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Uma história de coragem

O antropólogo norueguês Thor Heyerdahl estava convicto de que no século XII povos nativos sul-americanos fizeram algo quase impossível, emigraram para a Polinésia e povoaram as pequenas ilhas encravadas no oceano Pacífico. Como eles fizeram essa travessia que tem milhares de quilômetros de distância? Pasmem! Viajando em pequenas e frágeis jangadas. Esse era o pensamento de Thor.

Muitos riram da teoria desse ousado antropólogo norueguês. Contudo, crendo firmemente nela, Thor elaborou um projeto que beirava ao inacreditável. Em 1947, utilizando uma madeira leve e resistente de uma árvore, chamada pau- de-balsa, ele e alguns amigos construíram uma jangada semelhante a que os povos usavam naquela época. Desse modo, sem nenhuma tecnologia moderna, ele resolveu reconstruir o trajeto desses povos. Ele e mais cinco companheiros participaram da perigosa expedição.

O risco era enorme. O projeto parecia loucura. Como uma pequena balsa poderia enfrentar os vagalhões do grande oceano Pacífico? Teriam grandes chances de ir a pique, de morrer afogados ou de servir de banquete para tubarões. Muitos apostaram no fracasso da expedição e tentaram dissuadi-los. Mas, quem consegue conter o ímpeto de um sonhador? Os sonhos animam a alma, renovam as forças. Quem nunca sonhou nunca correu riscos na vida, nunca lutou por algo que amou. Sob o risco de não voltar, eles partiram.

No dia 28 de abril, a partir do pequeno porto peruano de Callao, um navio conduzia a jangada denominada “Kon- Tiki” oceano adentro. Quando a jangada era apenas um minúsculo ponto num mundo de águas, o rebocador desfez- se das amarras que o ligavam a ela. Assim, Thor e seus amigos começaram a sua sinuosa e longa trajetória.

Os olhos lacrimejavam e o coração vibrava no peito enquanto eles viam, pouco a pouco, o continente sumindo. O medo e a coragem se misturavam nas águas da emoção enquanto navegavam nas águas do oceano. Eram nada menos do que 8 mil quilômetros a ser percorridos.

Thor e seus amigos construíram uma jangada de acordo com o modelo sul-americano antigo, mas ninguém sabia manobrá-la. Içaram uma vela redonda torcendo para que os ventos os impelissem em direção ao seu destino. No começo, os ventos se recolheram como lençol. Mas aos poucos mostraram sua força e sopravam as velas com impetuosidade.

Os viajantes usavam como leme um longo remo preso à popa. Os sonhadores revezavam-se na real e exaustiva tarefa de economizar energia. Passaram-se dois longos meses, uma eternidade diante da mesmice do azul oceânico.

Parecia não haver grandes surpresas. Águas calmas, mas emoção tensa. Por quê? Porque o medo formava ondas que desconfiavam das calmas ondas do mar.

Nossos aventureiros receavam que condições climáticas desfavoráveis surgissem repentinamente. Então, de repente, o tempo mostrou sua força. No início de julho, nuvens negras cobriram a face do céu. Ventos fortíssimos surraram as velas. Ondas gigantescas arremessaram-se contra a frágil jangada. A tormenta era grande. O único mascote da tripulação, um papagaio, foi levado pelos ventos e se perdeu mar adentro. Todos lamentaram. Entretanto, atravessaram a tempestade. Pouco tempo depois, o inesperado aconteceu. Uma lufada mais forte de água arrastou um dos sacos de dormir, enquanto Hermam, o metereologista do grupo, calculava a velocidade do vento para fazer a previsão do tempo. Tentando agarrá-lo, Hermam perdeu o equilíbrio e foi arremessado no oceano.

Jogaram-lhe cordas, mas o vento soprava em direção oposta e seus amigos não conseguiam chegar até ele. O metereologista desaparecia cada vez mais no crepitar das ondas. O desespero abalou a equipe. Num ato impensável, Knut, um dos companheiros, atirou-se na água para encontrar o amigo. Tentava nadar velozmente em direção a ele, sem êxito.

