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Testes Baseados na Detecção da Atividade Enzimática

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.5. Metodologias Aplicadas à Detecção de Carbapenemases

2.5.5. Testes Baseados na Detecção da Atividade Enzimática

Os testes baseados na detecção da atividade enzimática são considerados referência entre os testes fenotípicos. São capazes de detectar novas enzimas ou variantes que apresentem o perfil cinético procurado, por exemplo, de carbapenemase, utilizando-se o respectivo substrato. Podem ainda ser associados aos inibidores de β-lactamases para a determinação de sua classe molecular. O primeiro teste disponível foi a espectrofotometria. Mais recentemente, a espectrometria de massa e a detecção da atividade enzimática pela colorimetria foram propostas.

2.5.5.1. Testes Colorimétricos (Carba NP, CarbAcineto NP e Blue-Carba)

O teste CarbaNP basea-se na detecção bioquímica da atividade enzimática contra imipenem, através da mudança de pH gerada pela reação de hidrólise do anel β-lactâmico e seguida da visualização colorimétrica, utilizando-se o indicador de pH vermelho-fenol (Nordmann et al., 2012). O teste apresentou elevada sensibilidade e especificidade para detecção de

carbapenemase em P. aeruginosa (94% e 100%, respectivamente) e enterobactérias (100%),

não apresentando resultados falso-positivos para a combinação de impermeabilidade de

membrana externa com a produção de ESβL ou AmpC (Dortet et al. 2012, Nordmann et al.,

2012). Entretanto, o teste falhou na detecção de variantes da família GES e OXA-48,

possivelmente pela baixa atividade de carbapenemase destas enzimas (Dortet et al., 2012; Tijet

et al., 2013). Tijet e colaboradores (2014) observaram dois resultados falso-negativos, uma P. rettgeri produtora de NDM-1 e um P. mirabilis produtor de IMP-27, quando este teste foi empregado. Os autores atribuiram estes resutados ao fenótipo mucóide da primeira e a

formação do chamado véu da segunda cepa, com consequente lise celular incompleta (Tijet et

Com o objetivo de superar as dificuldades na detecção de CHDLs, Dortet e colaboradores (2014) aprimoraram o teste Carba NP com modificações no inóculo bacteriano e na solução de lise, chamando o de CarbAcineto NP. Importante ressaltar que as colônias

utilizadas para os testes foram cultivadas por uma noite em tryptic soy agar (TSB) (Dortet et al.,

2014). Neste estudo, os autores reportaram a detecção de todos os isolados produtores de CHDLs, com exceção de três isolados apresentando resistência aos carbapenens em

decorrência da hiperexpressão da enzima OXA-51 pela presença da ISAba1 a montante do gene

blaOXA-51, além de oito isolados produtores de carbapenemases do tipo GES (GES-11 e GES-14).

A vantagem deste teste é a possibilidade de se obter um resultado em duas horas e a simplicidade de sua execução, pois não requer o uso de equipamentos. Este teste será recomendado para detecção rápida de carbapenemases no próximo documento do CLSI em 2015 e futuramente terá um kit comercialmente disponibilizado pela bioMérieux.

Uma modificação no teste CarbaNP foi proposta recentemente por Pires e colaboradores (2013). A vantagem deste em relação ao CarbaNP é a possibilidade de detecção da atividade de carbapenemase diretamente da colônia bacteriana, sem a necessidade de lise celular. Segundo os autores, esta modificação foi alcançada pela substituição do indicador vermelho-fenol pelo azul de bromotimol, com pH ótimo variando de 6,0 a 7,6 o que possibilita a melhor atividade

enzimática das carbapenemases (pH 6,8) (Pires et al., 2013). Entretanto, uma maior variação

das possíveis colorações do teste negativo e positivo pode ser um fator de dificuldade na prática, de azul para amarelo, de verde para amarelo ou ainda de azul para verde, respectivamente. O teste apresentou 100% de sensibilidade e especificidade para carbapenemases das classes A, B e D, revelando o resultado entre 30 minutos e 2 horas, entretanto nenhuma variante de GES foi testada (Pires et al., 2013).

