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2. O ROMANCE PÓS-DITATORIAL BRASILEIRO

2.2 Traços na recepção editorial e crítica

O jornalista e escritor Paulo Francis, citado por Hollanda e Gonçalves (1979, p. 7), no início dos anos 70, mostrava-se cético quanto ao desenvolvimento da literatura nos anos seguintes, mas seu prognóstico se revelou infundado. Não somente foi mantida a continuidade dos escritores que já eram atuantes, antes do golpe, como surgiram novos nomes, e em 1975 houve grande destaque para a produção do conto. O boom observado na literatura, nesse período, apesar dos prognósticos em contrário, se deve a assunção de alguns aspectos econômicos e históricos.

Primeiramente, é um período em que praticamente toda a formulação política, econômica – e mesmo a histórica – dos processos sociais amarra-se à permanência do regime, baseando-se em sua durabilidade e mutabilidade (SUSSEKIND, 1986, p. 12). Assim, o desenvolvimento da produção literária na década de 70, além de manter correspondência com uma censura menos coerciva em relação à literatura, sobrepõe-se ao desenvolvimento do mercado. Fato que por sua vez se tornou possível devido a mudanças em setores estratégicos que implicaram – entre várias providências – o redimensionamento das relações entre Estado e cultura.

Essa dinâmica abarcou segmentos variados do setor artístico, assim, a literatura sofreria o impacto dessa nova demanda tanto quanto o cinema que passa a demonstrar maior impulso em direção à maturidade industrial. Da mesma forma, as artes plásticas tornam-se, nesse momento, rentável negócio para produtores e marchands.

Todo esse processo se deve em grande parte à modernização de molde capitalista, exigente de certos aparatos que o regime não tardaria a fomentar, tais como a modernização da produção industrial, a transferência de capitais externos e a importação de novas técnicas e esquemas de organização. Esse último aspecto abarcaria a reestruturação de certas condições de produção e circulação de bens de consumo, na qual

se insere o mercado editorial. A nova cara moderna do país, nos passos do “milagre”, passa a expressar uma “atmosfera competente” (HOLLANDA e GONÇALVES, 1980, p.10) e abarca estrategicamente o desenvolvimento da tecnoburocracia - a partir da sofisticação de seus métodos e discursos - e da área de comunicações e da industria cultural, tendo em vista o aprimoramento do mercado da classe média. No entanto, observam Hollanda e Gonçalves (1979, p. 11):

é a TV que nesse momento irá melhor expressar o clima do “milagre”. Trabalhando com a técnica mais recente, a Tv constrói a imagem de um país moderno, um Brasil Grande, de obras monumentais, signos de uma potência emergente. A atualização de padrões culturais internacionalizados dita novos hábitos de consumo e comportamento para a burguesia e classe média.

De fato, a década de 70 ficaria muito assinalada pela correlação entre o crescimento econômico e o desenvolvimento dos mass-media. A televisão, seja como objeto industrializado seja como rede de comunicações, se consolida como o elemento mais contundente do processo de crescimento e consolidação da indústria da comunicação.

Além da política de desenvolvimento voltada para o crescimento do mercado, a conquista de alguns segmentos do setor – através do subsídio previdenciário que sustentou determinadas atividades artísticas, na medida em que o público declinava – faziam parte das atitudes que visavam estabelecer certo controle do Estado sobre o processo cultural. Tal preocupação deve-se ao fato de que a esquerda se tornara hegemônica no campo da cultura, aspecto que não poderia ser resolvido tão somente por mecanismos mais ortodoxos, como a censura e as prisões.

Importa lembrar que à semelhança da política exercida pelo Estado Novo para esse setor, em determinado momento a política cultural do regime de 64 também se baseou na cooptação de intelectual através do emprego público, assim como do controle do que era produzido, por meio de mecanismos jurídicos que, dentre outras coisas, estabelecia normas para a exibição de filmes e regulamentava as profissões de artista e técnico (SUSSEKIND, 1985, p. 22). Mas havia outras estratégias díspares, como o veto ao crédito de editoras cuja gestão era considerada simpática às esquerdas, ou mecanismos ainda mais sutis, como a já citada cooptação através da dependência do mecenato

governamental, o que implicava o financiamento de concursos, prêmios e co-edições de obras literárias.

