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Transcrição da história “O cavalo e os macacos”, retirada da tese de mestrado

Anexo 1. Materiais das Sessões

1.5. Transcrição da história “O cavalo e os macacos”, retirada da tese de mestrado

homogeneização cultural”, de José Victor Neto (Universidade Federal do Pará)

O cavalo e os macacos

“Era uma vez um cavalo muito magro, muito maltratado, ele trabalhava muito, ele carregava montes de tirada de cana, carregava muita coisa na carroça. Então era muito maltratado pelo trabalho, quase escravo. Ele sofria muito o cavalo, e aí o dono dele, o dono desse cavalo também era agricultor, tinha lá um roçal de milho, um roçal de milho muito bonito, mas quando começou a amadurecer o milho, ele começou a ter muito prejuízo, porque os macacos vinham lá e comiam o milho. E ele já não tinha mais o que fazer, já estava, assim, se maldizendo da vida, estava triste lá porque toda a vez os macacos vinham e comiam todo aquele milho dele, ele não sabia mais o que fazer para espantar os macacos. Se ele largava ali um pouquinho o roçado, os macacos vinham e comiam tudo.

E aí o cavalo ouvindo o dono se maldizendo da vida por causa disso, chegou com ele e falou:

- Meu amo, eu tenho uma proposta para lhe fazer. Se eu livrar você desses macacos, se eu trouxer eles aqui para o senhor tudinho, você me dá a liberdade?

- Dou. Está feito o trato.

- Então pronto. Pode deixar que eu vou resolver isso. - Mas como é que você vai resolver isso?

- Pode deixar que eu vou dar meu jeito.

Aí o cavalo pegou e chegou lá no roçado, ali naquele cantinho que os macacos desciam e se deitou, lá no meio do roçado e se fingiu de morto. Aí os macacos foram chegando, estava naquela hora em que os macacos iam comer. O macaco foi chegando e aí começaram a olhar ali e ficaram meio escabriado com medo:

- Que é aquilo? Tem um bicho morto no meio… será que é um bicho morto? Será que está morto mesmo?

137 - Vamos cutucar.

Foram lá e começaram a cutucar o cavalo e ele nada de se mexer. - Rapaz, eu acho que está morto mesmo.

Aí começaram a cutucar mais ainda, aí o cavalo sentiu que os macacos estavam lá, ouvindo eles conversando, aí começou a soltar uns ventos.

- Credo está fedendo já. Está morto mesmo. Está estragado. Já está começando a feder e a estragar a nossa comida. E agora? Que é que a gente vai fazer?

- Ah vamos tirar esse bicho daqui e vamos arrastar ele até um buraco lá na frente. A gente joga ele lá dentro porque senão quando ele começar a estragar, vai acabar com a nossa comida. Ninguém vai conseguir comer milho no meio de um bicho morto. Então vamos tentar tirar.

- Como a gente faz?

- Vamos amarrar a espora na cintura, a gente pega umas empirra ali e amarra na cintura e tenta arrastar o cavalo para fora do roçado.

- Pois então, embora compadre.

Aí se juntaram até ao último macaco, amarraram a empirra na cintura, amarraram o cipó no cavalo e começaram a tentar arrastá-lo. E nada do cavalo se mexer. O cavalo era muito pesado.

- Pois é, compadre. Nós sozinhos não vamos conseguir, não. Vamos buscar mais gente. Vamos buscar mais macacos para ajudar a gente.

Aí voltaram para a mata, e isso foi de tarde, e já voltaram com um monte de macaco.

- Já compadre. Bora? - Bora.

Amarraram de novo e amarraram o cavalo. - Todo o mundo, vamos lá, puxar.

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- Oh rapaz, isso não vai dar certo, a gente vai ter de chamar mais gente, vamos amanhã de manhã, a gente vem para cá com mais macaco para a gente puxar.

Aí foram para a mata de novo. Quando foi noutro dia, voltou com um monte de macaco.

- Agora a gente tira.

Aí começaram a puxar e nada do cavalo se mexer e quanto mais eles puxavam mais o cavalo ficava soltando vento, dava aquele peido podre que empestiava o ar todo, empestiava tudo de catinga.

- Credo, está fedendo muito. Deus me livre. Isso não vai dar certo. E agora como é que a gente vai fazer? Nem com esse monte de macaco a gente tirou.

- Não, mas ainda tem uma turma que está bem longe.

- Pois então, fulano, vai lá buscar a turma que está faltando para a gente pegar todos os macacos que estão faltando e arrastar esse cavalo que está aqui nesse roçado.

Pois bem, ele foi. Quando foi de tardezinha ele chegou lá da turma, então estavam todos os macacos daquela mata estavam ali para arrastar o cavalo, por senão eles iam perder aquele roçado, tinha muito milho.

- Já? Então vamos se amarrar.

E começaram lá a amarrar o cipó na cintura e amarraram o cavalo quando ele estava todo amarrado, estava todo enólanado, aí o chefe deles falou:

- Já está todo o mundo agarrado? - Já.

- Pode puxar? - Pode?

Então o cavalo ouviu, levantou e abriu na carreira, abrochou na carreira e correr, correr, correr com o macaco gritando, gritando:

- Oh compadre, mete a espora nesse cavalo para ele parar. - Rapaz eu já estou com o braço quebrado aqui.

139 - Ah rapaz ele já quebrou minha perna.

Outro já tinha partido a cabeça, outro já estava morto. Eles bateram na estrouqueira, no meio da mato e aí o cavalo chega gritando lá na casa do dono.

- Viu, meu amo, estão aqui os macacos. Eu não disse que trazia para o senhor? Era um monte de macacos, alguns já tinham morrido no meio da viagem e outros ainda estavam vivos e o dono começou a desatar os macacos que estavam vivos e a jogar eles numa jaula, prendeu todos os macacos, os que ainda tinham sobrevivido e aí pôs uma bacia bem grande para o cavalo. O cavalo se alimentou bem, a partir daquele momento, ele já ganhou liberdade, e aí o cavalo de magro já ficou gordo, um cavalo assim bonito, porque já não estava mais naquele trabalho pesado e passou o resto da vida dele lá na beira do igarapé comendo uma uma pevidinha, na sombra e ainda um dia desses eu passei e vi o cavalo lá feliz da vida, porque ele agora já não trabalha mais, é um cavalo livre”.

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