• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III: TRADUZIR O DISCURSO SOBRE MOSCO

3.3 Comentário à tradução do prefácio

3.3.1 Tradução dos nomes próprios

Leopardi cita no seu prefácio 75 nomes próprios26, distribuídos entre autores, poetas, historiadores, tipógrafos e tradutores, pertencentes

26 No Anexo I encontra-se uma tabela com a relação destes 75 nomes dispostos

em ordem alfabética, sendo que a primeira coluna constitui os nomes na forma como aparecem no prefácio em italiano; na segunda coluna, a forma recorrente em português e na terceira coluna, a forma adotada para a tradução.

a nacionalidades e épocas diferentes. Esse fato representou um desafio durante a tradução, porque ele fez três tipos de referências: literárias, ou seja, a obras, autores, críticos, tradutores e editores; geográficas, porque muitas vezes associava um autor à sua terra natal, e históricas, pois associava autores a fatos históricos. Apesar de distintas, essas referências estão intimamente entrelaçadas.

Outra peculiaridade relacionada às citações de nomes feitas por Leopardi é que alguns contemplam somente o sobrenome, o que contribuiu para aumentar o grau de dificuldade em estabelecer o conhecimento de quem realmente Leopardi estava tratando, como é o caso de: Zappi, Blair e Grillo.

Dentre os 75 nomes citados por Leopardi, destaco que há a ocorrência de nomes de autores italianos, como por exemplo: Fulvio Ursino, Tasso, Marino, Bettinelli e Bodoni27. A busca pela ocorrência desses nomes na língua portuguesa resultou em encontrá-los na mesma forma como aparecem no texto de Leopardi e por esse motivo a opção adotada na tradução foi a de manter a grafia original.

Visto que o Discurso sobre Mosco trata das poesias, da vida e das traduções desse poeta grego, é muito presente a citação de nomes gregos que, no prefácio, aparecem italianizados, como: Suida (Σουίδα), Aristarco (Ἀρίσταρχος), Bione (Βίωνος) e Archiloco (Ἀρχίλοχος), correspondentes em português a Suídas, Aristarco, Bíon e Arquíloco, opções que foram empregadas na tradução.

Os nomes de origem latina também aparecem italianizados, assim como os de origem egípcia. Destes últimos cito os reis Tolomeo Filometore e Tolomeo Filadelfo que têm a seguinte ocorrência em português: Ptolomeu Filometor e Ptolomeu Filadelfo. De origem latina comento os nomes: i Bavi ed i Mevi, os quais Leopardi menciona em seu prefácio, dizendo que um Anacreonte parafraseado só poderia ser invejado pelos Bavi e Mevi. Em um primeiro momento, a dificuldade residiu em determinar a que ou a quem se referiam esses nomes, pois assim como poderiam ser duas pessoas distintas, do mesmo modo poderiam referir-se a dois grupos familiares, visto que os nomes encontravam-se no plural, ou ainda poderiam constituir referências

27 Apresento em itálico as formas encontradas no texto de Leopardi para

destacá-las visualmente dos seus correspondentes encontrados na língua portuguesa.

geográficas, nesse caso, estariam se referindo, no plural, aos habitantes de dois lugares. A única certeza era a de que ambos se encontravam no plural e eram do gênero masculino, informação que vinha determinada pela terminação i. Identificado esse aspecto, procurei por referências que me esclarecessem essa questão: em português, encontrei Bávio e Mévio referenciados nas Bucólicas III de Virgílio, em que o poeta grego os critica por serem dois poetas de péssima qualidade28. Pela propriedade atribuída às suas poesias, esses dois poetas são citados como poetastros, ou poetaços, sinônimos de maus poetas. Leopardi os citou no plural (em português, Bávios e Mévios) e uma possível hipótese para justificar a sua escolha pode estar no fato de ele ter atribuído aos nomes Bávio e Mévio o valor coletivo e representativo da classe dos maus poetas. Foi com base nesse pressuposto que os nomes foram mantidos no plural na tradução.

Leopardi mencionou ainda nomes de tradutores e professores de outras nacionalidades, como o francês Longepierre, o inglês Davide Withford e os alemães Lieberkühn e Küttner. Assim como Leopardi os reproduziu, mantendo-os na sua língua de origem, também o fiz, mesmo porque em alguns casos foi difícil determinar de quem se tratava, considerando que no texto de Leopardi não havia muitas pistas que contribuíssem para isto, pois, como já foi dito no começo desta seção, alguns nomes estão incompletos. A ausência de notas explicativas sobre esses autores foi outro fator que dificultou o entendimento e consequentemente a tradução. As notas de rodapé do texto de partida, na sua maioria, relacionam-se ao nome de uma cidade e a um ano, o qual provavelmente corresponde ao ano da publicação ou edição da obra utilizada por Leopardi.

Ainda em relação aos nomes, descrevo a ocorrência da abreviação de axiônimos feita por Leopardi em P. Pagnini, M. de Fontenelle e M. Poinsinet de Sivry. Situação que, em um primeiro momento, gerou um questionamento: o que significam esse M e P? Poderiam ser a abreviaturas de nome, e se fosse esse o caso, não necessariamente haveria alteração na tradução. Outra possibilidade, e essa parece ser a mais condizente, é a de que estas letras correspondem à

28Outra referência a Bávio e Mévio se encontra em SHELLEY, Percy Bysshe;

SIDNEY, Sir Philip. Defesa da poesia. Ensaio, tradução e notas de Enid Abreu Dobranszky. São Paulo: FAPESP/ Iluminuras, 2002.

abreviação dos axiônimos padre e monsieur. Sendo assim, no português padre pode receber a abreviatura Pe. e monsieur, título usado para indicar a boa condição social de um homem e que tem o seu correspondente em português senhor, que por sua vez admite a abreviatura Sr.. Resolvida essa dúvida a questão passou a ser por que Leopardi conservou no seu texto a abreviatura de monsieur em francês e não usou signore, que seria o seu correspondente em italiano. Uma provável justificativa para isso seria a de que Leopardi, sendo leitor da língua francesa, teria lido Poinsinet e Fontenelle no idioma original e utilizado a abreviatura do pronome de tratamento em francês para discorrer sobre esses autores no seu prefácio. Além disso, possivelmente não somente Leopardi, mas os demais leitores desses autores franceses tinham a referência indicativa do autor vinculado à abreviatura com a letra M e, por esse motivo, Leopardi teria preservado a sua forma de origem. Há de se considerar também que, no tempo de Leopardi, a língua francesa era uma língua de grande prestígio, conhecida no meio intelectual/literário, de modo que, para Leopardi, o fato de utilizar axiônimos franceses possivelmente não se constituiu em uma preocupação em relação aos seus possíveis leitores quanto à legibilidade do texto. Na tradução usei Pe. para indicar P. Pagnini e Sr. para designar os autores franceses.