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Uma Engenharia Didática para o desenvolvimento do pensamento algébrico

3.2 Fundamentação teórica e metodológica

3.2.1 Uma Engenharia Didática para o desenvolvimento do pensamento algébrico

Em busca de uma modalidade de pesquisa adequada e consistente com a nossa proposta de estudo, identificamos a abordagem metodológica da Engenharia Didática idealizada primeiramente por Yves Chevallard, Guy Brousseau e Régine Douady na década de 1980 e depois sintetizada por Michàle Artigue, quando publica um artigo (ARTIGUE, 1990) na Recherches em Didactiques de Mathématiques31 (BITTAR, 2017).

31Revista francesa de grande circulação entre pesquisadores da Educação Matemática. Uma versão em

A Engenharia Didática é uma metodologia de investigação operacionalizada preferencialmente pelo método qualitativo e Artigue (1998, apud ALMOULOUD, 2012) a caracteriza como:

(...) um esquema experimental baseado nas realizações didáticas em sala de aula, ou seja, sobre a concepção, realização, observação e análise de sequências de ensino, permitindo uma validação interna a partir da confrontação das análises a priori e a posteriori (p. 26).

E ainda segundo Artigue (1988, apud ALMOULOUD, 2012), a Engenharia Didática foi apresentada como um método capaz de suscitar fenômenos didáticos em condições mais próximas possíveis do funcionamento de uma sala de aula, através da construção, realização, observação e análise de sessões de ensino.

A opção pela Engenharia Didática como metodologia se deu por “ser utilizada em pesquisas que estudam os processos de ensino e aprendizagem de um dado objeto matemático” (ALMOULOUD, 2007, p. 171), como o nosso estudo. Nessa conjuntura, existe a possibilidade de articulação entre conhecimento didático e conhecimento matemático, fazendo da prática docente também uma prática de investigação, permitindo que as experiências vivenciadas em sala de aula se tornem “produtos que podem ser reproduzidos para o ensino de Matemática” (SILVA, 2015, p. 18).

Adotamos em nosso estudo fases sequenciadas e interligadas da Engenharia Didática descritas por Artigue (1996) que compreendem análises, experimentações e validações das ações didáticas, descritas nos parágrafos seguintes, relacionando-as com a nossa pesquisa.

A primeira fase, a análise prévia, compreende a análise epistemológica dos conteúdos constantes no plano de ensino; o ensino habitual e seus efeitos/consequências; a compreensão dos alunos e das dificuldades e obstáculos que pontuam seu desenvolvimento; o campo de sujeição no qual se estabelecerá a realização didática e os objetivos da pesquisa (ARTIGUE, 1996).

Foi realizada uma análise epistemológica prévia do objeto matemático pensamento algébrico, análise institucional do livro didático, dos documentos legais que regem o ensino de Matemática no 6º. Ano e uma análise didática de pesquisas correlatas. Esta última compreendeu uma revisão de literatura, situando o problema de pesquisa num contexto maior, para identificar os possíveis obstáculos epistemológicos a serem

enfrentados na formação do pensamento algébrico e justificar a sua inserção no ensino de Matemática do 6º. Ano.

A segunda fase, concepção e análise a priori, é quando o investigador decide o modo de agir sobre uma determinada quantidade de variáveis pertinentes para o problema estudado (ARTIGUE, 1996).

Ainda segundo Artigue (1996), o objetivo da análise a priori é:

[...] determinar de que forma permitem as escolhas efetuadas controlar os comportamentos dos alunos e o sentido desses comportamentos. Para isso, ela funda-se em hipóteses; será a validação destas hipóteses que estará, em princípio, indiretamente em jogo no confronto, operado na quarta fase, entre a análise a priori e a análise a posteriori (ARTIGUE, 1996, p. 205).

