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TERRA E TRABALHO: OS ESTRATOS SOCIAIS ENVOLVIDOS NA

Trabalhar com a agricultura ilícita de maconha nem sempre era uma tarefa simples. Exigia colaboração, confiança e cumprimento de regras afim de não deixar vestígios. Afinal, a presença de pistas que possibilitassem investigações policiais – bem como a resultante destrui- ção dos plantios e a prisão dos envolvidos – evidentemente inviabilizava todo o negócio. To- davia, por uma série de motivos, sempre havia a possibilidade de que essa atividade ilícita fra- cassasse e, entre outras consequências, tornassem-se notícia de jornal. Quando isso acontecia, em conjunto com a deflagração do cultivo ilegal, os jornais abordavam questões relacionadas à propriedade da terra, aos responsáveis pelo plantio, ao valor da produção apreendida, às carac- terísticas das pessoas envolvidas, entre outras considerações. Nesse sentido, esses meios de comunicação, em especial o Diário de Pernambuco, produziam diferentes narrativas em torno da agricultura de maconha. Adiante, a tese explora justamente um pouco desse universo de representações.

A “política maconhada”: políticos, coronéis e grandes proprietários de terra

As notícias do Diário de Pernambuco apontam que pessoas influentes na sociedade pernambucana e alagoana se envolveram com a produção ilegal de maconha. O modo como o jornal retratava esses sujeitos permite identificá-los como supostos proprietários de terra e in- divíduos com força política na esfera local. De certo modo, esse jornal foi o primeiro e pratica- mente o único periódico de Pernambuco que abordou esse assunto de forma recorrente entre 1957 e 1981. As primeiras matérias com esse tipo de denúncia apareceram em 1957 e se inten- sificaram nos primeiros anos da década de 1960.

de “culturas de entorpecentes em propriedades pertencentes a figurões políticos”213. O repórter

Fernando Luis Cascudo foi quem promoveu o furo de reportagem. Na ocasião, Cascudo acom- panhou agentes da CEFE em uma operação que, ao longo de 5 dias, localizou, contabilizou e identificou proprietários de terra que cultivavam maconha nos Estados de Alagoas e de Per- nambuco. Disfarçados de possíveis compradores, os agentes e o repórter percorreram os se- guintes Municípios: Penedo, Palmeira dos Índios, Santana do Ipanema, Porto Real do Colégio e Águas Belas. A última reportagem da série foi publicada no dia 10 de setembro de 1957 e destacava que havia “ligação de chefes políticos à cultura da erva”. A Figura 4.2 exibe parte dessa matéria.

Figura 4.2: Reportagem do Diário de Pernambuco sobre a participação de políticos

Fonte: Diário de Pernambuco. 10 de setembro de 1957. Nº 205.Ano 132, p 24

Ainda segundo essa série de notícias, os resultados desta operação foram reunidos

213 Notícias publicadas nas seguintes datas: (6 de setembro de 1957, p 1); (6 de setembro de 1957, p 18); (7 e 8 de setembro de 1957, p 24); (8 de setembro de 1957, p, 32); (10 de setembro de 1957, p 24).

em um relatório, posteriormente encaminhado à CNFE, com o nome dos proprietários envolvi- dos nos plantios ilícitos. Segundo Fernando Luis Cascudo, “havia se comprovado as suspeitas de que os roçados de erva estavam em fazendas pertencentes a políticos de evidência no Nor- deste”214. Aparentemente, o repórter teve acesso ao mencionado relatório pois deu informações

detalhadas nas notícias. Por exemplo, ele mencionou que um dos cultivos de maconha desco- berto em Santana do Ipanema pertencia ao então deputado alagoano Claudenor Lima e que outros cultivos se localizavam em propriedades pertencentes ao Coronel José Sabino. Cascudo também ressaltou que estava programada uma batida no Município de Águas Belas por conta de denúncias de plantios de maconha na propriedade Serra das Antas. No entanto, a diligência não ocorreu porque o prefeito do Município “e senhor absoluto de toda região, o coronel Adálio Tenório”, não permitiu o livre trânsito da equipe em suas propriedades. Fernando Luis Cascudo concluiu a série de reportagens enfatizando que o envolvimento dos políticos dificultava as ações das autoridades locais no combate aos plantadores. Por conta disso, os agentes teriam confidenciado ao repórter que a CNFE cogitava utilizar a Polícia Federal para destruir os plan- tios que estavam sendo descobertos. A possibilidade de uma ação federal na região parecia um evento tão incomum para a realidade local que até intitulou a matéria do dia 10 de setembro daquele ano.

