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VII APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS PARA FINS INDUSTRIAIS

A lcid es L. Leão S ilvia M. S a rto r

Introdução

Várias questões surgem quando se questiona a geração dè resíduos - tanto urbanos como industriais - e sua evolução ao longo dos tempos. A primeira delas é a de como o ser humano interage com o ambiente. Nesse caso o extrativismo é o representante máximo, onde o ambiente natural é fonte e objeto do conhecimento. É o meio ecológico gerando produtos. Asegunda é a da exploração econômica dos recursos naturais, renováveis ou não. É o uso do ambiente como material de construção do universo. É o modo econômico associado ao tecnológico. E a terceira é a de uma nova visão, a ecomenia, onde se equilibra a <. exploração econômica com o extrativismo, ou seja, uma mistura de extrativismo e exploração econômica, mas com sustentabilidade e cuidados ambientais e sociais. É o cuidado com as transformações antes que elas sejam irreversíveis e que-seus impactos e alterações climáticas se tornem tragédias globais. Assim se atende à definição de sustentabilidade, mantendo-se o capital natural para as futuras gerações e satisfazendo-se as necessidades de crescimento contínuo. Desenvolvimento sustentável é um eufemismo para desenvolvimento, pois se o desenvolvimento não fosse sustentável seria simplesmente uma bolha de crescimento. Essa linha vai ao encontro da ecoeficácia e da análise de ciclo de vida que permite estabelecer um ranking de impactos ambientais de cada tipo e/ou material de embalagem, atendendo aos preceitos da série ISO 14.000.

Historicamente a religião veiculou conceitos que resultaram na degradação dos recursos naturais, na caça e pesca desenfreadas e na exploração dos animais e do homem, baseando-se na interpretação de seus adeptos, acerca da bíblia, de que Deus criou os homens para que o RESTO do planeta lhes servisse. Felizmente hoje esse conceito mudou, devido em parte a pensadores como Leonardo Boff, com a teoria de Gaia. Mas essa mudança na forma de ver a relação entre o homem e o planeta começou a se alterar em 1543, com a declaração de Nicolau Copérnico de que a Terra não é o centro do universo, permitindo o desenvolvimento de uma ciência voltada ao ambiente, à ecologia. A ecologia surgiu da palavra grega oikos (ambiente) e logos (estudo), que trata da interação entre o ser humano e o ambiente. Esse conceito evoluiu com Charles Darwin, que afirmou em 1859 que o “homem não é o centro da criação, e sim parte integrante da Natureza”. E finalmente outro marco na evolução da ecologia foi a ECO 92, que basicamente resumiu essa relação com a definição de que “a espécie humana e todas as demais são elos indissociáveis de um futuro comum”. Dentro desse conceito bastante discutido no livro Nosso Futuro Comum, da década de 1980, coloca-se a opinião do economista italiano Paretto, que, no final do século XIX, afirmava que “ninguém se beneficia se alguém não se prejudica”. Isso se aplica a todos os setores de atividade,

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especialmente à agricultura, à mineração e à indústria.

Buscou-se, ao longo dos anos, a riqueza e o consumo. Porém no final do século XX surgiu um novo conceito, chamado Agenda 21, a partir do qual as preocupações foram mudando do imediatismo para a sustentabilidade. Vários capítulos da Agenda 21 abordam a questão dos resíduos ou têm relação com ela, como os seguintes:

- Combate à pobreza;

- Mudança dos padrões de consumo; - Dinâmica demográfica e sustentabilidade;

- Proteção e promoção da saúde humana;

- Promoção de assentamentos humanos sustentáveis;

- Elaboração de políticas para o desenvolvimento sustentável; - Proteção da atmosfera: realizando a transição energética;

- Enfoque integrado do uso de recursos do solo; e, principalmente, - Busca de soluções para os problemas do lixo sólido.