2.5.5.2. Espectrofotometria

Este método é utilizado para a detecção da atividade hidrolítica de diversos substratos, inclusive carbapenens, utilizando a luz ultravioleta em comprimentos de ondas específicos para cada substrato, em um equipamento de espectrofotometria. O teste, utilizado nos laboratórios de referência, é capaz de detectar e quantificar a velocidade da reação de hidrólise. Entretanto, é um método trabalhoso, que requer o crescimento bacteriano em meio líquido por 16 a 20 horas, a extração do conteúdo proteico e visualização em tempo real da curva de hidrólise após mistura com o substrato. Bernabeu e colaboradores (2012) reportaram 100% de sensibilidade e 98,5%

de especificidade para detecção de carbapenemases (Bernabeu et al., 2012). Porém, isolados

produtores de carbapenemase com baixa atividade hidrolítica podem não ser detectados a não ser que intensos inóculos sejam utilizados e maiores períodos de avaliação sejam utilizados (Queenan & Bush, 2007).

2.5.5.3. Espectrometria de Massa - MALDI-TOF MS

A espectrometria de massa através da técnica de MALDI-TOF MS foi inicialmente utilizada para a detecção da atividade enzimática de carbapenemases por dois pesquisadores

europeus, concomitantemente (Hrábak et al., 2011; Burckhardt & Zimmermann, 2011). O

princípio do teste baseia-se na detecção dos produtos de degradação do antimicrobiano em questão e do desaparecimento de sua molécula íntegra após a incubação com bactérias produtoras de carbapenemase. A metodologia requer que esta solução, depositada em superfície sólida, seja misturada a uma matriz, que confere carga às moléculas do antimicrobiano presentes na amostra e as cristalizam. Estas, através da incidência do laser, sofrem um processo de dessorção, ou seja, desprendimento da superfície onde se encontram e adentram um campo elétrico a vácuo, onde um detector no final do campo negativo atrairá as moléculas ionizadas positivamente (Fenselau & Demirev, 2001). Estas migraram pelo campo

elétrico até alcançarem o detector, com velocidades inversamente proporcionais às suas massas (tempo de vôo). Todo este processo ocorre de forma muito rápida, em menos de 1 minuto por amostra.

A calibração prévia com moléculas de massas conhecidas na faixa de detecção da amostra em questão é necessária para que o equipamento converta o tempo de vôo adquirido pelo detector em picos no espectro de massa/íon (m/z) correspondente (Fenselau & Demirev, 2001). Outros importantes fatores relacionados à técnica são: (i) a capacidade das moléculas presentes na amostra em adquirir cargas elétricas, pois moléculas com maior capacidade terão maior chance de dessorção e alcançarão o detector em maior quantidade resultando em pico de

maior intensidade, sendo importante a razão entre amostra e matriz; (ii) a quantidade de amostra

presente; (iii) a intensidade e a frequência do laser empregada sobre a amostra, o que

relaciona-se também com a capacidade e frequência com que as moléculas alcançarão o detector; (iv) o

ajuste do intervalo de valores de m/z utilizado para a obtenção do espectro; e, (v) a automação

da aquisição do espectro através de software, que torna o espectro obtido menos subjetivo (Fenselau & Demirev, 2001). Portanto, todos estes fatores podem interferir na qualidade da aquisição dos espectros e impedem a quantificação direta de cada pico presente na amostra por esta metodologia.

Apesar do espectro fornecer uma intensidade do pico, é importante ressaltar que esta intensidade é relativa aos demais picos presentes na mesma amostra. Portanto, não é uma técnica quantitativa, e sim qualitativa, sendo que os critérios adotados até a presente data para categorizar os resultados em positivos ou negativos baseiam-se na presença ou ausência de

determinados picos de massa esperados (Hrábak et al., 2014). A técnica requer ainda a

expertise na interpretação dos resultados, uma vez que o conhecimento prévio das massas das

moléculas intactas, de seus aditivos em solução (moléculas de Na+, K+ e/ou H+), e dos produtos

(Zboromyrska et al., 2014). As empresas, fabricantes dos equipamentos atualmente disponíveis, estão desenvolvendo uma programação que permita a identificação automática da atividade enzimática para facilitar a sua implantação nos laboratórios de rotina.

