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Diego López fazia quatro anos e naquela manhã a alegria saltava em seu peito, a alegria era uma pulga saltando sobre uma rã saltando sobre um canguru saltando sobre uma mola, enquanto as ruas voavam ao vento e o vento batia as janelas. E Diego abraçou sua avó Gloria e em segredo, junto ao ouvido, ordenou: - Vamos entrar no vento. E a arrancou de casa.

2012 – Turma dos Heróis

O ano de 2012 terminou e mesmo conversando com o diretor da escola não pude continuar com a Turma dos Leões no ano que se iniciaria. Não poderia porque além de misturarem os alunos em novas turmas era necessário respeitar a ordem de escolha: quem tinha a pontuação mais alta — cujos pontos que mais valiam eram os anos de trabalho — escolheria antes. No entanto, mesmo que na minha vez houvesse um terceiro ano vago, esse não seria a minha turma do ano anterior, vez que de antemão me avisaram que mesclariam as crianças de qualquer maneira.

Assim, já sabia que passaria novamente pelo período doloroso de separação, de comparação dos alunos novos com os antigos, de luta para que o amor que sentia pelos anteriores não fosse um obstáculo na relação com os novos.

Depois de ter ficado com uma turma durante todo um ano, de ter alfabetizado aqueles que não estavam alfabetizados no início do ano, de ter visto como fomos construindo um coletivo e como as crianças estavam autônomas no final do ano, sentia-me mais segura para escolher um primeiro ano do que havia me sentido no final de 2010. Queria saber como era alfabetizar as crianças logo que chegavam ali no ensino fundamental, ver como a escrita e a leitura surgiam, como seria ensinar a ler e a escrever trazendo a vida deles para dentro da escola.

Mais uma vez decidimos, a professora Patrícia e eu, que trabalharíamos em parceria. Trabalhar em parceria com ela era algo riquíssimo. Havia alguém para conversar sobre as crianças, sobre os nossos avanços, sobre os problemas e as preocupações, enfim, sobre a escola. Podíamos pensar em propostas para as crianças juntas, partilhar ideias, dar opiniões, pedir socorro uma para a outra antes, depois ou no meio da aula. O diálogo constante sobre o cotidiano escolar e sobre as práticas de ensino com a Patrícia enriquecia o meu trabalho, me dava ânimo nos dias mais difíceis e nossas ideias juntas faziam que os planejamentos fossem sempre mais ricos.

Todos condenam as instituições de estudos fechadas, mas, na verdade, será que muitas das nossas escolas infantis não são construídas da mesma forma, isolando as crianças da vida? (...)Não há inter-relação entre as escolas e o meio ambiente, e a escola foge da população não menos do que antes.

É preciso instituir de todas as formas esta ligação. (...) Ou aparece uma praga na hortinha: as crianças aprendem como lidar com isso na escola — vão oferecer seus serviços na luta contra a praga (...) ajudam a levar e classificar a correspondência, escrever uma carta (...) sugerem na escola um manual para a

população (...) Aqui é difícil dar algum modelo. O professor deve apenas usar em cada caso, o que vai ao encontro do pensamento da criança, que pode naquele caso ter este ou aquele resultado (...)" (KRUPSKAYA, 2017, pp. 109-110). "... a prática reflexiva demanda e interroga a teoria e, principalmente, passamos a valorizar a prática como local de produção de conhecimento (...) mediante a reflexão (com)partilhada a professora vai assumindo pensar e fazer coletivamente o cotidiano escolar" (SAMPAIO, 2008, p.90).

Além disso, nossa parceria extrapolava nós duas e chegava às crianças. Nossas turmas eram parceiras. Seus alunos nos anos anteriores tinham total liberdade comigo e os meus com ela. Minha turma ia à classe dela para que nos presenteassem com suas produções e para apresentarmos produções nossas e vice-versa. Se por algum motivo eu não estava, era a Patrícia a referência a quem as minhas crianças iam recorrer, e se ela não estava, vinham a mim os alunos dela.

