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SCLE11 139-157 (AC) 9 F – ACGACCAAGCCATCATT

III.1.2 Trans-splicing e o gene do spliced leader em T rangel

Em biologia molecular, splicing é uma modificação pós- transcricional no RNA, na qual os íntrons são removidos e os exons co- nectados. É um processo necessário à maturação dos RNAm típicos de eucariotos que precede à tradução. Na maioria das vezes é multienzimá- tico e catalizado no chamado spliceosomo, um complexo de pequenas ribonucleoproteínas nucleares (snRNP). Se o splicing ocorrer na mesma molécula de RNA é chamado de cis-splicing, e se envolver moléculas diferentes, trans-splicing (LODISH; BERK; KAISER et al., 2007).

O fenômeno de trans-splicing de RNA foi demonstrado em pro- tozoários tripanosomatídeos e subsequentemente em nematódeos e tre- matódeos no final da década de 80 (AGABI AN, 1990). Similarmente a outros eucariotos, o RNAm maduro destes organismos possui na extre- midade 5´um cap e na extremidade 3´uma cauda poli- A. O cap consiste de uma guanosina 7-metilada (7mG) e da metilação específica dos nu- cleotídeos 1 a 4. Entretanto, além destas características comuns, todos os RNAm de organismos da ordem Kinetoplastida possuem uma sequência comum de 39 a 41 nucleotideos que é tipicamente uniforme dentro de cada espécie. Esta sequência comum, que não é sintetizada contigua- mente com a sequência protéica do gene a ser traduzido, é comumente chamada de spliced leader (SL), ou mini-exon, a qual é adicionada por trans-splicing a todos os RNAm. Assim, o gene que codifica para o RNA do SL é de importância central para o metabolismo de RNAm des- tes organismos, porque o seu produto é o substrato para a reação de

trans-splicing que provê ao RNAm a sua estrutura 5´cap (CAMPBELL; STURM; YU, 2000; CAMPBELL; THOMAS; STURM, 2003).

Em tripanosomatídeos, os genes que codificam o SL estão pre- sentes em aproximadamente 200 a 300 cópias e são organizados em tandem, apesar de cada unidade ser transcrita individualmente ( VA- NHAMME; PAYS, 1995). Em T. brucei gambiense, T. cruzi e C. fasci- culata, algumas unidades do gene são interrompidos por retrotranspo- sons site-específicos, mas em T. rangeli está intercalado com a sequên- cia do gene da subunidade 5S do RNAr, assim como em T. vivax (AK- SOY, 1991; AKSOY; SHAY; VILLANUEVA et al., 1992). Especifi- camente em T. rangeli, além de estarem organizados em tandem, encon- tram-se em três agrupamentos (clusters) e apresentam aproximadamente 330 cópias por genoma diplóide ( AKSOY; SHAY; VILLANUEVA et al., 1992).

O gene do SL é organizado em três regiões distintas : exon, íntron e região intergênica. O exon, altamente conservado mesmo entre dife- rentes espécies, contém a sequência de 39-41 nucleotídeos que é adicio- nada pós-transcricionalmente em todos os RNAm nucleares por trans- splicing. O íntron apresenta uma maior var iabilidade, tanto em tamanho quanto na sequência, sendo relativamente conservado entre espécies de um mesmo gênero ou sub-gênero. A região intergênica não é transcrita, sendo altamente var iável mesmo dentro de um mesmo gênero, apresen- tando tamanhos e sequências nucleotídicas distintas mesmo entre espé- cies muito próximas. O transcrito do gene SL varia em tamanho, de 96nt em Leishmania spp. a 141nt em T. brucei (98nt em T. rangeli), sendo encontrado predominantemente na porção de RNA não poliadenilado (AKSOY; SHAY; VILLANUEVA et al., 1992; CAMPBELL; ST URM; YU, 2000; GRISARD; CAMPBELL; ROMANHA, 1999).

Desde a descoberta do gene do SL em 1984, a identidade da RNA polimerase (RNApol) responsável pela transcrição deste gene em orga- nismos da ordem Kinetoplastida tem sido debatida. Vár ios grupos con- cluíram que o gene é transcrito pela RNApol II, RNApol III ou por uma polimerase com características intermediár ias. A presença do 7mG cap no transcrito do SL foi usado em favor da RNApol II, enquanto a ident i- ficação de elementos putativos Box A/B na região transcrita do gene e a presença de uma região poli T a jusante do gene suportam a transcrição pela RNApol III. Entretanto, só o cap e a cauda poli T foram confirma- dos experimentalmente. De fato, uma sequência de seis ou mais T são requeridos para terminação in vivo e in vitro pela RNApol II, enquanto que a RNA pol III necessita de apenas quatro T (CAMPBELL; STURM;

YU, 2000; CAMPBELL; THOMAS; STURM, 2003; PALENCHAR; BELLOFATTO, 2006).

A transcrição do gene da subunidade 5S do RNAr foi demonstra- da ser realizada por uma RNApol III (CABALLERO; SOUSA; MAR- QUES et al., 2007; CAMPBELL; ST URM; YU, 2000; CAMPBELL; THOMAS; STURM, 2003); então, poderia de se esperar que em T. ran- geli e em T. vivax, com a presença do gene do 5S RNAr inserido na re- gião intergênica do gene do SL, ocorresse uma coregulação transcricio- nal destas sequências pela RNApol III ou por outros fatores de transcri- ção regulatórios ( AKSOY; SHAY; VILLANUEVA et al., 1992). Entre- tanto, apesar da discussão estar em aberto, evidências experimentais têm identificado regiões promotoras de recrutamento da RNApol II para a transcrição do gene SL em tripanosomatídeos (GILINGER; BELLO- FATTO, 2001).

Estas regiões promotoras se encontram a montante do exon e fo- ram identificadas por mutagênese direcional em algumas espécies do gênero Leishmania, em Leptomonas seymouri, em T. brucei e em T. cruzi (CAMPBELL; STURM; YU, 2000), mas não há estudos em T. rangeli (Figura III.1).

Figura III.1 – Representação esquemática dos elementos promotores do gene

do spliced leader identificados in vivo por mutagênese direcional (CAMP- BELL; STURM; YU, 2000).

Devido à organização do gene do SL em grandes arranjos em tandem e a seu isolamento transcricional por espaçadores não transcri- tos, estes genes foram os primeiros candidatos para a identif icação de promotores de transcrição e de elementos de terminação (CAMPBELL;

STURM; YU, 2000). Além disso, tem sido utilizado como marcador ge- nético para distinguir e/ou caracterizar diferentes espécies de parasitos dentro da Ordem Kinetoplastida. (DESQUESNES; DAVILA, 2002; FERNANDES; SANTOS; CUPOLILLO et al., 2001; GRISARD; CAMPBELL; ROMANHA, 1999; MURT HY; DIBBERN; CAMP- BELL, 1992; URREA; CARRANZA; CUBA et al., 2005; VALLEJO; GUHL; CARRANZA et al., 2003).