Em bem menor número, o Diário Oficial do Estado de Alagoas também publicou notícias que apontavam o envolvimento de políticos locais com a agricultura de maconha. Con- tudo, dado o seu caráter oficial, o modo como essas notícias foram escritas guardam um certo distanciamento daquelas do Diário de Pernambuco. Por exemplo, no dia 18 de julho de 1961, o Diário Oficial do Estado de Alagoas reproduziu um telegrama, enviado pelo Delgado de Polícia do Município de Igreja Nova, Tenente Thenardi, para a Secretaria de Justiça e Segurança Pú- blica de Alagoas, informando que ele prendera o vice-prefeito do Município com 61 kg de maconha215. Dois meses depois, em 27 de setembro, outro telegrama desse jornal veiculou que o delegado da POLINTER, Rubens Quintella Cavalcante, prendera, por transportar dois sacos de maconha, os traficantes Isac Morais, Pedro Omena e João Virgílio, este último, presidente da Câmara dos Vereadores do Município de Dois Riachos, em Santana do Ipanema216. Em ge-

214 De acordo com as seguintes reportagens: Maconha sai de Pernambuco e Alagoas para o sul do Brasil e Países estrangeiros.

Diário de Pernambuco. 6 de setembro de 1957, p 1 e 18; No sertão alagoano, os maiores centros de cultura da “erva maldita” no Nordeste. Diário de Pernambuco. 7 e 8 de setembro de 1957, p 32; Forças Federais para destruir os campos de maconha do Nordeste. Diário de Pernambuco. 10 de setembro de 1957, p 24.

215 Polícia apreende maconha na cidade de Igreja Nova. Diário Oficial do Estado de Alagoas. 29 de julho de 1961. Nº 166. Sem página

216Preso em Santana do Ipanema traficantes de maconha do Sul do país: 2 sacos da “erva”. Diário Oficial do Estado de

ral, sem maiores detalhes, o Diário Oficial do Estado de Alagoas se limitava a reproduzir tele- gramas ou pequenas notas informativas sobre a questão.

Já na perspectiva do Diário de Pernambuco, os políticos do interior estavam tão envolvidos com o plantio de maconha que, para defender seus interesses, sempre que necessá- rio, impediam a polícia de continuar o trabalho de busca e de destruição das plantações. Do que a presente tese mapeou, o jornal utilizava três artifícios diferentes para defender seu ponto de vista quanto a isso. No primeiro deles, em geral fruto de um procedimento mais investigativo, o jornal costumava ser categórico em denunciar os envolvidos, inclusive fornecendo os nomes, e não poupava críticas, como no caso da série de três notícias do repórter Fernando Luis Cas- cudo. No segundo deles, supostamente com informação de terceiros, o jornal não explicitava uma crítica contundente, mas ressaltava as desavenças existentes entre os representantes da segurança pública e os políticos do interior, no que concernia ao combate de maconha. No mês de agosto de1960, por exemplo, o jornal publicou pelo menos 3 reportagens217 que relatavam

as diligencias do Tenente Alencar, e sua equipe de 40 agentes, no combate ao porte ilegal de armas, aos jogos de azar e à maconha, nos municípios pernambucanos próximos à fronteira com o Estado de Alagoas. Em particular, uma operação policial que já acontecia a mais de dois meses foi abruptamente encerrada antes da data prevista e por isso foi explorada pelo jornal:

Fonte bem informada, ligada ao tenente Alencar, disse-nos dos motivos que levaram o oficial a desistir das diligencias. É que em Bom Conse- lho, onde localizou vasto cultivo de maconha, iniciou a devastação da “erva maldita”. Sugiram as forças políticas para entravar seu trabalho. Na proporção que arrancava maconha mais crescia o ódio dos influentes políticos [...]. Não sendo homem para se curvar a interesses políticos, preferiu encerrar sua missão218.

