Note que ´algebras de Lie bidimensionais necessariamente satisfazem o exemplo especial e portanto est˜ao bem compreendidas.
3.4 O caso tridimensional 46
Seja G um grupo de Lie tridimensional com m´etrica invariante `a esquerda. Es- colha uma orienta¸c˜ao para ❣ e defina o produto vetorial como a aplica¸c˜ao bilinear × :❣ × ❣ −→ ❣ que para cada par de vetores unit´arios e linearmente independentes u, v ∈❣ fa¸ca corresponder o vetor u×v que ´e simultaneamente ortogonal a u e v com norma dada pela ´area do paralelogramo gerado por u e v e de forma que u, v, u × v seja uma base positiva de❣.
Lema 3.4.1. O colchete nesta ´algebra de Lie ❣ est´a relacionado com o produto vetorial pela f´ormula
[u, v] = L(u × v),
onde L :❣ → ❣ ´e a ´unica aplica¸c˜ao linear definida pela equa¸c˜ao acima. O grupo de Lie G ´e unimodular se, e s´o se, a transforma¸c˜ao linear L ´e auto-adjunta.
Demonstra¸c˜ao: Se¸c˜ao 6.
Considere G unimodular. Pelo Lema anterior L ´e auto-adjunta e admite uma base ortonormal e1, e2, e3 de autovetores, L(ei) = λiei. Trocando se necess´ario e1
por −e1, podemos assumir que e1, e2, e3 possui orienta¸c˜ao positiva. Neste caso os
colchetes ficam da forma,
[e1, e2] = L(e1× e2) = λ3e3, [e2, e3] = L(e2× e3) = λ1e1, [e3, e1] = L(e3× e1) = λ2e2.
A mudan¸ca da orienta¸c˜ao de ❣ altera o sinal do produto escalar e portanto de L e seus autovalores.
Defina,
µi = 12(λ1 + λ2 + λ3) − λi para i = 1, 2 e 3
de forma que, por exemplo µ1+ µ2 = λ3.
Teorema 3.4.2. A base ortonormal e1, e2, e3 escolhida anteriormente diagonaliza a
forma quadr´atica de Ricci. As curvaturas principais s˜ao dadas por r(e1) = 2µ2µ3, r(e2) = 2µ1µ3, r(e3) = 2µ1µ2
e a curvatura escalar ´e dada por
Demonstra¸c˜ao: Se¸c˜ao 6.
Provaremos agora um resultado muito ´util em variedades Riemannianas 3-dimen- sionais.
Lema 3.4.3. Dada uma variedade Riemanniana tridimensional temos em cada ponto a seguinte f´ormula
k(u, v) = ku × vk2 ρ2 − r(u × v).
Demonstra¸c˜ao. Tome um vetor w unit´ario, ortogonal a u e pertencente ao plano gerado por u e v. Desta forma span {u, v} = spann u
kuk, w o en u kuk, w, u×v ku×vk o ´e uma base ortonormal do espa¸co tangente. Agora
ku × vk2 ρ 2− r(u × v) = ku × vk 2 ρ 2 − ku × vk 2 r( u × v ku × vk) = ku × vk2[ρ 2 − r( u × v ku × vk)] = ku × vk2[r( u kuk) + r(w) + r( u×v ku×vk) 2 − r( u × v ku × vk)] = ku × vk2[r( u kuk) + r(w) − r( u×v ku×vk) 2 ] = ku × vk2k( u kuk, w) como queriamos.
Observa¸c˜ao 3.4.4. Em geral n˜ao existe uma formula semelhante a dada no Lema 3.4.3 para variedades Riemannianas de dimens˜ao maior que 3. Com efeito, associ- ada a forma quadr´atica de Ricci, existe uma matriz [r] de forma que [x]t[r][x] = r(x)
para todo vetor x. A determina¸c˜ao de [r] depende da forma bi-linear a qual a forma quadr´atica de Ricci esta associada. Note que se r(x) = hˆr(x), xi ´e a forma quadr´atica de Ricci e a forma bi-linear a qual est´a associada ´e r(u, v) = hReiuei, vi = hReivei, ui
e [r] ´e sim´etrica, ou seja, a determina¸c˜ao da forma quadr´atica de Ricci depende da determina¸c˜ao dos 1
2n(n + 1) termos de [r]. Isto ´e diferente dos 1 12n
2(n2 − 1)
parˆametros necess´arios `a determina¸c˜ao da curvatura seccional em um ponto, salvo os casos bi e tridimensionais. Portanto n˜ao existe em geral uma f´ormula semelhante a do Lema anterior para variedades Riemannianas com dimens˜ao maior que 3.
