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Vedação à impugnação do tributo lançado por homologação mas não pago

4 A IMPUGNAÇÃO AO LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO POR

4.2 Vedação à impugnação do tributo lançado por homologação mas não pago

Como visto no tópico anterior, possível é a impugnação do contribuinte do tributo lançado por homologação e não pago. Trata-se de desdobramento dos princípios da ampla defesa e do contraditório em sede do processo administrativo tributário.

Existe, porém, outra hipótese que pode acontecer quanto ao tributo lançado por homologação. Fala-se da situação em que o contribuinte apura o tributo a ser recolhido, porém não promove esse recolhimento. Pergunta-se, então, se esse particular poderia se valer da impugnação administrativa para discutir a validade do tributo que lhe é cobrado.

A doutrina afirma existir entendimento já pacificado no STF e no STJ sobre o assunto6. Para tais tribunais, restaria impossibilitado o direito de defesa do contribuinte na esfera administrativa, porquanto ele próprio tenha apurado e reconhecido o tributo como devido.7

Consideram, portanto, verdadeira confissão de dívida por parte do particular, de maneira que não caberia o mesmo dispor em contrário contra tal, devendo arcar com aquilo que apurou e informou ao fisco. Dessa maneira, a dívida seria certa (sujeitos definidos, sendo credor o fisco e devedor o contribuinte, cabendo o recolhimento do tributo não pago) líquida (quantum debeatur já apurado, ou seja, o montante de tributo) e exigível (não é passível de

6 Dentre os autores de obras jurídicas, Machado Segundo (2010, p. 13), Xavier (1997, p. 8), Farias Machado,

(2006, p. 73), Jorge Neto (2006, 80) e Tavares (2006, p. 8).

7 Cita-se, v.g., REsp 120.699/SP, 2ª Turma, Min. Rel. Francisco Peçanha Martins, julgamento em 18/05/1999,

qualquer impugnação na esfera administrativa), razão pela qual poderia ser expedida CDA (Certidão de Dívida Ativa) para a inscrição em dívida ativa, isto é, para que se procedesse à respectiva execução fiscal contra o contribuinte devedor.

Interpreta-se, desse jeito, que o ato do particular de apurar e calcular o tributo devido nesse tipo específico de lançamento é suficiente para constituir o crédito tributário, de maneira a dispensar a homologação ou qualquer atividade subsequente da autoridade administrativa.

Ainda segundo entendimento dos tribunais citados, tal afastamento não afrontaria a ampla defesa e o contraditório do particular, uma vez que estes princípios não teriam, assim como os outros insculpidos em nosso ordenamento jurídico, aplicabilidade absoluta, podendo ser afastados quando se pusessem em conflito com os demais.

Ocorre, entretanto, conforme já se mencionou neste trabalho, que o particular tem que lidar com uma legislação tributária complexa e esparsa, formada por diversos atos normativos secundários editados pelos órgãos fiscais. É compreensível, portanto, que na dificuldade que lhe é imposta, acabe por cometer algum equívoco, erro, quanto ao fato gerador do tributo, base de cálculo, alíquota, etc.

O contribuinte, na maioria das vezes, não tem o conhecimento técnico que se espera acerca do direito tributário, sendo pessoas que exercem os mais variados tipos de atividade na sociedade, cuja maioria não está ligada a conhecimentos jurídicos sobre matéria tributária. Dessa forma, normal é que, dentro de uma amostragem de contribuintes que devam realizar a apuração de um tributo a ser lançado por homologação, acabe havendo parcela destes que cometam algum equívoco no tocante às regras que devem ser aplicadas para o cálculo do montante devido ao fisco.

Não se diz, contudo, que o particular está liberado a errar indiscriminadamente sobre o tributo a ser recolhido aos cofres públicos, até porque, fazendo-o, incorrerá nas sanções administrativas e penais correspondentes ao descumprimento da lei. Cabe lembrar que o recolhimento de tributos, como meio de arrecadação pública, tem o condão de ser revertido à sociedade. O contribuinte deve buscar, demandando o máximo de esforço, cumprir as regras tributárias. O desrespeito a tais mandamentos jurídicos enseja em prejuízo reflexo à coletividade, que, por consequência, não tem interesse, a priori, em proteger possíveis equívocos, pelo contrário, deseja reprimi-los e se valer dos meios necessários para garantir o recolhimento do tributo.