Todos estavam com os olhos paralisados e a respiração ofegante. O balanço da jangada sob o orgulho das ondas não os distraía. A emoção angustiava-se, não podiam suportar a perda de um amigo, quanto mais de dois. Cada segundo asfixiava a esperança que sufocava a alma. O sonho de Thor se converteu em um amargo pesadelo, um sentimento de culpa pesava-lhe na alma. As lágrimas deixaram o anonimato e se tornaram companheiras dos olhos.

De repente, quando tudo parecia perdido, uma imagem diferente salpicou as águas. Os dois amigos reapareceram partilhando o mesmo salva-vidas. A alegria brotou no solo da ansiedade. Uma brisa de tranqüilidade surgiu nas turbulentas águas da emoção.

Muitos outros riscos Thor e seus amigos correram por causa de um sonho. Depois de três meses que estavam no mar, as aves terrestres se ajuntaram com as aves marinhas. Um alento animador. ”A terra estava próxima”, deduziram A pequena jangada “Kon-Tiki” demonstrara que a teoria de Thor podia ter fundamento: provavelmente, os povos da Polinésia tiveram origem nos nativos sul-americanos do passado. Entretanto, a experiência angustiante da pequena embarcação de Thor nos induz a refletir que muitos nativos daquela época que se aventuraram no Pacífico lá ficaram.

Ao chegar às ilhas, Thor e seus amigos ficaram extasiados, não podiam acreditar. Abriram-se as janelas da emoção e o medo partiu. Entretanto, ele voltou sorrateiro. O desembarque foi muito difícil. Por pouco não se chocaram com um atol. Quando o choque parecia inevitável, uma onda monstruosa quase os derrubou.

Refeitos do susto, começaram a sofrer impacto de outras ondas. A jangada não resistiu, começou a se destruir. Desse modo foram atirados na água. Quando tudo parecia perdido, eles começaram a nadar e encontraram uma plácida lagoa após a barreira de coral. Sem dificuldades, os seis náufragos conseguiram chegar a uma das pequenas ilhas da Polinésia. Thor, profundamente emocionado, caiu de joelhos. Não sabia se chorava ou se sorria. Emocionado, mergulhou seus dedos na areia seca e quente. Queria sentir o calor da terra e confirmar que não estava delirando. Eles conseguiram.

Você foi o maior nadador da história

Se você acha que nunca viveu uma aventura tão grande como a de Thor e de seus amigos, está enganado. Viveu uma travessia muito mais perigosa para se tornar um ser vivo. Navegou num oceano muito maior do que o Pacífico. Além disso, não tinha sequer uma mísera jangada para fazê-lo flutuar. Como você fez a travessia? A nado, na raça.

Comparando o tamanho de sua única célula com a distância que você teria de nadar dentro do útero para fecundar o óvulo, pasme! Você percorreu milhares de vezes a distância que Thor e seus amigos percorreram. Permita-me dizer que você foi, sem dúvida alguma, o maior nadador da história. Nunca se ache uma pessoa fraca e incapaz.

Quando tiver de percorrer um caminho tortuoso e difícil, não o considere longo demais. Quando tiver de estudar, fazer uma pós-graduação ou fazer cursos para se aprimorar profissionalmente, tenha consciência de que nenhum caminho é tão longínquo e árduo que não possa ser percorrido. Quando tiver de mudar sua maneira de ser para conquistar seus filhos, para cativar seus pais, para atrair seus alunos ou para melhorar seu rendimento intelectual, saiba que nenhum esforço é grande demais perto do que você empreendeu para conseguir viver.

Hoje pode ser que você esteja cansado, comporte-se como um esportista em final de carreira, mas naquele tempo você não se intimidou diante das enormes dificuldades que estavam à sua frente. Você nadou desesperadamente para ter o maior de todos os direitos, o direito de ser um ser humano único.