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TRIBUTAÇÃO DAS OPERAÇÕES NORMAIS NO MERCADO ACIONÁRIO À

4. TRIBUTAÇÃO NO MERCADO ACIONÁRIO

4.1 TRIBUTAÇÃO DAS OPERAÇÕES NORMAIS NO MERCADO ACIONÁRIO À

Segundo os doutrinadores, no mercado à vista de ações, a compra e venda de papéis tem liquidação imediata123. José Delgado afirma que o mercado à vista “só admite a liquidação das transações efetuadas com os valores mobiliários até o 5º dia útil da data do fechamento do negócio” 124. É nesse prazo que ocorre a liquidação financeira. A execução da ordem é imediata. A liquidação financeira é que ocorre em D+3. Com a aquisição o investidor passa a deter instantaneamente o papel em custódia, ainda que a liquidação financeira se dê após três dias úteis (D+3). O mesmo raciocínio é válido para a alienação dos papéis, operando-se desde logo a tradição. A liquidação e a custódia são responsabilidade da Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia – CBLC125 a quem cabe zelar pelo cumprimento das obrigações entre as partes, prevenindo a inadimplência com efeito cascata no mercado.

O day trade é uma operação à vista, diferindo das operações normais pelo fato da liquidação em D+3 ficar restrita ao pagamento da diferença verificada com o encerramento da operação. Essa diferença pode ser um valor negativo ou positivo. No mercado à vista de ações, uma operação é dita normal quando a alienação do papel se dá em dia/pregão posterior àquele em que foi adquirido. Esse conceito se contrapõe ao do day trade em que a operação é encerrada no mesmo dia, não ficando o papel em custódia. Ao tratar da tributação do ganho de capital no mercado acionário, a Lei nº 8.981/1995 não previu a retenção de imposto de renda na fonte. O recolhimento era responsabilidade do investidor. Havia alíquota única de 10%, sem distinção entre operações normais e day trade . Vale dizer: não havia retenção na fonte, mas o recolhimento era definitivo, não permitindo compensação na declaração anual de ajuste.

Com a edição da Lei nº 9.959, de 27 de janeiro de 2000, o day trade passou a ter tratamento fiscal diferenciado, com retenção parcial na fonte. Possibilitou-se averiguar, de

123 BENTO, Paulo Marcelo de Oliveira; MALHEIRO, Rafael Macedo; CASTILHO, Ramon Machado,

BATISTON, Renato Reis; COELHO, Renato Souza. Manual de Tributação no Mercado Financeiro. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 108-109.

124 DELGADO, José Augusto. Aspectos Conceituais de Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais e da

Previdência Privada. In: TORRES, Heleno Taveira (Coord.) Tributação nos Mercados Financeiro e de Capitais. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 33.

imediato, a ocorrência de ganho de capital naquela modalidade de operação. As operações normais continuavam sujeitas à declaração, pelo contribuinte. Sua fiscalização continuava falha. Não é incomum que um mesmo investidor opere através de mais de uma corretora e que transfira a custódia das ações entre elas. A complexidade aumenta quando há uma profusão de operações diárias, com diferentes papéis, a diferentes preços e quantidades, conjugando-se operações normais com day trade. Em casos assim torna-se virtualmente impossível o correto cálculo do preço médio de aquisição dos ativos e os ganhos de cada venda parcial.

As operações normais no mercado à vista careciam de um instrumento fiscalizatório eficaz. A experiência com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira – CPMF foi decisiva neste caso. Embora tenha origem na discussão acerca do imposto único, ainda como Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira – IPMF, a posterior CPMF chegou a incidir sobre as operações financeiras no mercado acionário. Essa cobrança tornava inviável muitas operações de curtíssimo prazo, a exemplo do day trade. O mercado reivindicou126 e o Conselho Monetário Nacional isentou os investidores estrangeiros da cobrança da CPMF na conversão da moeda.127 Posteriormente a isenção foi estendida aos demais investidores.

Frequentemente a tributação é instituída com um fim específico para depois revelar efeitos outros. Vale dizer, efeito extrafiscal não previsto. A CPMF tinha cunho arrecadatório, com o fim declarado e específico de custear a saúde pública. Percebeu-se, ademais, que era poderoso instrumento para fins fiscalizatórios, permitindo cotejar o montante de recursos movimentado no mercado financeiro com a renda e patrimônio declarados pelo contribuinte. Assim, mesmo depois de extinta, serviu de inspiração para a instituição do imposto simbólico à alíquota de 0,005% sobre as vendas de ações em operações normais no mercado à vista. Trata-se formalmente de imposto de renda, sobre ganho de capital, a despeito de incidir sobre o montante de recursos, patrimônio, ao menos no primeiro momento. Incide na fonte sobre o patrimônio do contribuinte, tenha ou não havido ganho de capital. Ele grava o patrimônio, mesmo que a operação de alienação das ações tenha redundado em prejuízo.

126 Diretriz número nove do Plano Diretor do Mercado de Capitais de 2002: “Quanto à tributação no mercado de

capitais, é importante que os critérios de tributação respeitem a isonomia com as melhores práticas internacionais, especialmente em relação à sua incidência sobre instrumentos de poupança de longo prazo, com é o caso de planos e entidades de previdência complementar e ganhos sobre investimentos de renda variável, bom como aqueles que, incidindo sobre as transações financeiras (CPMF), elevam os custos de transação, inibem a liquidez e inviabilizam a operação e a funcionalidade do mercado de capitais brasileiro.” In: ROCCA, Carlos Antonio (Org.). Plano Diretor do Mercado de Capitais 2002 – Texto integral e bases conceituais. Estudos IBMEC, v. 2. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002, p. 42.

127 VIEIRA, Enio; SOBRAL, Isabel e RODRIGUES, Luciana. O estrangeiro livre da CPMF na bolsa. São

Curiosamente esse imposto é conhecido no mercado como imposto rastreador. Trata- se de um tributo de caráter extrafiscal. Outro imposto incidente no mercado de capitais que tem caráter extrafiscal é o Imposto sobre Operações Financeiras - IOF. O foco, neste caso, é o controle do fluxo de capitais. As lições que podem ser retiradas daí vão além da fiscalização tendente a impedir crimes financeiros, como a lavagem de dinheiro. Pode-se considerar, também, uma experiência quanto à eficácia ou não do controle do fluxo de capitais, da perspectiva do combate à especulação financeira, com reflexos nas cotações cambiais. Trataremos desse tema no capítulo 5.