Como é possível observar, nesse tipo de matéria, o Diário de Pernambuco represen- tava os políticos do interior como pessoas que utilizavam sua influência política em benefício próprio e que, quando se envolviam com os plantios ilícitos de maconha, eram capazes de rea- lizar ameaças para protegê-los. Por outro lado, o jornal costumava retratar os agentes de segu- rança pública como homens, em defesa da sociedade e do bem comum, que se indignavam com

217 Tais reportagens foram publicadas nas seguintes datas: 1º reportagem (Alencar Diz que não teme a morte no dever de reprimir o bandidismo. Diário de Pernambuco. 05/08/1961, p. 7); 2º reportagem (Alencar tem atribuições limitadas. Diário de Pernambuco. 9/08/1961, p; 7); 3º reportagem (Descontente na missão, Alencar arriou as armas e recolheu contingente militar. Diário de Pernambuco. 30/08/960, p, 9).

218 Descontente na missão, Alencar arriou as armas e recolheu contingente militar. Diário de Pernambuco. 30 de agosto de 1960. P. 9

a situação, mas que nem sempre tinham força para o enfrentamento. Em conjunto com a repor- tagem do excerto acima, o jornal divulgou uma foto do tenente Alencar. De cabeça baixa e pensativo, o tenente, de certa forma, evocava uma misto de reflexão e desolação, mas ao mesmo tempo de honestidade e resignação.

Já no terceiro artifício, em uma seção denominada Meridional, o jornal escrevia reportagens com base em notícias de outros jornais do Brasil e divulgava a opinião de pessoas públicas de fora do Estado de Pernambuco – opinião geralmente dada em entrevistas ou coleti- vas de imprensa. Esse tipo de publicação trazia uma “fala escolhida” daqueles que não partici- pavam diretamente do cotidiano dos pernambucanos e funcionava como uma espécie de “edi- torial” 219 à distância. Isso porque, ideologicamente, os discursos defendidos não se distancia- vam dos ideários do jornal. De certa forma, expressados por cidadãos de notoriedade, esses discursos representava uma estratégia do Diário de Pernambuco para reforçar uma opinião so- bre determinado tema dentro da sociedade pernambucana.

A maconha, evidentemente, era uma das temáticas da seção “Meridional”. No dia 19 de julho de 1957, o jornal divulgou aos seus leitores uma entrevista, realizada na cidade do Rio de Janeiro, com o coronel Luiz de Melo, então presidente da CNFE. Na ocasião, o coronel relacionou o cultivo de maconha com os políticos do Nordeste. O excerto abaixo reproduz parte dessa entrevista:

O Nordeste e o problema político do tráfico da maconha

Falando a reportagem, o cel. Luiz de Melo, presidente da Comissão Na- cional de Fiscalização de Entorpecentes, disse: “hoje em dia, no Brasil, antes de ser um problema policial ou de saúde pública, a maconha é um problema político. Sabe-se que grandes plantações nordestinas da “erva-maldita” estão nas mãos dos chefes políticos, delegados, prefeitos e elementos de prestígio, que lutam contra a polícia, dispondo, inclu- sive, de maiores recursos materiais. Dessa forma, entendo que a solução não está somente nas providências de caráter policial. Deverão ser to- madas providências inclusive pelo exército. Só assim é possível a des- truição total das plantações, concluiu220.