As vantagens desta metodologia são: (i) a rapidez com que o teste fornece um

resultado. O tempo requerido refere-se ao período de incubação das amostras com a solução contendo o antimicrobiano para que a reação ocorra, este tempo é dependente da capacidade da enzima em hidrolizar o substrato, da quantidade do inóculo e da concentração do

antimicrobiano adicionado; (ii) a capacidade de detectar qualquer enzima que apresente

capacidade de hidrolisar o substrato, seja esta conhecida ou não; e, (iii) uma vez adquirido o

equipamento, o teste para detecção de carbapenemase requer poucos insumos e de baixo custo (Kostrzewa et al., 2013). Entre suas limitações, pode-se citar: (i) a incapacidade do teste de identificar a enzima presente, porém, esta limitação pode ser superada, em parte, pela a adição

de inibidores específicos, resultando na classificação desta enzima quanto à sua classe; (ii) a

necessidade de profissionais capacitados para interpretação dos resultados, fator que deve ser

superado no futuro próximo, com a automação da análise e interpretação dos resultados; e (iii) a

realização apenas em laboratório que disponha do equipamento de MALDI-TOF MS (Kostrzewa et al., 2013).

A acurácia desta metodologia foi avaliada por Burckhardt e Zimmermann (2011) para detecção de carbapenemases utilizando um ensaio com ertapenem. Neste, uma alça bacteriológica de 10 µL contendo as colônias bacterianas crescidas por uma noite em ágar sangue foi adicionada a 1 mL de solução de NaCl 0,45%, com ou sem 0,5 g/L de ertapenem. A

mistura foi então incubada a 36°C por até 2 horas e meia. A solução foi centrifugada e analisada

no equipamento de MALDI-TOF MS após adição da matriz (HCCA). Os autores detectaram a atividade de carbapenemase em todos os isolados testados (n=47), os quais consistiam em

IMP-2, KPC-2, VIM-1 e VIM-2). O tempo de incubação para a detecção de diferentes enzimas variou de 1 hora para IMP-1 e NDM-1, 1 hora de meia para IMP-2, KPC-2 e VIM-1, e de 2 horas e meia para VIM-2 (Burckhardt & Zimmermann, 2011).

No mesmo período, Hrábak e colaboradores (2011) avaliaram a acurácia da metodologia, agora empregando como substrato o meropenem. Os resultados obtidos no MALDI-TOF MS foram comparados àqueles obtidos por espectrofotometria. A solução na qual foi diluida o meropenem, Tris-HCl 20 mM com pH 6,8, diferiu daquela utilizada pelo estudo anterior, assim como o calibrante. Neste estudo o pico correspondente ao próprio meropenem foi utilizado como calibrante, enquanto que no primeiro estudo, os picos conhecidos da matriz HCCA foram utilizados com este propósito. Outras diferenças foram o meio de crescimento bacteriano previamente a execução do teste, que neste estudo foi o Müeller-Hinton ágar, o inóculo bacteriano, escala 8 de MacFarland, a matriz utilizada, ácido 2,5-dihidroxi-benzóico (DHT), e o tempo de incubação de 3 horas. Excelentes resultados foram obtidos (97% de especificidade e 98% de sensibilidade) quando foram testados 14 isolados de P. aeruginosa e 16 isolados de diferentes espécies de enterobactérias, sendo todos produtores de carbapenemases (VIM, IMP,

NDM-1 e KPC-2). Apenas um resultado falso-negativo foi observado em P. aeruginosa produtora

de VIM-2 e dois resultados falso-positivos em P. aeruginosa resistente a carbapenem. Segundo

os autores, não foi possível a visualização do pico correspondente à molécula do meropenem

degradado (Hrábak et al., 2011). Frente a estes únicos estudos publicados, com inúmeras

variações metodológicas entre si, iniciamos a padronização do teste para a detecção de carbapenemase com isolados produtores de enzimas não antes testadas pelos estudos apresentados. Adicionalmente, a padronização de um protocolo para identificação precoce de micro-organismos causadores de ICS, e que permitisse a detecção de atividade de carbapenemase diretamente do frasco de hemocultura foi o segundo objetivo deste estudo.