Desse modo, a interferência do Estado no processo cultural teve, em parte, motivação circunstancial. Porém, de modo geral, é de opinião da crítica especializada que as tensões provocadas por intervenções mais ou menos articuladas, tendo em vista objetivos diferenciados, projetou resultados enfáticos sobre os processos criativos relativamente à escolha de determinados esquemas formais e de uso da linguagem. Esse aparato externo teria predisposto as obras a expressarem um caráter dialético, interpretado como “tática” de defesa (HOLLANDA e GONÇALVES, 1979, p. 11).

Por dialético, nesse caso, entende-se a constituição de argumentos e formas dramaticamente fundamentadas na ambiguidade e na relação entre forças potencialmente inversas. Portanto, a partir dessa leitura, a virada mercadológica, cuja consequência visível para a literatura foi justamente o boom literário, teve não só desdobramentos em relação aos mecanismos de produção e circulação das obras, como teria também afetado, consideravelmente, os aspectos estéticos e gnosiológicos delas.

Nesse sentido, não se pode esquecer que, para além das tensões oriundas de tais interferências, havia também todo um panorama de estratégias de caráter estatal que visava uma imagem de prosperidade, mas que coabitava com a desalentadora situação política do país, devido às condições impostas pelo regime. Além disso, havia a impressão de desarticulação relacionada à prática e ao discurso das oposições, elemento que foi adquirindo maior clareza, na medida em que se tornaram cada vez mais visíveis os violentos mecanismos de coerção policial, especialmente durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici. Também é preciso lembrar que, estritamente no campo das relações com os setores da cultura, até o momento em que o general Médici assume o poder, há uma certa liberdade de atuação nas mídias, como é caso da televisão e também em relação à arte de protesto, desde que estas estivessem longe das camadas populares. Sobre essa condição, vale observar o que diz Flora Sussekind (1985, p. 14):

Tiro certeiro o da estratégia autoritária nos primeiros de governo militar. Certeiro e silencioso: deixava-se a intelectualidade bradar denúncias e protestos, mas os seus possíveis espectadores tinham sido roubados pela televisão. Os protestos eram tolerados, desde que diante do espelho. Enquanto isso, uma população convertida em platéia consome o espetáculo em que se transformam o país e sua história. A utopia do “Brasil Grande” dos governos militares pós-64 é construída via televisão, via linguagem do espetáculo. Sem os media e sem público, a produção

artística e ensaística de esquerda se via transformada assim numa espécie de

Cassandra. Podia falar sim, mas ninguém a ouvia. A não ser outras idênticas cassandras.

Por todos esses aspectos, ao longo da virada da década de 60 para a de 70, forma- se uma faixa de resistência no interior da classe média que traria consequências explícitas, na medida em que o desenvolvimento da consciência acerca da falência da militância e, paralelamente, do desejo revisionista que a acompanhou, fez surgir expressões fragmentadas e minoritárias de radicalização da pequena-burguesia. Tais atitudes de rebeldia e radicalismo se traduziriam especialmente de duas formas: por um lado, na opção pela luta armada, e por outro, naquilo que ficou conhecido como desbunde.

Alguns elementos foram vitais para a construção do sentido de desbunde, entre os quais, destacam-se, o sentimento de opressão situacional, a ascensão do movimento

hippie que propunha a chamada “ampliação da consciência”, através do uso de drogas ou

da imersão em religiões ou cultos não-ocidentais, novas atitudes acerca dos relacionamentos afetivos-sexuais e a recusa a qualquer forma de engajamento forçado. Tais fundamentos infiltram-se na contracultura, recebendo vários nomes (PAIANO, 1996, p.51-52): underground, alternativa, experimental, desbunde. Há por traz de todas essas definições um sentido de nonsense, de deboche, e de desprendimento para com as normas, mas sem abdicar do caráter crítico, fatores que lhes imputaram um sentido utópico e, ao mesmo tempo, ambíguo. Veja-se mais uma vez, a avaliação de Hollanda e Gonçalvez (1979, p. 11-12).

