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Para Vigotski aprendizado e desenvolvimento estão presentes e se interrelacionam desde o primeiro dia de vida da criança; logo, estava interessado em estudar as relações existentes entre o processo de desenvolvimento e a capacidade de aprendizado.

Para ele é o aprendizado que permite o desenvolvimento: “o aprendizado

humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles que a cercam”. Vigotski

(2007:100). É o aprendizado que permite o desenvolvimento dos processos psicológicos humanos os quais são organizados culturalmente.

Vigotski (2007:94-95) analisa sob dois enfoques o aprendizado e o desenvolvimento:

1. Nos processos de aprendizado - não sistematizados – que ocorrem antes da criança entrar na escola.

2. Nos processos de aprendizado – sistematizados – que ocorrem no período escolar que oferecem novos elementos para o desenvolvimento da criança.

Além desses enfoques, ele também determinou dois níveis de desenvolvimento:

1. Nível de desenvolvimento real – diz respeito ao desenvolvimento já completado, efetivado; corresponde às capacidades já adquiridas pela criança – o que ela é capaz de realizar sozinha, de maneira independente, sem o auxílio de alguém mais velho ou mais experiente.

2. Nível de desenvolvimento potencial – corresponde àquilo que a criança é capaz de fazer; porém, com o auxílio de outra pessoa (mais experiente), o que pressupõe uma interação entre a criança e o outro na resolução de uma tarefa ou atividade.

A distância entre o que a criança consegue realizar sozinha, autonomamente e aquilo que realiza com a colaboração de outra pessoa ou grupo social, caracteriza a Zona de desenvolvimento proximal – que define as funções que ainda estão em processo de amadurecimento, maturação.

...a zona de desenvolvimento proximal. Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (VIGOTSKI,

2007:97).

De acordo com a caracterização de Vigotski, é na zona de desenvolvimento proximal que pode surgir novas formas (construção, modificação, enriquecimento, mudanças dos esquemas de conhecimento) de um aluno, por exemplo, menos competente enfrentar as situações problemas graças ao auxílio de colegas mais competentes num processo de interação; além disso, é possível entender que aquilo que o aluno (ou pessoa) faz com a ajuda da zona de desenvolvimento proximal num dado momento poderá realizar independentemente em outro.

Para Vigotski é o aprendizado que faz com que se crie a zona de desenvolvimento proximal acionando processos internos de desenvolvimento que são ativados quando a criança interage com as pessoas do seu meio social. Quando esses processos são internalizados passam a fazer parte do desenvolvimento individual da criança.

Porém, o simples fato de a criança entrar em contato com objetos não garante o aprendizado. É necessária a intervenção de membros mais maduros da cultura do aprendizado para que ocorra o processo de desenvolvimento. A escola é um lugar de interações sociais onde o aprendizado é conduzido para um determinado tipo de desenvolvimento; logo, a intervenção do professor assume papel central na trajetória dos alunos. Se o professor tem convicção dessa dimensão, seu desempenho como mediador do processo ensino- aprendizagem da leitura manifesta a valorização social em suas ações, focando a leitura como experiência individual, não deixando de considerar que esta também constitui uma experiência social porque envolve pensamento e linguagem.

Diante da multiplicidade de conceitos expostos (segundo os estudos de Vigotski) ao longo do texto na tentativa de compreender o homem e seu meio e como ambos se constituem, percebemos a complexidade e a dificuldade de apreensão da relação homem/mundo. É exatamente esse esforço de tentar compreender e apreender o indivíduo em sua totalidade que os estudos de Vigotski têm contribuído significativamente.