Essa parceria, além de ser para partilhar ideias e construir ações outras dentro da escola, também era parceria para que as crianças pudessem partilhar suas produções, suas ideias e suas vidas na escola, já que estávamos sempre realizando propostas juntas e os estudantes brincavam sempre juntos.

Saber que teria a Patrícia para trabalhar em parceria novamente, que juntas e com as crianças descobriríamos dia após dia como seria ser professora do primeiro ano do ensino fundamental e que nossas turmas seriam parcerias, eram fatores que me acalmavam. Porque sim, eu estava apreensiva diante do fato de que teria, naquele ano, algumas vinte crianças, de cinco e seis anos, esperando ansiosamente para aprenderem a ler e a escrever, porém sem deixar de serem crianças, podendo viver a infância e brincar.

Também como no ano anterior, Violeta pegou minha lista de alunos e foi até a escola de educação infantil que as crianças haviam frequentado antes, perguntar sobre cada uma delas. Descobriu que as professoras não tiveram tempo de separar as turmas e que quem havia feito isso, sem critério a seguir, havia sido a escriturária da escola. Ao trazer as notícias sobre os meus alunos disse que, tirando um ou outro, todos os que recebiam reclamações sobre seus comportamentos estavam juntos em minha sala.

Sinceramente, acho que não me preocupei tanto, afinal mesmo se fossem todos tímidos, depois de um tempo em minha sala estariam falantes e movimentando-se em busca de trocas com os colegas. Mal sabia que aquilo significava movimento intenso durante todo o ano. Diferentemente das outras turmas em que a agitação dos primeiros meses dava lugar a um movimento produtivo e mais calmo no decorrer dos meses, nessa fomos do primeiro dia de aula ao último em ritmo acelerado; claro que com avanços, mas nunca deixando de ser uma turma com movimentação intensa. Avanços porque foram aprendendo além dos conteúdos conceituais, conteúdos procedimentais e atitudinais, o que não significa que a agitação tenha diminuído, passava sempre a ter outras características, mas a intensidade pouco diminuiu durante o ano letivo.

Voltando à minha apreensão, preciso dizer que apesar de ter alfabetizado crianças nos anos anteriores eu realmente tinha muitas dúvidas quanto ao que fazer no início do ano letivo. Não sabia se conseguiria alfabetizar. Ao pensar que não seria uma ou outra criança, mas a turma toda a quem eu teria de ensinar a ler e a escrever, percebia que não sabia muito bem por onde deveria começar.

Por isso fui até a Rosaura perguntar como seria esse começo. Cheguei logo perguntando se teria de dizer “Crianças esse é o A, aquele é o B”, “Muito prazer A, encantada B”. Ao que me respondeu que sim, que teria de ensinar o alfabeto para as crianças; que teria de propor atividades nas quais precisassem testar suas hipóteses, em duplas, nas quais fossem percebendo outras maneiras de escrever ao estarem com os colegas e ao discutirem sobre seus jeitos de escrever. Além disso, as propostas deveriam ter uma função social, isto é, propostas que fizessem sentido para as crianças, ao invés de um simples fazer por fazer.

Sabendo do que diziam da turma e lembrando-me de como havia agido no ano anterior com o Mário — quando tive medo que estivesse em minha sala — tentando não me levar pela caracterização das crianças que chegava até mim, tendo ideia do que fazer no início de um primeiro ano — depois que fui conversar com a Rosaura — e continuando apreensiva, chegou o dia de conhecer as crianças. Elas eram menores do que eu imaginava, elas eram muito pequenas e tudo ali naquela escola parecia ser muito diferente para elas.

Eu tenho a nítida impressão de que em três dias ouvi mais a expressão “prô” do que em um ano inteiro. Pois é, a Turma dos Leões tinha uma autonomia que fomos construindo juntos, mas só hoje pude perceber o quão grande era. Arrumavam o armário, ajudavam uns aos outros, verificavam no registro que faziam na lousa se havia alguém fora da sala e se não houvesse saiam quando precisavam, escreviam textos ótimos, trabalhavam em parceria... Eu

"No processo cotidiano de aprender a ler e a escrever, o(s) tempo(s) e o(s) modo(s) de intervir (e mediar) precisaram ser

ressignificados por conta de modos outros de compreender o ensinaraprender, o conhecimento e o que significa conhecer; a alfabetização, leitura e escrita; a(s) criança(s) e a(s) infância(s); erro e acerto..." (SAMPAIO, 2008, p. 101).

