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Transe e incorporações 

No documento Portal Luz Espírita (páginas 185-200)

O  estado  de  transe  é  esse  grau  de  sono  magnético  que  permite  ao  corpo  fluídico  exteriorizar­se,  desprender­se  do  corpo  carnal,  e  à alma tornar  a  viver  por  um instante sua vida livre e independente. A separação, todavia, nunca é completa; a  separação absoluta seria a morte. Um laço invisível continua a prender a alma ao seu  invólucro  terrestre.  Semelhante  ao  fio  telefônico  que  assegura  a  transmissão  entre  dois  pontos,  esse  laço  fluídico  permite  à  alma  desprendida  transmitir  suas  impressões pelos órgãos do corpo adormecido. No transe, o médium fala, move­se,  escreve  automaticamente;  desses  atos,  porém,  nenhuma  lembrança  conserva  ao  despertar. 

O estado de transe pode ser provocado, quer pela ação de um magnetizador,  quer  pela  de  um  Espírito.  Sob  o  influxo  magnético,  os  laços  que  unem  os  dois  corpos  se  afrouxam.  A  alma,  com  seu  corpo  sutil,  vai­se  emancipando  pouco  a  pouco;  recobra  o  uso  de  seus  poderes  ocultos,  comprimidos  pela  matéria.  Quanto  mais profundo é o sono, mais completo vem a ser o desprendimento. As radiações  da  psique  aumentam  e  se  dilatam;  um  estado  diferente  de  consciência,  faculdades  novas  se  revelam.  Um  mundo  de  recordações  e  conhecimentos,  sepultados  nas  profundezas do “eu”, se patenteia. O médium pode, sob  o império de uma vontade  superior,  reconstituir­se  numa  de  suas  passadas  existências,  revivê­la  em  todas  as  suas  particularidades,  com  as  atitudes,  a  linguagem,  os  atributos,  que  caracterizam  essa existência. Entram ao mesmo tempo em ação os sentidos psíquicos. A visão e  audição, a distância, se produzem tanto mais claras e fiéis quanto mais completa é a  exteriorização da alma. 

No  corpo  do  médium,  momentaneamente  abandonado,  pode  dar­se  uma  substituição  de  Espírito.  É  o  fenômeno  das  incorporações.  A  alma  de  um  desencarnado,  mesmo  a  alma  de  um  vivo  adormecido,  pode  tomar  o  lugar  do  médium e servir­se de seu organismo material, para se comunicar pela palavra e pelo  gesto com as pessoas presentes. 

Sábios  eminentes  dão  testemunho  da  realidade  desses  fatos.  O  Dr.  Oliver  Lodge, em seu discurso na Royal Society, de Londres, em 31 de janeiro de 1902 167 ,  assim se exprime: 

167 

“Uma  máquina,  elaborada  como  o  são  os  nossos  corpos,  pode  ser  empregada,  no  caso  de  transe,  não  só  pela  Inteligência  que,  por  assim  dizer,  a  fabricou, mas também por outras Inteligências a que dela se permite fazer uso. Isso  naturalmente não se realizaria senão por um certo tempo e com bastante dificuldade.  Em sua comunicação transmitida ao Congresso Oficial de  Psicologia, de Paris, em  1900 168 ,  o  professor  Myers,  de  Cambridge,  era  ainda  mais  afirmativo.  Depois  de  haver  enumerado  os  fenômenos  obtidos  no  estado  de  transe  pelas  Sras.  Piper  e  Thompson, fenômenos que ele estuda há 25 anos, assim concluía o professor: 

“Em  sua  maioria,  os  fatos  enunciados  lembram  o  caráter  e  a  memória  de  certas pessoas mortas... Estou convencido de que essa substituição de personalidade,  ou mudança de Espírito, ou possessão, é um sensível progresso na evolução da nossa  raça”. 

Durante o transe, o Espírito do médium pouco se afasta; permanece quase  sempre  confundido  no  grupo  espiritual  que  cerca  o  seu  invólucro  terrestre.  Sua  influência às vezes se  faz ainda sentir sobre o  corpo, a que seus próprios hábitos o  atraem.  Sua  ação  se  torna  em  tal  caso  um  incômodo,  um  estorvo  para  os  Espíritos  que se comunicam. 