Esses capítulos da Agenda 21 irão nortear o desenvolvimento no século XXI, que prima pela qualidade de vida, menos trabalho, mais lazer, mais serviços, mais tecnologia, etc. O conceito de Qualidade de Vida passou a ser mais importante do que ter, possuir, gastar, etc... Para se ter qualidade de vida, tem-se que desenvolver o tripé:

- Ambiental - preservação e conservação de recursos naturais (Agenda 21);

- Social - cuidado com as condições básicas da sociedade. Ex.: combate à falta de saneamento básico e investimentos em escolas, que levariam a uma redução da mortalidade infantil e do analfabetismo, com a diminuição da necessidade de mão-de-obra não qualificada; e - Econômico - geração de empregos diretos, criando alternativas econômicas para regiões economicamente deprimidas. Por exemplo: há 13 bolsões de pobreza crônicos no Brasil, entre eles o Vale do Ribeira e o do Jequitinhonha, áreas tradicionalmente exportadoras de mão-de-obra não qualificada.

É dentro desse contexto que a universidade se enquadra, produzindo tecnologias novas que permitam desenvolver e manter a sustentabilidade, suportando o tripé básico da qualidade de vida.

Com a sociedade cada vez mais ávida em consumir, a geração de resíduos torna-se uma das principais preocupações ambientais. Essa geração se agravou com o avanço do processo de urbanização e industrialização. Antigamente o lixo, cuja origem vem do latim lix, que

significa cinzas, já evidenciavas principalformadetratamentodos resíduos domésticos - a queima. Ocorreu, ao longo do tempo, uma multiplicação dos problemas em relação ao crescimento da geração de resíduos em termos per capita. Isso ocorreu devido a mudanças nos hábitos de consumo, principalmente nos países desenvolvidos, destacando-se aqui o principal poluidor do planeta, os EUA. Os fatores econômicos e sociais resultam numa mudança na composição dos resíduos, principalmente na geração de embalagens. Isso pode ser evidenciado pelos dados de consumo de materiais diversos, sobretudo os polímeros ou os plásticos (Figura 1). Hoje os EUA gastam cerca de US$490 bilhões em orçamento militar e mais de US$250 bilhões na Guerra do Iraque. O Worldwatch Institute lista, no mundo, maiores gastos com maquiagem, perfumes, viagens, etc., do que os gastos necessários para prover água potável ou combater a fome no planeta.

Infelizmente o Brasil segue o modelo americano de consumo e, o que é pior, de desperdício. Somente o entulho descartado na cidade de São Paulo, segundo dados publicados pelo jornal Folha de São Paulo,

seria suficiente para construir cerca de 35 casas/dia. Já o desperdício industrial corresponde ao intervalo de 20 a 40% do faturamento global do setor. No caso dos hortigranjeiros esse desperdício corresponde a 30%, e nos grãos esse valor chega a 20% da produção. Como resultado, 100.000 crianças morrem de fome anualmente no Brasil.

Há variações nos dados da literatura sobre a geração de resíduos no mundo; inclusive no Brasil há grandes variações nos dados citados. Todavia se estima que o brasileiro gere em média 0,6 kg/dia, o que está de acordo com valores de países europeus como Itália (1,5 kg/dia), Holanda (1,3 kg/dia), Japão (1,1 kg/dia), Grécia (0,8 kg/dia) e Portugal (0,6 kg/dia), mas representa muito menos do que é gerado pelos EUA, 3,2 kg/dia per capita. Essa geração excessiva de lixo e sua deposição inadequada podem gerar vários problemas, inclusive para a saúde humana:

- Metais tóxicos - são aqueles pesados, que apresentam densidade acima de 5 g/cm3, e alguns leves, cómo o bário, mas ainda assim tóxicos (lâmpadas de mercúrio, embalagens tóxicas, pilhas e baterias,

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componentes eletrônicos, restos de tintas, plásticos coloridos, borrachas, tecidos, defensivos, entre outros produtos);

- Doenças vinculadas ao lixo - 5,2 milhões de pessoas, incluindo 4 milhões de crianças, morrem ao ano. Ex.: surto de cólera ocorrido no Peru, dengue (acúmulo de águas), etc.;

- Contaminação de corpos de água de superfície e subsuperfície, levando à falta de disponibilidade de água potável de qualidade ou mesmo à busca por águas profundas.

Esses problemas estão relacionados com a incidência de câncer em proporções maiores. Dentre as causas de câncer não genéticas, de 30 a 50% são constituídas por produtos naturais; fumar responde por 20%; causas ocupacionais por 5 a 25%, medicinais por 5 a 10% e as oriundas de aditivos alimentares por 5 a 10%. Muitos desses compostos

acabam nos aterros ou lixões, acumulando-se na cadeia alimentar através da água.

