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Com base na ideia de Vygotsky (2007) de que o desenvolvimento e a aprendizagem ocorrem pelas interações sociais, algumas pesquisas (COLL, 1994; MOYSÉS, 1997; COLAÇO, 2004) têm investigado a importância do trabalho em grupo e seus benefícios para o processo de aprendizagem dos conteúdos.

Coll (1994) analisa os processos de interação grupal e afirma que o trabalho colaborativo incide de forma decisiva sobre aspectos como o processo de socialização em geral, a aquisição de aptidões e habilidades, o controle dos impulsos agressivos, o grau de adaptação às normas estabelecidas, a superação do egocentrismo, a relativização progressiva do ponto de vista próprio, o nível de aspiração e, ainda, o rendimento escolar.

Em adição a essas ideias, Colaço (2004) aponta como benefícios do trabalho em grupo o fato de as crianças ensinarem e aprenderem conteúdos das matérias escolares, modalidades comunicacionais e de convivência, disciplinamentos referentes às normas de condutas sociais, características do ambiente cultural da escola, bem como desempenharem, disputarem e negociarem papeis entre elas.

Coll (1994) procura entender a relação aluno-aluno, já que esta, na maioria das vezes, é ignorada no que se refere à aprendizagem de conteúdos, valorizando-se apenas a relação professor-aluno. Por isso, intensificam-se os esforços para identificar os tipos de organização social, nas atividades de aprendizagem, que possibilitam modalidades de organização de um trabalho pedagógico favoráveis à consecução das metas educacionais. Em seu estudo, Coll analisa situações de interação e encontra três tipos diferentes, classificando-os como situação cooperativa, situação competitiva e situação individualista.

Na situação cooperativa, os objetivos dos participantes estão estreitamente vinculados, de maneira que cada um deles possa alcançar seu objetivo se − e apenas se − os outros alcançarem os seus; os resultados que cada membro do grupo persegue são, portanto, benéficos para os outros membros com os quais está interagindo cooperativamente.

Por outro lado, em uma situação competitiva, os objetivos dos participantes estão também relacionados, mas de forma excludente: um participante pode alcançar a meta que propôs se − e apenas se − os outros não conseguem alcançar as suas;

cada membro do grupo persegue, portanto, resultados que são pessoalmente benéficos, mas, em princípio, prejudiciais aos outros membros com os quais está associado competitivamente. Por último, na situação individualista, não existe qualquer relação entre os objetivos que os participantes pretendem alcançar: o fato de que um participante alcance ou não o objetivo fixado não influi sobre o fato de que os outros participantes alcancem ou não os seus; perseguem-se resultados individualmente benéficos, sendo irrelevantes os obtidos pelos outros membros do grupo (COLL, 1994, p. 79).

Após apresentar essas definições, Coll (1994) dedica-se a realizar uma investigação que visa estudar a influência desses três tipos de organização social, no que se refere à interação que se estabelece entre os alunos e a relação desta interação com o rendimento escolar. Ele analisa 122 investigações realizadas com alunos dos Estados Unidos. Entre os resultados encontrados, cito dois que têm relação direta com minha pesquisa, pois, como afirmado anteriormente, este estudo busca compreender a importância e os benefícios das atividades colaborativas, por acreditar que estas qualificam o processo de aprendizagem e superam as atividades que são realizadas de forma individual ou competitiva, somente.

Coll (1994) conclui, a partir dos dados analisados, que as situações cooperativas são superiores às competitivas no que concerne ao rendimento e à produtividade dos participantes e que a cooperação intragrupo é superior à competição interpessoal quanto ao rendimento e à produtividade dos participantes. O primeiro achado, sobre situações cooperativas serem superiores às competitivas no que diz respeito ao rendimento e à produtividade dos participantes, foi observado em qualquer que fosse o grupo etário e a natureza do conteúdo. A superioridade manifestou-se, de igual modo, em tarefas de formação de conceito e resolução de problemas. As situações cooperativas não são superiores às competitivas apenas no caso de tarefas mecânicas. O autor destaca, ainda, que há uma série de variáveis que afetam a superioridade da cooperação sobre a competição, o que significa que ainda há o que explicar sobre essa superioridade. Nas análises dos meus dados de pesquisa, percebi que, nas atividades em grupos em que se exige a apropriação de conceitos, o diálogo entre pares interfere e qualifica muito o processo de aprendizagem.