O que se defende, na verdade, é que o contribuinte tende a buscar o cumprimento da legislação tributária vigente. Porém, não tendo o conhecimento específico suficiente acerca

da matéria, embora se esforce para tê-lo, é compreensível que equívocos surjam, não apenas em prejuízo do fisco – e, consequentemente, da coletividade -, mas como também em seu próprio prejuízo, de maneira que o Estado não deixaria de arrecadar aquilo o que está determinado em lei, mas até montante superior.

Portanto, indiscutível que o contribuinte deva ser incentivado a apurar sempre o valor corretor do tributo, nos casos em que a lei assim definir – como é caso do tributo lançado por homologação -, não prejudicando a sociedade, numa perspectiva mais ampla.

Questiona-se, porém, se o contribuinte deve ser penalizado quando evidentemente não originar perda alguma da arrecadação estatal, tão somente em virtude de ter declarado dever, a título de tributo, um valor superior ao que realmente deve ou de ter declarado dever algo que a lei manifestamente expresse que não é devido.

A penalidade que aqui se refere é a constituição de dívida em desfavor do contribuinte, inclusive com a expedição da CDA, em decorrência da impossibilidade que este tem de impugnar o lançamento tributário por homologação cujo recolhimento antecipado não realizou.

Pergunta-se se tal impossibilidade de impugnação ao lançamento entendida pelo STF e pelo STJ não acabaria por ofender ao princípio da ampla defesa e do contraditório na esfera administrativa, em posição antagônica à defendida por esses tribunais. Sim, fala-se unicamente da esfera administrativa, pois, se o contribuinte quiser discutir a validade e legalidade do lançamento que originou a expedição da CDA junto ao Poder Judiciário, poderá fazê-lo normalmente, sem qualquer dificuldade, por meio de embargos do executado, a fim de invalidá-la na totalidade ou em parte, frustrando a pretensão executiva estatal.

Inclusive, é quanto à invalidação da CDA que surge o grande embate acerca do tributo lançado por homologação não pago, notadamente quando se fala em exigibilidade desse título executivo, tendo em vista a obscuridade que cerca o esgotamento da esfera administrativa para discussão do crédito tributário com base na declaração de dívida do contribuinte.

Além disso, vale observar que a nomenclatura mais técnica seria apuração do particular, em vez de crédito tributário, pois, segundo consta do art. 142 do CTN, o lançamento só restaria configurado pela atuação da autoridade administrativa, de maneira que não existiria lançamento sem esta e, por conseguinte, não se teria constituído o crédito tributário. A partir disso, indaga-se como é possível executar título que sequer possui objeto, ou seja, dívida.

Estranha-se o direito de defesa ser concedido em esfera judicial quando não o é na esfera administrativa, muito embora haja previsão constitucional explícita sobre a aplicabilidade deste em ambas, não havendo, à primeira vista, qualquer restrição para que a impugnação fosse aceita junto à administração fazendária. Os requisitos de legalidade quanto ao lançamento apontados em ação judicial seriam os mesmos levantados na impugnação administrativa, os quais deveriam ser seguidos pela autoridade fazendária.

4.3 O entendimento do STJ e STF sobre a matéria

No tópico anterior, informou-se o entendimento do STJ e do STF quanto à matéria, segundo exposto pela doutrina jurídica pátria. Ocorre, contudo, que tais exposições realizadas pelos autores de obras jurídicas geralmente se pautam na indicação de precedentes isolados, sem maiores detalhamentos da formação do convencimento desses tribunais acerca do assunto, ou até mesmo da incidência desse posicionamento diante da real quantidade de demandas que chegam para apreciação.

Buscou-se, então, no âmbito desse trabalho, realizar uma pesquisa mais aprofundada quanto a essa relação, tentando verificar a quantidade de julgados nesse sentido – impossibilidade de impugnar administrativamente tributo lançado por homologação não pago -, assim como quantas contendas foram levadas sobre a matéria aos citados tribunais, de maneira a esclarecer o leitor da real aplicabilidade desse pensamento nas demandas tributárias.

No banco de jurisprudência do sítio eletrônico do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, utilizaram-se como parâmetro de busca as expressões “tributário”, “declarado e

não pago”, “homologação” e “processo administrativo” com incidência em acórdãos

proferidos no período compreendido entre 01/01/2004 e 01/07/2014 – ou seja, aproximadamente na última década.