Quando  a  força  oculta  é  insuficiente  e  o  transe  pouco  profundo,  o  desprendimento é incompleto; as personalidades se confundem. O médium resiste à  ação exterior do Espírito, que se esforça por tomar posse de seus órgãos. 

Suas radiações psíquicas se mesclam às do manifestante. Daí, em variadas  proporções,  conforme  os  casos,  duas  partes  a  distinguir  na  manifestação:  a  do  médium  e  a  do  Espírito,  operação  delicada,  que  exige  profundo  conhecimento  das  personalidades que se apresentam e das condições do fenômeno. 

O estado de transe facilita a sugestão. Nos fenômenos de escrita e da mesa,  o médium se conserva na plena posse do seu “eu”, de sua vontade, e poderia repelir  as inspirações que recebe. No desprendimento já se não dá o mesmo. A alma se tem  retirado,  e  o  cérebro  material  fica  exposto  a  todas  as  influências.  Quando  está  suficientemente  protegido,  o  médium  torna­se receptivo,  tanto  às  sugestões  de  um  magnetizador como às dos assistentes, ou às de um Espírito. É o que muitas vezes  lança  uma  certa  confusão  na  interpretação  dos  fatos  e  exige,  da  parte  dos  experimentadores, extrema prudência. Em tal caso é difícil distinguir a natureza real  das  influências  atuantes.  Hudson  Tuttle,  médium  ele  próprio,  o  faz  notar  em  seu  livro ARCANA OF SPIRITUALISM: 

“Os grupos espíritas são frequentemente joguete de uma ilusão, enganados  por suas próprias forças positivas. Afastam os ditados espíritas, substituindo­os pelo  reflexo  de  seus  próprios  pensamentos;  e  então  observam  contradições  e  confusões  que ingenuamente atribuem à intervenção de Espíritos malévolos”. 

168 REVUE  SCIENTIFIQUE  ET  MORALE  DU  SPIRITISME,  outubro  de  1900,  pág.  213.  Ver  também  o 

É preferível, por isso, deixar agirem sozinhos os Espíritos sobre o médium,  abstendo­se  de  toda  intervenção  magnética humana.  Foi  sempre  o  que  fizemos, no  curso  de  nossos  estudos  experimentais.  Em  raras  circunstancia,  quando,  faltando­  lhes de repente a força psíquica, as Inteligências nos pediam que atuássemos sobre o  médium por meio de passes, bastava essa passageira intervenção para fazer crer aos  assistentes numa ação sugestiva de nossa parte. 

Na  maioria  das  vezes,  os  fluídos  de  um  magnetizador,  por  seu  estado  vibratório particular, contrariam os dos Espíritos, em lugar de auxiliá­los. Têm estes  que se entregarem a um trabalho de adaptação, ou purificação, que esgota as forças  indispensáveis à manutenção. Um magnetizador, cujos fluidos não sejam puros, que  não  possua  um  caráter  reto,  nem  irrepreensível  moralidade,  pode,  mesmo  sem  o  querer, influenciar o sensitivo num sentido muito desfavorável. 

Mesmo quando a ação oculta é poderosa e  bem determinada, é preciso ter  ainda em conta o embaraço do Espírito que se deve comunicar com o auxílio de um  organismo estranho, mediante recursos muitas vezes restritos. O estado de harmonia  entre as faculdades do Espírito e as do médium raramente existe; o desenvolvimento  dos  cérebros não é idêntico, e as manifestações são por isso  contrariadas.. É o que  nos  diziam  certos  Espíritos,  no  curso  de  nossas  experiências  de  incorporação:  “Estamos acanhadamente encerrados; faltam­nos meios suficientes para exprimir os  nossos  pensamentos.  As  partículas  físicas  deste  cérebro  são  muito  grosseiras,  para  poderem  vibrar  sob  nossa  ação,  e  as  nossas  comunicações  se  tornam  por  isso  consideravelmente enfraquecidas”. 

O Espírito Robert Hyslop o repete a seu filho, o professor Hyslop. Quando  penetra na atmosfera terrestre e no organismo do médium, as coisas, diz ele, se lhe  amesquinham:  “Todas  as  coisas  se  me  apresentam  tão  nitidamente,  e  quando  aqui  venho para exprimi­las, James, não o posso”. 169 

Entretanto, quando  se  pode  dispor  de  um  médium  de real valor, quando  a  possessão  é  completa  e  a  força  suficiente  para  afastar  as  influências  contrárias,  deparam­se  fenômenos  Imponentes.  O  Espírito  se  manifesta  na  plenitude  do  seu  “eu”,  em  toda  a  sua  originalidade.  O  fenômeno  das  incorporações  se  mostra  então  superior a todos os outros. 