Entendemos o homem como um ser multideterminado, que altera e sofre as alterações do meio social; logo, não podemos deixar de considerar que muitos são os problemas a serem resolvidos sobre as questões que envolvem o processo de ensino e aprendizagem da leitura e muitas são as áreas de conhecimento que procuram contribuir com reflexões e pesquisas a cerca dessas questões. Dentre elas Kato (2007:1) cita: sociolinguística, psicolinguística, linguística textual e ciências da cognição. A área da Psicologia da Educação também é uma delas. Nessa perspectiva traremos à luz das discussões as idéias de Vigotski para o embasamento teórico de nossa pesquisa; além, de outros estudiosos que compartilham idéias sociointeracionistas no tocante à aprendizagem da leitura.

PARTE II

Conhecer não é refletir a realidade, é elaborar modelos que se pareçam o mais possível ao que sabemos dessa realidade. Todo conhecimento é uma aproximação incerta.

2.0 A leitura e as exigências da sociedade da informação.

Quando deparo-me refletindo sobre a questão da leitura nos dias atuais, um questionamento inquieta meus pensamentos: Será que a leitura está perdendo seu valor social e cultural? Compreendo a leitura como portadora de possibilidades de saberes, reflexões, ações, prazeres, experimentos, motivações; enfim, um elemento indispensável para conciliar a vida pessoal, cultural, educacional, profissional e social.

A sociedade atual é caracterizada pela expansão frenética da informação, exigindo de todos que dela participam uma atitude constante de aprendizagem e esforços para transformar informações em conhecimento, os quais se tornam cada vez mais provisórios em função do acelerado ritmo de transformações em virtude da dinâmica existente na sociedade.

Para Assmann (2000:8) toda a informação pode ser classificada, analisada, estudada e processada a fim de gerar saber; ou seja, a informação é como se fosse uma matéria prima a ser transformada em um bem.

Segundo Millán (2000) “el conocimiento está dentro de la información”. Para o autor, conhecimento e informação possuem matrizes diferentes: a informação é algo externo, é informe, é rapidamente acumulada, pode-se automatizar e é inerte; já o conhecimento é interiorizado, é estruturado, só pode crescer lentamente, é apenas do humano e conduz a ação. O autor ainda nos diz que “la lectura es la llave del conocimiento en la sociedad de la información”.

Algumas questões invadem nossa mente sobre a relevância do ato de ler nos dias atuais em que os textos tornam-se hipertextos e os contextos mais globalizados, exigindo cada vez mais do leitor uma compreensão crítica para perceber as relações que permeiam texto e contexto. E mais, o que significa ler nas chamadas sociedade da informação.

Sacristán (2007:48) argumenta que “toda sociedade é da informação” porque na sociedade há acúmulo de saberes, conhecimentos que são conteúdos das atividades comunicativas; toda sociedade exige a participação de seus membros em processos de comunicação, transmitindo formas de fazer, pensar, querer; ou seja, a sociedade é sustentada por uma cultura que envolve as pessoas em redes sociais. Para o autor o que há de novo na sociedade em que

vivemos é que o acúmulo de conhecimentos disponíveis cresce muito; a possibilidade existente de que esse acúmulo seja mais acessível; que se disponha de informação sobre mais coisas; a circulação de conteúdos incrementa sua fluidez por meio de canais de circulação, a presença de mais atividades e agentes que reproduzem e reinterpretam o conhecimento; os meios de comunicação acrescentam sua presença na vida cotidiana, marcando a atualidade, ocupando nosso tempo; mais pessoas podem participar dessas tendências (em diferentes tipos e níveis de informação e em desigual medida uns com relação aos outros).

Já Assmann (2000:9) aponta que a simples disponibilização crescente da informação não basta para caracterizar uma sociedade da informação; o mais importante, segundo o autor, é o desencadeamento de um vasto e continuado processo de aprendizagem. Para ele o fundamental é considerar a sociedade da informação como uma sociedade da aprendizagem.

Para Pozo (2002:25) cada sociedade, cada cultura cria suas próprias formas de aprendizagem, sua “cultura da aprendizagem” e as atividades de aprendizagem devem ser entendidas no contexto das demandas sociais em que são geradas; ou seja, é o contexto social que determina quais conhecimentos o cidadão necessita dominar.