"O aprendizado das técnicas de ler e escrever ou o das técnicas de manejar o arado ou usar

fertilizantes (bem como o aprendizado das ideias de um programa de ação), – enfim todo aprendizado deve encontrar-se

intimamente associado à tomada de consciência da situação real vivida pelo educando"

(WEFFORT, 1982, p. 6).

"O que

fundamentalmente importa é que estes homens particulares e concretos se reconheçam a si próprios, no transcurso da discussão, como criadores de culturas" (WEFFORT, 1982, p. 8).

podia sair com eles pela escola e por outros lugares sem me preocupar, eles sabiam o que podiam ou não fazer, zelavam por aqueles que estavam juntos.

Já a turma que ainda não tem nome depende de mim para tudo, de segundo em segundo tem uns cinco dizendo “prô”, depois mais sete e depois mais cinco. Alguns choram, outros batem e outros perguntam quando irão dormir, ou quanto falta para a mãe chegar. As falas são mais ou menos assim: - Prô! -Prô, prô, prô... - PROOOOOOOOOOOOÔ! - Vanessa... Ô VANESSA! - Ô tia. - Prô, olha só... - Prô, olha ele! - Prooooô!

Eu sei que criança não para, mas essas são extremamente diferentes dos Leões, não parece que é somente um ou dois anos de diferença, parece que são sete anos!

Apesar de tudo, eu acho que estou começando a me encantar e a me desesperar também. Ambas coisas boas! Talvez eu tenha que descobrir como ir construindo essa relação da maneira mais adequada possível, como me comportar com elas, o que esperar e o que exigir agora. Acredito que encanto e desespero são bons para uma escuta sensível... Penso, ainda, que será preciso, como já dizia Che, “endurecer, mas sem perder a ternura jamais”. Porque sabe... subir em cima do armário, acender fósforo na sala e deitar no parapeito da lousa ainda não poderá na nossa turma (Trecho da narrativa "O meu (nosso) período de adaptação", 08 de fevereiro de 2012).

Assim como nos outros anos, a heteronomia das crianças era algo que me incomodava e, novamente, realizava uma comparação entre os alunos novos e os alunos dos anos anteriores. Para isso, levava em consideração como estavam os alunos antigos depois que já tinham desenvolvido certa autonomia, um senso de coletivo e se configuravam como um grupo. Esquecia como havia sido os outros inícios de ano e, outra vez, pensava que os alunos do ano em questão sabiam só um pouco do que eu esperava. Dessa maneira, ao invés de me acalmar ao lembrar que tudo deve ser construído pouco a pouco e

que as crianças já sabiam muito, bastava encontrar meios para que me mostrassem; ficava nervosa, pensando em tudo que nos faltava. E, ainda por cima, achava que o desespero me ajudaria a buscar razões para as suas condutas, à medida que me colocaria sempre em busca.

Começamos juntos a aprender a ensinar a ler e a escrever e a aprender a ler e a escrever. Sentavam-se em duplas e também em duplas foram aprendendo a ajudar, a conversar e a resolver conflitos. O ano todo foi assim: aprendendo junto, sentando em duplas e, quando não em duplas, em trios, quartetos ou quintetos, dependendo do que eu julgasse mais apropriado na proposta a ser desenvolvida.

Foi um ano difícil, não somente por conta da turma que demandava a todo momento por infância, mas também por conta de um pequenininho que demandava muito mais do que infância, me demandava todos os minutos do dia, demandava atenção total: o Vitório. Vivendo com demandas por todos os lados, como costumava acontecer no começo do ano, não soube muito bem o que fazer... Escrevia, refletia, questionava e me organizava em torno do que as crianças me diziam a partir de seus atos, considerados indisciplina ali naquele ambiente escolar.