Indagam certos experimentadores: o Espírito do manifestante se incorpora  efetivamente  no  organismo  do  médium?  Ou  opera  ele  antes,  à  distância,  pela  sugestão mental e pela transmissão de pensamento, como  o pode fazer um espírito  exteriorizado do sensitivo. 

Um exame atento dos fatos nos leva a crer que essas duas explicações são  igualmente  admissíveis,  conforme  os  casos.  As  citações  que  acabamos  de  fazer  provam  que  a  incorporação  pode  ser  real  e  completa.  É  mesmo  algumas  vezes 

169 M.  Sage, MADAME  PIPER  ET  IA  SOCLÉTÉ  DEZ  RECHERCHES  PSYCHIQUES, pág. 244. mental  e pela 

inconsciente,  quando,  por  exemplo,  certos  Espíritos  pouco  adiantados  são  conduzidos  por  uma  vontade  superior  ao  corpo  de  um  médium  e  postos  em  comunicação  conosco,  a  fim  de  serem  esclarecidos  sobre  sua  verdadeira  situação.  Esses  Espíritos,  perturbados  pela  morte,  acreditam  ainda,  muito  tempo  depois,  pertencerem à vida terrestre. Não lhes permitindo seus fluidos grosseiros o entrarem  em  relação  com  Espíritos  mais  adiantados,  são  levados  aos  grupos  de  estudo,  para  serem  instruídos  acerca  de  sua  nova  condição.  É  difícil  às  vezes  fazer­lhes  compreender  que  abandonaram  a  vida  carnal,  e  sua  estupefação  atinge  o  cômico,  quando, convidados a comparar o organismo que momentaneamente animam com o  que  possuíam  na  Terra,  são  obrigados  a  reconhecer  o  seu  engano.  Não  se  poderia  duvidar, em tal caso, na incorporação completa do Espírito. 

Noutras circunstâncias, a teoria da transmissão, a distância, parece melhor  explicar  os  fatos.  As  impressões  oriundas  de  fora  são  mais  ou  menos  fielmente  percebidas  e  transmitidas  pelos  órgãos.  Ao  lado  de  provas  de  identidade,  que  nenhuma hesitação permitem sobre a autenticidade do fenômeno e intervenção dos  Espíritos,  verificam­se,  na  linguagem  do  sensitivo  em  transe,  expressões,  construções  de  frases,  um  modo  de  pronunciar  que  lhe  são  habituais.  O  Espírito  parece  projetar  o  pensamento  no  cérebro  do  médium,  onde  adquire,  de  passagem,  formas de linguagem familiares a este. A transmissão se efetua em tal caso no limite  dos  conhecimentos  e  aptidões  do  sensitivo,  em  termos  vulgares  ou  escolhidos,  conforme  o  seu  grau  de  instrução.  Daí  também  certas  incoerências  que  se  devem  atribuir à imperfeição do instrumento. 

Ao despertar, o Espírito do médium perde toda consciência das impressões  recebidas  no  sentido  de  liberdade,  do  mesmo  modo  que  não  guardará  o  menor  conhecimento  do  papel  que  seu  corpo  tenha  desempenhado  durante  o  transe.  Os  sentidos  psíquicos,  de  que  por  um  momento  haviam  readquirido  a  posse,  se  extinguem  de  novo;  a  matéria  estende  o  seu  manto;  a  noite  se  produz;  toda  recordação  se  desvanece.  O  médium  desperta  num  estado  de  perturbação,  que  lentamente se dissipa. 

Às  vezes  o  regresso  à  carne  origina  cenas  pungitivas,  quando  o  médium,  durante  a  exteriorização, tornou  a  ver, no  Espaço,  entes  amados,  e no  instante  que  precede o despertar ainda conserva essa impressão. O contraste entre a vida livre e  luminosa,  que  acaba  de  fruir,  e  o  cárcere  sombrio  a  que  é  obrigado  novamente  a  descer,  provoca  cenas  de  lágrimas  e  lamentos,  repugnâncias  de  reintegrar­se  na  carne,  que  se  traduzem  por  lamentos  e  comovedoras  súplicas.  Temos  sido  muitas  vezes testemunhas de tais cenas. 