Essas alternativas, sem dúvida diversas, não deixam, contudo, de apresentar elementos comuns e bastante significativos de um momento de desagregação, de falta de perspectivas, e de uma ansiosa busca de saídas. O privilégio da ação e o sentimento colocados à frente das preocupações racionalizantes, a relativa descrença frente o discurso intelectual e teórico, a valorização do corpo como lugar político, são características gerais e comuns dessas experiências.

A essa altura, é preciso lembrar que assim como esse conjunto de condições apresentou feições diferenciadas ao longo da permanência do regime, do mesmo modo ocorreram mudanças na maneira como estavam sendo problematizados, no âmbito da produção artística, determinados aspectos da experiência próxima. No que se refere à

literatura, esses novos esquemas de problematização incidiram sobre o esboço formal das obras e, como se vê, não passaram desapercebidos pela crítica.

Entre os artistas engajados na “resistência subterrânea” (PELLEGRINI, 1996, p.7) desenvolvida durante a década de 70, é visível a tendência em concentrar seu esforço de criação no diagnóstico daqueles anos entrópicos. Desse modo, vários dos elementos observados por Heloísa Buarque de Hollanda e Marcos Augusto Gonçalves – muitos dos quais em oposição entre si, embora articulados – também foram projetados para a produção literária, mas de um modo bastante diferenciado daquele que se viu durante os anos 60, pelo menos até 1968.

A propósito, Fábio Lucas (1985, p. 95) opina que a hipertrofia dos problemas sociais e políticos, a partir da década de 60, deu nitidez às relações de poder que, direta e indiretamente, os sustentaram. Essa nitidez teve como efeito, uma percepção “mais rápida e menos matizada” dos fenômenos históricos e políticos implicados: “Por isto, os escritores não precisaram usar uma intuição demasiadamente aguda para captar o perfil das contradições mais vivas da sociedade”. O diagnóstico de Fábio Lucas expressa como, para os primeiros críticos, a percepção desse aspecto e de suas implicações estéticas concentrou-se na ideia de que o contato muito próximo com a experiência dos eventos empobreceu a ficção do período, pois teria minimizado o trabalho complexo com a linguagem, e concorrido para a assunção definitiva de um persistente naturalismo.

Ao traçar analogias entre narrativas produzidas sobre diferentes condições, como é o caso de O cortiço, Cacau e Infância dos mortos, Flora Sussekind explora a ideia de que o realismo entre elas não muda, a despeito de pertencerem a tempos distintos e distantes entre si. O sentido de realismo aí implicado é o realismo como documento – em detrimento de uma literatura mais voltada para a elipse e o chiste – que se traduz como literatura radiográfica, na contínua busca pelas mazelas mais profundas da nação (SUSSEKIND, 1984, p. 37):

Os três romances parecem apontar par um significado que se situa fora deles, num contexto extra-literário. Negam-se enquanto ficção, enquanto linguagem, para ressaltar o seu caráter de documento, de espelho ou fotografias do Brasil. Do leitor exige que os leia como se não se tratassem de ficção. Não é à-toa que uma norma do Direito Criminal serve de epígrafe a Aluízio Azevedo, e que Infância dos mortos se atribui veracidade fazendo uso de alusão a uma notícia de jornal cheia de estatística.

Porém, ao analisar Quatro-olhos e Zero, observa que essas narrativas pertencem ao grupo restrito daquelas que rompem com esse naturalismo radiográfico (Sussekind, 1984, p. 38) que se comporta como “diagnóstico médico” do país, em busca de um “décor brasileiro, personagens típicos e uma identidade nacional”.

De sua parte, Tânia Pellegrini, que pertence a uma espécie de segunda geração dos críticos que se dedicaram às narrativas em questão, valeu-se da ideia de arte como reconhecimento e recriação da realidade e não mera representação do real, uma vez que integra a realidade como universo interno. Essa ideia, cujos fundamentos estão em estudos de Candido e Kosik, tem como principal elemento a premissa de que a arte afrouxa seu teor idealista e humanista, assim não somente o sujeito perde seu pedestal como a realidade deixa de ser vista como acessório.

