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Com base no banco de dados dos registros de movimentos de massa ocorridos no espaço urbano da cidade de Ouro Preto, devidamente compilados e sistematizados, foram efetuadas inspeções técnicas de campo e coleta de informações junto a moradores dos locais atingidos, para complementação dos dados e organização sistêmica do cadastro final.

Estas visitas aos locais dos eventos foram feitas, de forma sistemática, por grupos de alunos do curso de graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal de Ouro Preto, devidamente instruídos e qualificados para proceder a aferição e complementação dos dados do inventário. Os dados coletados foram registrados em planilha própria, procedendo-se também a uma documentação fotográfica das áreas (Figura 4.2), enfocando-se o arranjo geral da situação, condicionantes geotécnicos locais e eventuais obras de estabilização e/ou contenção, executadas no local.

Figura 4.2 – Registro Fotográfico da ruptura ocorrida na Rua Padre Rolim

Constatou-se que muitos dos processos ocorridos mostram potencial de repetição a curto e médio prazo, principalmente porque as intervenções adotadas por diferentes gestões do poder público municipal (retaludamento, drenagem superficial, drenagem subterrânea, aterros compactados, muro de gabiões, etc), mostraram-se inadequadas. A inconsistência destas soluções está diretamente relacionada à percepção equivocada dos potenciais mecanismos de instabilização da encosta.

Considere-se, por exemplo, as encostas associadas às litologias do Grupo Sabará. Em geral, estes taludes tendem a apresentar excelente comportamento geotécnico, mesmo para cortes verticais elevados. Entretanto, em horizontes superiores mais intemperizados de feições morfológicas desfavoráveis (na direção da xistosidade), as zonas de oscilação de umidades pode induzir intensa ação erosiva e a mobilização de escorregamentos superficiais.

Em geral, obras de contenção convencionais têm sido propostas para a solução dos problemas, sem levar em consideração as especificidades locais, a absoluta necessidade de uma ampla investigação geotécnica prévia e a influência decisiva da geologia local na natureza dos processos de movimentos de massa (Figura 4.3).

Figura 4.3 – Exemplo de solução estrutural inadequada (Rua René Gianetti)

Os trabalhos de campo possibilitaram caracterizar estas incongruências entre os condicionantes geológico-geotécnicos locais e as soluções adotadas e, assim, avaliar projeções em termos da repetição de eventos danosos.

A síntese destes trabalhos consistiu na elaboração de um mapa geotécnico, representando os processos (escorregamentos, queda e rolamento de blocos, corrida de tálus e erosão fluvial), estado de atividade atual (ativa, inativa/latente e estabilizada), assim como os materiais envolvidos (solos, rocha, rocha / detritos e depósitos de tálus). A etapa de campo foi auxiliada pelos mapas topográficos inventariados na escala 1:5.000, fotografias aéreas (escala 1:5.000), ortofotos e uso de GPS (Global Positioning System) para localização precisa das ocorrências. O datum utilizado foi o Córrego Alegre apresentando, quanto à qualidade do sinal, uma oscilação com erro aproximado de até 7,0m.

2007

2008

Uma avaliação preliminar incluiu a diferenciação entre ocorrências e possibilidades de ocorrências: as primeiras referem-se à deflagração efetiva do processo, com ou sem relato de prejuízos econômicos; as segundas referem-se à potencialidade de uma dada ocorrência, avaliando-se a gravidade da situação em relação à iminência de deflagração efetiva. Estas considerações permitiram distinguir os movimentos de massa mobilizados e os que subsidiam análises de susceptibilidade do meio.

As ocorrências propriamente ditas foram sistematizadas, tomando-se como referência apenas o conjunto de eventos passíveis de contextualização completa, sendo descartadas aquelas que apresentavam dados insuficientes e/ou incompletos para uma caracterização plena. Neste contexto, 254 ocorrências foram efetivamente listadas e correlacionadas com a natureza correspondente do evento geotécnico (Figura 4.4).

Figura 4.4 – Distribuição das ocorrências cadastradas por tipologia dos eventos geotécnicos

Os escorregamentos (rotacionais e translacionais) constituem os eventos predominantes por excelência no ambiente urbano da cidade, com relevância também para as quedas e tombamento de blocos rochosos. Os demais eventos têm incidências mais limitadas e de abrangências específicas.

Nas vistorias de campo, etapa de complementação dos dados aferidos a partir dos eventos ocorridos, elaborou-se ficha de campo (Figura 4.5 e reproduzida no Anexo I), visando otimizar a coleta e a sistematização das informações.

