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1.1 - Aspectos iniciais

A transição agroecológica é um termo consolidado no contexto da agroecologia, referente ao início de uma transformação do ambiente agrícola, onde o agricultor convencional incorpora práticas sustentáveis, baseadas nos princípios agroecológicos. Diversos autores utilizam-no como ferramenta de pesquisa, perspectiva política ou etapas processuais. Entretanto, o que é a “transição agroecológica”? Um conceito? Uma proposta de ação? Ao realizar uma breve busca em revistas brasileiras sobre tal assunto, percebo haver uma grande quantidade7 de trabalhos que abordam esta temática (LIMA, PIRES e VARGAS, 2015; SOUSA et al., 2007; PACIFICO e SOGLIO, 2010; DA ROCHA BARROS, 2009; BORGES, 2009; JANTARA e ALMEIDA, 2009; CORRÊA et al, 2007; SA, 2016; MUNIZ, 2016; FONTENELE, 2011; PASQUALOTTO et al., 2016; BECKER et al, 2016; SILVA e BRANDENBURG, 2013; e outros). Contudo, boa parte desses trabalhos aborda essa temática enquanto uma proposta consolidada dentro do campo agroecológico. Uma discussão aprofundada, apesar de consolidada, e conceitual sobre o tema pode ser encontrada em Gliessman e Rosemeyer (2010); Costabeber (1998); Petersen (2013); Schmitt e Petersen (2009); Moreira (2007). Alguns (COSTABEBER e MOYANO, 2000; COSTABEBER, 1998) realizam uma discussão com o propósito de delimitar uma definição para o termo.

Outros autores (ALTIERI, 2012; ALTIERI, 1994) aprofundam-se em uma descrição histórica, problematizando o período da Revolução Verde, onde a transição agroecológica aparece enquanto um resultado desse contexto. Outros (SEVILLA GUZMÁN, 2001; SEVILLA GUZMÁN e MOLINA NAVARRO, 1990; PETERSEN, 2013; SCHMITT e PETERSEN, 2009), realizam uma discussão a partir de uma perspectiva política, onde compreendem a agroecologia e a transição a partir de uma abordagem de oposição e resistência ao contexto e modelo de desenvolvimento em que estamos inseridos. Outros, ainda, (GLIESSMAN e

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Até o momento, na Revista Brasileira de Agroecologia foram encontrados 137 trabalhos sobre a temática da transição agroecológica. Foram encontrados também 227 trabalhos, entre artigos e relatos de experiências, na revista Cadernos de Agroecologia. Na revista Agriculturas, o volume 3, número 3 do ano de 2006 é uma edição somente para esta temática. Foram encontrados artigos também na revista Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável.

ROSEMEYER, 2010; GLIESSMAN, et al., 2007) compreendem esse processo de uma forma mais esquemática, descrevendo etapas a serem ultrapassadas para um equilíbrio sustentável. Mas boa parte dos trabalhos encontrados em revistas utilizam a transição agroecológica enquanto uma proposta metodológica ou um objetivo de trabalho de extensão agrícola, muitas vezes desfavorecendo sua característica processual, na expectativa de mudanças repentinas e permanentes. Tais trabalhos são muito comuns na proposta de relatos de experiências, muito difundidos em congressos e encontros de agroecologia. Um exemplo é o artigo de Pacífico e Soglio (2010), onde foram debatidas as dificuldades encontradas na aplicação do método de transição de uma agricultura convencional para um sistema orgânico em culturas de café no norte do Paraná. Steinwandter et al. (2007) realizam uma avaliação técnica de forragens para a adubação em um sistema a partir de levantamentos de dados quantitativos, em uma área em transição agroecológica. Avila et al. (2012) também abordam a transição agroecológica a partir de uma avaliação técnica quanto a biomassa vegetal no sistema, descrevendo qual tipo de adubação poderia ser mais eficiente. Porto e Soares (2012) realizam um debate sobre o tema, introduzido pelo histórico da revolução verde e de dificuldades advindas de uma agricultura convencional no campo da saúde, sugerindo a transição agroecológica como forma de superar tais problemáticas.