Foi também um ano de escrever menos, bem menos do que nos outros dois — enquanto em 2010 e 2011 havia escrito vinte e uma narrativas em cada ano, neste ano de 2012 escrevi no total apenas sete. Foi o ano em que ingressei no mestrado, comecei a participar das disciplinas, comecei a elaborar de uma outra forma as minhas reflexões acerca do início da carreira. Como pensava que nessa pesquisa só iria pensar nos anos de 2010 e 2011, tinha de dividir o meu tempo entre essas três turmas: refletia sobre o vivido nos anos anteriores e sobre esse ano para que pudéssemos, a cada dia, nos conhecer melhor, aprendendo e ensinando uns aos outros.

Esse escrever menos, com certeza, fez com que o nosso processo de construir maneiras de ser e fazer nossas — maneiras mais organizadas, onde fôssemos interiorizando o certo e o errado

"A ajuda e o fazer em cooperação,

imprescindíveis à aprendizagem, não apenas das crianças, mas também, da(s) professora(s) e da pesquisadora, garantem um ensinaraprender de modo (com)partilhado com o(s) outro(s), abrindo possibilidades para a criação de uma esfera de confiança, de cooperação e de cuidado entre os sujeitos" (SAMPAIO, 2008, p. 100). "Essas ‘maneiras de fazer’ constituem as mil práticas pelas quais usuários se reapropriam do espaço organizado pelas técnicas da produção sócio-cultural (...) se trata de distinguir as operações quase microbianas que proliferam no seio das estruturas tecnocráticas e alteram o seu

funcionamento por uma multiplicação de ‘táticas’ articuladas sobre os ‘detalhes’ do cotidiano" (CERTEAU, 2008, p. 41).

— fosse mais lento.

Eu tive uma namorada que via errado. O que ela via não era uma garça na beira do rio. O que ela via era um rio na beira de uma garça. Ela despraticava as normas. Dizia que seu avesso era mais visível do que um poste. Com ela as coisas tinham que mudar de comportamento.

Manoel de Barros (2010a)

(...) A Violeta me faz enxergar as coisas que estão diante de mim a todo o momento. Comecei a ser firme com as crianças. A Violeta me ajudou, no começo de toda aula, com a roda ou com a conversa sem roda mesmo. Primeiro fui firme e fria, sem um sorriso durante o dia todo, e isso me fez mal. Depois consegui ser firme e enxergar encantos e isso me fez bem. Por incrível que pareça elas melhoraram bastante. Eu me acalmo, elas se acalmam.

Mas parece que cada dia traz uma surpresa nova e isso cansa, isso desgasta tanto! Um dia é bom, no outro a sala vem abaixo, mesmo sem gritos e com firmeza. Quando penso que estamos começando a construir algo, que estamos no mesmo lado da corda ao brincar de cabo de guerra... tudo desanda. E eu não sei se quando desanda sou eu quem vai pro outro lado ou se são elas. Eu só sei que desestimula, parece que não saímos do lugar.

Tenho uma intuição: acho que posso ser eu quem vai pro outro lado da corda!

Mas como? Quando faço isso? Se eu estou tentando agir de outra maneira, por que mudamos de lado justamente no instante em que tudo parecia estar bem?

Talvez percebam que eu não estou completamente apaixonada como sou capaz de ficar por elas. Criança percebe, não é?! Talvez a coisa seja bem mais complexa! Talvez eu tenha de entender que essas crianças têm a capacidade de carregar oceanos na peneira, e não só água (BARROS, 2010b). Elas carregam rios em peneiras e eu não estou conseguindo acompanhar. Acho que devemos criar um esconderijo secreto dos heróis onde possamos carregar os rios e até os oceanos, mas eu tenho de aprender a fazer isso com eles.

Eu estou aprendendo (acho). Embora em certos momentos me esqueça de tudo isso. Toda aprendizagem é dolorosa (é?), faz com que a gente saia de uma zona de conforto. Queria sentir por essas crianças o que sentia pelos Leões, acho que seria meio caminho andado nesse exercício de construir grutas de heróis e carregar água na peneira.

