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Traços distintivos do imperialismo contemporâneo

No documento jonathanhenrisebastiaojaumont (páginas 75-79)

CAPÍTULO II – O CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO

2.3. Imperialismo e capitalismo contemporâneo

2.3.2. Traços distintivos do imperialismo contemporâneo

O imperialismo contemporâneo corresponde à etapa que começa com as transformações ocorridas posteriormente à crise de 1970. Para o canadense Leo Panitch e o russo Sam Gindin (2006), este é um momento marcado pelo crescimento da hegemonia estadunidense. Estes localizam na guinada econômica dos Estados Unidos permitida pela segunda guerra mundial, assim como, no seu protagonismo na reconstrução dos países que, hoje, conformam a Tríade (Estados Unidos, Europa e Japão), os processos determinantes para a constituição de um sistema integrado por todas as outras potências capitalista sob a coordenação e patrocínio estadunidense. Este sistema foi, como vimos, construído, incisivamente, por uma continua e agressiva ação estadunidense no período estudado, tendo, inclusive, que desenvolver “a capacidade de incorporar eventualmente seus rivais capitalistas

25 Este tópico se utilizou, parcialmente, do ensaio de Marisa Amaral (2017) como orientação bibliográfica e

e [de] vigiar e policiar a “globalização””. (PANITCH; GINDIN, 2006, p. 22)..

O resultado é o que os mesmos denominam de império informal. Tal informalidade, para os autores, provém da penetração das fronteiras nacionais ao integrar os Estados como componentes do império estadunidense. Neste sentido, “O império informal requer que a penetração econômica e cultural de outros estados seja sustentada pela coordenação política e militar com outros governos independentes.” (PANITCH; GINDIN, 2006, p. 28). É, também, a partir desta articulação, que os Estados Unidos colocam em marcha seus projetos para a acumulação de capital em nível mundial, mas podem fazê-lo, com isso, desde uma responsabilização destes Estados nacionais pela criação das condições internas necessárias à sua concretização. Para os autores, esta situação só é possível, no entanto, dada a extraordinária superioridade econômica dos Estados Unidos por toda a segunda metade do século XX e sua posição geopolítica hegemônica desde a desintegração do Campo Socialista.

A nova ordem mundial que emerge da queda do muro de Berlim, com efeito, parece reforçar a tese de um imperialismo solitário (AMARAL, 2017, p. 164). Nas palavras de Leo Panitch e Sam Gindin:

Não podemos entender o imperialismo na atualidade como se fosse uma crise não resolvida da década de setenta caracterizada por uma sobre-acumulação e um excesso de competição, dando lugar novamente a uma rivalidade interimperial. Distintamente do período anterior, que se caracterizava pela força econômica relativa da Europa e do Japão, o momento histórico atual mostra, pelo contrário, sua relativa debilidade. (PANITCH; GINDIN, 2006, p. 47).

O argentino Atílio Borón parece coadunar com esta ideia. Para o mesmo, o Estado estadunidense assume um lugar primordial na estrutura imperialista mundial, subordinando, absolutamente, as rivalidades existentes e relegando ao papel de coadjuvantes seus aliados centrais. A hegemonia dos Estados Unidos sobre os instrumentos financeiros clássicos de dominação imperialista, tal como o Fundo Monetário Internacional ou o Banco Mundial, atestam a supremacia deste país no âmbito internacional. Assim como, suas condições no campo militar parecem favorecer, também, decisivamente, esta posição que lhe confere o caráter de única superpotência militar do planeta. Por outro lado, o predomínio estadunidense na esfera da cultura lhes dá a possibilidade concreta de hegemonizar a produção de imagens audiovisuais e a circulação de ideias, através do incrível desenvolvimento dos meios de comunicação de massas. Este imperialismo cultural permite a construção de um discurso mundial propagandísticos que tem nos valores e ideais – e interesses – estadunidenses sua base e em sua generalização, seu objetivo. Por isso, para Boron, “hoje em dia, o imperialismo

é mais que nunca o imperialismo norte-americano”. (BORÓN, 2006, p. 467).