Mas quais seriam os elementos fundamentais que constituem a transição agroecológica? Qual o entendimento dos autores, trata-se de um conceito, ou uma proposta de ação? E como esses autores percebem a relação entre produção e consumo no contexto da transição agroecológica? Nesse sentido, esse capítulo objetiva compreender algumas abordagens quanto à transição agroecológica a partir da perspectiva de alguns autores que discutem o tema de forma mais aprofundada: Stephen Richard Gliessman, Miguel Altieri, José Antônio Costabeber, Paulo Frederico Petersen e Francisco Caporal, observando contribuições para o debate, controvérsias, fragilidades e originalidade de cada proposta. Trago, também, para o debate uma breve análise da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) (BRASIL, 2012) e do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PLANAPO) (MDA, 2013), bem como o documento “aspectos conceituais sobre agroecologia” divulgado no site do VI Congresso Latino Americano de Agroecologia, promovido pela Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e

Sociedad Científica Latinoamericana de Agroecología (SOCLA), que ocorreu em setembro de 2017, a fim de entender especificamente como tais instrumentos abordam a transição agroecológica e a relação entre produção e consumo. Ao final, pretendo deparar-me com entendimentos sobre a transição agroecológica e quais as implicações para a relação produção e o consumo em cada proposta.

1.2 - O processo de transição agroecológica

Os primeiros trabalhos cujo objetivo era a descrição da transição agroecológica surgiram no final da década de 1980 e início de 1990. Nesse período, Gliessman (1990, 1992) e Altieri (1994) descreveriam as bases para a transição agroecológica. Em seus textos, descrevem os sistemas produtivos sustentáveis, enfatizando suas características. A proposta de ambos autores seria estabelecer parâmetros de sustentabilidade que poderiam nortear, não somente agricultores convencionais interessados em realizar a transição agroecológica, mas também definir o grau de sustentabilidade dos sistemas em questão. O estabelecimento desses parâmetros se daria por meio de comparações realizadas em sistemas naturais ou agroecossistemas tradicionais. Assim, Gliessman (2001) comenta que uma forma de se estabelecer indicadores de sustentabilidade, seria por meio da observação de sistemas com um histórico registrado. Nesse sentido, o autor traz como exemplo a pesquisa realizada por Erle Ellis, que observariam a agricultura de moldes sustentáveis desenvolvida no delta do rio Yang-tse, na China. Conforme Gliessman (2001), a justificativa para esses parâmetros ocorreria pois esses sistemas manejados por populações índígenas e tradicionais são exemplos de práticas agrícolas sustentáveis que se sustentam no tempo. Assim,

“Com base no conhecimento ganho a partir desses sistemas, a pesquisa ecológica pode conceber princípios, práticas e desenhos aplicáveis na conversão de agroecossistemas convencionais insustentáveis em sustentáveis” (GLIESSMAN, 2001, p. 566).

Altieri (1987) também enfatiza a possibilidade de estabelecer estratégias para uma agricultura sustentável por meio de conhecimentos advindos dos sistemas tradicionais, já que esses têm desenvolvido uma série de práticas e manejos sustentáveis que podem ser incorporados aos sistemas produtivos atuais.

O início das discussões relativas à transição, também denominado como conversão por esses autores, dar-se-ia por meio do estabelecimento de parâmetros determinados por modelos já sustentáveis. Com isso, as discussões e diretrizes não partiriam da observação e da teorização de sistemas em transição agroecológica. Mas será que esse desenvolvimento teórico não possibilitaria um cenário de comparações entre experiências que desejam realizar a transição? Além disso, estabelecer uma proposta a partir de experiências já sustentáveis não promoveria idealizações e expectativas de um tipo específico de modelo de sustentabilidade?

Gliessman dedica-se a pesquisas que visariam descrever e aprofundar o processo de transição agroecológica. Para isso, realizaria uma releitura histórica em seus textos, a fim de embasar seu argumento agroecológico, onde explicaria a necessidade de mudanças no sistema produtivo convencional. O autor desenvolveria esquematicamente justificativas para um agricultor iniciar o processo de transição, descreveria as atividades e características práticas de uma propriedade que está alterando o seus sistema de produção e também reafirmaria e estabeleceria níveis para realização e finalização do processo.

Para Gliessman e Rosemeyer (2010), vários são os fatores que influenciam um agricultor a iniciar o processo de transição agroecológica, como por exemplo a pequena margem de lucro obtida na agricultura de molde convencional, preocupação com saúde, confiança no desenvolvimento de práticas que transformam a agricultura de base ecológica em uma possibilidade viável, entre outros. Os autores argumentariam que um processo de transição agroecológica bem sucedido dependeria de fatores internos, ou seja, da dedicação do próprio agricultor. Contudo, somente tal impulso não seria suficiente, sendo necessário também, fatores externos à propriedade rural, como o desenvolvimento de mercados e estruturas de cálculo de preços coerente com a realidade dessa agricultura em transformação, políticas de incentivo e outras mudanças dentro do sistema de abastecimento alimentar (GLIESSMAN e ROSEMEYER, 2010).

