• Nenhum resultado encontrado

Tese de Giovanni Balbi

No documento Da obrigação propter rem (páginas 57-60)

Capítulo I – Situação jurídica propter rem

3. Obrigação propter rem em perspectiva doutrinária

3.1. Tese de Giovanni Balbi

A obra de G. BALBI acerca da obrigação propter rem140 pode ser

considerada paradigmática por ter rompido com o que até então se compreendia como pressuposto da obrigação propter rem141.

Antes de conceituar a obrigação propter rem, à qual dá o nome, no mais das vezes, de obrigação real, G. BALBI exclui da categoria uma série de situações jurídicas

qualificadas tradicionalmente como tal142.

adotado foi o da maior ou menor profundidade com que o tema foi abordado a ensejo do tratamento de algum outro tema central, pois até onde se tem notícia não houve publicação de trabalho monográfico nacional que versasse exclusivamente sobre o objeto desta dissertação.

140 Cf. Le obbligazioni propter rem, Torino, Giappichelli, 1950.

141 J. O. ASCENSÃO diz que coube a G. BALBI afastar a opinião de GROSSO e BRANCA, até então

incontestada, de que a obrigação propter rem teria por pressuposto o conflito de direitos reais incidentes sobre a mesma coisa. Cf. As Relações cit. (nota 9.supra), p. 102.

142 Na Parte II desta dissertação, no item destinado à diferenciação da obrigação propter rem de figuras a

ela assemelhadas, analisar-se-ão as categorias jurídicas excluídas do conceito por G. BALBI, razão pela qual deixa-se de fazê-lo aqui.

58

O autor propõe, assim, a seguinte conceituação: “ tem-se obrigação real quando é sujeito devedor qualquer pessoa que seja titular de um dado direito real de gozo, pelo que, extinto ou transmitido tal direito real, extingue-se ou, transmite-se, ao mesmo tempo, a qualidade de devedor143”. O capítulo III de sua obra, no qual se encontra esta conceituação, é integralmente dedicado à sua explicitação e justificação.

Começa por dizer que a obrigação é tida por propter rem quando seu devedor é determinado por meio da identificação do titular de um direito real de gozo sobre a coisa a que se refere o comportamento deste devedor144. Adverte que a qualificação de real, ob rem ou propter rem não se refere à realidade em sentido técnico, o que promete demonstrar ao longo de seu estudo. Diz que todas as vezes em que a relação é real, ou seja, sempre que ostentar a característica da absoluteza – a qual identifica com a oponibilidade

erga omnes-, não haverá obrigação propter rem.

Afirma haver certa contradição no fato de um direito subjetivo implicar um dever, e estatuí que, para evitar tal contradição, o cumprimento do dever não pode esvaziar a utilidade do direito real. Disso decorre que o comportamento devido não é qualquer um, mas apenas aquele justificado à luz do exercício do direito real que o ensejou145.

Como consequência desta conexão entre conteúdo do direito subjetivo real e comportamento devido, G. BALBI ensina que se infere o caráter acessório da obrigação propter rem, advertindo, porém, que o termo acessório não é preciso pelo fato de um dever não poder ser acessório de um direto. O que quer consignar é que as vicissitudes do direito real repercutem na obrigação propter rem, por exemplo, a sucessão no direito real, seja a título universal, seja a título particular, faz com que o o novo titular deste direito passe a ser obrigado ob rem ou, caso haja fracionamento do direito de propriedade, como com a instituição de usufruto, a obrigação propter rem modifica-se: ambos, nu- proprietário e usufrutuário poderão ser devedores ob rem, ou, somente o será o usufrutuário, se efetivamente estiver gozando do direito sobre a coisa. Finalmente, assevera G. BALBI,

extinto o direito real, extinta estará a obrigação propter rem146.

143 Le obbligazioni cit. (nota 140.supra), p. 117. 144 Le obbligazioni cit. (nota 140.supra), p. 117.

145 Cf. G. BALBI, Le obbligazioni cit. (nota 140.supra), p. 119. 146 Le obbligazioni cit. (nota 140.supra), pp. 120-121.

59

A maior contribuição de G. BALBI sobre o tema da obrigação propter rem,

no entanto, consistiu em aclarar a questão da sucessão no direito subjetivo real e na obrigação propter rem. O autor demonstrou que só é correto falar em sucessão na obrigação propter rem em razão da sucessão no direito real quando, antes da transmissão deste, a obrigação propter rem já era exigível, pois que, diferentemente do que afirmava a doutrina até então, após a transmissão do direito real, poderão surgir novas obrigações

propter rem a cargo do agora titular do direito real, sendo inexato fazer menção à sucessão relativamente a elas147.

Segundo se pensa, esta clarificação realizada por G. BALBI sobre o

momento quando é próprio falar-se em sucessão na obrigação propter rem trouxe avanço significativo ao tema, razão pela qual sua obra deve ser considerada paradigmática.

Com relação ao chamado abandono liberatório, G. BALBI só reconhece algumas poucas exceções ao seu exercício, são elas: (i) não será admitido o abandono quando o devedor propter rem haja realizado fatos os quais impliquem sua responsabilidade pelo adimplemento, pois, agora, o pagamento não é mais unicamente vinculado ao direito real, mas também a estes fatos. Exemplifica, dizendo que o co- proprietário de um muro não pode renunciar à sua parte para liberar-se do dever de repará- lo se a necessidade de reparo surgiu de ato seu; (ii) não será admitido o abandono se os condôminos em condomínio voluntário obrigaram-se a manter a indivisão por certo período. Neste caso, só será admitido o abandono após este período; (iii) não será admitido o abandono se o devedor ob rem comprometeu-se a adimplir o débito independentemente de sua qualidade de titular do direito real a ele der causa; (iv) finalmente, não se admite o abandono quando o exercício do direito real que deveria ser objeto do abandono é, por sua vez, conexo ao exercício de outro direito, a não ser que se renuncie, também, a este último. Diz que o condômino em condomínio edilício não pode renunciar à propriedade da fração ideal sobre a coisa comum para livrar-se do dever de contribuir com as despesas de conservação sem renunciar à propriedade sobre a unidade autônoma148.

147 Le obbligazioni cit. (nota 140.supra), pp. 139 e ss. 148 Le obbligazioni cit. (nota 140.supra), pp.198-200.

60

Finalmente, entende que, pelo abandono, o devedor propter rem libera-se não só das prestações por vencer, como também das já vencidas149.

No documento Da obrigação propter rem (páginas 57-60)