Não  nos  sendo  possível  examinar  todos  os  fatos  relacionados  com  o  fenômeno  do  transe,  limitar­nos­emos  a  citar  os  mais  importantes, não  só  entre  os

que têm sido verificados nestes últimos anos, por diversos homens de Ciência, como  entre os que temos por nossa parte observado. 

Figuram em primeiro plano as manifestações devidas à mediunidade da Sra.  Piper.  Essa  senhora  esteve  muito  tempo  ligada  por  contrato  à  Sociedade  de  Investigações Psíquicas (S.P.RJ, de que já temos falado, e que possui uma seção em  Londres  e  outra  em  Nova  Iorque.  A  Sra.  Piper  foi  o  agente  principal  das  experiências levadas a efeito nesses centros por sábios como os professores Lodge,  Myers,  Hodgson,  W.  James,  Hyslop  e  outros,  todos  pertencentes  a  universidades  inglesas ou americanas, e que são decerto os homens mais competentes que podem  ser ainda citados em matéria de Psiquismo. O estudo de suas faculdades constituiu o  objetivo  de  numerosas  sessões,  cujos  resultados  foram  consignados  nos 

PROCEEDINGS, boletins da Sociedade supramencionada. Esses documentos formam  um  volume  de  650  páginas,  constituindo  o  tomo  XVI  dos PROCEEDINGS.  Um  resumo dele foi publicado em francês. 170 

A  Sra.  Piper  –  os  experimentadores  o  atestam  –  goza  de  excelente  saúde.  Não  há  em  sua  família  nenhuma  tara  hereditária.  Só  duas  vezes  no  curso  das  experiências,  em  1893  e  1895,  esteve  enferma;  em  ambas,  suas  faculdades  mediúnicas declinaram, e não foi possível obter boas comunicações. 

A  Sra.  Piper  foi  objeto  de  constante  e  minuciosa  vigilância.  Policiais  lhe  acompanhavam  os  passos  e  observavam­lhe  os  menores  atos;  tomaram­se  todas  as  providências para descobrir a fonte em que ela poderia colher informações. Durante  sua  permanência  na  Inglaterra,  em  casa  dos  professores  Myers  e  Lodge,  ela  ficou  insulada, privada de toda relação estranha; suas malas foram revistadas, suas cartas  abertas  a  pedido  seu.  Nada  se  encontrou  de  suspeito.  Ao  contrário,  quanto  mais  rigorosa  era  a  vigilância,  maior  caráter  de  certeza  revestiam  as  manifestações  obtidas. 

Durante o transe ela se conserva indiferente à dor, e os globos dos olhos se  lhe  reviram  nas  órbitas.  Fala  ou  escreve,  e  a  voz  muda  a  cada  Espírito.  Todas  as  perguntas feitas são breves, e ela nunca sabe quem as formula, porque os visitantes  são introduzidos durante o seu sono e uniformemente designados sob o nome de Sr.  Smith.  Alguns  levam  a  precaução  ao  ponto  de  vir  de  carruagem,  tendo  o  rosto  coberto com uma máscara. 

Um testemunho, primeiro que todos, nos deve prender a atenção. É o do Dr.  Richard  Hodgson,  vice­presidente  da  S.P.R. na  América,  que  abordou  o  estudo  do  fenômeno espírita como crítico severo e meticuloso. Foi ele quem estudou os fatos  extraordinários  atribuídos  à  Sra.  Blavatsky,  e  concluiu  pelo  embuste.  Pôs  em  evidência as fraudes inconscientes de Eusápia Paladino, e mostrou­se, durante anos, 

170 M.  Sage, MADAME  PIPER  ET  IA  SOCÍÉTÉ  ANGIO­AMERICAINE  DES  RECHERCHES  PSYCHÍQUES

um  implacável  adversário  da  mediunidade.  Aqui  está  o  que  ele  declarou  nos 

PROCEEDINGS: 

“Há doze anos que estudo a mediunidade da Sra. Piper. Ao começo, uma só  coisa  desejava:  descobrir  nela  a  fraude  e  o  embuste.  Entrei  em  sua  casa  profundamente materialista, com o fim de a desmascarar. Hoje, digo simplesmente:  Creio!...  A  demonstração  me  foi  feita  por  modo  a  tirar­me  até  a  possibilidade  de  uma dúvida”. 