Gliessman et al. (2007) reafirmam níveis descritivos para a transição agroecológica, argumentando que esses seriam observados enquanto resultado de pelo menos trinta anos de trabalho e dedicação de Gliessman. Entretanto, essa

proposta desenvolvida, como os próprios autores afirmam, é influenciada pelos trabalhos de Stuart Hill.

Hill (1985), conforme comenta Gliesseman et al. (2007) sugeriria uma transição agroecológica esquemática e composta por níveis, o qual irá influenciar os diversos trabalhos consequentes. Hill (1985) debate sobre a importância em estabelecer um sistema agrícola sustentável. O mesmo autor sugeriria os três primeiros níveis incorporados por Gliessman em seus estudos, comparando por meio de exemplos os possíveis sistemas produtivos (convencional, no início da transição e com o processo de transição mais consolidado). Também apresenta abordagens e ações para cada nível e objetivos referentes a esses (HILL, 1998). Conforme Gliessman (2001), esses níveis poderiam servir como um caminho a ser trilhado pelo agricultor e poderiam demonstrar o processo evolutivo da transição. O mesmo autor acrescentaria que também têm a finalidade de promover uma categorização da pesquisa relativa a essa temática.

O primeiro nível (Melhorar a eficiência das práticas convencionais), sugerido pelos autores descreve a necessidade de tornar mais eficiente o uso dos insumos, como forma de reduzir os elementos prejudiciais ao ambiente. Exemplos práticos desse nível, seriam os processos de melhoramento de maquinário em busca de eficiência, o monitoramento de pragas, otimização das atividades agrícolas, entre outras práticas que colaboram para a diminuição dos impactos negativos advindos da agricultura convencional.

“A meta desse nível é utilizar os insumos (por exemplo: água, fertilizantes, combustíveis, pesticidas) de maneira mais eficiente, de tal modo que se utilizem menos e se reduzam ao mesmo tempo seus impactos negativos. [...] Embora estes tipos de esforços reduzam os impactos negativos da agricultura convencional, não ajudam a romper sua dependência de insumos humanos externos (GLIESSMAN, et al., 2007, p. 21)8

O segundo nível (Substituir práticas e insumos convencionais por práticas alternativas sustentáveis) seria composto pela substituição de insumos convencionais e de práticas de uso intensivo de recursos, por ações de maior responsabilidade ambiental, como por exemplo utilização de controle biológico, fixadores de nitrogênio no solo, cobertura no solo. Ou seja, seriam realizadas troca

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de insumos e práticas da agricultura convencional para um sistema produtivo com maiores preocupações ambientais.

“Nesse nível, a estrutura básica do agroecossistema não é muito alterada, muitos dos problemas que se observam nos sistemas convencionais também estão presentes naqueles que substituem insumos.” (GLIESSEMAN, et al., 2007, p. 21).9

O terceiro nível (Redesenho do agroecossistema) sugerido pelos autores diria sobre a necessidade do redesenho do agroecossistema, para que as práticas agroecológicas tornar-se-iam mais eficientes e funcionais, na forma de prevenir diversos problemas que teriam que ser remediados na segunda etapa descrita. Nesse sentido, seriam adotadas práticas de rotação de cultura, diversificação de manejo e estrutura da propriedade rural, diversidade de culturas, práticas agroflorestais.

“Os estudos sobre a conversão do sistema como um todo, nos permitem compreender os fatores limitantes do desempenho no contexto da estrutura e função do agroecossistema. Os problemas são reconhecidos e se previnem a partir daí, com enfoque no desenho e manejo interno e tempos estabelecidos, ao invés de aplicar insumos externos.” (GLIESSMAN, et al, 2007, p. 22)10

O quarto e último nível (Mudança ética e de valores para uma cultura sustentável) foi proposto por Gliesseman et al. (2007) e incorporado a partir da reflexão sobre a complexidade da problemática da transição agroecológica. Nesse nível, os autores compreenderiam que o sistema alimentar em que estamos imersos seria influenciado por concepções que extrapolam a propriedade rural, ou seja, nesse nível incorporam o papel do consumidor na transição agroecológica. Tal proposta basear-se-ia na importância de consumidores e produtores rurais estarem em consonância quanto aos aspectos da sustentabilidade, compreendendo o papel de cada um nesse processo. Seria o que os autores denominam da “reintrodução do componente cultura dentro da agri-cultura”:

“A educação do consumidor, no sentido de que ele consome como alimento não somente o produto que ele adquire, mas que o produto é resultado de um processo complexo, que tem impactos ambientais e socioeconômicos, também, eventualmente influenciará os valores que orientará as decisões dos produtores. A sustentabilidade como

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Tradução realizada pela autora.

