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CAPÍTULO II – CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA DE H WALLON AO

2.1 UMA INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA DA PESSOA, EM WALLON

Nós escolhemos Wallon como referencial teórico por acreditarmos que a teoria dele, por levar em conta a totalidade da pessoa, na realidade concreta da existência humana, responde a vários problemas ligados à infância e a adolescência e também às relações entre o indivíduo e a sociedade. Isto acontece devido ao fato de a teoria dele enfatizar e valorizar as interações sociais e ao mesmo tempo combater as oposições de classes.

Neste sentido, ele defendia uma educação que deveria levar em conta não somente a formação integral da pessoa, mas também o bem estar de todos na sociedade. Assim ele valorizava a democracia, a luta pela justiça social e as políticas públicas.

Nesta perspectiva, Wallon é um referencial para esta pesquisa ao combater a dicotomia que esteve muito presente na história da criança e do adolescente especialmente as oriundas das classes mais carentes e ao demonstrar que é possível construir uma sociedade que seja benéfica para todos ao valorizar as aptidões e participação de todos. Também acreditamos que este referencial nos mostra possibilidades de concretizar o novo paradigma atribuído pelo ECA de considerar a criança e o adolescente seres em desenvolvimento e dotados de direitos.

A escola moderna tornou-se mais disciplinada e também dicotômica, isto é, cada vez mais se cria uma escola para a classe privilegiada e outra para a classe popular. No entanto, Silva (2007), demonstra que as excelentes descobertas feitas pelo eminente teórico da educação, Wallon, contribuíram, de um modo incisivo, para proporcionar o progresso e a harmonia não somente no interior da escola, mas também na relação da sociedade com a escola. Além do mais, demonstrou como pode haver uma relação saudável entre as ciências, especialmente entre a Pedagogia e a Psicologia.

Silva (2007), ao demonstrar a grande contribuição que Wallon deu à Educação, não o fez de um modo isolado, mas procurou sintonizá-lo no tempo e no espaço, e demonstrou as influências do meio social na formação do pensamento, conforme as ideias deste eminente pensador, por isso ele parte da bibliografia dele.

Wallon nasceu em Paris, no dia 15 de junho de 1879. O avô dele fora historiador e político importante para a história da França e foi pela intervenção dele que a palavra república integrou a Constituição francesa.

A família dele se preocupava com a política, a justiça e a democracia. Silva destacou o quanto Wallon ficou sensibilizado no velório do poeta Victor Hugo ao ouvir o depoimento do pai ao descrever as qualidades do poeta: luta pela liberdade e defesa dos pobres.

Wallon decide fazer a Escola Normal Superior e seguir a carreira de professor de Filosofia. Recebe uma educação filosófica nos parâmetros da filosofia de Kant e Hegel. No Normal Superior foi influenciado pelo professor Frédéric Rauh. No entanto, ele fica descontente com a rotina de professor no secundário e decide pela carreira de medicina, forma-se em 1908 e torna-se assistente do professor Nageotte (1866 – 1948) eminente histopatologista. A tese de seu doutorado foi L’enfant turbulent (a criança agitada), esta tese foi o primeiro livro dele.

Wallon colaborou, como médico, na Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Ele foi mestre de conferência de Psicologia Infantil na Sorbonne (1920-1937). Silva (2007) destacou ainda que a guerra influenciou o pensamento de Wallon em relação à teoria do desenvolvimento da infância e também sobre a relação entre razão e emoção. Wallon ao cuidar de feridos neurológicos e de soldados afetados por traumas de guerra verificou e constatou uma maior incidência e intensidade de traumas de guerras nos soldados e menos nos superiores deles. Haveria relação entre racionalização, controle emocional e saúde futura? Boa parte da produção dele está ligada a este questionamento.

Na década de 1920, Wallon atua no Laboratório de Psicobiologia ligado a uma escola na periferia de Paris. Silva afirma que Wallon não submeteu a Psicologia à Medicina, mas se dedicou às consultas mesmo quando não tinha condição física.

Em 1927, engajou-se como presidente da Sociedade Francesa de Psicologia. Em 1930 escreve o seu 30 livro: “Princípios de Psicologia Aplicada”, fruto das incursões na área de Psicologia do Trabalho e da Orientação Profissional.

Os primeiros textos de Wallon procuram estabelecer uma nova Psicologia que transcenda o mecanismo – organicionista e o espiritualismo. A partir do momento que Wallon participa de um congresso de Psicologia Clínica na Rússia e se envolve com o Círculo da Nova Rússia é que a Psicologia dele passa a se definir como Psicologia Dialética.