Por outro lado, Pellegrini parte da noção de cultura, contida em Amoroso Lima e Terry Eagleton, como algo formado por movimentos subjetivos que contém em si a dinâmica dos movimentos objetivos que se materializam em gestos, decisões, atitudes, tendências etc., constatação que leva Pellegrini (1996, p.8-9) a suspeitar de que as intervenções da censura ou mesmo da auto-censura, além da homogeneização desejada pela indústria cultural, na produção de 70, teve implicações sobre a potência criadora.

Examinando particularmente os depoimentos de Augusto de Campos e de Carlos Estevam, ambos publicados na revista “Visão”, à época, Pellegrini (1996, p.11) mostra algumas tendências de interpretação do fenômeno. No primeiro caso observa que a colocação nega a compreensão da literatura a partir de sua diversidade material, onde estaria “o indício das contradições materiais (historicamente determinadas) que a produzem e que nela se encontram na forma e no conteúdo” e conclui, que nesse caso, “os textos literários não são apenas simples reflexo do momento histórico e de suas injunções, mas, em última instância, o resultado de seu condicionamento”.

Observa ainda que no Brasil a indústria cultural nos anos 70 é sustentada pela ideologia do poder autoritário instituído, influenciado pelo desenvolvimento tecnológico, comum aos países capitalistas, que coloca em primeiro plano “a coisa, o objeto, o bem, o produto e nunca o homem, que entra num processo crescente de reificação e alienação” (PELLEGRINI, 1996, p.13). O desenvolvimento da indústria cultura também provoca o rompimento de fronteiras entre cultura erudita e cultura de massa, desfazendo um processo hierarquizante em que a primeira incidia sobre a segunda. Porém, alerta que tanto uma quanto a outra são produtos da classe dominante “e que a interferência da última no campo da primeira se faz mais em termos de incrementar toda uma estratégia

de dominação já cristalizada, com meios mais sofisticados, a qual vai incidir diretamente (alterando, mudando, transformando) sobre a produção cultural”.

Pellegrini (1996, p.14), vê nisso uma limitação para o campo da literatura. Antes “tida como um modo de conhecimento e de transformação do real” a literatura termina por adotar estratégias que buscam deslocar ou manter em suspensão a ideia de um termo aos conflitos ideológicos presentes na realidade. Diante desses aspectos, a pesquisadora afirma que as contingências mais amplas, como o desenvolvimento do capitalismo, devem ser levadas em conta na análise da produção de romances na década de 70, mas tais contingências não esvaziaram as gavetas, ao contrário, estas se mantiveram cheias de interrogações, resultantes, entre outras coisas, da confluência entre rebeldia e desenvolvimento do mercado editorial.

Renato Franco é outro que dentre os críticos não negligencia o papel do crescimento da industria cultural – que se realiza paralelo a um processo de modernização conservadora – chamando a atenção para o seu poder e alcance – através do apoio e fomento do poder estatal e de como esses aspectos, articulados, podem ser vistos como um das justificativas para o novo formato composicional que o romance passa a apresentar nos anos 70. E, com isso, Franco (1998, p. 45) reforça a ideia de que há realmente uma mudança de etapa na literatura que se projeta em função de tais câmbios histórico-políticos e culturais:

Podemos, portanto afirmar que é bastante plausível pensarmos que, por volta de 1968, encerrou-se de fato um largo ciclo cultural cuja existência teve origem nos anos 30 e deveu-se, em grande parte, à vigência dessas condições históricas que, todavia, tendiam agora a desaparecer.

De fato, Franco mostra que há uma ideia de etapa encerrada entre os anos 60 e 70, que comporta transformações na literatura de um decênio para o outro, e, nesse sentido, observa que o projeto modernizador, continuado pelo regime, coincide com o aparecimento da pós-modernidade no Brasil. Aposta que foram o sentimento de incerteza e as angústias, frente a essas novas condições, os elementos que levaram os produtores culturais à luta política. Ou seja, o impulso de rebeldia que marcou muito da escritura do período teria sido produto muito mais do impulso de resguardar o território profissional e político do que, propriamente, de uma ética da escrita.