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conceito tem um enorme potencial de servir como vínculo entre os componentes mais importantes dos sistemas alimentares - os que produzem o alimento de um lado e os que consomem os produtos do outro.” (GLIESSMAN, et. al, 2007, p. 22)11

Gliessman et al. (2007) também afirmariam que apesar da transição agroecológica poder ser mais facilmente observada por meio de fatores ambientais e biofísicos, seria importante também a transição dos aspectos sócio-econômicos, já que esses gerariam influência nas áreas de produção agrícola. Entretanto, os autores reconheceriam as dificuldades para esse processo de transição sócio- econômico, sugerindo um ambiente de cooperação entre agricultores e consumidores.

“Em outras palavras, além de construir as bases ecológico ambientais no desenho e manejo de sistemas sustentáveis de uma produção agrícola, também é necessária a criação de um tecido social que contribua para a manutenção dessa sustentabilidade.” (GLIESSMAN et al., 2007)12

Altieri refere-se à transição em seus textos de forma a complementar o seu entendimento sobre a produção agroecológica, denominando-o conversão agroecológica. Entretanto, Altieri e Nicholls (2007) afirmam que a conversão agroecológica ocorreria evidenciando os pilares agroecológicos. Assim, descrevem ações que promovessem o manejo orgânico do solo (por meio do aumento da matéria orgânica, promoção da ciclagem de nutrientes e aumento da vida biológica do solo) e diversificação do agroecossistema (por vias de cultivos diversos, rotações de culturas, corredores biológicos, entre outros).

O autor (1994) sistematiza a transição em etapas, sendo estas semelhantes à proposta dos níveis de Hill (1985). A primeira etapa citada corresponderia ao abandono progressivo do uso de insumos químicos. A segunda referir-se-ia ao racionamento do uso de insumos, tornando o uso desses de forma mais eficiente a partir de ações integradas, como o manejo de pragas e da fertilidade do solo. A terceira etapa seria relativa à substituição de insumos agroquímicos por outros menos impactantes ao meio ambiente. E por último o redesenho dos sistemas agrícolas incorporando biodiversidade por meio de lavouras diversas e criação de

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Tradução realizada pela autora

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animais, com o intuito de que o sistema possa se subsidiar com relação à sua própria fertilidade. Entretanto, em textos mais recentes como em Altieri (2000) e Altieri e Nicholls (2007), o autor sintetiza as etapas nos três níveis sugeridos por Gliessman (2001), onde a segunda e terceira etapa são apresentadas de forma conectadas. Apesar de reafirmá-las, os autores não as desenvolvem, não descrevendo características e ações relativas a cada etapa.

O autor faz uma ressalva sobre conversões que reduzem-se à utilização eficiente dos recursos, e substituição de insumos, ressaltando a importância do redesenho dos sistemas (ALTIERI, 1994, 2000)

“Mas será que a adoção de práticas que aumentam a eficiência do uso de insumos ou que substituam agrotóxico por insumos de base biológica, embora deixem a estrutura de monocultura intacta, realmente tem o potencial de levar o redesenho produtivo dos sistemas agrícolas?” (ALTIERI, 2012, p.140)

Assim, durante as etapas descritas anteriormente, ocorreriam uma série de modificações no sistema agrícola, como:

“aumento da biodiversidade do solo, como também da vegetação e da fauna associada; Aumento da produção de fitomassa e da matéria orgânica do solo; Diminuição dos níveis de resíduos de insumos químicos e das perdas de nutrientes e de água; Estabelecimento de relações funcionais entre os diversos componentes agrícolas; Planejamento ótimo de sequências e combinações entre cultivos e utilização eficiente dos recursos disponíveis no contexto local” (ALTIERI, 1994, p. 376).