Como resultado, foram encontrados 25 (vinte e cinco) acórdãos prolatados no período. Desse total, 16 (dezesseis) acórdãos tinham pertinência com a temática, sendo os demais descartados; 16 (dezesseis) julgados afirmavam que o crédito tributário, no lançamento por homologação, é constituído com o valor declarado pelo contribuinte; 4 (quatro) – incidência de vinte e cinco por cento nos acórdãos relevantes - mencionavam que o montante tributário declarado e vencido sem pagamento já poderia ser inscrito em dívida ativa

– a partir da expedição da CDA -, dispensando-se qualquer ato administrativo (procedimento)

expressamente sobre a impossibilidade do sujeito passivo da obrigação tributária poder impugnar administrativamente o tributo lançado por homologação não pagou, ou melhor, o tributo apurado (TABELA1).

Tabela 1 – Acórdãos do STJ de 01/01/2014 a 01/07/2014, considerando os parâmetros de busca citados anteriormente.

Ano do julgamento Total Pertinência quanto ao tema do trabalho Afirma(m) que o ato do particular constitui o crédito tributário Afirma(m) que a declaração do particular pode dar ensejo à CDA e à execução fiscal Afirma(m) expressamente a impossibilidade de impugnar o tributo administrativamente 2004 1 0 - - - 2005 1 0 - - - 2006 3 1 1 0 0 2007 9 5 5 2 0 2008 2 2 2 0 0 2009 3 3 3 1 0 2010 4 3 3 1 0 2011 1 1 1 0 0 2012 - - - - - 2013 - - - - - 2014 1 1 1 0 0 TOTAL 25 16 16 4 0

Vale, porém, uma ressalva. A impossibilidade de defesa administrativa da apuração realizada, levantando equívoco que resulte arrecadação a maior (indevida) ou a inexigibilidade do tributo (isenção ou imunidade tributárias, e.g.), seria decorrência de desdobramento lógico.

Explica-se melhor a seguir. O título executivo, como já mencionado anteriormente, deve possuir três requisitos essenciais para restar constituído: certeza, liquidez e exigibilidade. A certeza se configura pela determinação dos sujeitos da relação de inadimplência (devedor e credor) e pela existência de um objeto a ser revertido a um destes (adimplemento da obrigação, que, na arrecadação pública, seria a dívida tributária em desfavor do contribuinte). A liquidez se configura pela determinabilidade do objeto, ou seja, da dívida, de maneira a poder quantificar o montante a ser executado – quantum debeatur. A exigibilidade significa a inexistência de qualquer meio ou recurso passível a desconstituir ou

alterar a relação de inadimplência, não mutacionando ou extinguindo o objeto a ser executado (NEVES, 2012, p. 891-892).

Ocorre que a CDA tem presunção de legitimidade quanto à executoriedade – muito embora seja passível de prova em contrário, ou seja, possui legitimidade relativa, juris tantum. Ou seja, quando o crédito tributário dá surgimento à CDA em desfavor do contribuinte, espera-se que este documento público, título executivo que é, contemple os requisitos para tal, possuindo dívida certa, líquida e exigível.

Dessa maneira, notadamente pela exigibilidade do título executivo formalizado, infere-se que não há mais possibilidade de discussão acerca da validade do tributo constituído na esfera da administração pública, razão pela qual o recebimento de impugnação administrativa afastaria a existência desse requisito essencial.

Seguindo adiante, observa-se que os julgados colhidos revelam o posicionamento

– não apenas dominante, mas já pacificado nessa Corte, observando-se a incidência de 100%

nos acórdãos relevantes – de que a declaração do particular é suficiente a constituir o crédito tributário, prescindindo o ato da autoridade administrativa ou até mesmo qualquer notificação posterior ao lançamento, decorrente da homologação. Isto é, o ato unilateral do contribuinte é tratado como verdadeiro ato de lançamento, muito embora a lei mencione que o lançamento seja ato privativo da autoridade administrativa (art. 142, CTN), bem como que o lançamento por homologação seja decorrente da apuração antecipada realizada pelo contribuinte acrescida da ratificação posterior do fisco, ainda que tacitamente (art. 150, caput e §4º, CTN).

Nesse sentido, inclusive, vale mencionar o enunciado nº 436 da Súmula do STJ,

ao afirmar que “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco”.

