Capítulo 6. Manejo da água e erosão do solo
6.3 Desafios da agricultura conservacionista para o aprimoramento do manejo da água
6.3.3 Terraceamento e a otimização da performance da agricultura conservacionista
Como exposto, a prática do terrraceamento agrícola contempla o quarto princípio da conservação do solo. Dentro dos estudos do grupo de pesquisa (Figura 6.4) pelo monitoramento de 31 eventos de chuva, em que o escoamento foi evidenciado nas bacias pareadas com e sem terraço (Figura 6.7), a prática do terraceamento indicou uma redução de 71% no escoamento superficial (LONDERO et al., 2017), o que demonstra o sucesso dessa prática como quarto princípio da conservação do solo.
Como na agricultura de sequeiro, o solo é utilizado como reservatório natural de água para as plantas, o seu recarregamento para criar condições de umidade na zona radicular das culturas será dependente da infiltração da água da chuva.
A redução do escoamento superficial, na bacia com a prática mecânica de terraceamento, incrementou o recarregamento de água disponível na camada de 0 a 1,5 m,
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CAPÍTULO 6. MANEJO DA ÁGUA E EROSÃO DO SOLOdurante o ciclo das culturas da soja e do milho em 13,7 e 7,8%, respectivamente. Além disso, no acompanhamento do desempenho produtivo dessas culturas, evidenciou-se um incremento da produtividade de grãos de 13 e 9%, para as culturas da soja e milho, respectivamente, aumentando a sustentabilidade nesse sistema de manejo (Figura 6.8).
Dessa forma, demonstra-se a possibilidade de que uma grande quebra de paradigma no meio rural mostra que o pensamento “produtivista” caminha em lado oposto ao pensamento “ambientalista”. Na verdade, seguir os princípios da conservação do solo e da água, por uma agricultura conservacionista, além da preservação dos recursos (solo), ambiente (recursos hídricos), vai proporcionar ao campo maior estabilidade e rentabilidade das atividades agrícolas.
FIGURA 6.7 Visão geral das bacias pareadas de ordem zero manejadas sobre Plantio Direto com e sem a prática do terraceamento e uma representação da dinâmica do escoamento superficial nas bacias num evento de chuva de grande magnitude.
CAPÍTULO 6. MANEJO DA ÁGUA E EROSÃO DO SOLO
6.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Manejar a água e compreender a dinâmica dos processos que envolvem a erosão e a degradação dos solos são essenciais para o aprimoramento de estratégias que incrementem a produtividade das culturas em equilíbrio com a sustentabilidade do ambiente. Para isso, enfatiza-se a importância da utilização dos quatro princípios da conservação do solo como norteadores na definição das estratégias de manejo de solo, planta e água. Nos estudos de monitoramento de perdas de água e solo, na escala de encosta agrícola, demonstramos a importância da rotação de culturas e da intensificação das plantas de cobertura ao aprimoramento da performance do Plantio Direto, como prática de conservação do solo, tornando-o, de fato, Sistema
FIGURA 6.8 Produtividade média de grãos de soja e de milho nas bacias pareadas com (CT) e sem (ST) a prática do terraceamento e o recarregamento médio de água disponível durante todo o ciclo de cada cultura.
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CAPÍTULO 6. MANEJO DA ÁGUA E EROSÃO DO SOLOde Plantio Direto. Além disso, evidencia-se que o uso do terraceamento é essencial à redução do escoamento superficial, possibilitando incrementos no recarregamento de água disponível na camada de enraizamento e a otimização da produtividade das culturas.
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CAPÍTULO 7
CONTAMINAÇÃO DA ÁGUA E DO
SOLO POR RESÍDUOS UTILIZADOS
NA AGRICULTURA
Tales Tiecher1
Tadeu Luis Tiecher2
1Professor do Departamento de Solos da Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Interdisciplinary
Research Group on Environmental Biogeochemistry (IRGEB), Porto Alegre – RS
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CAPÍTULO 7. CONTAMINAÇÃO DA ÁGUA E DO SOLO POR RESÍDUOS UTILIZADOS NA AGRICULTURA7.1 INTRODUÇÃO
O crescimento populacional tem aumentado a demanda mundial por alimentos que pode ser alcançada de duas formas: a) pelo aumento da área de produção agropecuária; e/ ou b) pela intensificação dos atuais sistemas de produção para produzir mais alimentos e fibras por unidade de área. Embora a expansão agrícola, em muitos países ou regiões, já não seja mais possível, em algumas regiões do Brasil a expansão de área agrícola ainda pode ser alcançada. Contudo a diminuição de florestas e outros recursos naturais em detrimento dessa expansão tem causado questionamentos e debates, nas mais diversas esferas da sociedade, pois pode gerar impactos ambientais irreversíveis.
A conversão de áreas naturais em sistemas agrícolas necessita de grande quantidade de fertilizantes e corretivos, especialmente, em solos com baixa fertilidade natural, como a maioria dos solos tropicais e subtropicais fortemente intemperizados. Além disso, a intensificação dos sistemas de produção agropecuários também aumenta a exportação de nutrientes do solo e a necessidade de insumos externos para, pelo menos, repor os nutrientes exportados via grãos, carne ou fibras.
Nas próximas décadas, aliada às restrições das duas vias possíveis de aumento da produção de alimentos, está a previsão da escassez iminente das reservas minerais de alguns nutrientes essenciais para as plantas, especialmente o fósforo (ASHLEY; CORDELL; MAVINIC, 2011; CORDELL; DRANGERT; WHITE, 2009), o que tem forçado a busca de fontes alternativas de fertilizantes. Nesse cenário, o uso de resíduos na agricultura tem recebido atenção especial e maior, nas últimas décadas, pois é uma alternativa interessante visando à reutilização de nutrientes em sistemas de produção de alimentos mais sustentáveis.
Os resíduos, como os dejetos animais (bovinos, suínos e aves), resíduos urbanos (composto de lixo e lodos de estação de tratamento de esgoto) e resíduos industriais, possuem composição e características químicas que podem ser interessantes do ponto de vista agronômico, pois possuem potencial fertilizante (fonte de nutrientes) e, em alguns casos, potencial corretivo da acidez do solo. Todavia o solo, muitas vezes, tem sido utilizado como simples meio de descarte desses resíduos. Além disso, o uso indiscriminado desses resíduos, sem estimar a sua composição e as características físico-químicas do solo, pode resultar em contaminação do solo e da água com nutrientes, metais pesados, patógenos e outros
CAPÍTULO 7. CONTAMINAÇÃO DA ÁGUA E DO SOLO POR RESÍDUOS UTILIZADOS NA AGRICULTURA
compostos orgânicos. Dada a importância deste tópico, neste capítulo, serão apresentadas as propriedades do solo que afetam a dinâmica de contaminantes, presentes em resíduos utilizados na agricultura, os principais contaminantes presentes nestes resíduos e alguns aspectos relacionados com a fitorremediação e recuperação de áreas contaminadas, com o intuito de preservar a qualidade da água e do solo.