O autor também lista algumas dificuldades que poderiam aparecer para um agricultor que deseje realizar a transição, citando desde contratempos gerados pela incorporação de tecnologias importadas, até dificuldades de uma produção estável quanto a custos e padrões no início do processo. Descreve também situações que poderiam acelerar e potencializar a transição, incluindo ações e incentivos do poder público, articulações entre consumidores e agricultores, cooperativismo e formas de organização dos agricultores e até mesmo uma nova compreensão da propriedade agrícola enquanto um único sistema (ALTIERI, 1994). Nesse sentido, Altieri e Rosset (1996) acrescentam a importância de, durante a transição agroecológica, desenvolver estratégias para a manutenção do equilíbrio econômico do agricultor, já que nas primeiras fases, poderia haver uma diminuição produtiva e

consequentemente, financeira. Nesse sentido, sugerem que sejam considerados programas de incentivos e subsídios.

Altieri (1994) afirma que os sistemas agroecológicos devem contribuir para o desenvolvimento rural e para a igualdade social. Contudo, para que isso ocorra, ações como a redução de mecanização do campo, diversificação agrícola e a participação dos agricultores nas ações de desenvolvimento rural deveriam ser promovidas. Para o autor, a proposta para uma agricultura sustentável incorpora diversos aspectos:

“É evidente então que os requisitos de uma agricultura sustentável engloba aspectos técnicos, ambientais, institucionais e de políticas agrárias” (ALTIERI, 1994, p. 385)13

O autor ressaltaria a importância do desenvolvimento de técnicas e tecnologias locais, priorizando o conhecimento endógeno à importação de ensinamentos, mas pondera acrescentando que os princípios agroecológicos que darão base para este desenvolvimento tecnológico local, poderiam ser incorporados de uma localidade para outra. (ALTIERI, 2012; 1994). Nesse sentido, acrescentam a importância da valorização do saber tradicional, acrescentando que esse poderia subsidiar no desenvolvimento de práticas e manejos (ALTIERI e ROSSET, 1996).

Tanto Gliessman quanto Altieri desenvolvem um argumento semelhante quanto a transição agroecológica, vinculando-a com uma necessidade frente a um processo histórico, estabelecendo parâmetros de sustentabilidade, reconhecendo as contribuições das agriculturas tradicionais. Contudo, descreveriam as particularidades da transição agroecológica por meio da observação de agroecossistemas já sustentáveis. Altieri delimita fases da conversão agroecológica, e Gliessman reafirma os níveis de transição sugeridos por Hill (1985). Entretanto, a proposta esquemática de ambos é similar, sendo, inclusive, as mesmas características de cada uma dessas.

Em aspectos de originalidade da proposta, Gliessman et al. (2007) introduzem na discussão um elemento ainda não incorporado, o consumo. Os autores compreendem que após iniciar a transição agroecológica no campo, seria

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necessário que ela expanda-se para o meio urbano, sendo a última etapa do processo. Somente assim, aos olhos do autor, o processo estaria completo. Entretanto, apesar de seu esforço, Gliessman et al. (2007) não desenvolvem com profundidade a discussão sobre essa temática, apresentada por meio do quarto nível, dando maior ênfase ao processo na produção agrícola. Tanto é que relacionam o consumo ao meio urbano (desconsiderando o consumo no meio rural, por exemplo) e subestimando a complexidade envolvida nas práticas de consumo. Nesse sentido, a transição no consumo aparece enquanto uma consequência do próprio processo de transição agroecológica da produção. Além disso, ao reafirmar tais níveis descritos por meio de características que reforçam estratégias e procedimentos de produção, o autor declara a importância de uma abordagem técnica em contraponto à uma proposição política. Ainda inicia seu discurso com base nas alterações ecológicas de um agroecossistema, incorporando uma perspectiva social somente no quarto nível, também como consequência do primeiro.

Altieri (1994) realiza sua discussão sobre a transição agroecológica de maneira sistemática e normativa por meio de etapas de conversão e listas descritivas relativas às dificuldades que possivelmente seriam enfrentadas por agricultores em transição. O autor destaca as práticas, técnicas e conhecimentos endógenos, compreendendo que esses seriam um ponto forte para que a transição agroecológica ocorra de maneira mais simplificada. Contudo, o autor desenvolve seu debate dentro da concepção da produção rural, estabelecendo etapas, descrevendo aspectos técnicos relativos as mudanças no agroecossistema e enfatizando a transição agroecológica enquanto uma meta para se estabelecer uma agricultura sustentável. Assim, o autor privilegia o debate em torno da produção rural, sendo que não há um debate ao redor do consumo, aparecendo esse enquanto um potencializador do processo do campo. O autor ainda inicia seu argumento relacionando a necessidade da transição a aspectos ecológicos, dando destaque

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