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2.1 Eixos Temáticos e Tendências de Estudo sobre o Mundo do Trabalho

2.1.10 Trabalho feminino

O eixo temático trabalho feminino é composto somente por 3 artigos e representam

3,79% da produção teórica estudada na tese. Os textos abordam a inserção da mulher no mercado do trabalho e demonstram o caráter precário dessa “inclusão”. O quadro apresenta as particularidades dos artigos.

AUTOR ÁREA DE

GRADUAÇÃO DO AUTOR

TÍTULO DO ARTIGO CARÁTER DO ARTIGO

REVISTA Safira Bezerra

Ammann

Serviço Social Mulher: trabalha mais, ganha

menos, tem fatias irrisórias de poder

Ensaio teórico Serviço Social e Sociedade nº 55 – 1997

Virgínia Paes Coelho

Serviço Social O trabalho da mulher, relações familiares e qualidade de vida

Resultado de pesquisa Serviço Social e Sociedade nº 71 – 2002 Hildete Pereira de Melo Ciências Econômicas

O trabalho feminino na indústria: o que mudou?

Resultado de pesquisa

Praia Vermelha nº 11 – 2004

Quadro 21 – Eixo Temático – Trabalho Feminino

A participação ativa das mulheres no mercado de trabalho não é mais novidade. As duplas jornadas de trabalho, como trabalhadora assalariada fora do lar e, ao mesmo tempo, desenvolvendo “atividades do lar”, são vivências cotidianas de milhares de mulheres.

Virginia Coelho (2002) analisa os fatores que repercutem na qualidade de vida das mulheres inseridas no mercado de trabalho e destaca os reflexos nas relações familiares.

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Observe a argumentação de Antunes (2001, p. 177, destaque do autor): “Uma vida cheia de sentido em todas as esferas do ser social, dada pela omnilateralidade humana, somente poderá efetivar-se por meio da demolição das barreiras existentes entre tempo de trabalho e tempo de não-trabalho, de modo que, a partir de uma atividade vital cheia de sentido, autodeterminada, para além da divisão hierárquica que subordina o trabalho ao capital hoje vigente e, portanto, sob bases inteiramente novas, possa se desenvolver uma nova sociabilidade. Uma sociabilidade tecida por indivíduos (homens e mulheres) sociais livremente associados, na qual ética, arte, filosofia, tempo verdadeiramente livre e ócio, em conformidade com as aspirações mais autênticas, suscitadas no interior da vida cotidiana, possibilitem as condições para a efetivação da identidade entre indivíduo e gênero humano, na multilateralidade de suas dimensões. Em formas inteiramente novas de sociabilidade, em que liberdade e necessidade se realizam mutuamente. Se o trabalho torna-se dotado de sentido, será também (e decisivamente) por meio da arte, da poesia, da pintura, da literatura, da música, do tempo livre, do ócio, que o ser social poderá humanizar-se e emancipar-se em seu sentido mais profundo”.

Para Coelho (2002, p. 67), a colocação feminina no mercado de trabalho tem suas particularidades. A participação masculina se dá de acordo com as oportunidades oferecidas e, na maioria dos casos, sua inserção vai estar relacionada às qualificações pessoais, com pouca ou nenhuma interferência dos fatores familiares e domésticos. No caso das mulheres, a situação é absolutamente diferente, pois além dos fatores que envolvem sua qualificação e a oferta de trabalho, existe a continuidade de um modelo de família no qual são tidas como as principais responsáveis tanto no que se refere à socialização dos filhos como em relação às tarefas domésticas.

Para a autora, segundo dados de sua pesquisa52, os filhos é o fator que mais interfere

em relação à participação feminina no mundo do trabalho.

Maiores responsáveis pela guarda, pelos cuidados e pela educação dos filhos e vivendo a situação de insuficiência de equipamentos coletivos, como as creches, as mulheres enfrentam limitações para o trabalho, principalmente se os ganhos financeiros não conseguem cobrir os custos com os cuidados das crianças. (COELHO, 2002, p. 70).