Outras falas de autoridades públicas veiculadas nessa seção também defendiam

219 Os termos que estão entre aspas foram empregados por Lilia M. Schwarcz em sua dissertação de mestrado (1986) na qual a autora analisou as representações dos escravos através das notícias e editoriais publicados pela imprensa paulista no final do século XIX. Para melhor apreender a forma como os brancos representavam os negros a autora também analisou notícias publicadas originalmente em outros periódicos da época e que ganhavam destaque em jornais paulistas como o Correio Pau- listano, A Província de São Paulo, a Redempção, Diário Popular, entre outros. Nesse aspecto, a pesquisa de Schwarcz também serviu como modelo de apoio metodológico para essa tese.

aproximadamente o mesmo ponto de vista. Por exemplo, José Araujo Silva, presidente da Co- missão de Entorpecentes do Estado de Alagoas, afirmou em uma coletiva de imprensa que não acreditava que os chefes políticos controlassem as plantações de maconha, porém defendia: “os coronéis do interior, acostumados a ser a sombra protetora de seus correligionários, apoiam os produtores de maconha quando eles, acossados pela polícia, lhes pedem proteção”221. Ou seja, ainda que não controlassem, esses coronéis eram no mínimo coniventes.

Independentemente da veracidade de todos os tipos de denúncia feitas pelo Diário de Pernambuco, aos poucos, as narrativas de envolvimento de políticos e coronéis com a agri- cultura de maconha se propalaram pela sociedade e se tornaram um tema de debate nas dife- rentes esferas. A própria classe política utilizava esse discurso sempre que necessário. Uma das justificativas do deputado Getúlio Moura apresentada no texto do projeto de Lei nº 3.295-65, já trabalhado no capítulo 3, para a permanência dos cultivos de maconha no campo era justamente porque, no Brasil, em especial no Nordeste, havia criminosa tolerância com os plantadores de maconha, protegidos pelo nefasto coronelismo que ainda imperava nos sertões222.

De modo geral, o Diário de Pernambuco apontava que esses chefes políticos atua- vam de dois jeitos: (1) cultivavam a maconha em suas terras ou (2) protegiam agricultores que plantavam maconha em suas terras. No primeiro, como mostrado nas reportagens do Luis Fer- nando Cascudo, os políticos envolvidos foram denunciados explicitamente como os responsá- veis pelo plantio e a produção de maconha. No segundo, eles participavam indiretamente, uma vez que permitiam os plantios em suas terras e até saiam em defesa de seus “correligionários” quando esses eram descobertos pelas autoridades de combate à maconha. A respeito dessa úl- tima forma de atuação, o jornal explicitava que muitas vezes isso ocorria porque havia uma certa relação de dependência entre o dono da terra e o plantador de maconha – o primeiro ne- cessitava de voto e de apoio da massa para se manter em postos de poder e o segundo necessi- tava de terra, proteção e favores políticos.

Além disso, o Diário de Pernambuco relacionava os políticos e proprietários envol- vidos na produção de maconha com um certo coronelismo. O emprego do termo “coronel” para caracterizar esses possíveis produtores, de certa forma, representava uma insatisfação do jornal com a classe política e proprietária de terras pernambucana e se configurava como um meio do jornal fazer clara oposição a essa classe, dada que nessas reportagens a utilização do referido termo era sempre empregada de forma depreciativa. Como o termo “coronel” suscitou e ainda suscita um amplo debate historiográfico, antes de seguir com a análise dos jornais, os próximos

221 Coronéis protegem plantadores, mas a polícia poderá reprimi-los. Diário de Pernambuco. 24 de outubro de 1958, p 20. 222 Conforme texto do Projeto de Lei nº 3.295 de 1965.

parágrafos fazem uma pequena digressão sobre o assunto.

Dentre os vários estudos que tratam especificamente sobre esse tema, “Corone- lismo, enxada e voto”, de Vitor Nunes Leal, traz que o coronelismo perdurou ao longo de toda a Primeira República (1889-1930), devido à falta de centralização do poder do Estado. Para esse autor, o coronelismo foi uma forma peculiar do poder privado de se adaptar à nova con- juntura socioeconômica e de manter seus interesses. Na prática, ocorria uma troca de proveitos entre o poder público – que começava a se fortalecer – e os chefes locais, muitos deles propri- etários de terra – que perdiam espaço frente a essa tentativa de centralização política. Esse pacto deu origem a um sistema baseado em uma trama de relações de poder que interligava os políti- cos locais (municípios), os governadores dos Estados e o presidente da República, de modo que esses três poderes formavam um sistema (LEAL, 2012).

