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4. DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE

5.1 Tipo de Pesquisa

Numa pesquisa científica o método se caracteriza pela escolha de procedimentos sistemáticos que possibilitam a descrição e a explicação de fenômenos. Essa escolha determina o planejamento e a organização da coleta de dados, bem como direciona a análise dos mesmos. De acordo com Lakatos e Marconi (1992, p. 40-41):

O método é o conjunto de atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e verdadeiros -, trançando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista.

Há duas grandes classificações de métodos: o quantitativo e o qualitativo. O primeiro é caracterizado pela quantificação dos dados e pelo tratamento dos mesmos por meio de técnicas estatísticas. O método qualitativo busca descrever a complexidade de um fenômeno, ampliando o conhecimento sobre o mesmo e preocupa-se com os participantes da pesquisa, considerando os contextos em que estão inseridos.

Para Gil (2008), a pesquisa exploratória objetiva desenvolver conceitos esclarecendo-os e modificando-os, de maneira a proporcionar uma compreensão mais ampla e mais precisa em torno dos fenômenos investigados, enquanto a pesquisa descritiva busca estudar as características de uma população ou fenômeno específico, verificando possíveis correlações entre variáveis.

A escolha do método de uma pesquisa depende da natureza e da complexidade do objeto de estudo. Neste trabalho a pesquisa é exploratória e descritiva, com abordagem qualitativa, tendo em vista que o foco de atenção se concentra nos gestores participantes da pesquisa e nas suas próprias considerações sobre os fatos ocorridos em suas trajetórias de vida.

5.1 Tipo de Pesquisa

Escolheu-se para este trabalho a abordagem biográfico-narrativa, tendo em vista tratar-se de uma pesquisa sobre as trajetórias profissionais de gestores escolares. O uso dessa abordagem possibilita a obtenção de narrativas das trajetórias de vida, narradas pelos gestores, e interpretadas em conjunto pelo

pesquisador e sujeitos da pesquisa. No caso em tela possibilita compreender os fatores marcantes ou incidentes críticos, identificados nas trajetórias profissionais de gestores escolares.

Segundo Nóvoa (1995, p. 116-117):

Esta abordagem permite compreender de um modo global e dinâmico as interações que foram acontecendo entre as diversas dimensões de uma vida. Só uma história de vida permite captar o modo como cada pessoa, permanecendo ela própria, se transforma. Só uma história de vida põe em evidência o modo como cada pessoa mobiliza os seus conhecimentos, os seus valores, as suas energias, para ir dando forma a sua, num diálogo com os seus contextos. Numa história de vida podem identificar-se as continuidades e as rupturas, as coincidências no tempo e no espaço, as “transferências” de preocupações e de interesses, os quadros de referência presentes nos vários espaços do quotidiano.

Na história de vida, a narrativa do sujeito retrata não apenas a sequência e cronologia dos fatos, mas os sentimentos que permeiam as diferentes fases de seu percurso, possibilitando ao pesquisador uma imersão nas percepções do pesquisado. Conforme Denzin (1970, apud SPINDOLA; SANTOS, 2003, p. 121):

O termo História de Vida, traduzido de historie (em francês) e de story e history (em inglês), tem significados distintos. O sociólogo americano Denzin propôs, em 1970, a distinção das terminologias: life story (a estória ou o relato de vida) é aquela que designa a história de vida contada pela pessoa que a vivenciou. Nesse caso, o pesquisador não confirma a autenticidade dos fatos, pois o importante é o ponto de vista de quem está narrando. Quanto à life history (ou estudo de caso clínico), compreende o estudo aprofundado da vida de um indivíduo ou grupos de indivíduos. Inclui, além da própria narrativa de vida, todos os documentos que possam ser consultados [...]. Assim, a história de vida trabalha com a estória ou o relato de vida, ou seja, a história contada por quem a vivenciou.