Samir Amin (2012), de sua parte, entende, também, que a atual fase do capitalismo contemporâneo, ao generalizar a monopolização da economia mundial, sustenta as bases objetivas para um imperialismo coletivo da Tríade. Neste âmbito, no entanto, o alinhamento aos Estados Unidos é total e imediato e os desacordos superficiais existentes não expressam, na realidade, contradições importantes na subordinação de Europa e Japão à dominação estadunidense. Neste cenário, o imperialismo age, decisivamente, segundo Amin, para garantir, fundamentalmente, o controle do desenvolvimento tecnológico, dos recursos naturais, dos meios de comunicação, do sistema financeiro e monetário mundial e das armas de destruição de massa. O autor, no entanto, localiza na China e em sua aliada atual, a Rússia, projetos alternativos emergentes e o principal alvo do imperialismo coletivo da Tríade.

David Harvey, por sua vez, explicita – com as contribuições de Rosa Luxemburgo, Hegel e Marx – a necessidade de um caráter dual da acumulação capitalista. São duas faces complementares, organicamente ligadas e entrelaçadas dialeticamente, que cumprem papeis distintos no processo de valorização do capital. A questão, para o autor, é que se, para os clássicos, a acumulação dita primitiva era uma solução externa ou, definitivamente, anterior à reprodução expandida do capital, lhe parece necessário “uma reavaliação geral do papel contínuo e da persistência das práticas predatórias da acumulação primitiva ou original no âmbito da longa geografia histórica da acumulação do capital”. (HARVEY, 2004, p. 120, grifo

do autor).

Com efeito, se tomarmos a ampla gama de processos que Marx (2013, p. 785-833) descreveu no capítulo acerca da acumulação primitiva é possível perceber, na realidade, seu aprimoramento e sua incorporação como “características centrais da face do capitalismo contemporâneo”. (HARVEY, 2004, p. 123). Para tanto, o capital financeiro, verdadeira vanguarda da espoliação contemporânea, conformou inúmeros novos mecanismos desta modalidade de acumulação de capital.

O objetivo central, neste âmbito, passa a ser a liberação de um conjunto de ativos a custos muito baixos para o capital sobreacumulado empregá-los em campos lucrativos de valorização. A acumulação por espoliação garante, portanto, este processo de subvalorização de elementos-chave da acumulação capitalista e sua destinação privilegiada a setores dominantes que desencadearam tal processo. Neste sentido, para Harvey, as próprias crises podem ser induzidas para alavancar processos de acumulação por espoliação. O sistema financeiro mundial – sob a liderança do Fundo Monetário Internacional e com o apoio do Estado estadunidense –, aliás, especializou-se, fundamentalmente, nisto. Sua tarefa, em

aliança com os Estados envolvidos, passa a ser, essencialmente, portanto, orquestrar estas desvalorizações estratégicas sem desencadear colapsos gerais que possam colocar em risco a reprodução do sistema. A existência deste sistema financeiro mundial capaz de operar os mecanismos centrais da acumulação por espoliação é, com isso, uma das grandes novidades capitalistas contemporâneas.

A conformação do sistema financeiro mundial, como vimos, deu conta de uma necessidade colocada pelas dificuldades estruturais de valorização do capital no âmbito de sua reprodução ampliada, a partir dos anos 1970. Mas se estas dinâmicas são complementares e a acumulação por espoliação abre caminhos para a reprodução ampliada do capital, a partir da década de 1970, “a acumulação por espoliação passou a ocupar o primeiro plano como a contradição primária no âmbito da organização imperialista da acumulação do capital”. (HARVEY, 2004, p. 141). De fato, ao se localizar, centralmente, na periferia do sistema capitalista mundial, a acumulação por espoliação vai conformar o cerne da atuação imperialista. Nas palavras do autor:

O poder hegemônico do Estado costuma ser empregado para garantir e promover arranjos institucionais internacionais e externos por meios dos quais as assimetrias das relações de troca possam funcionar em favor do poder hegemônico. É por meio desses recursos que, na prática, se extrai um tributo do resto do mundo. (HARVEY, 2004, p. 147).

O papel contemporâneo da espoliação, neste sentido, recoloca múltiplos e novos desafios para a organização dos embates decorrentes desta nova combinação da acumulação capitalista mundial.

CAPÍTULO III – DEPENDÊNCIA CONTEMPORÂNEA E PADRÃO ATUAL DE

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