3.4 O caso tridimensional 48
Corol´ario 3.4.5. No caso unimodular tridimensional, o determinante r(e1)r(e2)r(e3)
da forma quadr´atica ´e sempre n˜ao-negativo. Se o determinante ´e zero, ent˜ao ao me- nos duas das curvaturas principais de Ricci deve ser zero.
Demonstra¸c˜ao. Basta notar que nas condi¸c˜oes do teorema, o determinante ´e igual a 2µ2µ32µ1µ32µ1µ2 = 23µ21µ22µ23.
Logo ´e sempre maior que zero. Se ela se anula, ent˜ao ao menos duas curvaturas principais de Ricci se anulam.
Se o determinante r(e1)r(e2)r(e3) ´e diferente de zero ´e f´acil colocar as constantes
de estruturas em fun¸c˜ao das curvaturas de Ricci principais. Suponha que se tenha o colchete fixo. Escolhendo uma m´etrica tal que a base ηζe1, ξζe2, ξηe3seja ortonormal
obtemos,
[ηζe1, ξζe2] = ηζ2ξ[e1, e2] = ηζ2ξλ3e3,
[ξζe2, ξηe3] = ξ2ζη[e2, e3] = ξ2ζηλ1e1,
[ξηe3, ηζe1 = η2ξζ[e3, e1] = η2ξζλ2e2,
e as novas constantes de estrutura s˜ao: ζ2λ
3, ξ2λ1 e η2λ2 . Desta forma ´e poss´ıvel
multiplicar as constantes de estrutura por uma constante positiva sem que se altere a ´algebra de Lie. Obviamente a m´etrica ´e alterada para que com a ´algebra de Lie fixa, forne¸ca as novas contantes de estrutura. Mudando o sinal se necess´ario, podemos supor que no m´aximo uma das constantes λ1, λ2 ou λ3 ´e negativa. Assim obtemos
Tabela 3.1: Grupos de Lie unimodulares e 3-dimensionais Sinais de λ1, λ2, λ3 Grupo de Lie associado Descri¸c˜ao
+, +, + SU (2) ou SO(3) compacto, simples
+, +, - SL(2, R) ou O(1, 2) n˜ao-compacto, simples
+, +, 0 E(2) sol´uvel
+, -, 0 E(1, 1) sol´uvel
+, 0, 0 Grupo de Heisenberg nilpotente
0, 0, 0 R⊕ R ⊕ R comutativo
Corol´ario 3.4.6. Dependendo da escolha da m´etrica invariante `a esquerda, a forma quadr´atica de Ricci para o grupo SU (2) pode ter assinatura (+, +, +), (+, 0, 0) ou (+, -, -) e a curvatura escalar pode ser positiva, negativa ou zero.
Demonstra¸c˜ao. Considere, sem perda de generalidade, λ1 ≥ λ2 ≥ λ3. Ent˜ao µ2,
µ3 > 0. Se λ1 > λ2+ λ3 temos µ1 < 0. Se λ1 = λ2+ λ3, ent˜ao µ1 = 0. Finalmente,
se λ1 < λ2+ λ3 devemos ter µ1 > 0, o que nos d´a os tr´es casos citados.
Corol´ario 3.4.7. Para qualquer m´etrica invariante `a esquerda no grupo de Heisen- berg a forma quadr´atica de Ricci possui assinatura (+, -, -) e a curvatura escalar ρ ´e estritamente negativa. Al´em do mais a curvatura principal de Ricci satisfaz
|r(e1)| = |r(e2)| = |r(e3)| = ρ.
Demonstra¸c˜ao. Para o grupo de Heisenberg temos λ1 > 0, λ2 = λ3 = 0. Portanto
µ1 = −λ21, µ2 = λ21 = µ3 e µ2µ3 = −µ1µ3 = −µ1µ2, ou seja, r(e1) = −r(e2) =
−r(e3) = λ2 1 2 . Al´em disso, ρ = 2(µ2µ3+ µ1µ2+ µ1µ3) = −λ 2 1 2
´e estritamente negativa.
Corol´ario 3.4.8. Seja G = SL(2, R) ou E(1, 1), ent˜ao dependendo da escolha da m´etrica invariante `a esquerda a assinatura da forma de Ricci pode ser (+, -, -) ou (0, 0, -). Contudo, a curvatura escalar ρ deve sempre ser estritamente negativa. Demonstra¸c˜ao. Tome inicialmente λ1 = 0 e λ2, λ3 com sinais opostos. Ent˜ao
2µ2µ3 = −(λ2−λ3) 2 2 , 2µ1µ2 = −λ2 2+λ 2 3 2 , 2µ1µ3 = λ2 2−λ 2 3 2
3.4 O caso tridimensional 50
e disso ρ = −(λ2−λ3)2
2 < 0.