Por outro lado, além dos aspectos positivos para a pesquisa, cabe acrescentar que narrar faz parte da vida. Tanto em situações pessoais como profissionais, a narração está sempre presente, seja para explicar um fato, expressar uma opinião ou sentimento. À medida que um sujeito passa a narrar sua trajetória, passa também a refletir sobre ela e, nesse sentido, a utilização da abordagem biográfica permite ao sujeito pesquisado vivenciar um processo de autoconhecimento.

Desse modo, o método biográfico-narrativo pode se constituir num caminho para a compreensão das trajetórias percorridas por gestores escolares em seus diferentes processos de formação pessoal e profissional. Esta perspectiva torna possível compreender os modos como os gestores dão sentido ao seu trabalho e

atuam em seu cotidiano, permitindo também trazer à tona as experiências passadas que influenciam as situações atuais de forma desejável ou não (BOLIVAR, 2002).

Dessa forma, a análise da trajetória de vida de um indivíduo permite compreender os percursos por ele percorridos, considerando-se uma série de fatores como as diferentes fases cronológicas, os diferentes contextos sociais e históricos, bem como os ciclos de vida profissional. Portanto, cada indivíduo tem uma trajetória ímpar, composta por fatores pessoais e profissionais.

No caso dos profissionais que exercem a gestão escolar, objeto dessa pesquisa, a trajetória profissional pode ser marcada por diversos fatores desde o seu primeiro contato com o letramento. As impressões e valores que os membros de sua família atribuem à educação formal, bem como as condições favoráveis ou não ao seu ingresso e prosseguimento nos estudos podem influenciar, muitas vezes, sua percepção acerca do assunto. Neste sentido, a “educação familiar e escolar

estariam longe de ter apenas um valor instrumental, ou seja, ser a aquisição de aprendizagens úteis. Elas exerceriam sobretudo uma influência total na

personalidade dos indivíduos” (SETTON, 2005, p. 338).

A incursão no mundo letrado através do ingresso na educação formal, por outro lado, também é capaz de oportunizar experiências positivas ou negativas que, na maioria das vezes se fazem presentes nas narrativas dos gestores, ao descreverem suas trajetórias. Desta forma, o docente, ao iniciar a sua trajetória profissional de fato, já carrega consigo experiências, emoções, alegrias, decepções e outros sentimentos que reuniu ao longo de vários anos, que se somarão às diferentes vivências que acumulará durante o exercício profissional. Cada uma das experiências vivida, refletida e reformulada também de maneiras diferentes, em conformidade com a identidade do indivíduo.

O percurso profissional de cada professor é o resultado da ação conjugada de três processos de desenvolvimento: processo de crescimento individual, em termos de capacidades, personalidade e capacidade pessoal de interação com o meio; processo de aquisição e aperfeiçoamento de competências de eficácia no ensino e de organização do processo de ensino-aprendizagem; e processo de socialização profissional, em termos normativos ou de adaptação ao grupo profissional a que pertence e à escola onde trabalha, e interativos, pela reciprocidade de influências que estabelece entre si próprio e o meio em que desenvolve o seu múnus. (GONÇALVES, 1995, p. 147)

Desta forma, os gestores escolares, ao ascenderem na carreira, iniciando o percurso no campo da gestão, não se configuram meramente como agentes administrativos, mas como professores que são, trazem as experiências tanto da vida pessoal, como também da sua atuação como docente. Assim, ao desempenhar as funções de coordenação pedagógica, vice-direção ou direção de escola, seu campo de visão tende a se ampliar, haja vista a necessidade de assumir responsabilidades cada vez mais desafiadoras. E, retomando as Retomando as postulações de Tardif e Raymond (2000), na prática, a pluralidade e heterogeneidade dos saberes profissionais favorecem o enfrentamento desses desafios, no momento em que trazem à tona conhecimentos experienciais.

Nesta perspectiva, compreender como os incidentes críticos influenciam no desenvolvimento profissional dos gestores escolares, pressupõe a análise de sua trajetória também como docente.