Para transformar a esse ponto a opinião de um homem tão prevenido como  o  Dr.  Hodgson,  foram  precisos  fatos  bem  eloqüentes.  O  mais  significativo  é  a  manifestação  espontânea  de  seu  amigo  George  Pellew  (aliás,  Pelham),  homem  de  letras,  falecido  havia  alguns  meses,  e  que  a  médium  não  podia  conhecer.  A  identidade  do  defunto  foi  estabelecida  de  modo  muito  positivo,  no  curso  de  numerosos diálogos. 

O Dr. Hodgson trouxe à presença da médium adormecida todos os antigos  amigos  de  G.  Pelham  que  pôde  encontrar  –  cerca  de  uns  trinta.  O  Espírito  os  reconhecia a todos, logo à chegada, e os acolhia com ditos imprevistos. Não somente  os chamava por seus nomes, como lhes falava no mesmo tom familiar, usando das  expressões  habituais  de  que  se  servia  com  cada  um  deles,  segundo  o  grau  de  intimidade que os ligava na Terra, e isso sem a menor hesitação da parte da médium,  antes com a máxima espontaneidade. A todos fornecia as mais minuciosas provas de  identidade.

Um deles, o professor Newbold, propôs a Pelham uma tradução do grego,  língua  que  ele  conhecia,  mas  que  a  Sra.  Piper  ignorava  absolutamente.  O  Espírito  traduziu com exatidão, acompanhando o texto literal grego. 

Durante  a  primeira  fase  das  experiências,  o  médium  é  influenciado,  dirigido,  fiscalizado  (segundo  a  expressão  americana)  por  Espíritos  pouco  adiantados. Um certo Phinuit responde de modo incoerente às perguntas formuladas,  e  torna­se  necessária  toda  a  paciência  anglo­saxônia  para  acompanhar  o  desenvolvimento do fenômeno durante anos, através do labirinto de suas divagações.  É  provável  que  investigadores  franceses  não  tivessem  tido  essa  perseverança  e  houvessem perdido todo o beneficio das concludentes manifestações que sucederam  a esse período confuso. 

Com G. Pelham as comunicações se tornam mais claras; mas, no correr do  tempo,  sente­se  a  falta  de  direção  competente.  Phinuit  e  Pelham não  são  Espíritos  que tenham bastante força nem aptidões para manterem o transe em grau profundo e  impedirem  a  personalidade  do  sensitivo  de  imiscuir­se  algumas  vezes  nos  fenômenos e os perturbar. Estimulada por influências contrárias, a médium se esgota  rapidamente.  A  “máquina”,  conforme  a  expressão  dos  guias,  se  deteriora.  As  manifestações se tornam de novo confusas.

Evoca­se o Espírito Stainton Moses, autor dos “Ensinos Espiritualistas”, há  pouco restituído à vida do Espaço, e trava­se com ele  controvérsia sobre um ponto  de  doutrina.  O  escritor  inglês  afirmava  em  seu  livro  que  os  Espíritos  atrasados  conservam  no  outro  mundo  suas  paixões  e  apetites  terrestres  e  ainda  os  procuram  satisfazer.  Essa  teoria  desagrada  em  extremo  ao  professor  Newbold,  que  pede  a  Stainton  Moses  se  retrate.  Este  acede  imediatamente,  e  suas  explicações  são  deploráveis.  Certos  escritores,  comentando  este  fato,  acreditaram  dele  poder  tirar  conclusões desfavoráveis à filosofia espírita. As condições  em que Stainton Moses  se  pronunciou  nos  parecem  suspeitas.  A  médium  funcionava  mal;  o  Espírito  não  pôde  sobre  ela  firmar  seu  império,  nem  mesmo  chegou  a  provar  sua  identidade.  Talvez  não  houvesse  afinidade  suficiente  entre  seu  organismo  fluidico  e  o  da  Sra.  Piper. É essa uma dificuldade que os críticos não tomam bastante em consideração.  Por seu lado, o professor Newbold, com sua opinião muito arraigada, teria exercido  ação sugestiva sobre o sensitivo.  De resto, aí estão os fatos, aos milhares, para demonstrar a inanidade dessa  teoria muito cômoda, dessa opinião de que a morte bastaria para nos desembaraçar  de nossos vícios. O Espírito, na realidade, conserva­se o mesmo que se fez durante a  vida  terrestre.  As  necessidades  procedem  do  corpo  e  com  ele  se  extinguem.  Os  desejos  e  as  paixões  são  do  Espírito  e  o  acompanham.  Quase  todos  os  fenômenos  das  casas  mal­assombradas  são  produzidos  por  Espíritos  atrasados  que  vêm  satisfazer,  post­mortem, rancores nascidos  aqui na Terra,  de  males  ou  de  prejuízos  causados  por  certas  famílias, que  assim  se  tornam  presa  de  nefastas influências.  O  mesmo se dá em todos os fatos de obsessão e em certos casos de loucura. Todos os  observadores  de  longa  data  o  sabem.  A  sensualidade  e  a  avareza  subsistem  nas  almas inferiores. Os fenômenos produzidos por Espíritos “incubo” e “súcubos” não  são  imaginários  e  assentam  em  testemunhos  formais.  fácil  negar;  seria  preferível  observar e curar. 