O segundo achado da pesquisa de Coll (1994) indica que a cooperação intragrupo é superior à competição interpessoal quanto ao rendimento e à

produtividade dos participantes. A superioridade é maior quando a tarefa consiste em elaborar um produto e o número de participantes é pequeno. Ao analisar as variáveis da pesquisa, o autor aponta a existência do conflito cognitivo como um dos fatores responsáveis pela situação de cooperação superar a de competição. O pesquisador explica, ainda, que o conflito surge da ideia essencial da necessidade de uma confrontação entre pontos de vista moderadamente divergentes: a existência de concepções diferentes, relativas a uma mesma situação ou tarefa, junto à exigência de uma atividade grupal comum, gera um conflito sociocognitivo, algo que mobiliza e força as reestruturações intelectuais e, com isso, o progresso intelectual. O autor ainda ressalta que,

para que as crianças possam elaborar conjuntamente uma noção ou resolver um problema não é necessário que um dos participantes já a domine ou conheça a solução. Basta que abordem estas tarefas com pontos de vistas divergentes e que tenham as aptidões intelectuais mínimas que a estrutura da noção ou problema exige (COLL, 1994, p. 86)

Reconheço sua relevância e, por isso, tomei por base os estudos de Coll (1994), destacando esses dois dados (o de que as atividades cooperativas em grupo superam as competitivas e o de que as atividades realizadas com foco na aprendizagem de conceitos e aproveitando os conflitos cognitivos que as intervenções podem provocar, potencializam o trabalho colaborativo) porque me ajudaram a pensar e a ter a clara ideia sobre meu objeto de pesquisa. Acredito que, em situações de interação colaborativa, a aprendizagem e o rendimento escolar das crianças é maior; por isso, entendo o trabalho colaborativo como princípio didático de organização da prática pedagógica. Percebo, de igual modo, que, ao analisar as práticas desenvolvidas em grupo, especialmente quando as crianças são desafiadas a realizarem algo (ou criarem um produto) em grupos pequenos, a colaboração atinge níveis mais elevados.

Na sequência, sigo a reflexão com base em outros autores que se dedicaram a estudar os efeitos do conflito cognitivo e os níveis de participação de um grupo, entendendo que precisam ser vistos como elementos importantes, que leva o trabalho colaborativo a atingir todo seu potencial.

Candela (2002) realizou uma pesquisa com crianças que se organizavam de maneira colaborativa e apontou algumas vantagens da interação entre os participantes do grupo, dentre elas, a possibilidade da construção do conhecimento.

Para a pesquisadora, é por intermédio do confronto de ideias que surge a elaboração de novas hipóteses, o que pode resultar em uma aprendizagem significativa.

Por seu turno, Moysés (1997) argumenta que a atividade compartilhada ativa o desenvolvimento cognitivo, o que possibilita a aquisição de conhecimentos. Analisando a atividade compartilhada, a autora cita três níveis de participação em um grupo: o primeiro nível, aquele em que o único objetivo dos participantes é cumprir a sua parte na tarefa; o nível intermediário, aquele em que os participantes se preocupam em se ajudar, enquanto realizam a sua própria parte da tarefa; e, por último, o nível mais elevado, aquele em que a colaboração é o objetivo da própria tarefa.

Nesse estudo, Moysés (1997) ainda cita quatro fatores como sendo fundamentais para a eficiência da atividade compartilhada: 1) o emprego de modelos que assegurem a coordenação dos procedimentos individuais dos participantes; 2) a divisão e o rodízio das operações de base entre os parceiros, conforme a estrutura do objeto estudado; 3) o aparecimento da situação de conflito, provocando uma necessidade de reconstrução habitual; e 4) a apresentação desse trabalho sob forma de atividade lúdica. De acordo com Moysés (1997), para que a atividade compartilhada alcance os níveis mais elevados, o professor ou o condutor da atividade deve estar atento a esses quatro fatores de eficiência.

Observo, em minha prática pedagógica, a relevância de conhecer esses fatores e tê-los em mente, tanto ao planejar atividades numa perspectiva colaborativa, como ao conduzir as atividades junto às crianças. O professor precisa propiciar e criar interações que facilitem e valorizem a presença desses quatro aspectos durante o processo de interação das crianças. O primeiro fator descrito tem relação direta com esta pesquisa e, por isso, na última seção deste capítulo, dedico-me a refletir e a considerar melhor esse fator e a importância dele para o desenvolvimento do trabalho colaborativo.

Rubtsov e Guzman (apud MOYSÉS, 1997) investigaram os mecanismos psicológicos que favorecem o bom desempenho na resolução de tarefas feitas conjuntamente e concluíram que a coordenação de operações é, de fato, o principal mecanismo que leva ao reconhecimento e à solução de tarefas educacionais nos trabalhos realizados de forma compartilhada. Mas, o que de fato fará com que as crianças adquiram essa habilidade de coordenação entre as interações com seus

pares? Como aprender a interagir com os outros de maneira que todos sejam beneficiados? É sobre esses aspectos que escrevo na próxima seção.