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3. A EXPANSÃO DA DENDEICULTURA NA AMAZÔNIA BRASILEIRA:

3.4. Palma de Óleo no Brasil: estratégias para Produção nacional e uso de

3.4.1 Zoneamento Agroecológico da Palma de Óleo

Em 07 de maio de 2010 a presidência da República Federativa do Brasil publicou o Decreto 7.172 que aprovou o zoneamento agroecológico da cultura da palma de óleo e dispôs sobre o estabelecimento pelo CMN de normas referentes às operações de financiamento ao segmento da palma de óleo. (BRASIL, 2010).

De acordo com o que consta no referido Decreto e nos zoneamentos da palma na Amazônia, o ZAE-dendê, o zoneamento foi feito levando em consideração as necessidades da planta em relação a clima e solo, e a disponibilidade de terra, excluindo as consideradas legalmente bloqueadas ou unidades de conservação ambiental e terras indígenas demarcadas.

Deste modo, o zoneamento da palma no Brasil ficou dividido em dois grandes grupos considerados áreas de baixo risco ambiental. A área “A”, que continha as áreas aptas antropizadas dos Estados do Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Roraima e as áreas “B”, que contemplavam as áreas aptas antropizadas dos Estados de Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Pernambuco, Rio de Janeiro e Sergipe. (BRASIL, 2010).

Como desdobramento do ZAE-Palma de Óleo, fez-se um zoom na Amazônia Legal, região que vem recebendo incentivo na expansão da palma de óleo, e na qual o dendê surge como rota tecnológica a ser incentivada.

Para Antônio Ramalho e Paulo Motta (2010):

O zoneamento agroecológico é uma ferramenta fundamental para a criação de mecanismos de orientação à implementação da cadeia de produção de palma de óleo. Para a Amazônia Legal, em particular, constitui base técnico-científica para se buscar a sustentabilidade dos pontos de vista social, econômico e ambiental pela indicação das terras mais adequadas à cultura de palma de óleo. (idem, p. 20). Observemos que foram excluídas das áreas aptas e, portanto, disponíveis, somente unidades de conservação, terras legalmente bloqueadas e terras indígenas demarcadas. Ora, uma das grandes lutas d movimento indígena Brasil afora se dá justamente na demarcação de suas terras, o que vem sendo feito muito lentamente por causa dos conflitos de interesse existente sobre as terras indígenas, excluir das áreas aptas somente os territórios indígenas demarcados é maximizar a pressão e os conflitos que já existem e possibilitar a existência de outros.

Além dos desastres ambientais a expansão da dendeicultura é ligada ao trabalho escravo, à grilagem de terra, a expulsão de trabalhadores de suas terras, à exploração do trabalho infantil, entre outras denúncias feitas por ONG’s internacionais e corroboradas por muitos estudos científicos que veem a dendeicultura além da eficiência econômica.

A ligação direta da expansão da palma com o desflorestamento levou o parlamento Europeu a sugerir que a partir de 2020 passaria a reduzir o uso de biodiesel oriundo da palma de óleo e completa substituição de todos os biocombustíveis de primeira geração até 2030. Ao final da discussão sobre o tema, o parlamento europeu finalizou sua resolução aprovando que até 2020 a União Europeia somente adquirirá óleo de palma certificado como sustentável26.

É neste contexto de pressão internacional que o zoneamento agroecológico surge não apenas como um instrumento de planejamento, mas também como uma ferramenta de competitividade no mercado internacional, pois vende a imagem de que o óleo de palma oriundo da Amazônia, maior floresta tropical do mundo, é

26

Recomendação 82 da Resolução do Parlamento Europeu, de 4 de abril de 2017, sobre o óleo de palma e a desflorestação das florestas tropicais http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P8-TA-2017-

sustentável. E não apenas isto, que ele vem contribuindo para o reflorestamento e no combate ao desmatamento.