É... elas despraticam as normas, elas inventam sentidos para a desordem, elas experimentam e por isso parecem indisciplinadas, elas simplesmente estão a todo momento experimentando, inventando, criando. Isso foi tudo o que eu sempre quis para os meus alunos. Eu que preciso aprender a ver errado! Preciso encontrar uma forma de dialogar com o modo deles de viver (descobrir e usar os objetos do nosso mundo para inventar o mundo deles).

Acho que preciso olhar errado, carregar oceanos em peneiras com eles. Mas eu preciso saber: como? (Trecho da narrativa "Tenho de ver errado", 20 de março de 2012).

Eu tinha entendido que aquilo tudo que elas imaginavam, criavam, faziam não deveria ser extinto, deveria ser cultivado, deveria me ajudar para que a escola e a vida estivessem a todo o momento em diálogo. A parte delas elas faziam: traziam toda vida e imaginação que tinham para dentro da aula. Faziam isso da maneira delas, o que eu precisava tentar fazer era que essa maneira não fosse desorganizadora, mas sim, produtiva.

Essa turma inventiva, viva e cheia de infância que fomos foi a Turma dos Heróis. Sim, elas escolheram o nome heróis. Escolheram também que cada um seria um herói, heróis que já existiam ou heróis que passavam a existir ali mesmo. Heróis com poderes já conhecidos por alguns ou com poderes novos: como o de transformar o sabor de qualquer comida para o sabor escolhido por quem a fosse comer. Foram aprendendo a escrever fazendo listas de poderes, listas de heróis, listas de como poderiam ser as roupas de nossos heróis; procurando letras que faltavam para descobrir nomes de heróis que ainda não conheciam e fazendo cruzadinhas de heróis para completar nomes de heróis que já conheciam; inventando músicas sobre heróis que eram cantadas nos corredores; textos sobre heróis que eram lidos na sala e colocados em nosso livro da vida... Nas horas mais inesperadas e

"No âmbito da cultura de pares, as crianças realizam um conjunto de acções, designadamente: a Associação da palavra “amigo” aos companheiros com quem passam a realizar atividades partilhadas observáveis (brincar); a defesa, para continuar partilhando, dos espaços e brincadeiras (espaço interactivo) das crianças exteriores ao seu grupo de amigos; a partilha de rituais, sobretudo baseado em lendas e mitos culturais; a criação de estratégias para evitar o que não querem; a elaboração de ajustes secundários para contornar as regras dos adultos – esses ajustes são respostas

inovadoras e colectivas, por vezes mais

elaboradas que as próprias regras, que criam nas crianças a sensação de 'grupo'; o uso de valores comunitários e o seu investimento na perseguição de objetos pessoais" (SARMENTO, 2003, p. 14).

nas esperadas também, saíam correndo com o braço esticado dizendo ser o Super Homem, a Mulher Maravilha, ou olhavam para mim com cara de sapeca e davam um soco na palma da mão dizendo ser o Hulk. Soltavam o poder do gelo e do fogo ao esticar seus braços ordenando “poder do gelo!”, “poder do fogo!”; não importava se eu estava brava chamando atenção da turma, se estava explicando algo, ou se era hora disso mesmo.

Ali, a hora de ser criança era sempre, a hora de ser herói era todo dia, toda hora. Se eu quisesse conseguir ter um ano produtivo e significativo com elas era preciso que pensasse e as deixasse pensar comigo, para que juntos transformássemos as aulas em grandes momentos de ser o que desejássemos, fazendo o que me levava para o mundo delas e não o que lhes trazia para fora do próprio mundo.

E foi assim que aconteceu. Todos os dias eram dias de inventar, de trabalhar e de brincar. Transformávamos todo o fazer da aula em algo que fosse necessário fazer no mundo que ali vivíamos juntos.

Isto é, produzíamos um texto coletivo que era uma receita de massinha ou de como fazer um bilboquê, porque faríamos tanto a massinha, como o bilboquê. Escrevíamos cartas para mandar para crianças de outra escola — escreviam cada um a sua, com a minha ajuda e/ou a dos amigos e amigas, mas já escreviam cartas

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