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A universidade corporativa é um recurso que pode ser considerado de difícil imitação?

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.3 Universidade Corporativa

2.3.5 A universidade corporativa como fonte de vantagem competitiva

2.3.5.3 A universidade corporativa é um recurso que pode ser considerado de difícil imitação?

Como já discutido anteriormente, um dos pontos centrais da visão baseada em recursos é a premissa de que a heterogeneidade de recursos pode gerar recursos que são difíceis ou custosos de imitar. É a assimetria de informações, relativa ao potencial dos recursos e das competências específicas da firma, que deve guiar a estratégia, pois é a única fonte possível de vantagem competitiva (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Por isso, a capacidade de as empresas de erguerem barreiras a imitação de seus recursos estratégicos é fundamental para a construção de vantagens competitivas sustentáveis.

A pergunta que se faz aqui é se é possível erguer barreiras à imitação dos processos educacionais. Uma das limitações para se erguer essas barreiras seria a livre mobilidade dos recursos humanos entre as diferentes empresas (BARNEY, 1991). A livre mobilidade dos recursos humanos permitiria que o conhecimento e o investimento feito para formar um dado profissional, fosse rapidamente apropriado pelos concorrentes, com um custo considerado muito baixo (HATCH; DYER, 2004). Assim, não haveria dificuldade de os concorrentes

contratarem os profissionais que desenvolveram a Universidade Corporativa, sejam eles empregados da empresa rival ou consultorias de mercado. A óbvia conclusão decorrente é que os sistemas de educação corporativa seriam recursos facilmente imitáveis.

Alguns autores não concordam com a afirmação acima, pois defendem que os recursos humanos são mais valiosos e de mais difícil imitação na medida em que seus resultados estão atrelados a fatores específicos da firma e ao ambiente em que esse resultado é desenvolvido (HITT et al, 2001). Lado e Wilson (1994) também defendem esse mesmo conceito ao afirmarem que as práticas de Recursos Humanos podem gerar vantagens competitivas por terem o potencial de serem únicas, possuírem ambiguidade causal, complexidade social e por isso serem de difícil imitação. Snell et al (1996), vão além e afirmam que ao levarmos em conta a complexidade dos sistemas de Recursos Humanos com todas as suas possibilidades de complementariedade e interdependências, seria impossível a sua imitação.

Dessa forma, quando uma empresa contrata um profissional de seu concorrente, ela absorve apenas parte do seu conhecimento. A empresa contratante teria que passar por um período de ajustamento dinâmico, que permite que o melhor do profissional seja descoberto (PENROSE, 1959; TEECE et al, 1997). Os custos de imitação serão tão maiores quanto for o tempo necessário de adaptação e quanto mais “inóspito” for o novo ambiente ao conhecimento trazido pelo novo profissional. Quanto mais os resultados do profissional forem relacionados ao ambiente da empresa anterior menos útil será o recurso para a empresa concorrente e, por isso, menor será a imitabilidade do recurso.

Outro fenômeno, relacionado com a dificuldade de imitar os processos de educação corporativa, é apontado por Nystrom e Starbuck (1984) e Starbuck (1996). Para exercer algumas atividades em um novo ambiente, muitas vezes é necessário que o profissional desaprenda a forma como essas atividades eram feitas na empresa de origem e reaprenda a fazer na nova realidade e condições que lhe são dadas na nova empresa. Esse processo de “desaprender” e reaprender reduz os resultados do profissional e da empresa. Um exemplo dado no trabalho de Starbuck (1996) ilustra bem o conceito apresentado – a Toyota, quando iniciou suas fábricas nos EUA, tomou a decisão de não contratar empregados com experiência

prévia no setor automobilístico, justamente devido ao problema da necessidade de “desaprendizado”.

Liebeskind (1996) e Mowery et al (1996) afirmam que quanto mais os conhecimentos da empresa forem tácitos, menos útil será para seus concorrentes. O conhecimento tácito é aquele adquirido pelos processos, rotinas, conhecimentos individuais, e relacionamentos (LIEBESKIND, 1996).

Uma das formas de desenvolver o conhecimento tácito é o envolvimento do empregado na solução dos problemas da empresa. Hatch e Dyer (2004) mostraram que ao estimular de forma estruturada os operadores de equipamento de empresas de tecnologia para desenvolverem atitudes sistemáticas de resolução de problemas, houve geração de novos conhecimentos tácitos que aumentaram em muito a produtividade.

Berman et al (2002), utilizando como modelo a RBV, desenvolveram um estudo para mostrar que o conhecimento tácito pode ser fonte de vantagens competitivas. Os autores defendem que existe dois tipos de conhecimento tácito, o individual e o em grupo, e que esse tipo de conhecimento é uma função de ações de aprendizado coletivas, ou seja, é desenvolvido em atividades de troca de aprendizado dentro de grupos de trabalho e é apreendido individualmente pelos diversos membros desses grupos.