Apesar do qualificativo “agroecológico”, o ZAE- dendê não é mais que edafoclimático, conforme podemos abstrair de RAMALHO FILHO et al (2010) ao discorrer sobre a metodologia utilizada: “O Zoneamento Agroecológico da Palma de Óleo para as áreas desmatadas da Amazônia Legal foi obtido basicamente pelo cruzamento da aptidão das terras com a aptidão climática, após a exclusão das áreas protegidas por lei". (p. 53).

Figura 17 Organograma de Fases do Zoneamento Agroecológico da Palma de óleo

Fonte: RAMALHO FILHO et al, 2010, p. 53.

No decorrer do texto do ZAE-Dendê percebe-se que há o uso indiscriminado dos termos agroecológico e desenvolvimento sustentável, caindo nos modismos muito utilizados sem as devidas considerações ao que implicaria as diretrizes e o próprio desenvolvimento sustentável e a produção agroecológica. Todavia, ao observarmos o organograma da metodologia adotada (Figura 17) e dos temas

considerados no estudo, depreende-se que o agroecológico é um recurso discursivo que se ocupa de promover a aparência do fato.

O Zoneamento Agroecológico da Palma de Óleo foi publicado pela Embrapa em 2010, elaborado com vistas a fornecer informações aos produtores rurais para viabilizar o plantio do dendê como alternativa ao desenvolvimento sustentável. Proporcionar bases para o planejamento de uso do solo respeitando a legislação ambiental e ainda “fornecer bases para o planejamento de polos de desenvolvimento no espaço rural em alinhamento com as políticas governamentais sobre segurança alimentar e energia”. (p.7)

Para começar, o plantio de dendê é dentro de um modelo de monocultivo e baseado no uso intenso de fertilizantes químicos. Ora, se o desenvolvimento sustentável, no plano ecológico, busca o equilíbrio entre os ecossistemas, não é salutar colocar o dendê como uma alternativa ao desenvolvimento sustentável, dado ao modo industrial e de monocultivo que é produzido e ainda aos impactos do uso de produtos químicos e agrotóxicos ao meio ambiente e isto sem mencionar os resíduos e efluentes resultantes da produção do óleo bruto.

Outra crítica que pode ser feita ao zoneamento agroecológico é que essa nomenclatura segue um modelo de reprodução de palavras que estão em voga e que remetem a tipos sustentáveis de agricultura. Assim como desenvolvimento sustentável vem sendo utilizado sem critérios e sem reflexões, o termo agroecológico tem virado uma moda e se detido à mera reprodução de termos, como se o nome agroecológico já carregasse um valor em si, sem que, no entanto, se adote condutas de fato ligadas à agroecologia.

Ainda que no zoneamento tenha-se tido o cuidado de aprofundar os estudos quanto aos fatores limitantes dos solos e do clima em relação às necessidades do dendê, isto foi feito com vistas a suprir as necessidades de modo convencional e somente levando em consideração essa planta, o que passa muito longe dos princípios agroecológicos, tendo em vista que a agroecologia:

Trata-se de uma nova abordagem que integra os princípios agronômicos, ecológicos e socioeconômicos à compreensão e avaliação do efeito das tecnologias sobre os sistemas agrícolas e a sociedade como um todo. Ela utiliza os agroecossistemas como

unidade de estudo, ultrapassando a visão unidimensional – genética, agronomia, edafologia – incluindo dimensões ecológicas, sociais e culturais. (ALTIERE, 2008, p. 23).

Conforme afirma Miguel Altiere (2008), “Para os agroecologistas, vários aspectos dos sistemas tradicionais de conhecimento são particularmente relevantes, incluindo aí o conhecimento de práticas agrícolas e do ambiente físico, os sistemas taxonômicos populares e o emprego de tecnologias de baixo uso de insumos” (p. 26), tudo o que o sistema de cultivo de dendê não possui.

