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1- INTRODUÇÃO

2.13 TRATAMENTO PRÉ E PÓS NATAL

Muitos autores concordam que o diagnóstico e tratamento imediatos da infecção por toxoplasmose na gestante poderiam prevenir a transmissão materno- fetal do parasita. Até o momento duas revisões sistemáticas avaliaram o efeito do tratamento pré-natal na transmissão materno-fetal (Wallon et al., 1999b; Peyron et

al., 2000). Em uma delas, foram encontrados nove artigos que preenchiam os

critérios de inclusão. A infecção congênita foi comum nos grupos tratados. Cinco estudos mostraram que o tratamento pré-natal foi efetivo e quatro não, mas em nenhum deles, o estudo era randomizado ou possuía um grupo controle diretamente comparado com um grupo de tratamento (Wallon et al., 1999b). Na outra revisão sistemática, de 2591 artigos identificados, nenhum preenchia os critérios de inclusão e os autores não puderam chegar a uma conclusão de que o tratamento pré-natal poderia reduzir a transmissão congênita da toxoplasmose

(Peyron et al., 2000). A realização de meta-análise sobre o efeito do tratamento pré-natal não foi possível nestas revisões, pois usaram diferentes métodos analíticos e meios de agregação de dados.

Um grande estudo de coorte multicêntrico prospectivo realizado na Europa incluiu 1260 mulheres grávidas infectadas e seus recém-nascidos e não encontrou evidências de que o tratamento precoce com espiramicina ou associação de sulfadiazina e pirimetamina tenha algum efeito sobre a transmissão materno-fetal do parasita. Os autores especulam que a transmissão materno-fetal ocorre rapidamente após a infecção e por isso, a oportunidade de tratamento é muito pequena, provavelmente nos primeiro 15 dias (a transformação de taquizoítos em cistos se torna completa nos primeiros 15 dias após a infecção e os cistos são impermeáveis aos antiparasitários). Como a triagem pré-natal para gestantes soronegativas é realizada mensal ou trimestralmente a maioria das infecções não é diagnosticada a tempo de se iniciar o tratamento para prevenir a transmissão da infecção para o feto e encistamento dos parasitas (Gilbert & Gras, 2003; Gilbert & Dezateux, 2006).

Uma revisão sistemática usando dados individuais de pacientes para se realizar uma meta-análise mostrou que dentre 550 crianças infectadas identificadas pelos programas de triagem pré e pós-natal realizados na Europa, não há evidências de que o tratamento pré-natal reduza de maneira significativa o risco de manifestações clínicas (OR:1,11; 95% IC:0,61-2,02). A soroconversão em uma idade gestacional avançada apresentou uma forte associação com o risco de transmissão materno-fetal da infecção (OR:1,15; 95% IC:1,12-1,17) e com menor risco de lesão intracranianas (OR:0,91; 95% IC: 0,87-0,95) mas limitado com lesões oculares (OR:0,97; 95% IC: 0,93-1,00) (Thiebaut et al., 2007). Esse trabalho

mostra também que o tratamento da mulher grávida dentro das primeiras três semanas de infecção pode reduzir a transmissão da infecção para o feto, mas o tratamento tardio não possui efeito.

No Brasil, a recomendação é de que após o diagnóstico da infecção aguda materna, independentemente da idade gestacional, deve-se iniciar a espiramicina que será mantida até a pesquisa da infecção fetal. A espiramicina é um macrolídeo cuja função é bloquear o parasita na placenta, impedindo ou retardando a infecção congênita. Porém, se o feto já estiver contaminado, sua ação parece não ser adequada. Se após a propedêutica, for confirmada a infecção fetal, deve-se iniciar o tratamento tríplice com a pirimetamina, sulfadiazina e ácido folínico, da décima oitava semana de gestação até o termo. No caso de soroconversão após a vigésima quarta semana de gestação, mesmo sem infecção fetal comprovada, o esquema tríplice também deverá ser iniciado (Montoya & Liesenfeld, 2004; Remington et al., 2005; Zugaib, 2007). Nas gestantes em tratamento com pirimetamina, é importante solicitar hemograma mensal para avaliação de complicações hematológicas. Também é importante avaliar risco/benefício do uso do esquema tríplice no último mês de gestação, devido ao risco de hiperbilirrubinemia neonatal provocado pela sulfadiazina (Queiroz-Andrade et al., 2004). Caso seja afastada a infecção fetal, após propedêutica invasiva, deve-se manter o uso da espiramicina até o termo e controle ultrasonográfico mensal.

Com relação ao tratamento pós-natal, uma vez diagnosticada a toxoplasmose congênita no recém-nascido, seja ele sintomático ou não, o tratamento deverá ser iniciado por um período variável de tempo: três meses na Dinamarca (Guerina et al., 1994; Schmidt et al., 2006) , dois anos na França (Villena et al., 1998a) e por um ano no Brasil. A maioria dos estudos recomendam

o tratamento durante todo o primeiro ano de vida (McLeod et al., 2006; Petersen & Liesenfeld, 2007; Phan et al., 2007) .

O uso de Pirimetamina e Sulfadiazina constitui a base do tratamento da toxoplasmose congênita no recém-nascido e seu uso foi adotado a partir de estudos realizados em modelos animais no ano de 1950, mas foi recentemente revisto (Petersen & Schmidt, 2003). O objetivo do tratamento é o de eliminar as formas proliferativas do parasita e, propiciar tempo para que o recém-nascido desenvolva resposta imune competente para manter o parasita na forma de cisto. As drogas agem de forma sinérgica contra as formas proliferativas do parasita presente durante o processo infeccioso agudo. Não penetram nos cistos parasitários, por isso não são recomendadas na fase crônica. Na evidência de

inflamação grave: lesão ocular em atividade na macula ou proteína do líqüor ≥ 1

g/dL, recomenda-se associar prednisona (Queiroz-Andrade et al., 2004; Remington

et al., 2005).

Crianças com toxoplasmose congênita que nascem sintomáticas devem ser tratadas, mas o real benefício do tratamento nas crianças assintomáticas permanece sob intensa discussão (Rothova, 2003; Petersen, 2007). Além disso, o tratamento pode apresentar sérios efeitos colaterais (principalmente neutropenia) em 14-50% das crianças (Guerina et al., 1994; Kieffer et al., 2002).

Um estudo realizado na Holanda comparou crianças com toxoplasmose congênita, sem tratamento, com uma coorte de crianças, identificadas pelo programa de triagem pré-natal francês, tratadas durante o primeiro ano de vida. Não houve diferença estatisticamente significativa na proporção de crianças com doença ocular nos dois grupos (Gilbert et al., 2001a).

O seguimento de uma coorte de 120 crianças com toxoplasmose congênita grave mostrou melhora significativa naquelas crianças que receberam sulfadiazina e pirimetamina durante o primeiro ano de vida quando comparadas com controles históricos (McLeod et al., 2006). Entretanto, esse estudo apresenta alguns problemas: ausência de informações sobre a história natural da infecção, viés de seleção (casos graves) e ausência de grupo controle.

Outros estudos, sobre a evolução clínica das lesões oculares, reportaram um melhor prognóstico ocular quando a infecção congênita foi identificada e tratada precocemente (Koppe & Rothova, 1989; Guerina et al., 1994; McAuley et al., 1994; Mets et al., 1997; Neto et al., 2004; Wallon et al., 2004; Kodjikian et al., 2006; Phan

et al., 2007).

O consenso é de que, com base nos conhecimentos atuais, o mais razoável, é aceitar que o tratamento pós-natal é melhor do que a ausência de tratamento (Gomez-Marin & dela Torre, 2007).

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