Numa visão romântica e dotada de moralismo burguês, a inserção da mulher no mercado de trabalho é sinônimo de prestígio e de valorização pessoal, mas nem sempre as condições de trabalho e as responsabilidades com a família são divididas entre os seus companheiros, o que acentua o estresse e as precárias condições de vida da maioria das mulheres trabalhadoras. Tais questões são confirmadas por meio das conclusões da pesquisa de Coelho (2002, p. 75) ao afirmar que as mulheres trabalhadoras apresentam experiências de vidas marcadas por inúmeras tarefas cotidianas e tendo de arcar com “responsabilidades diversificadas na vida pública e no espaço doméstico”, uma parcela das mulheres vem conseguindo apresentar bom desempenho, mas pagando o preço de um enorme desgaste físico e emocional. “De modo geral, trabalham mais, vivem em piores condições e têm mais encargos que a geração de suas mães”.

Hildete Melo (2004), dando continuidade ao debate sobre o trabalho feminino, investiga as mudanças na estrutura ocupacional feminina, na indústria manufatureira, em relação aos avanços tecnológicos nos anos 1980/1990. A pesquisa utilizou as variáveis: sexo, faixa etária, escolaridade, rendimento, posição na família e ocupação. As bases de dados

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O artigo é síntese de sua tese de doutorado: Visitando a história a partir de memórias femininas: mudanças e permanências na socialização da mulher – 1960-1990.

utilizadas foram as tabulações especiais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE).

Nas últimas décadas, as mulheres foram inseridas de forma significativa no mercado de trabalho, mas esta inserção não foi acompanhada por diminuição das desigualdades profissionais entre os sexos. O trabalho feminino, de acordo com a autora, continua concentrado em alguns setores de atividades e agrupado em um pequeno número de profissões. Esta segmentação é ainda a base das desigualdades entre homens e mulheres no mundo do trabalho industrial.

O resultado parcial de pesquisa apresentado por Melo (2004) oferece inúmeros dados que podem ser material de estudo para várias análises sobre a condição da mulher no mercado de trabalho. Apresentamos, portanto, de forma sintética os principais resultados da pesquisa.

Para Melo (2004, p. 129), a novidade foi que a participação feminina, nos anos 1990, no setor industrial, manteve seu patamar histórico de meados da década de 1980 e até numa proporção um pouco superior. A reestruturação produtiva da indústria de transformação brasileira não expulsou as mulheres: “em 1985 a taxa de participação na indústria de transformação era de 26,35% e em 1997 atingiu 28,13%”.

Nos anos 1990, com a reestruturação produtiva nacional, não houve redução das trabalhadoras industriais, ocorreu incremento na participação no mercado de trabalho. Para Melo (2004, p. 219), a situação na indústria manufatureira é heterogênea: alguns ramos industriais eram e são setores em que tradicionalmente havia uma significativa participação feminina – têxtil, vestuário, calçados – e outros que se caracterizam por baixa participação – metalurgia, química, mecânica. Para o primeiro grupo de indústria, o problema para as mulheres não era de acesso ao emprego, mas de mantê-lo na conjuntura em crise dos anos 1990. Os outros, incluindo o segundo grupo, são ramos industriais que historicamente absorvem baixa força de trabalho feminina. Para estes, o problema é de oportunidade de acesso ao emprego como, por exemplo, o caso das indústrias metal-mecânico, editorial/gráfica e de bebidas. Destaca-se também a crescente absorção de operárias na indústria alimentícia. Esta indústria é formada por um elevado número de empresas heterogêneas, grandes grupos multinacionais e um pequeno número de pequenas e médias empresas, mais atrasadas em relação às inovações tecnológicas.

Entretanto, as formas de emprego da força de trabalho feminino continuam concentradas em alguns setores de algumas atividades, e agrupadas em reduzido número de profissões. Esta segmentação é a base das desigualdades entre homens e mulheres no mercado de trabalho. Esta realidade, segundo a autora, pode esconder um aspecto importante com

relação à ocupação feminina: “como as mulheres não chegam a ter uma profissão tão definida como os homens, mas aceitam participar do mercado de trabalho em ocupações pouco definidas e menos especializadas, talvez esse aspecto explique em parte a manutenção de seu patamar de participação na indústria de transformação. (MELO, 2004, p. 97).