Assim sendo, reforça-se a ideia de que este tribunal dá o status de verdadeira confissão de dívida à declaração do particular, e não de mero facilitador para lançamento posterior a ser efetivado pela autoridade fazendária.

Inclina-se essa corte para o entendimento de que a declaração apta a constituir o crédito tributário pode ter as mais variadas formas possíveis, devendo, entretanto, ser prevista em lei e servir como verdadeira confissão de débito fiscal. Assim sendo, são válidas como tais declarações, verdadeiros lançamentos tributários impróprios, a GIA – Guia de Informação e

Apuração de ICMS -, o DCTF – Declaração de Contribuições de Tributos Federais -, Declaração de Rendimentos para fins de imposto de renda (IR), etc8.

Interessante, também, trazer parte da ementa do julgado referente ao Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1070751/RS:

A única declaração unilateral constitutiva ipso jure do crédito tributário é a do Fisco, por força do lançamento compulsório (art. 142 do CTN que assim dispõe: compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante de tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível9.

Segundo o juízo da Corte, o ato administrativo praticado pela respectiva autoridade fiscal só é indispensável quando do lançamento compulsório do tributo, que estaria compreendido na hipótese do art. 142 do CTN, única hipótese em que se dá de pleno direito. Parece, portanto, que o ato declaratório do particular confessando dívida, embora não reste contemplado na lei como lançamento tributário propriamente dito, acaba o sendo de forma peculiar, não compulsória, capaz de constituir o crédito tributário por si só.

Em que pese o posicionamento confuso do STJ, importante mencionar que o art. 142 do CTN não indica se tratar de hipótese de lançamento compulsório, como se essa dita compulsoriedade significasse espécie do gênero lançamento – havendo um tipo de lançamento compulsório e outro(s) não compulsório(s). Pelo contrário, o artigo em questão traz o lançamento como figura ampla, da qual a compulsoriedade seria inerente a todas as espécies, notadamente pelo constante no seu parágrafo único, onde o lançamento é vinculado (obediente à lei) e obrigatório, sob pena de responsabilidade funcional à autoridade administrativa.

Ademais, cabe notar que a atividade administrativa é prevista em todos os tipos de lançamento, quer seja de ofício (art. 149, CTN) – nos casos determinados pela lei, apurando os fatos geradores e os tributos a serem recolhidos pelo sujeito passivo -, por declaração (art.

8 Nesse sentido, AgRg no REsp 1145116/PR, 2ª Turma, Rel. Min OG Fernandes, julgamento em 22/04/2014,

publicação em DJe em 07/05/2014; AgRg no REsp 1228660/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgamento em 15/09/2011, publicação em DJe em 27/09/2011; REsp 932109/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgamento em 09/12/2008, publicação em DJe em 17/12/2008; REsp 883250/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgamento em 11/12/2007, publicação em DJ em 19/12/2007, p. 1149; REsp 754273/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgamento em21/03/2006, publicação em DJ em 03/04/2006, p.262;

9 AgRg no Ag 1070751/RS, 1ª Turma/STJ, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 23/04/2009, publicação em DJe

em 03/06/2009. No mesmo sentido estão os seguintes acórdãos: REsp 850321/PE, 1ª Turma/STJ, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 11/12/2007, publicação em DJe em 03/03/2008; REsp 751776/PR, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 27/03/2007 e publicação em DJ em 31/05/2007, p. 338.

147, CTN) – recebendo a apuração dos fatos geradores dos contribuintes para que possa realizar o lançamento dos tributos, ou seja, indispensáveis à constituição do crédito tributário - e por homologação (art. 150, CTN) – recebendo a apuração dos fatos geradores e dos tributos já realizada pelo contribuinte, porém devendo ratificá-la posteriormente.

Destarte, a lei, diferentemente do que é sustentado no STJ, não dispensa a atividade da autoridade administrativa de lançamento. O motivo se mostra óbvio: se o lançamento, em sentido amplo, é ato privativo, vinculado e obrigatório da autoridade administrativa, suas espécies não podem dispensar jamais a atuação desta, sob pena de não existir lançamento e, por conseguinte, não se constituir o crédito tributário em desfavor do particular.

Cabe destacar, também, a busca realizada no banco de jurisprudência do sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal. Utilizaram-se como parâmetros de pesquisa os

termos “declarado”, “pago”, “homologação”, “processo” e “administrativo”, referente ao

mesmo período da pesquisa realizada no tocante ao STJ – aproximadamente última década. Como resultado, encontrou-se apenas 1 (um) acórdão, com julgamento em 28/08/2012.