Em sua análise, Vitor Nunes Leal parte da política praticada na esfera municipal e da estrutura agrária do período para mostrar como se articulava esse sistema político. No mu- nicípio, o coronel comandava uma massa populacional através de “voto de cabresto”. Essa força eleitoral, por sua vez, dava-lhe prestígio político e se somava à sua posição econômica já exis- tente. Em seu espaço de influência, o coronel tinha uma ampla jurisdição sobre seus dependen- tes, criando rixas e desavenças e proferindo, às vezes, verdadeiros arbitramentos, que os envol- vidos respeitavam. Também se concentrava em suas mãos, com ou sem caráter oficial, extensas funções policiais, que podiam ocorrer com o auxílio de empregados, capangas ou agregados. Em parte, seu poder resultava da sua qualidade de proprietário rural, uma vez que a grande massa humana que sobrevivia em suas terras vivia em extremo estado de pobreza, ignorância e abandono. Ou seja, comparada à situação dessa gente, o coronel era um homem rico (LEAL, 2012).

Embora Leal defenda que o coronelismo tenha sido um sistema que terminara em 1930, alguns autores defendem que determinados resquícios dessa estrutura sobreviveram a Revolução de 1930 e ao processo de redemocratização de 1945. Auxiliadora Ferraz de Sá (1974) e Maria Isaura Pereira de Queiroz (1969), por exemplo, analisaram as ações de alguns líderes políticos no interior do sertão pernambucano e interpretaram tais ações como a readap- tação e a permanência do coronelismo. De acordo com as autoras, mesmo em face dos menci- onados desdobramentos políticos, os “novos coronéis” procuravam manter uma rede de favores, alianças e compromissos políticos, em conjunto com a concentração da propriedade da terra e da centralização de toda uma rede de subordinados.

enquanto detentor de poder local, ainda estava bastante presente no sertão nordestino. Nas no- tícias, esse coronel representava proprietários de terra, políticos e “senhores absolutos” de cer- tas áreas sertanejas. De acordo com o jornal, nos casos associados à agricultura ilegal de maco- nha, essa figura desfrutava de tanto poder que era capaz de interferir nos processos de investi- gação, a tal ponto que as autoridades de segurança pública tinham dificuldades para realizar o combate aos plantios ilícitos em espaços de domínio de um coronel. Esse tratamento dado pelo jornal aos poderosos da maconha não é mero detalhe. Outras figuras que exerciam poder no campo pernambucano não usufruíam da mesma estatura pejorativa. Um contraexemplo emble- mático era o modo como o jornal abordava usineiros que cometiam crimes contra os trabalha- dores rurais, os quais lutavam por melhores condições de trabalho e de vida. Embora esses usineiros influenciassem a política local, comandassem seu exército particular de capangas e, muitas vezes, solucionassem desavenças por meio da morte do suposto inimigo, o Diário de Pernambuco não atacava esses senhores. Isso fica explicito pela forma como as notícias eram produzias. Nos casos em que trabalhadores eram violentados ou assassinados, por exemplo, o editor produzia uma matéria sobre um conflito no campo que resultou em morte. De modo geral, essas notícias não denunciavam os usineiros como responsáveis pelo ocorrido. Nas re- portagens, eles eram representados como vítimas de um suposto comunismo que se infiltrava no campo e, além disso, como vítimas de trabalhadores subversivos que se contrapunham a ordem e provocavam conflitos – geralmente resolvidos com excessos de violência e de morte (PORFÍRIO, 2015).

As notícias que relacionavam os coronéis e os políticos com a produção de maconha diminuíram consideravelmente no final da década de 1960 e praticamente desapareceram ao longo da década de 1970 – nesta última, inclusive, apenas duas notícias desse tipo foram cata- logadas223. Essa mudança é percebida já em uma reportagem de 16 de julho de 1967, publicada no terceiro caderno do Diário de Pernambuco. Os “políticos e coronéis” de antes deram lugar a expressões imprecisas, como “forças ocultas”, que despersonalizavam e dificultavam a identi- ficação de pessoas influentes, como exemplificado no excerto abaixo:

223 A primeira data de 11 de dezembro de 1973. Nela o Diário informava que policiais do Setor de Repressão ao Tóxico, da