Figura 4.5 – Modelo da ficha de campo utilizada nas inspeções in situ

Em síntese, as principais informações coletadas foram as seguintes:

 Informações cadastrais, incluindo codificação da ocorrência, locação, etc;

 Diagnóstico da situação local, com informações relativas à locação, drenagem, ocupação e tipo de vegetação;

 Natureza e descrição do evento geotécnico;  Litologia;

 Mecanismos potenciais de instabilização e riscos associados;

 Avaliação do risco, em termos de potenciais perdas de vidas humanas, danos construtivos, moradias envolvidas, riscos ambientais ou mesmo remotos;

 Prioridade de intervenção em caso de evolução dos problemas detectados;

 Principais recomendações que possam solucionar ou reduzir a evolução da atual condição para uma condição mais crítica do ponto de vista geotécnico.

O diagnóstico de cada evento foi feito identificando-se as principais características locais e ponderando fatores de risco, de forma a caracterizar a susceptibilidade do meio em relação à mobilização de um dado movimento de massa. Nesta abordagem, foram identificados os agentes predisponentes e efetivos e as causas internas, intermediárias e externas dos movimentos de massa.

Os agentes predisponentes são entendidos como o conjunto de fatores inerentes ao meio físico local (litologia, declividade, etc.), enquanto os agentes efetivos referem-se ao conjunto de fatores diretamente responsáveis pelo desencadeamento do movimento de massa, incluindo-se a ação humana.

Quanto aos condicionantes geológicos, são analisados a composição mineralógica e físico-química das diferentes litologias, graus de alteração, atitudes das camadas, padrões estruturais e famílias de descontinuidades. Os materiais (solos e rochas) são classificados com base em padrões de distribuição granulométrica (no caso dos solos) ou geomecânicos (caso de rochas). Especial relevância deve ser dada à aferição da posição do lençol freático no terreno e faixas de oscilação. Os fatores geomorfológicos, muitas vezes denominados de parâmetros topográficos, incluem declividades, forma da encosta (em planta e em perfil), orientação, espessuras do solo, amplitude da encosta, elevação, etc.

A cobertura vegetal é considerada como fator de estabilização de encostas não somente em relação aos escorregamentos, como também em relação a movimentos lentos de rastejo. Apresenta efeitos benéficos em áreas atingidas por escorregamentos, através da retenção da massa mobilizada e atua também como sistema dissipador de energia, diminuindo a velocidade do material em deslocamento e minimizando os danos em terrenos situados a jusante.

A ação do homem, como importante agente modificador da dinâmica natural do relevo, atua como elemento de grande relevância na ocorrência de movimentos de massa, das seguintes formas: remoção da cobertura vegetal; lançamento e concentração das águas servidas; vazamentos na rede de abastecimento, esgoto e presença de fossas; execução de cortes com geometria inadequada quanto a altura e inclinação; execução de aterros de modo inadequado quanto a compactação, geometria e fundação; lançamento de lixo e entulho nas encostas; vibrações produzidas por tráfego pesado, etc.

As causas internas são aquelas que induzem condições de colapso da encosta sem quaisquer mudanças da sua geometria, resultando de processos de redução da resistência interna do material (acréscimos de poropressões, diminuição da coesão e atrito interno por processo de alteração, etc). As causas externas são aquelas que induzem acréscimos das tensões atuantes, sem uma concomitante diminuição da resistência do material (cortes do terreno, efeitos de sobrecargas, etc). Causas intermediárias são aquelas que envolvem efeitos conjugados de aumento dos esforços atuantes e redução da resistência intrínseca dos materiais (exemplo típico é a liquefação do material por efeitos de vibrações externas).

Os depósitos potencialmente instáveis são aqueles que tendem a apresentar elementos críticos ou combinações de elementos críticos em suas feições geomorfológicas, geológicas, geotécnicas e/ou oriundas de ocupação antrópica. Assim, taludes íngremes e altos com lençol freático elevado (elevadas poropressões induzidas no maciço); horizontes superficiais de solos muito intemperizados; descalçamento da base de taludes; material friável ou incoerente aflorando abaixo de material mais resistente; maciços rochosos intensamente fraturados; concentração de núcleos habitacionais em áreas acidentadas e de difícil acesso; condições climatológicas desfavoráveis (chuvas torrenciais), etc são exemplos destes condicionantes.

Após as investigações de campo e o preenchimento completo das fichas de campo, o passo seguinte foi a digitalização e a sistematização dos registros, envolvendo processos complementares de tratamento dos dados em escritório. Esta etapa dos trabalhos permitiu a geração de um sistema de informação georeferenciado, base para elaboração de um posterior sistema de informações geográficas aplicado para a área urbana da cidade de Ouro Preto/MG.