Encontramos ressonância nas palavras de Vigotski (2007:58) que nos diz que a aprendizagem proporciona a internalização da cultura; em outras palavras, as funções psicológicas superiores são geradas na cultura.

Em nossa cultura, a informação flui de maneira mais dinâmica, mas também menos organizada, (Pozo, 2002:36). Para o autor as modernas tecnologias da informação são mais acessíveis e flexíveis; porém se ao conectar- se à internet a pessoa não for capaz de organizar as informações, extrairá pouca aprendizagem dessa atividade.

Pozo (2002:37) nos revela:

... na sociedade da informação é o consumidor quem deve organizar ou dar significado à sua viagem. É a cultura do zapping informativo, uma cultura feita de retalhos de conhecimento, uma collage que é necessário recompor para obter um significado. Para isso, necessitam-se não só de estratégias para buscar, selecionar e reelaborar a informação. Como

também de conhecimentos com os quais relacionar e dar significado a essa informação.

Isso leva-nos a pensar que a fragmentação da informação não produz conhecimento.

Na atualidade, as sociedades, as culturas estão interconectadas pelas redes de comunicação; as informações chegam às pessoas em tempo real e para compreender esse mundo interconectado, se faz necessário oferecer conhecimentos interligados.

Sendo a leitura um objeto de ensino em todas as áreas do conhecimento não pode prescindir de um olhar global dos professores das diversas áreas do conhecimento sobre as sociedades em rede.

A sociedade da informação exige uma escola cuja aprendizagem seja substancial, interdisciplinar, capacitando o aluno para compreender e atuar em uma sociedade, e porque não dizer, em um mundo tão complexo como o nosso. E mais que a escola desenvolva no aluno “a necessidade de seguir aprendendo” Sacristán (2007:64).

Cada vez mais as pessoas estão interagindo e se apropriando de novas tecnologias de informação e comunicação para transmitirem suas idéias ou ter acesso a outras e isso apenas num clicar de teclas. Mas, será que no Brasil as pessoas estão participando da sociedade da informação?

Estudos realizados pelo Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional - INAF (2005) apontam que apenas 25% da população brasileira utilizam computadores para efetuarem consultas e pesquisas na Internet e no uso do correio eletrônico. Ainda, segundo o INAF, somente 47% dos brasileiros entre 14 e 64 anos chegaram a completar a 8ª série do ensino fundamental. Isso demonstra que 53% da população não têm o nível escolar mínimo necessário, o que no nosso entender, impede e exclui essas pessoas de participarem da sociedade da informação, comprometendo o desempenho frente às demandas, não só do mundo do trabalho, bem como, sua participação cidadã.

Como o expressou Sacristán (2007:58):

Ante a sociedade da informação as disparidades aumentam de forma inexorável, pois quem mais pode aproveitar as vantagens desta sociedade

são os que têm mais capital cultural. Quem tem menos, não apenas não poderá aproveitar as oportunidades, como também, sofrem suas consequências negativas (perda de emprego, subemprego, consumo passivo de televisão de má qualidade, etc).

Para o autor, as desigualdades ainda existentes na sociedade, entre elas de oportunidades, meios, poder, capacidades adquirem novos significados em função do valor dado à informação e ao uso das novas tecnologias.

Isso significa que quanto mais aspectos da vida das pessoas são afetados pelas mudanças da sociedade da informação, mais marginalizados ou excluídos serão aqueles que não dispõem de meios necessários para ter acesso às diversas fontes do conhecimento, levando-nos a crer que o acesso de todos os cidadãos à sociedade da informação necessita de políticas públicas as quais podem fazer a diferença desde que estejam assentadas em princípios de igualdade de oportunidade, participação e acesso de todos aos serviços oferecidos pela sociedade da informação para que a qualidade de vida das pessoas também melhore.