Aqui a nossa hipótese de estudo de observação dos comportamentos dos alunos frente a uma tarefa proposta foi explicitada, a sequência didática concebida e a fundamentação teórica testada quanto a validade para respondê-la. E então foram pensadas as variáveis didáticas e como elas se relacionam com a hipótese de dificuldade na aprendizagem matemática e o desenvolvimento do pensamento algébrico.

Artigue (1996) indica a distinção de dois tipos de variáveis de comando: “1) as variáveis globais que dizem respeito da organização geral da engenharia; e 2) as variáveis locais, que dizem respeito a uma sessão ou fase da engenharia” (p. 202). Nesse sentido, a nossa variável global parte do questionamento como se dá o desempenho do aluno diante de cada objeto matemático, ostensivos ou não-ostensivos, identificados nas respostas às atividades de experimentação. E as nossas variáveis locais de estudo, a priori, são: (1) Apresentação dos problemas: linguagem natural ou icônica; (2) Tipo de problema quanto ao objeto matemático: sequência, equação, função ou aritmético/algébrico; (3) Nível de dificuldade dos problemas: simples ou sofisticado.

A terceira fase, a experimentação, conforme delimita Artigue (1996), é constituída pelo período de aplicação das atividades planejadas. Em um segundo momento, esta fase baseia-se na análise do conjunto dos dados obtidos na experimentação durante as sessões de ensino, assim como produções dentro ou fora de sala. Dessa maneira, a experimentação pressupõe: explicitação dos objetivos e condições de realização da pesquisa; a determinação da população de alunos que participarão da experimentação; o

estabelecimento do contrato didático; a aplicação dos instrumentos de pesquisa; o registro de observações feitas na experimentação (ARTIGUE, 1996).

A experimentação do nosso estudo se deu em três fases, com aplicação de atividades de resolução de problemas, em três salas de aula, tal como ocorre no ensino regular. Observamos in loco as produções dos alunos com o objetivo de identificar os níveis de desenvolvimento do pensamento algébrico (ALMEIDA, 2016), tal como objetivamos para este estudo, discutindo a proposta e fazendo ajustes necessários nos instrumentos a partir do que foi observado.

Na análise a posteriori e validação, quarta fase, consideram-se todas as informações obtidas na investigação por meio dos questionários, dos testes, das anotações do diário de campo, das filmagens, das produções dos alunos ou outros instrumentos que forem pertinentes.

Realizamos então a análise dos dados obtidos com as etapas de experimentação, na dinâmica observada na aplicação da sequência, comparando os resultados da análise a priori com a análise a posteriori, interpretamos teoricamente os fenômenos observados e produzidos com os instrumentos utilizados, e por fim, a validação teórica interna dos dados observados.

Segundo Bittar (2017), no processo de validação, deve-se fazer uma “análise dos comportamentos cognitivos dos alunos diante das situações propostas” (p. 106) e validando-os a partir das análises feitas inicialmente e durante todo o desenvolvimento da sequência didática. Trata-se de uma validação interna das hipóteses de investigação, uma vez que se analisa se ocorrem e quais são as contribuições para a superação do problema.

A flexibilidade quanto às atividades, sua elaboração e revisão, é uma característica da Engenharia Didática que facilita o trabalho do pesquisador diante de fatores intervenientes. Acrescenta Bittar (2017) que,

A engenharia didática é uma metodologia de pesquisa e, ela não é fechada, como afirmam algumas críticas a essa metodologia. Ao contrário, ela propõe uma forma de preparar, aplicar e analisar sequências didáticas. Seu objetivo é promover a construção do conhecimento pelo aluno, com papel importante atribuído ao professor, e para que isso aconteça, ela é aberta. Essa metodologia propõe analisar o que ocorre ao longo do processo de ensino: conforme a situação vai

se desenvolvendo, em sala de aula, o pesquisador redireciona, apresenta alternativas (p. 107).

Nesse sentido propomos para este estudo uma sequência didática que visa o desenvolvimento do pensamento algébrico a partir da resolução de problemas, observados nas etapas de experimentação. Todas esses termos e etapas serão descritos em seus pormenores na sequência deste capítulo.