Em 1934, Wallon produz o seu grande livro “As Origens do Caráter”. A importância deste livro consiste que nele já estão desenvolvidas as principais teses sobre o desenvolvimento do eu, o papel da emoção e do movimento. Em 1935 ele foi eleito para o quadro de professores do Collége de France. É importante salientar que o envolvimento político de Wallon não é partidário nem eleitoreiro e que ele vê na relação da Psicologia com a Pedagogia não a submissão de uma em relação à outra, mas fortalecimento e integração mútua.

Um projeto de Wallon em co-autoria com o físico Paul Langevin (1872 – 1946) destaca o aprendizado como um trabalho e neste sentido ressalta a importância de pagamento de bolsa, pois assim é um modo de auxiliar e recompensar o trabalho do aluno. Esta ideia possibilita aos filhos das classes não privilegiadas a dedicação aos estudos.

Em 1938, a convite do historiador Lucien Febvre, ele coordena e redige os trabalhos para publicação do 80 Tomo da Enciclopédia Francesa. Na década de 1940, ele publica os seus mais importantes livros. A evolução Psicológica da Criança (1941): Do Ato ao Pensamento (1942) e As Origens do Pensamento na Criança (1945).

É importante destacar que Wallon foi responsável pela emenda que introduziu o serviço de Psicologia Escolar nas escolas públicas francesas (1944). Ele atuou como deputado na Assembleia Constituinte (1946), logo após a II Guerra Mundial. Editou a revista Enfance (1948). Presidiu a Sociedade Médico-Psicológico (1951). Em 1954 se torna presidente da Sociedade Francesa de Educação Nova e também lidera Jornadas Internacionais de Psicologia da Criança.

A teoria de Wallon (1975) visa um saber psicológico que tem em conta a totalidade da pessoa na realidade concreta da existência. O método dele é baseado no materialismo dialético e é dominado de método concreto-multidimensional. Este método se caracteriza pela comparação de planos diferentes de atividades, isto é, a busca pelas diferenças. Neste sentido, ele busca superar uma racionalidade

redutora que leva a um condicionamento causal único. Por isto, a busca não se detém na origem, mas nas origens de um fenômeno ou comportamento.

Wallon (2007) valoriza a emoção, pois o bebê para lidar com o meio dispõe da emoção. A emoção é uma resposta orgânica expressiva e comunicativa, a função dela é ativar o outro. “As emoções que, na psicologia genética de Wallon, constituem as primeiras manifestações sociais da criança e situam-se na origem de toda linguagem” (ALMEIDA, 1997, p. 111), pois a emoção traz em si a possibilidade de ser interpretada e provocar resposta. Assim, a emoção é uma linguagem anterior à linguagem, seria uma protolinguagem.

Quando a emoção se torna consciente e entra em contato com as significações recebidas da cultura, ela se torna afetividade. A afetividade já não tem a clareza das alterações orgânicas, mas se integra à construção do eu e do mundo exterior. Wallon (1979) não admite que a individualidade, a consciência de si, seja um dado primário e original, mas é fruto de uma construção de um longo processo. No final dos 10 anos de vida, ao estabilizar as respostas emotivas, surge um quadro mais ou menos fixo dessas respostas com a maturação fisiológica. E, na medida em que os sinais são interpretados pelo ambiente humano, a criança passa a ter uma consciência de si, porém ainda de uma forma primária e indiferenciada.

No início, a dialética entre tônica e cinética deu significado a essas configurações corporais. Isto acontece devido à intervenção de um “contato” social. Mas, o nascimento da função representativa ou simbólica ocorrerá somente a partir dos 2-3 anos até a adolescência. A partir desta idade, começam a se destacar as intenções. As funções acontecem de acordo com a maturação dos outros nervos correspondentes às áreas frontais, occipitais, que ocorrem durante a adolescência.

Os três livros de autoria de Wallon que explicam o desenvolvimento do ser humano do zero ano a adolescência, podem ser considerados o projeto de psicologia do autor que visam à construção de uma psicologia a qual engloba o homem completo.