Se λi s˜ao todos diferentes de zero, com digamos λ1 < 0 < λ2 ≤ λ3 e observando
que ρ = λ3(λ1+ λ2− λ3) + (λ1− λ2+ λ3)(−λ1+λ22+λ3), ent˜ao ∂λ∂ρ1 = −λ1+ λ2+ λ3 e ρ
´e estritamente mon´otona como fun¸c˜ao de λ1. Portanto ρ(λ1, λ2, λ3) < ρ(0, λ2, λ3) =
−1
2(λ2− λ3) 2 ≤ 0.
Note que no primeiro caso onde λ1 = 0 e λ2, λ3 possuem sinais opostos obtemos
assinatura (+, -, -) ou (0, 0, +) no caso de |λ2| = |λ3|. No segundo caso obtemos
µ1 > 0 e µ3 < 0. Se µ2 = 0, ent˜ao (0, 0, -). Se µ2 6= 0, ent˜ao (+, -, -).
Corol´ario 3.4.9. O grupo euclidiano E(2) ´e n˜ao-comutativo, mas admite uma m´etrica invariante `a esquerda flat. Toda m´etrica invariante `a esquerda n˜ao flat possui forma de Ricci de assinatura (+, -, -), com curvatura escalar ρ < 0.
Demonstra¸c˜ao. Como λ1, λ2 > 0 a ´algebra de Lie de E(2) ´e n˜ao-comutativa. Para
uma m´etrica invariante `a esquerda flat, escolha λ1 = λ2. De fato,
µ1 = 0, µ2 = 0 e µ3 = 2λ1 = 2λ2
e disso r(e1) = r(e2) = r(e3) = 0 e ρ = 0. Note que se w ∈❣, ent˜ao w = ǫ1e1+ ǫ2e2+
ǫ3e3e como e1, e2, e3 diagonaliza a forma de Ricci, devemos ter r(w) =P r(ei)ǫi = 0.
Agora a f´ormula em 3.1.1 mostra que k(u, v) = 0 ∀u, v ∈❣. Neste caso a assinatura da forma de Ricci ´e (0, 0, 0). Perceba que λ1 = λ2 ´e uma condi¸c˜ao necess´aria e
suficiente para m´etrica ser flat.
Se λ1 6= λ2, ent˜ao µ1 = −λ12+λ2, µ2 = λ1−λ2 2 e µ3 = λ1+λ2 2. Assim se λ1 < λ2,
teremos µ1, µ3 > 0 e µ2 < 0 e se λ1 > λ2, ent˜ao µ2, µ3 > 0 e µ1 < 0 obtendo desta
forma assinatura (+, -, -) para a forma de Ricci. Com isso ρ = −(λ1−λ2)2
2 < 0.
Lema 3.4.10. Se o grupo de Lie G ´e conexo, tridimensional e n˜ao-unimodular, ent˜ao sua ´algebra de Lie possui uma base e1, e2, e3 tal que
[e1, e2] = αe2+ βe3,
[e1, e3] = γe2+ δe3,
[e2, e3] = 0
e tal que a matriz
A = α β γ δ
possui tra¸co α + δ = 2. Se excluirmos o caso onde A ´e a identidade, ent˜ao o terminante D = αδ − βγ ´e um invariante completo desta ´algebra de Lie.
Demonstra¸c˜ao: Se¸c˜ao 6.
Note que se A = Id, ent˜ao [e1, e2] = e2, [e1, e3] = e3 e [e2, e3] = 0. Portanto
se x, y ∈ ❣ com x = a1e1 + a2e2 + a3e3 e y = b1e1 + b2e2 + b3e3 teremos [x, y] =
(a1b2− a2b1)e2+ (a1b3− a3b1)e3 recaindo no exemplo especial.
Considere um grupo de Lie como em 3.4.10 com A 6= Id.
Teorema 3.4.11. Se o determinante D ´e negativo ent˜ao toda m´etrica invariante `a esquerda possui a forma quadr´atica de Ricci de assinatura (+, -, -), mas se D ≥ 0 a assinatura (0, -, -) ´e tamb´em poss´ıvel, assim como a assinatura (-, -, -) no caso D > 0. Na verdade, para D > 0, existe uma m´etrica invariante `a esquerda de cur- vatura seccional estritamente negativa e para D > 1 existe uma m´etrica invariante `a esquerda de curvatura negativa constante. Em todos os casos a curvatura escalar ´e estritamente negativa.
Demonstra¸c˜ao: Se¸c˜ao 6.
Em todos os casos n˜ao-unimodulares, ao menos duas das curvaturas principais de Ricci s˜ao negativas e podemos concluir que no caso tridimensional n˜ao existe grupos de Lie que admite uma m´etrica invariante `a esquerda com forma de Ricci de assinaturas (+, +, -) ou (+, ±, 0).