A manifestação efêmera de Stainton Moses e a discussão de seus ENSAIOS 

sugeriram aos experimentadores a idéia de evocar os Espíritos que os haviam ditado,  Espíritos  superiores,  designados  nessa  obra  sob  os  nomes  de  Imperador,  Reator,  Doctor  e  Prudens.  Estes  acudiram  ao  chamado,  e  imediatamente  o  aspecto  das  sessões  mudou.  Sentiu­se  que  ação  nova  e  combinada  se  exercia  sob  a  direção  de  alta Inteligência. Cessam as incoerências; as obscuridades, os  erros se dissipam; as  explicações  se  tornam  claras,  as  provas  abundantes;  as  últimas  dúvidas  dos  experimentadores  se  desvanecem.  O  médium  é  objeto  de  cuidados  fluídicos  assíduos;  a  “máquina”,  reparada,  funciona  daí  em  diante  com  precisão.  Reator  é  especialmente  preposto  a  sua  guarda,  e  afasta  os  intrusos,  os  Espíritos  levianos.  Todas  as  manifestações  têm  que  se  submeter  à  sua  fiscalização.  h  ele  quem  se  encarregará  de  transmitir  as  comunicações  úteis,  as  respostas  às  perguntas  formuladas.  Imperador  começa  sempre  por  uma  prece.  Quando  fala  pela  boca  da

Sra.  Piper,  sua  voz  é  grave,  imponente;  impressiona  e  comove.  Suas  vibrações  provocam  o  recolhimento,  restabelecem  a  harmonia  nos  pensamentos  dos  consultantes. 

Isso vem confirmar o que tantas vezes notamos em nosso longo tirocínio de  experimentador.  Quando  se  empreende  o  estudo  dos  fenômenos,  como  diletante,  sem  nenhum  cuidado  pelas  condições  psíquicas  a  preencher,  raramente  se  obtêm  resultados  perfeitos  e  satisfatórios.  Nas  sessões  que  eu  dirigia,  de  acordo  com  um  método rigoroso, desde que a unidade e elevação dos pensamentos cessavam entre  os  assistentes,  desde  que  o  recolhimento  era  interrompido  por  conversas  ou  discussões  inoportunas  e  surgiam  divergências  de  opinião,  logo  as  manifestações  diminuíam  de  valor  e  intensidade.  Espíritos  inferiores  se  intrometiam,  e,  sob  a  sua  influência,  as  faculdades  dos  médiuns  se  turbavam,  não  produzindo  mais  que  imperfeitíssimos  resultados.  Era  preciso  um  enérgico  esforço  de  reação  interior  e  obter  a  intervenção  das  potências  invisíveis,  para  restabelecer  o  curso  regular  das  manifestações. 

Na  experiência  espírita  – não  o  esqueçamos  –  os  resultados  dependem  da  proteção  oculta  que  podemos  obter  e,  sobretudo,  da  extensão  e  eficácia  dessa  proteção.  Ora,  esta  só  se  pode  exercer  no  limite  em  que  a  tornemos  possível,  colocando­nos  em  estado  moral  e  mental  de  harmonia  que  facilite  a  ação  dos  Espíritos adiantados. Sem afinidade de pensamento e de sentimento, sem comunhão 

No documento Portal Luz Espírita (páginas 185-200)