O desenvolvimento do estudo tinha como principal dificuldade medir o conhecimento tácito que, utilizando o conceito da RBV, seria difícil de imitar. A dificuldade de imitação ocorre justamente pela impossibilidade de ele ser observado e codificado. Se o conhecimento tácito pudesse ser medido diretamente ele não seria mais tácito (BERMAN et al, 2002). O problema da dificuldade de medição foi resolvido utilizando uma proxi baseada no tempo que os jogadores de um time jogam juntos. Os dados foram retirados da Associação Nacional de Basquete dos Estados Unidos. Os autores acharam evidências de uma relação positiva entre a experiência compartilhada na equipe e os resultados, o que pode conduzir a empresa ao desenvolvimento de vantagens competitivas. Contudo, a pesquisa mostra, também, que com o passar do tempo esse impacto diminui, podendo se tornar negativo. É o que Berman et al (2002) chamam de “ossificação do conhecimento”. A razão para isso, segundo os autores, é

que o conhecimento acumulado pode gerar rotinas nos processos e convívios das pessoas e isso pode gerar miopia nas decisões e enrijecimento de processos. Os autores afirmam que desenvolver as competências essenciais da empresa, baseando-se em conhecimento tácito, pode levar as organizações à competências enrijecidas no médio prazo. Outra conclusão interessante do estudo é que ações de aprendizagem individual são comparativamente mais importantes que o conhecimento tácito adquirido exclusivamente pela troca de experiências dentro dos grupos.

Outros autores também pesquisaram o papel do conhecimento tácito como fonte de vantagem competitiva como Teece et al (1997) e Lippman e Rumelt (1982). Esses estudos ajudam a entender o impacto dos sistemas de educação corporativa na geração das vantagens competitivas. Apesar de os sistemas de educação corporativa estarem fundamentados em mecanismos formais de educação, como já falado, é cada vez mais utilizado o modelo conhecido como “70, 20, 10”, no qual o orçamento para o desenvolvimento de educação dentro da empresa deve ser aplicado 70% no local de trabalho, 20% para ações de coaching e

mentoring e somente 10% de treinamento formal (ABTDA, 2014). Os 70% investido no

ambiente de trabalho promovem mais diretamente a formação do conhecimento tácito, contudo, os outros 30% contribuem de forma indireta para o desenvolvimento desse tipo de conhecimento.

Essa análise mostra que talvez um dos elementos mais importantes na definição de estratégias educacionais seja o desenvolvimento do conhecimento tácito por meio do incentivo de trocas de experiências dentro dos grupos de trabalho e entre esses grupos, sem, contudo, perder de vista a importância do aprendizado individual para que não ocorra o enrijecimento do valor gerado pelo conhecimento tácito.

O trabalho de Hatch e Dyer ATCH (2004) também mostra que empresas que são superiores em adquirir, desenvolver e explorar os processos educacionais desfrutam de vantagens competitivas sustentáveis. Na medida em que os empregados adquirem os conhecimentos específicos da empresa, eles são capazes de fazer contribuições aos processos educacionais da empresa desenvolvendo crescentes barreiras à imitação.

Outros estudos como Koch e McGrath (1996) defendem que devido à natureza intangível dos recursos humanos e graças à complexidade social na qual é é formado há evidências de que ele é custoso e leva tempo para ser imitado.

Por outro lado, o conhecimento codificado somente sustenta vantagens competitivas na medida em que a empresa consegue criar barreiras formais de proteção como patentes (KNOTT, 2003).

É importante levar em conta, na construção de barreiras a imitação, que os processos de educação corporativa e o estoque de conhecimento de uma organização é proveniente da seleção, desenvolvimento e utilização dos recursos humanos (KOCH; MCGRATH, 1996; SNELL;DEAN, 1992). Deveria existir uma relação próxima entre as atividades de seleção, desenvolvimento e utilização dos recursos humanos e os estabelecimentos dos processos educacionais dentro das empresas.

A questão que deve ser feita então é como fazer com que a educação corporativa seja menos codificada, pois o papel do conhecimento na geração da vantagem competitiva é ampliado quanto mais entrelaçado ele estiver com o conhecimento tácito. A universidade corporativa tem um papel fundamental neste contexto.

2.3.5.4 A universidade corporativa pode ser organizada para gerar vantagem competitiva?

Conforme discutido anteriormente, é necessário que a empresa esteja organizada para explorar os recursos que potencialmente trariam vantagens competitivas (BARNEY; HESTERLY, 2008). Não é suficiente ter recursos, é necessário gerenciá-los, alinhá-los estrategicamente para que os níveis estratégicos, táticos e operacionais possam convergir para ações, procedimentos, processos, metas e objetivos comuns.

Vale a pena relembrar o trabalho de Vasconcelos e Cyrino (2000) no qual os autores afirmam que para que um recurso seja explorado de forma a maximizar os seus resultados a empresa deve estar com sua estrutura organizacional moldada para a exploração desse recurso. A

organização defendida por Barney e Hesterly (2008) está relaciona à construção de processos administrativos e organizacionais que cumpram as funções de coordenação e integração, buscando o gerenciamento do uso interno e externo dos recursos da empresa. A construção desses processos está relacionada à aprendizagem estruturada, que busca os processos pelos quais a repetição da experimentação possibilita a utilização mais eficaz dos recursos e sua reconfiguração – buscando mecanismos de antecipação da necessidade de novas competências e recursos que permitirão a continuidade do desempenho superior (VASCONCELOS; CYRINO, 2000). Assim, os sistemas de educação corporativa devem ser desenhados para maximizar os seus resultados por meio da interação com as diversas áreas da empresa.

2.3.5.5 Universidade corporativa, gestão do conhecimento e vantagem