No livro “As Origens do Caráter” (1934), há o enfoque predominante do nascimento aos 02 anos. O livro foca a emoção e a importância dela no desenvolvimento do caráter. O caráter é a forma mais estável de responder aos estímulos do ambiente e o eu consiste na produção da singularidade e identidade que pressupõe uma relação de conhecimento com o outro. Este período vai até o final da adolescência. No livro Do Pensamento ao Ato (1942), ele foca a criança dos

02 aos 06 anos, busca respostas sobre a origem do pensamento. Nesse livro ele se detém sobre o gesto, o ato, a imitação. Já o livro As origens do Pensamento na Criança (1945) é dedicado à fase infantil de 05 aos 12 anos. Aqui ele tenta descobrir a origem do pensamento verbal, o enfoque recai sobre o “par” e na relação dialética destes elementos, como se forma o conceito e como se transmite algo para alguém.

Embora o bebê nasça com o sistema nervoso autônomo bem desenvolvido, o controle da temperatura e o sistema postural, garantidos pela função tônica, não se encontram suficientemente desenvolvidos. A espécie humana é marcada por um longo período de maturação biológica e especialmente neurológica após o nascimento. Com o passar do tempo, o comportamento se aperfeiçoa, torna-se mais claro e estável, controlável, intencional, expressivo. A consciência surge como síntese dialética: da maturação social e da experiência pessoal.

O ato, cheio de intenção, é por si próprio expressivo e, na medida em que a criança aprende a controlá-lo, a representação simbólica aparece. Contudo, a representação simbólica necessita da função simbólica para que ocorra a transição. Wallon (2007) afirma que a função simbólica pode buscar para o objeto uma representação e para a representação um signo sem que exista a palavra. Por outro lado, a presença de palavra pronunciada por um papagaio não significa existência de função simbólica. A função simbólica pela palavra busca o essencial que permite substituir, pensamento, intenções e imagens.

Assim, a representação garante a representação simbólica, mas depende do contexto social, pois ela surgiu e se desenvolveu juntamente com a espécie humana, sendo um meio de relação entre os membros.

Pode-se observar que Wallon (1975) era dotado de discernimento, pois ele não submeteu a Psicologia à Medicina e vice versa, como também a relação da Psicologia e Pedagogia era vista por ele como relação de fortalecimento e integração, assim, manteve a autonomia de ambas. E em relação à política ele tinha uma visão ampla e não eleitoreira e, em relação à teoria, ele demonstrou que existe possibilidade de execução. Desta forma, com dedicação, empenho e estudo é possível colocar em prática essa teoria.

A Teoria de Wallon (1975) torna-se relevante na medida em que ele transcende o organicismo e espiritualismo e busca um saber que leva em conta a totalidade da pessoa na realidade concreta em que vive. E neste contexto, “as finalidades da educação devem visar à formação integral do ser humano,

considerado, portanto, nos seus aspectos evolutivos, psicossociais, afetivos, e político-culturais.” (ALMEIDA, 1997, 114), Ao visar à totalidade, ele utiliza um método que não reduz e que não se detém na origem, mas nas origens: método concreto-multidimensional que é baseado no materialismo dialético, compara planos diferentes, valoriza as diferenças.

Wallon (1979) dá ênfase nas interações sociais, destaca o papel do outro na construção e desenvolvimento do indivíduo onde a consciência de si não é dada, mas, fruto de uma relação ampla do indivíduo com o meio, com o outro, isto é: uma visão integrada da pessoa. Neste sentido, a função simbólica não é algo dado, mas é fruto de um processo dialético que envolve emoção, controle, domínio, significação e chega-se a palavra como meio. Porém, o essencial é substituir o conteúdo real e tudo isto acontece numa relação de oposição e solidariedade em que o sujeito na relação com o concreto deve se submeter à cultura, ao social e ao histórico. Tudo isto não acontece de um modo linear e harmônico, mas ocorre por oposição e solidariedade, inicia se com o biológico e psicológico e interrelaciona-se com o meio, antes de chegar ao simulacro e ao símbolo.

Pode se deduzir que Wallon (1979) define a criança e o adolescente ou qualquer indivíduo como ser em relação, não isolado, mas em interação com o outro e com o meio social. E como o processo de desenvolvimento humano, para ele, não ocorre de um modo harmônico, mas em contexto de oposição e solidariedade, torna- se necessário desenvolver na escola e na família um espírito democrático e espaços para reflexão e diálogo com a finalidade de preparar cada membro para exercitar concessões e partilha com a finalidade de alcançar a justiça para todos.

2.2 A CONTRIBUIÇÃO DA PSICOLOGIA DE WALLON PARA A COMPREENSÃO

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