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ETAPA 4 Análise ampliada de Fortaleza

2. DENGUE: ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E ESTUDOS CLIMÁTICOS

2.1. Transmissão da dengue

A dengue, doença viral febril aguda, constitui a doença reemergente mais importante e combatida entre os países intertropicais, onde as condições ambientais e socioeconômicas favorecem a proliferação do Aedes aegypti, principal vetor da doença. (BARRERA et al., 2000; GLUBER, 2001). Schatzmayr (2008) aponta o vírus da dengue como o mais difundido geograficamente, sendo encontrado em áreas tropicais ou subtropicais. (Figura 03)

De acordo com o Ministério da Saúde (2009: 11),

Nas últimas duas décadas, a incidência de dengue nas Américas tem apresentado uma tendência ascendente, com mais de 30 países informando casos da doença, a despeito dos númerosos programas de erradicação ou controle que foram implementados. Os picos epidêmicos têm sido cada vez maiores, em períodos que se repetem a cada 3-5 anos, quase de maneira regular. Entre 2001 e 2005, foram notificados 2.879.926 casos de dengue na região, sendo 65.235 de dengue hemorrágica, com 789 óbitos. As maiores incidências nesse período foram reportadas pelo Brasil, Colômbia, Venezuela, Costa Rica e Honduras (82% do total).

Desde a reintrodução do vírus no Brasil, na década de 1980, mais de 60% dos casos notificados de dengue na Região das Américas ocorreram no Brasil. (NOGUEIRA et al, 2007)

Figura 03 – Distribuição Geográfica da dengue no mundo. Fonte OMS, 2004.

A dengue apresenta quatro formas de infecção: infecção assintomática e dengue clássico, onde o homem infectado apresenta cefaléia, dores musculares, dores articulares,

exantema, diarréia e vômitos, estas duas formas apresentam curso benigno. As outras formas são: a febre hemorrágica da dengue (dengue hemorrágica), responsável pelo número crescente de casos graves e óbitos, geralmente associada à hemorragia e alterações hemodinâmicas, queda de pressão arterial e no extremo mais grave define a síndrome do choque da dengue; e a dengue com complicações, associada a manifestações frequentemente graves, mas menos comuns como hepatite e manifestações neurológicas (SILVA e ANGERAMI, 2008).

Seu agente etiológico é o arbovírus32 do gênero Flavivirus, pertencente à família

Flaviviridae. São conhecidos quatro tipos de vírus (arbovírus) que constituem os sorotipos designados como I, II, III, IV antigeneticamente separados. A infecção por um deles dá proteção permanente para o mesmo sorotipo e imunidade parcial e temporária contra os outros três, ou seja, a imunidade é permanente para um mesmo sorotipo, havendo imunidade cruzada temporariamente. Por outro lado, acredita-se que o tipo de vírus associado à infecção secundária possa ter grande importância no desenvolvimento da dengue hemorrágica (OMS, 1987; VERONESI, 1991). Os quatro tipos de vírus favorecem a expansão e o surgimento de epidemias da doença. Seu hospedeiro vertebrado e fonte de infestação é o ser humano.

O modo de transmissão de acordo com o Guia de Vigilância Epidemiológica (2006: 231),

se faz pela picada dos mosquitos Aedes aegypti, no ciclo ser humano-Aedes aegypti- ser humano. Após um repasto de sangue infectado, o mosquito está apto a transmitir o vírus depois de 8 a 12 dias de incubação extrínseca. A transmissão mecânica também é possível, quando o repasto é interrompido e o mosquito, imediatamente, se alimenta num hospedeiro susceptível próximo. Não há transmissão por contato direto de um doente ou de suas secreções com pessoa sadia, nem por intermédio de água ou alimento.

A dengue possui um período de incubação33 que varia de 3 a 15 dias, sendo em média de 5 a 6 dias. Seu período de transmissibilidade ocorre em dois ciclos: no ser humano e no vetor. A transmissão do ser humano para o mosquito ocorre no período de viremia34, começando um dia antes do aparecimento da febre se estendendo até o 6º dia da doença. No mosquito, após um repasto de sangue infectado, o vírus vai se localizar nas glândulas salivares da fêmea do mosquito, onde se multiplica depois de 8 a 12 dias de incubação. A partir desse momento, é capaz de transmitir a doença e assim permanece até o final de sua vida que varia de 6 a 8 semanas (GUIA DE VIGILANCIA EPIDEMIOLÓGICA, 2006).

32 Arbovírus são vírus que se multiplicam nos tecidos dos organismos dos artrópodes, infectando-os, e tornando- os vetores depois de sugarem sangue de hospedeiros em período de viremia.

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Período de incubação é o tempo decorrido entre a exposição ao organismo patogênico e a manifestação dos primeiros sintomas da doença. Nesse período o indivíduo não manifesta nenhum sintoma da doença.

A intensidade de interação entre o ambiente, o agente, a população de hospedeiros e o vetor determina a dinâmica de transmissão do vírus. Junior e Junior (2008) apontam uma série de componentes dessa interação dividindo-os em macro e microdeterminantes. Com base nos autores supracitados elaborou-se o fluxograma da figura 04, apresentando os fatores que favorecem o risco de dengue ao indivíduo e à população.

Figura 04 – Fluxograma de fatores de risco para a dengue

Os vetores da dengue são o Aedes aegypti e o Aedes albopictus, sendo o primeiro o principal (CÂMARA, et al, 2009).