Ao examinar Cabeça de papel, de Paulo Francis, em texto já citado, Davi Arrigucci verifica a presença das seguintes características: de um lado, a atitude narrativa que expõe a combinatória entre romance e confissão, a partir da identificação de duas das principais características da narrativa confessional: o discurso intelectual e a digressão analítica. Por outro, são romances que se comportam como anti-romances, na medida em que buscariam romper com as regras do gênero.

Por sua vez, Fábio Lucas (1985, p.101) revela especial atenção para um item pouco analisado pela crítica, qual seja, a presença do riso, da ironia, e seus companheiros de jornada: a sátira e a paródia. A julgar pelo que diz a presença desses recursos, em algumas narrativas, se constitui em recurso capaz de contornar o aspecto maniqueísta. Ainda acerca dessa característica, Regina Dalcastagnè (1996, p. 46) parece concordar com o que diz Lucas, uma vez que observa um veio irônico com força suficiente para romper a suposta imparcialidade do discurso jornalístico.

Outro aspecto bastante contemplado pela crítica é a presença, independente ou em combinação, das técnicas de jornalismo e cinema. O auge desses usos deu-se na década de 70, especialmente com a assunção dos romances-reportagem. Nesse caso, as projeções da linguagem e das técnicas do jornalismo foram tão peculiares e tão apropriadas ao hibridismo da produção literária da década de 70, que sua realização ficcional se dissemina de duas maneiras: como subgênero do romance e como forma estilizada dos esquemas discursivos da linguagem do jornalismo.

Na primeira ocorrência, tem-se uma narrativa que, à maneira de reportagem, apresenta como núcleo temático fatos reais, porém revestida de técnicas narrativas tipicamente ficcionais. Na literatura brasileira remonta a O caso Lou (1975), de Carlos Heitor Cony, narrativa, que adotando esse modelo, muito se aproxima daquela que é reconhecida como o paradigma do gênero na literatura universal: In cold blood (A sangue

frio), de Truman Capote. A segunda ocorrência surgiria da degeneração desse formato,

em que a técnica do subgênero seria reaproveitada para fins alegóricos. Pelo menos essa é a interpretação que faz Rildo Cosson, pelo que diz Davi Arrigucci quando se refere a um tipo de romance alegórico, baseado na reportagem. Segundo Cosson, tal leitura justificaria porque narrativas tão distintas, como Lúcio Flávio, o passageiro da agonia, de José Louzeiro, Cabeça de papel, de Paulo Francis e Reflexos do Baile, de Antônio Callado, são consideradas como “romances jornalísticos”.

As narrativas do primeiro tipo organizam-se a partir de um determinado modo de narração, muito próximo à maneira como a literatura de não-ficção americana se

constituiu. O modelo penetra o mercado literário brasileiro a partir de estratégias comerciais de algumas editoras. Em 1966, a editora Nova Fronteira, publica a tradução de In cold blood, no mesmo ano em que esse romance é lançado nos E.U.A, cercado de polêmica criada por seu autor e acompanhado de grande repercussão comercial. O romance de Capote foi o primeiro título dessa coleção, intitulada Testemunhos. Em meados da década de 70, outra incursão seria feita: a editora Civilização Brasileira também lança uma coleção tendo como referência fatos reais narrados nos moldes de uma ficção. Seu primeiro título foi o já citado romance-reportagem escrito por Cony.

No caso do formato re-elaborado o romance-reportagem teria se distanciado desse referente imediato, em decorrência da contínua incursão de vários repórteres no campo da literatura, e, consequentemente, da infiltração dos estilemas do jornalismo na ficção, muitas vezes em chave paródica. Nesse sentido, Regina Dalcastagné (1996, p. 46), comenta, lucidamente, que em relação ao discurso jornalístico romances como Reflexos

do baile, A Festa e Zero não apenas o imitam, mas também o desmontam, colocando “em

confronto as informações veiculadas pelo jornal com a representação do real elaborada pelo romance, eles evidenciam os contrastes, iluminam as semelhanças e desvendam ainda um terceiro plano de compreensão – o histórico”

Tal disseminação, para críticos como Arrigucci, Hollanda e Gonçalves, articulou- se como tendência específica da narrativa literária da década de 70. Para outros, como é