Trata-se de Agravo Regimental em Agravo de Instrumento 794.679/SP, em que, embora não haja pertinência direta ao tema do presente trabalho – no recurso em questão, deseja-se a exclusão de multa, aplicada em razão do inadimplemento do contribuinte, alegando-se sua desproporcionalidade e efeito confiscatório -, houve o reconhecimento de algumas questões aqui relevantes no voto prolatado pelo então relator, Min. Joaquim Barbosa. Por exemplo, entendeu-se que o inadimplemento em si não é causa suficiente a violar o contraditório e a ampla defesa inerente ao contribuinte, porquanto apenas traduz motivação por ele já reconhecida. Por outro lado, reconheceu-se a possibilidade de ingresso de processo administrativo quando houver erro cometido pelo contribuinte no registro do fato jurídico tributário e na apuração do tributo a ser recolhido.

Mais: indicou-se que o fato novo, a motivação inédita trazida pelo contribuinte, diversa daquela por ele já reconhecida quando da declaração já apresentada, é apta a ensejar o exame do caso pela Administração Pública. Veja-se:

Conforme se lê no acórdão-recorrido, os valores exigidos decorrem de tributo cujo fato jurídico foi declarado pela agravante, sem, contudo, o recolhimento a tempo oportuno (lançamento por homologação). Para ter alçada constitucional, a ausência de contraditório e de ampla defesa descaracterizadoras do devido processo legal deveriam estar relacionadas à imposição de pena por motivação diversa daquela previamente reconhecida pelo próprio sujeito passivo (inadimplência pura e simples).

[...] Hipotéticos erros cometidos pelo sujeito passivo no registro do fato jurídico tributário e na apuração do montante devido poderiam ser examinados pela

administração desde que por iniciativa do sujeito passivo e com os meios legais próprios.

[...] A propósito, a própria narrativa da agravante confirma a observação feita em relação ao processo administrativo tributário, no sentido de que não há indício de que o auto de infração inovou a motivação restrita ao mero inadimplemento tributário.

Assim sendo, a corte compreende que o contribuinte pode cometer erros na apuração do tributo e, em virtude da constatação desses equívocos, não pagar o que foi apurado, restando inadimplente. Entretanto, essa inadimplência pura e simples, já reconhecida pelo sujeito passivo, não serve como motivação para afastamento da ampla defesa e do contraditório que lhe são inerentes, no sentido de excluir a multa aplicada pela administração fazendária.

Melhor explicando, o contribuinte que declarou dever tributo equivocadamente não vai, por motivos óbvios, recolhê-lo, uma vez que seu intuito é, mediante processo administrativo tributário, se esquivar de tal pagamento, seja de forma integral ou parcial. Dessa maneira, não poderia ser punido com multa por tributo que discute não ser devido, o que invalida, por consequência, seu recolhimento. Caso o recolhesse ou fosse compelido a o recolher por causa da ameaça de imposição de multa, estaria frustrando sua própria pretensão.

Tal desencadeamento lógico pode ser lavado à impugnação do lançamento tributário por homologação não pago. O contribuinte, ao perceber o equívoco na apuração feita, tem por pensamento primordial não pagar o tributo declarado, notando que não o deve ou que o deve em menor quantia em relação ao que foi informada ao fisco. Pagar o tributo apurado para possivelmente só o ver restituído com os meios jurídicos pertinentes ou sofrer a ameaça de ter o débito inscrito na dívida ativa para posterior execução fiscal – o que se vislumbra como verdadeira penalidade ao particular -, impedindo a impugnação administrativa do contribuinte, é frustrar a pretensão deste, o que, conforme se observa do posicionamento desse tribunal supremo, viola os princípios constitucionalmente previstos do contraditório e da ampla defesa.

Essa nova visão, embora isolada e longe de ser pacífica, passa a ir de encontro com a posição outrora sustentada por esse tribunal constituinte10 de que o tributo lançado por homologação não pago pode ser de pronto inscrito em dívida ativa para posterior execução fiscal, independentemente de qualquer procedimento administrativo, inclusive notificação do contribuinte sobre o lançamento, mostrando que o debate sobre a matéria não está exaurido.

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