O Aedes aegypti é originário da África, vivendo em regiões tropicais e subtropicais do globo, entre as latitudes de 35° norte e 35º sul. (JUNIOR e JUNIOR, 2008). É um mosquito adaptado ao ambiente urbano de características peri e interdomiciliares. Se prolifera nos mais diversos recipientes, geralmente introduzidos no ambiente pelo homem, a exemplo de pneus velhos abandonados, garrafas, vasos de plantas, calhas, piscinas, entre outros, cuja as paredes servem à ovipostura do mosquito. Macho e fêmea alimentam-se da seiva das plantas, presentes, sobretudo, no interior das casas, no entanto apenas a fêmea pica o ser humano em busca de sangue para maturar os ovos (OPAS, 1982). Tem hábitos diurnos, pica o homem desde o amanhecer até o fim do dia e abriga-se no interior das casas para repousar em cantos sombrios, atrás de móveis, quadros, armários, entre outros refúgios (REY, 1992; NEVES, 1998). As fêmeas apresentam uma sobrevida de dois meses e realizam hematofagia doze ou até mais vezes (VERONESI, 1991; REY, 1992; NEVES, 1998).

Seu ciclo de vida compreende quatro etapas (Figura 05). Os ovos se fixam em locais adjacentes à superfície da água, que ao entrar em contato com esta eclodem. Após saírem dos ovos as larvas passam por quatro estágios de desenvolvimento, em um período que varia de acordo com a temperatura, a disponibilidade de alimento e a densidade larvária no recipiente. A fase seguinte é a fase de pulpa seguido da metamorfose para mosquito. A estimativa de tempo completo do ciclo é muito imprecisa visto a complexidade de fatores envolvendo sua dinâmica. Junior e Junior (2008) chamam a atenção que o período de incubação do ovo até a pulpação pode variar de 5 dias em condições ótimas a semanas em locais com baixa temperatura e alimento insuficiente, sendo que um ovo pode resistir até um ano sem eclodir. A fase pulpa dura de 2 a 3 dias e dois dias após virarem mosquito eles estão aptos a acasalar, reiniciando o ciclo. Em média, cada Aedes aegypti vive em torno de 30 dias e a fêmea chega a colocar entre 150 e 200 ovos de cada vez (JUNIOR e JUNIOR, 2008).

Uma vez com o vírus da dengue, a fêmea torna-se vetor permanentemente da doença. Calcula-se que haja uma probabilidade entre 30 e 40% de chances de suas crias já nascerem também infectadas (SOUZA, 2010).

A transmissão do vírus da dengue ocorre pela picada do Aedes aegypti fêmea infectado. O inseto pica durante o dia. Na sua fase larvária, vive na água limpa e parada, na água armazenada para uso doméstico, ou em qualquer lugar onde haja água limpa acumulada (OLIVEIRA, 2006).

A grande capacidade de adaptação do Aedes aegypti ao ambiente urbano levou muitos pesquisadores a examinar a ecologia desse mosquito, na tentativa de desvendar seus hábitos e comportamentos na natureza e no espaço habitado pelo homem. Junior e Junior (2008: 12) afirmam que,

em pequenas altitudes, a temperatura, a umidade e a precipitação média anual afetam a sobrevivência e reprodução do vetor, da mesma maneira que a temperatura afeta a replicação do vírus no vetor. Esses parâmetros geográficos e climáticos podem ser utilizados para estratificar as áreas em que se espera que a transmissão seja endêmica, epidêmica ou esporádica.

Mendonça (2003) aponta as altas latitudes como livres desta doença devido às baixas temperaturas, todavia, a mudança climática global poderá favorecer a expansão da sua área de ocorrência para latitudes e altitudes mais elevadas que as manifestadas até o presente. Benjaran (2002) e Paula (2005) verificaram esse fato no norte da Argentina e no Estado do Paraná respectivamente.

O estudo de Souza (2006) para o Estado de Goiás comprovou que a transmissão da doença ocorreu em maior quantidade nos quatro primeiros meses de cada ano estudado, período de elevada pluviosidade, diminuindo substancialmente nos meses de junho a setembro, época de poucas chuvas, afetando diretamente a capacidade de vôo e reprodução do vetor.

Relativo a temperatura Focks et al (1995), estimou que o período de incubação extrínseco do vírus é de 8,33 dias para temperaturas de 32º C e de 16,67 dias para temperaturas de 22º C, comprovando que as chances das fêmeas de completar o período de incubação é 2,64 vezes maior que aquelas submetidas às temperaturas mais baixas. Há estudos como o de Watts et al (1987) que verificaram a temperatura do ar interferindo nas atividades de repasto sanguíneo das fêmeas dos mosquitos e em sua longevidade. Estes e outros estudos como os de Patz et al (1998) indicam que a temperatura e a precipitação induzem variações na eficiência vetorial do Aedes aegypti sendo determinantes importantes no padrão cíclico anual de dengue.

O Aedes albopictus é uma espécie silvestre que se adaptou aos ambientes rurais, suburbanos e urbanos. No Brasil ainda não foi apontado de maneira efetiva como vetor da dengue, apesar de já terem sido identificados mosquitos não infectados de forma esporádica em algumas áreas urbanas do Brasil, como se verifica nos estudos de Serufo et al (1993), Neto et al (2002) e Alves et al (2008). No ano de 2005 no bairro Montese em Fortaleza – Ceará foram encontrados 13 Aedes albopictus (todos fêmeas), todavia nenhum infectado pelo vírus da dengue (MARTINS et al, 2006). Ibañez-Bernal et al (1997) encontraram mosquitos Aedes albopictus infectados com o vírus da dengue em Reynosa - México na epidemia de 1995, mostrando a capacidade de infecção pelo vírus da dengue, todavia nas Américas o vetor apresenta importância secundária, visto que ainda não foi associado à transmissão do vírus.