O ensaio teórico de Safira Ammann (1997, p. 86) tematiza a desigualdade de gênero nas relações sociais com ênfase na educação, no trabalho e na participação política da mulher na sociedade. O artigo examina em que medida ocorre o acesso da mulher latino-americana ao sistema formal de educação e até que ponto a educação funciona como elemento potencializador ou, pelo menos, amenizador do “alijamento das instâncias decisórias da produção e da política”.

A autora traz importantes informações correlacionadas à mulher. O primeiro destaque é a respeito da educação. Segundo Ammann (1997), o problema do analfabetismo vem sendo controlado e, em várias regiões, as taxas de alfabetização das novas gerações das mulheres passaram a superar a dos homens. A presença feminina no sistema formal de educação praticamente equivale à masculina, chegando mesmo a superá-la no ensino médio e superior. A mulher ocupa espaços intelectuais de destaque, principalmente em áreas de ciências exatas e naturais que tradicionalmente eram dominadas pelo sexo masculino.

Em relação ao mundo do trabalho, a subalternização da mulher ainda é permanente nos países da America Latina. Resumidamente, destacamos as seguintes questões levantadas pela autora: a) critérios de seleção e de alocação desiguais para a força de trabalho feminina em relação à masculina; b) tarefas monótonas, repetitivas, de ciclo curto, que requerem destreza e habilidade manual, em detrimento do uso da inteligência; c) salários femininos inferiores, agravados nas faixas etárias mais elevadas; d) concentração das mulheres em funções subalternas. Para Ammann (1997, p. 101), esse quadro discriminatório provoca desdobramentos em nível societal, como é o caso da feminização da pobreza que se alarga pelos países do continente.

A autora também destaca a participação política das mulheres na vida social. Os movimentos sociais femininos tiveram considerável crescimento nas últimas décadas, mas a presença da mulher na política institucional dos países latino-americanos ainda é pequena.

Analisando as conclusões da autora, podemos dizer que os ganhos das mulheres no âmbito educacional não provocaram ainda resultados satisfatórios nas “instâncias da produção e da política”.

Entender o mundo do trabalho e, simultaneamente, a condição feminina passa a ser uma tarefa essencial para não cairmos nos engodos burgueses protoformados pela concepção

liberal do trabalho como esforço individual e busca incessante pelo reconhecimento social, hoje tão escasso para aqueles que vendem sua força de trabalho.

Nos artigos deste eixo temático, notamos, de forma breve, as particularidades do trabalho feminino e como a feminização do mundo do trabalho nas últimas décadas forcejam o caminho para uma nova divisão sexual do trabalho. Se isso não acontece, a exploração da mulher na sociedade tende a se intensificar.

Novos desafios são colocados para compreendermos o papel da mulher trabalhadora.

Recorremos a Cláudia Nogueira (2006, p. 16), que faz pertinente indagação53:

[...] se a mulher contemporânea é uma trabalhadora assalariada como os homens, inclusive inserindo-se em novos postos de trabalho (até mesmo aqueles que anteriormente eram reservados para os trabalhadores), repartindo a responsabilidade do sustento familiar ou mesmo sendo a provedora principal da família, as suas atividades domésticas não deveriam também sofrer uma substancial transformação da divisão sexual do trabalho?

A autora ainda enfatiza que, uma nova divisão do trabalho, tanto no espaço produtivo como no espaço da reprodução social, torna-se necessária diante das condições atuais da sociabilidade, mas, em contrapartida, não é de “interesse do capital uma metamorfose na divisão sexual do trabalho em direção a uma igualdade substantiva e, tampouco, uma alteração hierárquica da família capaz de alcançar a igualdade de gênero e conseqüentemente eliminar a opressão patriarcal presente no núcleo familiar” (NOGUEIRA, 2006, p. 230).