O zoneamento foi realizado levando em consideração as condições edafoclimáticas e com vistas a avaliar o potencial das terras sob diferentes níveis de aplicação de tecnologia agrícola e de capital. Neste sentido, o zoneamento definiu dois níveis de manejo, o manejo B e o manejo C.

Quadro 1 Níveis de manejo considerados no ZAE-dendê TIPO DE

MANEJO

CARACTERÍSTICAS

B Emprega práticas agrícolas que refletem um nível tecnológico médio, havendo modesta aplicação de capital e de resultados de pesquisas para manejo, melhoramento e conservação das condições das terras e das lavouras. As práticas agrícolas estão condicionadas, principalmente, à tração animal. A motomecanização, portanto, é mais intensa no preparo inicial do solo e em alguns tipos de tratos culturais compatíveis com implementos agrícolas mais simples.

C Emprega práticas agrícolas que refletem um alto nível tecnológico; caracterizando-se pela aplicação intensiva de capital e de tecnologias para manejo, melhoramento e conservação das condições das terras e das lavouras. A motomecanização está presente nas diversas fases da operação agrícola.

Fonte: EMBRAPA, 2010.

Considerando o cruzamento de aptidão de solo e de clima para a cultura do dendezeiro, o zoneamento foi definido em quatro classes, a Preferencial, com potencial alto de produção; a Regular, com médio potencial, em solos com moderada limitação para a produção sustentada do dendê; a Marginal apresenta solos com fortes limitações para a produção sustentada do dendê e a Inapta, condições de solo e clima desfavoráveis, tornando inviável a produção econômica do dendezeiro.

A Embrapa recomenda o plantio do dendê apenas nas áreas classificadas como preferenciais e regulares. As classificadas como marginais e inaptas demandam alto investimento em insumos e podem não dar retorno produtivo e econômico.

No Estado do Pará um total de 23.277 km2 foi classificado como áreas preferenciais para o manejo B e 16.668 km2 para o manejo C. A área considerada Regular para o manejo B e para o manejo C foram calculadas em 104.484 km2 e 8.109 km2, respectivamente.

A região preferencial para o cultivo no manejo B e para o manejo C, no estado do Pará, concentra-se na região Nordeste paraense, notadamente na área onde estão instaladas as empresas investidoras na extração do óleo de palma e onde há uma busca por agricultores familiares para se integrarem às empresas.

Figura 18 empresas dendeicultoras em municípios do Estado do Pará até 2015

Fonte: NAHUM e BASTOS, 2015.

Até a implantação do PNPB a produção de dendê no estado do Pará era toda voltada para o mercado de alimentos, e para a indústria química. As principais

empresas no Pará para a indústria alimentícia são a Agropalma, a Marborges, a Denpasa, a Dentauá e a Palmasa.

Após o PNPB várias empresas chegaram ao Estado do Pará, dentre elas dá- se destaque para a companhia Vale, por meio da empresa Biopalma e para a empresa Belém Bioenergia Brasil (BBB), pertencente à Petrobrás Biocombustíveis e à empresa europeia GALP energia. Nesse ínterim, chegaram à região a empresa Yossan e a multinacional norte-americana Archer Daniels Midland (ADM).

Apesar de essas empresas terem se instalado no estado do Pará no advento do PNPB e os incentivos que tanto empresas quanto agricultores receberam tinham como justificativa a produção de biodiesel, a maioria da produção (se não toda) é voltada para a indústria de alimentos e a indústria farmacêutica.

De acordo com a ANP (2018), em 2017 no Norte do país havia apenas três plantas autorizadas para produção de biodiesel, dentre as quais apenas duas estavam em funcionamento e nenhuma delas era no estado do Pará.

Berta Becker (2010) aponta que a industrialização do dendê até a produção do biodiesel é um desafio, haja vista que, de acordo com esta autora, o preço do óleo no mercado é superior ao do biodiesel, o que tem levado os produtores a preferirem comercializar o óleo. Fortalecendo deste modo, uma tendência da Amazônia que é exportar produtos com pouca ou nenhuma agregação de valor.