Ao estudar a trajetória de vida dos gestores desde as suas experiências docentes através de seus próprios relatos, pode-se compreender o percurso por eles percorridos e analisar os acontecimentos que os marcaram significativamente. Esses eventos significativos são denominados “incidentes críticos”.

Bolívar (2002) descreve incidentes críticos como sendo eventos na vida individual que são selecionados em função da atribuição de um impacto em direções particulares. O autor também se refere a esse tipo de evento como “acontecimento biográfico”, ou seja, acontecimento cuja ocorrência nas trajetórias de vida “assinala

uma ruptura, é importante e significativo, referido a crises ou eventos críticos que

deram lugar a mudanças de rumo no curso da vida” (BOLÍVAR, 2002, p. 189).

Nesse sentido, Sá (2004, p. 96) afirma que os incidentes críticos:

Constituem situações imprevistas. Tais incidentes poderiam ser comparados a uma categoria presente no estudo do envelhecimento humano ao longo da vida – as variáveis ou eventos não-normativos, traduzidos pelos acontecimentos biológicos, culturais e ambientais, cuja ocorrência não é previsível e não tem caráter universal, como, por exemplo, o divórcio, os acidentes, as doenças.

Na mesma perspectiva de Bolívar (2002) e Sá (2004), Almeida (2009, p. 196) ressalta que “os acontecimentos são considerados relevantes (incidentes críticos)

somente quando os sujeitos os apontam como tal”. Considerando as suas

contribuições para o desenvolvimento do indivíduo, a autora defende que os incidentes críticos considerados como crises, rupturas e provocadores de mudanças

de rumo possibilitam aos professores identificarem tais ocorrências em suas trajetórias profissionais, auxiliando-os a chegar a uma maior compreensão das decisões tomadas em função da vivência de situações – planejadas ou não – nas referidas trajetórias, bem como a uma reflexão sobre sua formação e atuação (ALMEIDA, 2009).

Para Huberman (1995), em pesquisas de abordagem qualitativa, são os respondentes que identificam os acontecimentos sociais, os contextos ou períodos que exerceram certa influência, mesmo que estes fatores estejam ausentes ou sejam diferentes para outros grupos.

A reflexão e análise realizada pelo próprio entrevistado sobre o seu relato, trazem as situações que podem ser elencadas como incidentes críticos, sendo identificadas com referências positivas ou negativas. Desta forma, a análise dos relatos biográficos sob a ótica dos incidentes críticos, permitiu a construção das trajetórias profissionais dos professores que, ao longo da carreira, tornaram-se diretores de escola, possibilitando a identificação das experiências significativas durante a atuação docente que incidiram tanto na sua escolha pela profissão, bem como influenciam suas práticas gestoras. As narrativas dos gestores trazem lembranças que podem explicar muitas de suas práticas habituais, práticas estas fundamentadas em experiências e conhecimentos que se deram ao longo de suas trajetórias pessoais e profissionais. “A trajetória de vida profissional de um sujeito

pode ser estruturada em torno de experiências significativas de aprendizagem que

constituíram marcos em sua vida” (BOLÍVAR, 2002, p. 190).

Nos relatos aparecem acontecimentos, fatos, fases ou pessoas que, rememorados significam mudanças importantes em suas vidas porque lhes determinaram rumos, decisões ou trajetórias em certas direções, importando destacar os elementos que afetaram sua configuração pessoal. Para Bolívar (2002) os incidentes críticos desempenham um importante papel na evolução e na identidade profissional.

Os incidentes podem ser, em conjunto, (a) fatos individuais que, por incontornáveis, estabelecem a identidade, (b) acontecimentos críticos que promovem a mudança dessa identidade e (c) resultados de acontecimentos que reafirmam uma parte da identidade original e repelem a outra. Os incidentes críticos fazem com que o indivíduo reconheça em si mesmo coisas que antes lhe escapavam (BOLÍVAR, 2002, p. 62).