Assim, é importante, antes de se planejar a destinação dos resíduos e seu aproveitamento no Brasil, estabelecerem-se definições claras. A principal delas é o que é lixo. Lixo é uma mistura de resíduos e rejeitos. Resíduos são recicláveis e rejeitos são destinados à deposição final em aterros. Os conceitos podem variar conforme a época e o lugar. Dependem de fatores jurídicos, econômicos, ambientais, sociais e tecnológicos. A definição e a conceituação dos termos lixo, resíduo e reciclagem diferem conforme a situação em que forem aplicadas. Segundo Figueiredo (1995), a idéia usual de resíduos decorre da agregação aleatória de elementos bem definidos que, quando não tratados, podem transformar-se em uma massa sem valor comercial e com um potencial de agressão ambiental, variável segundo a sua composição. Resíduo é algo que fez parte de um processo produtivo ou não, e que eventualmente não está sendo aproveitado mas que apresenta ainda uma utilização em potencial, ou, ainda, é tudo o que serve para um processo produtivo próprio ou de terceiros. Resíduos são substâncias, produtos ou materiais gerados num processo industrial ou agrícola que, no mesmo processo ou em outro, ainda podem ser reaproveitados. Rejeito é algo inservível, cuja única aplicação é a destinação final. Rejeitos consistem na parte inaproveitável dos resíduos, restando apenas a sua deposição ou destinação final. Nessa deposição final tem que ser considerada sua inativação, neutralização, descontaminação ou desintoxicação. Os resíduos provêm de um produto, que é a atividade-fim de um negócio. Co-produto é algo de valor compatível com o produto da atividade-fim do negócio. Subproduto é algo que forneça uma remuneração ao negócio menor que a da atividade principal. No desenvolvimento dos processos de reciclagem ora em andamento na UNESP, busca-se a promoção de materiais tidos como rejeitos para resíduos, de subprodutos para produtos

e assim por diante, valorizando-se a cadeia produtiva dos recicláveis. Por outro lado, lixo seria algo inservível, necessitando apenas ser descartado de uma maneira atóxica e não poluente, e, se possível, não devendo ser notado pela geração atual e pelas futuras gerações. Lixo seria mais o rejeito do que o resíduo, e portanto será utilizada a terminologia RSU - Resíduos Sólidos Urbanos para definir-se o lixo urbano doméstico. Pois, a partir dessas definições, os processos estudados no presente trabalho poderão ou não tornar-se viáveis (LEÃO, 1997).

As pressões ambientalistas e a crescente competitividade pressionam nossas empresas a fazer mais (quantidade de produtos, qualidade) com menos (matérias-primas, energia, impacto ambiental, etc.). A intensidade de uso dos materiais deve levar em conta o custo de fabricação, utilização, reutilização, reciclagem e deposição final. Em outras palavras, deve-se aumentara eficiência de conversão dos recursos naturais, prolongar a vida útil dos produtos, considerar sua reciclabilidade e devem-se usar tecnologias corretas para com o meio ambiente e para com os trabalhadores da empresa. Isso tornará os produtos da empresa competitivos globalmente, pois, ao se atender às demandas descritas anteriormente, o custo final do produto será menor. Tecnologias que permitam a utilização de materiais anteriormente descartados como rejeitos, para a produção de novos materiais de maior valor agregado, são bem-vindas. Aênfase do trabalho do Laboratório de Resíduos Sólidos e Compósitos da UNESP é a produção de um novo material denominado compósitos lignocelulósicos com matrizes termoplásticas.

Sistemas compósitos consistem na associação de uma substância chamada matriz a uma outra substância, que pode ser uma carga ou reforço e ser contínua, descontínua, curta, longa, na forma de pó, esferas, etc. O resultado dessa mistura é um efeito sinérgico nas propriedades globais do sistema, a partir das propriedades individuais dos seus componentes.

A indústria de compósitos tem a expectativa de ser o mais importante segmento da indústria de plásticos. As perspectivas são imensas para atender a mercados em grandes quantidades, com baixo preço e oferecendo um balanço favorável de produto, qualidade, desempenho e custo.