professor da academia, acreditando que o primeiro oferece conhecimento real e prático que o segundo nunca poderá oferecer. Contudo, os professores em ateliers carecem de tempo para se dedicarem aos alunos; a dedicação exclusiva ao ensino não permite aos professores a prática do design.

Em Question the Classroom, John Caserta encoraja os docen-

tes de design a redesenhar o espaço de sala de aula. Ao reconhe- cer a problemática do docente em equilibrar as necessidades dos estudantes com a necessidade de construir o seu próprio corpo de trabalho, Caserta sugere uma nova pedagogia. Cada professor do curso colocaria uma questão, para desenvolvimento de uma disciplina, que permitiria que o seu próprio trabalho evoluísse. O plano curricular anual muda, assim, de acordo com quem está a ensinar e quais os objetivos do mesmo para a sua prática. Se- gundo Caserta, este modelo pretende explorar os interesses de investigação do docente na sala de aula, oferecendo ao aluno for- mas de lidar com o desconhecido que de outra forma não seriam alcançadas, “quando a questão é bem construída e dada dentro do contexto apropriado, os estudantes desenvolvem projetos sig- nificativos em resposta” (Caserta, 2017). Caserta objetiva, desta forma, quebrar a dicotomia entre sala de aula e investigação.

Fig. 54 EEES (Espaço Europeu de Educação Superior), indicativo do número de países signatários do Acordo de Bolonha, agora 48 membros. Question the Classroom, de John Caserta, 2017 →

94 DEBATE 02

Com o objetivo de explorar modelos de educação alterna- tivos e criar um novo tipo de espaço social e conceptual,

Department 21 é um caso de estudo interessante a des-

tacar decorrida quase uma década desde a sua original conceção. Department 21 foi um espaço experimental in- terdisciplinar, dirigido por alunos, que teve lugar na Royal

College of Art de janeiro a fevereiro de 2010. Num período

de 6 semanas, alguns alunos tiveram à sua disposição um espaço no qual puderam testar e organizar, de forma arbitrária, a sua própria arte e escola de design. “Queríamos criar um ambiente desafian- te, inclusivo, radical e produtivo que pudesse conduzir a Royal College of Art a novos modelos de educação” (Cooper et al. 2010). Com a for- mação de uma comunidade estudantil livre de quaisquer categorias pré-estabelecidas de iden- tidade disciplinar, a aprendizagem gerava-se es- sencialmente através do diálogo aberto e crítica constante entre colegas. Os estudantes podiam convidar professores para tutoriais abertos e professores externos para palestras, e realizar

workshops. Num ambiente radical e autónomo, Department 21 adotou estratégias que procura-

vam ampliar as noções de educação, prática e disciplinaridade. A experiência surge como uma oportunidade de contornar os modelos convencionais e seguir sem regras em direção a uma educação renovada e experimental, liberta de expectativas e funcionalidade disciplinar. O rumo ao desconhecido pressupõe o afasta- mento de noções pré-estabelecidas de investigação, ap- tidões, ferramentas e estratégias. Department 21 foi, se- gundo Bianca Elzenbaumer, um espaço simultaneamente interdisciplinar (intersecionando várias disciplinas, pro- curava um ponto de equilíbrio), multidisciplinar (lidava com uma multitude de disciplinas), transdisciplinar (foi

DEPARTMENT 21

Fig. 55 Department 21, fotografia das instalações na Royal College of Art, em Londres. Department 21, de Callum Cooper et al., 2017 →

95 REPENSAR O ENSINO DO DESIGN